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Novos ares, velhos problemas
Saiu de cena a grosseria dos últimos anos — que não conta para o PIB, mas faz muito bem à saúde. Um costume abominável do Brasil, entretanto, persiste
100 dias de governo, Novos ares, velhos problemas, Capital Aberto
É melhor o governo se ocupar (e se preocupar) com a queda no número de julgamentos da CVM | Imagem: Freepik

Em abril, a imprensa dedicou-se ao balanço dos 100 dias de governo, mais um costume americano que, parece, importamos definitivamente. Não vejo consistência em períodos aleatórios e, de minha parte, considero suficientes, para uma avaliação, os primeiros dez dias. 


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A começar pelo próprio ministério, onde predominam políticos testados, incluindo ex-governadores e quatro ex-candidatos à presidência da República, sendo dois de centro-esquerda e dois de centro-direita, significando experiência e diversidade.  

Em que pesem algumas concessões inevitáveis, há ministros capazes, como demonstrado em rápidos debates com parlamentares oposicionistas, aparentemente interessados em produzir “conteúdos” para seguidores em redes nem sempre sociais. Saiu de cena a grosseria dos últimos anos. Não conta para o PIB, mas faz muito bem à saúde. 

Contando para o PIB, tem o ministro da Fazenda dialogando com o Congresso, ao contrário do que acontecia com o seu antecessor. Por outro lado, as viagens do presidente promovem a reinserção internacional do País, afastando a triste condição de pária, que tanto parecia agradar ao grupo instalado no poder durante o período 2019-22. Faz bem ver o país presente em parlamentos estrangeiros e em fóruns globais. É muito melhor do que acordar ao som de cercadinhos toscos ou dormir ao som de “lives” monocórdias e despropositadas. 

E, principalmente, os acontecimentos decorrem de forma transparente, sem os obscuros gabinetes paralelos e os sigilos que marcaram a administração anterior. 

Ainda nos primeiros dez dias, o governo deu resposta adequada aos acontecimentos de 8 de janeiro, sobre os quais não é necessário comentar. Cabe, entretanto, dizer que a escalafobética (existem termos que não devem ser aposentados do uso cotidiano, porque insubstituíveis) tentativa de golpe constituiu uma síntese do (não) pensamento político da gestão passada. 

Lembrou o rocambolesco assalto integralista ao Palácio do Catete em 1938, apoiado, ontem e hoje, por extremistas e salvadores da Pátria. A par das grandes linhas, o presidente Lula tem pontuado no varejo, como aconteceu ao advertir sobre as “genialidades” divulgadas ao público sem prévio entendimento com a equipe de governo. 

Por sinal, o secretário de reformas econômicas, Marcos Pinto, defendeu a instituição de mandato para o superintendente de processos sancionadores da Comissão de Valores Mobiliários. Não causou boa impressão, até por contrariar a própria estrutura compartilhada de direção na agência, que não é exercida de forma isolada, mas por meio de um colegiado de diretores. Também não há garantias de que os eventuais titulares tenham perfis adequados ao delicado cargo, sem falar na hipótese de engavetadores seletivos, como já vimos acontecer em outros órgãos. 

Além disso, de mandato em mandato, os escolhidos em gabinetes ainda acabam emparedando os eleitos nas urnas e os aprovados em concursos públicos. Não é uma opção democrática, devendo ser (re)pensada, por conta da boa governança republicana. 

Os processos sancionadores na CVM, geralmente, são propostos pelas áreas técnicas e apreciados pelo colegiado da autarquia. Não faz sentido que o titular da área esteja imune à avaliação pela direção, a respeito do seu desempenho e eficiência. 

É melhor se ocupar (e se preocupar) com a queda no número de julgamentos. Segundo nota publicada em newsletter semanal da CAPITAL ABERTO, reportando pesquisa da FGV Direito SP, o recorde histórico aconteceu em 2018 (109 processos julgados). Em 2019 houve queda (98), repetida em 2020 (63), em 2021 (56) e em 2022 (50). 

Uma explicação para esse decréscimo é a carência injustificável de pessoal na CVM. Tornou-se urgente a reposição de quadros, mas colocaram condicionantes à realização de concursos públicos no projeto de arcabouço fiscal. Muito estranho, pois nesse caso o interesse público se afina com os interesses privados – ninguém se sente feliz com impunidades. A quem interessa essa escassez de agentes públicos? 

Voltando ao atual governo, aparentemente há uma tentativa de cerco por parte de correntes vencidas na eleição de 2022. A ideia parlamentarista, defendida com alguma seriedade em outros tempos, foi colocada em prática casuisticamente em 1961, com cara e corpo de semigolpe. Não deu certo.  

Agora temos uma espécie de bem remunerado parlamentarismo branco, nascido no vácuo da inapetência, aliada ao despreparo. Parece mais um saldo das manifestações de 2013. O governo resiste e, por isso, sofre alguns reveses. Faz parte e não se trata de novidade. É apenas um costume abominável do Brasil (velho ou novo), pujante e nostalgicamente golpista. 

*Carlos Augusto Junqueira de Siqueira é advogado. Atuou como superintendente da Comissão de Valores Mobiliários e é autor dos livros Fechamento do capital social e Transferência do controle acionário 

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