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A simplicidade premiada pelos analistas de ações
Estatística aponta que o retorno médio das ações nos Estados Unidos tende a ser inversamente proporcional ao número de páginas do balanço anual das empresas
Alexandre Póvoa é fundador da Valorando Consultoria e autor dos livros “Valuation”, “Como Precificar Ações” e “Mundo Financeiro, o Olhar de um Gestor” | Ilustração: Julia Padula
Alexandre Póvoa é fundador da Valorando Consultoria e autor dos livros “Valuation”, “Como Precificar Ações” e “Mundo Financeiro, o Olhar de um Gestor” | Ilustração: Julia Padula

Desde que comecei a trabalhar no mercado financeiro, na década de 90, escuto a mesma ladainha: “Em vez de comprar as respectivas empresas operacionais, adquira a ação da holding, que é negociada com desconto”. A justificativa é tentadora: comprando a ação da holding, além de levar toda a potencial alta das subsidiárias, ainda resta um plus a capturar. Quando a holding possui empresas fechadas, que o mercado normalmente precifica mal (ou não precifica), a tentação é ainda maior de entrar no investimento.  


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O ponto é que já estamos em 2022 e aqueles velhos prêmios nunca se materializam. Por que a soma das partes (1+1) nunca é igual a 2? Por que uma ação de empresa holding vale normalmente menos que a união de todas as companhias que a compõem? Por que existe o famoso fenômeno do “desconto de holding” (vide o caso de Itaúsa, Metalúrgica Gerdau, Bradespar, Simpar, entre outras) que, teimosamente, persiste ao longo do tempo?  

Há duas explicações principais. A primeira razão objetiva está no âmbito tributário. Se, por hipótese, a holding resolvesse vender a empresa operacional algum dia, ela teria que pagar imposto sobre o ganho de capital auferido. Por isso, a holding tem que valer menos que as suas 100% controladas somadas. 

A segunda justificativa, de ordem mais subjetiva, tem a ver com a forma que o investidor enxerga uma companhia. Nas décadas de 60 e 70, a palavra diversificação soava como música nos ouvidos dos maiores investidores mundiais. Afinal, como não seguir a lógica financeira de Henry Markowitz e William Sharpe, recomendando que, ao unir negócios sem nenhuma relação entre si, chegamos a um risco total menor na carteira? Usando a linguagem popular, “ao não se colocar todos os ovos na mesma cesta”, o investidor carrega um empreendimento múltiplo com maior tranquilidade, já que um possível prejuízo em um setor poderia ser compensado pelos lucros em outro. 


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Calhamaços desnecessários 

A complexidade crescente dos balanços, porém, começou a jogar contra e a destruir o valor das empresas. O mundo financeiro de hoje clama por simplicidade e o investidor recompensará, cada vez mais, a transparência total. Uma medida da maior dificuldade na análise de balanços pode ser encontrada no estudo publicado pelo Prof. Aswath Damodaran, da Stern School of Business. A pesquisa revela que, em média, o número de páginas de um balanço anual de uma empresa aberta norte-americana foi multiplicado por cinco nos últimos 30 anos.  

Concomitantemente, uma estatística produzida pelo Banco Morgan Stanley Dean Witter mostra que o retorno relativo médio das ações nos EUA tende a ser inversamente proporcional ao número de páginas de seu balanço anual. A razão sugerida baseia-se na tese de que o investidor pressupõe que grande parte das informações são inúteis e tornam de difícil entendimento o cerne do resultado. Não é à toa que o mercado normalmente reage bem quando uma empresa vende uma participação importante em outra companhia, ou quando há uma revelação maior dos números de um grupo (separação de empresas, os spin-offs, “destravando valor”). É o prêmio pela simplicidade, decorrente da identificação de virtudes e fraquezas de uma empresa. 

Um exemplo no Brasil é o da Hypera Pharma: até 2011, a companhia atuava em diversos segmentos, como alimentos, cosméticos, consumo, higiene infantil, produtos odontológicos, limpeza e farmacêutico. Na época, se chamava Hypermarcas, por reunir dezenas delas em seu portfólio, com valor de mercado na casa dos 9 bilhões de reais. Era vista pelos analistas como “muito complicada para fazer projeções (tal era o número de produtos em diferentes ramos) e, mais importante, para entender a estratégia”.  

Então, a empresa resolveu alterar o seu plano de voo, concentrando-se no segmento farmacêutico a partir de 2011. Entre aquele ano e 2017, vendeu todos os ativos que não se encontravam nesse setor. Em 2018, promoveu a mudança de nome para Hypera Pharma, a fim de deixar claro o seu foco a partir dali. Interessante é notar que, apesar de ter, intencionalmente, se “autoreduzido”, seu valor de mercado atual, mesmo em um momento péssimo para ações, é de 27 bilhões de reais (200% de apreciação em 11 anos). No mesmo período (julho de 2011 a julho de 2022), o Ibovespa valorizou-se em 100%.  

Armadilhas 

O perigo de leituras equivocadas, afinal, ronda os analistas e investidores. Eventos não recorrentes em demonstrações de resultados, ativos e passivos escondidos em empresas subsidiárias, técnicas de “suavização de lucros”, planejamento fiscal (por exemplo, depreciação acelerada), potenciais déficits escondidos em fundos de pensão e planos de saúde de empregados — tudo isso pode fazer potencialmente o valor de uma ação ir do céu para o inferno, de acordo com o grau de atenção do analista.  

Há ainda problemas a serem enfrentados em empresas nas quais a inovação é “a alma do negócio” e gastos com pesquisa, desenvolvimento e marketing, por critérios puramente contábeis (é impossível garantir que haverá um retorno associado), não são usualmente registrados como investimento e sim como despesa. Isso pode causar distorções, reduzindo artificialmente o tamanho do patrimônio e do lucro contábil. A lista de armadilhas inclui também as operações, sobretudo financeiras, que são registradas “fora do balanço”, como swaps e outros tipos de derivativos. Algumas possuem valor aparentemente irrisório, mas podem transformar-se em bombas de efeito retardado de acordo com o comportamento dos mercados. Todas essas dificuldades exigem ajustes cirúrgicos nas projeções de resultados e, consequentemente, no cálculo do valor justo de uma ação. Quanto mais complicado o quadro, mais o investidor se afasta.  

Há um dilema embutido nessa história toda. Do lado positivo, o crescente número de instrumentos (sobretudo financeiros) gera facilidades operacionais para as empresas. Por outro prisma, aumenta a complexidade para o entendimento pleno do balanço. As boas empresas devem conseguir conciliar os dois aspectos, para não serem penalizadas pelo mercado. A simplicidade, no mundo financeiro, é premiada.   

Alexandre Póvoa ([email protected]) é estrategista da Meta Asset Management e autor dos livros “Valuation, como precificar ações” e “Mundo financeiro, o olhar de um gestor 

 

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