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Assembleias de 2021 em 5 episódios
Problemas nos sistemas de votação, divergências sobre a remuneração de executivos e intervencionismo do governo foram destaque nos encontros deste ano
5 episódios marcantes da temporada de assembleias de 2021

Durante as assembleias, foram discutidos os pacotes de remuneração de executivos, as dificuldades em eleições por voto múltiplo, as incoerências em boletins de voto a distância, a governança em estatais, entre outros | Imagem: freepik

Cada temporada de assembleias gerais ordinárias (AGOs) tem suas particularidades e casos emblemáticos, em geral definidos pelas circunstâncias das companhias, pelo cenário interno e pelo ambiente no exterior. Em 2021, questões de interferência política em gestão e pressões de investidores estrangeiros fermentaram as discussões nos encontros realizados entre março e abril. Petrobras e Vale, por exemplo, foram protagonistas de episódios que devem continuar a reverberar no mercado ao longo do ano e merecem atenção redobrada por parte dos atuais — e futuros — acionistas. 

A seguir, os principais destaques da temporada de assembleias de 2021. 

Problemas na votação dos investidores estrangeiros 

Enquanto a MP de Ambiente de Negócios é alardeada pelo governo como um caminho para atrair investimentos estrangeiros para o Brasil, os investidores internacionais continuam a esbarrar em questões operacionais durante as assembleias no País. Em abril, a Petrobras ficou sob os holofotes após ser questionada pelo sistema de voto a distância que elegeu seu novo conselho de administração. De oito vagas abertas no board, os minoritários só conseguiram ocupar uma (com Marcelo Gasparino) e criticaram o processo eleitoral quanto a diferenças de redação nos boletins de voto a distância publicados em inglês e em português. Segundo os críticos, as divergências teriam induzido os acionistas a erro. Além disso, investidores estrangeiros ouvidos pela Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec) afirmam que seus votos na assembleia da petroleira foram apenas parcialmente computados, algo percebido por eles em outras empresas brasileiras.  

“Acionistas estrangeiros com ativos em dezenas de países classificam o Brasil como o mais complexo. É ainda pior quando se trata de eleição por voto múltiplo, situação em que os investidores devem não só indicar os candidatos escolhidos, mas também o percentual de suas ações que será alocada em cada um”, explica Fábio Coelho, presidente da Amec. 

A eleição por voto múltiplo também deu bases para a disputa acirrada entre acionistas de referência e minoritários na assembleia geral da Vale, que tem a maior parte do capital nas mãos de estrangeiros. Estavam em jogo 12 cadeiras no conselho de administração da companhia. Havia 16 nomes em votação, 12 deles indicados pela própria Vale. O desfecho da reunião teve que ser adiado após acionistas detentores de american depositary receipts (ADRs, recibos de ações negociados no mercado americano) reclamarem de um suposto erro no cômputo de votos. O Citi, instituição depositária dos ADRs, recontou os votos antes da retomada da discussão na AGO. 

Mudanças em série na alta administração de estatais 

A interferência do presidente Jair Bolsonaro na cúpula de importantes companhias de capital misto esteve no centro das discussões do mercado e materializou-se nas AGOs através de novas eleições para os conselhos de administração do Banco do Brasil, da Eletrobras e da Petrobras. Essas companhias sofreram mudanças importantes no board por decisão do Planalto. Em geral, deixaram os colegiados os conselheiros de perfil mais técnico, ligados ao mercado e com postura independente, e entraram executivos alinhados aos interesses do Executivo. Entre eles estão o general Joaquim Silva e Luna e o ex-secretário de energia do Ministério de Minas e Energia Rodrigo Limp Nascimento, que foram indicados pelo controlador para os cargos de CEO e presidente do conselho na Petrobras e Eletrobras, respectivamente. 

Na avaliação de Francisco Petros, sócio do escritório Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados e conselheiro de administração da Petrobras entre 2015 e 2019, o Estado está em muitas empresas, que acabam sendo excessivamente reguladas por órgãos diversos, como a Agência Nacional do Petróleo (ANP), a Controladoria-Geral da União (CGU), o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) — isso sem falar dos órgãos internacionais, caso a companhia tenha ações listadas fora do País. “Esse arcabouço desequilibra as relações societárias, de gestão das estatais e as relacionadas à presença dessas empresas no mercado de capitais. Ele não atende de maneira equilibrada os interesses envolvidos”, analisa o advogado.  

Entenda os reflexos na governança corporativa de estatais na reportagem: “Os riscos da nova ingerência política na Petrobras” 

Limites à remuneração de executivos 

Amplamente discutida em âmbito internacional, a remuneração de executivos bateu às portas das companhias brasileiras na temporada de AGOs deste ano. O debate começa a ganhar tração em algumas das maiores empresas listadas na B3, um reflexo da pressão de acionistas estrangeiros. Durante assembleia da Vale, por exemplo, 22% dos investidores votaram contra o pacote de remuneração global apresentado pela administração, superior a 202 milhões de reais, o maior já sugerido pela empresa. Se fossem considerados apenas os boletins de votos a distância, que concentram a opinião dos acionistas estrangeiros, a proposta teria sido recusada.  

Mas o ativismo entre assets brasileiras em relação à remuneração de executivos parece crescer. Em maio, a gestora de recursos JGP, que adotou os fatores ESG (ambientais, sociais e de governança) como parâmetro, fez questão de deixar registrado por escrito seu voto contrário à proposta do Assaí para a remuneração do conselho de administração, no valor de 43 milhões de reais. O entendimento é de que o montante parece desproporcional, considerando que o presidente do colegiado, Jean Charles Naouri, como acionista majoritário e executivo do grupo francês Casino, dono da marca Assaí, não receber remuneração pela sua posição. Apesar da reclamação da JGP, a proposta foi aprovada, já que o Assaí tem controlador.  

Voto negativo no Brasil? 

Um assunto que causou rebuliço no mercado, paralelamente às assembleias ordinárias, foi a discussão sobre a instituição do voto negativo em eleições do conselho. O gatilho foi a proposta da Vale para, na reforma de seu estatuto social, incluir a previsão o voto negativo para o pleito do board. 

A ideia provocou um debate intenso no mercado de capitais brasileiro, envolvendo desde interpretações de pontos da Lei das S.As. até implicações para a governança corporativa. Após manifestação contrária à legalidade do voto negativo apresentada pela Superintendência de Relações com Empresas (SEP) da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a administração da Vale retirou a proposta. “Mesmo que depois tenha sido retirada, a proposta da mineradora serviu para trazer à tona uma discussão relevante sobre o sistema de votação para conselhos de administração no País. É verdade que o mercado nacional ainda tem muitas companhias com controlador definido, mas esse cenário está mudando”, pondera Pablo Renteria, sócio do Renteria Advogados e ex-diretor da CVM.  

Além disso, a expectativa é de que o assunto volte a ser debatido, já que a mineradora ressaltou que se reservava o direito de requerer, no momento oportuno, o reexame da matéria pela CVM.  

Entenda a questão na reportagem: “A polêmica em torno do voto negativo 

Assembleias presenciais ou digitais? 

Outro destaque da temporada de assembleias foi o modelo das AGOs. No Brasil, a possibilidade de as companhias abertas realizarem assembleias 100% digitais, sem a presença de um componente presencial, foi possível graças à edição da Medida Provisória (MP) 931/20. Desde então, foi observada uma adoção cada vez maior desse modelo.  

“As assembleias digitais foram bem recebidas pelas companhias abertas, muito embora parte delas resista à migração“, afirma o ex-diretor da CVM Gustavo Machado Gonzalez. O advogado fez um levantamento com 70 companhias abertas cujas ações integravam a carteira do Ibovespa para avaliar como realizariam as AGOs em 2021. A análise do material indica que a adoção do modelo exclusivamente digital passou a ser a principal opção — das 70 empresas da amostra, 48 (68,57%) realizaram ou iriam (até a data do estudo) realizar suas AGOs de modo exclusivamente digital, contra 25 (34,72%) no ano passado. 

Aquelas que não aderiram ao modelo, como Ambev, Totvs e Lojas Americanas, têm sido alvo de críticas por dificultar a comunicação entre administração e acionistas. Em artigo, Renato Chaves, que atua em conselhos de administração e fiscal, opina que, em vez de distanciamento social, tem sido praticado o distanciamento societário. “Companhias apregoam possuir tecnologia de ponta para vendas online, controle da produção, trabalho remoto — mas oferecem uma caneta Bic para a condução das assembleias de acionistas 100% presenciais, 100% offline. É a vanguarda do atraso”, escreve. 

Confira a análise das AGOs realizadas em 2020 e 2021 no artigo: “Assembleias digitais: notas sobre a temporada de AGOs de 2021” 


Notas 

“Assembleias 100% offline: o distanciamento da realidade” — Blog de Governança, por Renato Chaves 

 

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