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Capitalismo de stakeholders: compromisso sincero ou jogada de marketing?
Estudo feito por pesquisadores de Harvard revela que as empresas pouco têm feito para romper com a lógica da primazia do acionista
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Imagem: Freepik

No próximo mês, a “Declaração sobre o Propósito de uma Corporação” — manifesto público de responsabilidade corporativa, assinado por mais de 180 empresas americanas — completa três anos. A iniciativa, lançada pela Business Roundtable, conta com a participação de CEOs de renomadas companhias, como Amazon, Apple e Coca-Cola. Ao aceitarem assinar o documento, essas empresas se comprometeram publicamente a estabelecer um novo paradigma: criar valor para todos os stakeholders e não apenas para os acionistas. Mas será que esse compromisso vem sendo levado a sério? 


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A “Declaração sobre o Propósito de uma Corporação” prevê que as companhias fomentem práticas como a diversidade de gênero e raça no ambiente de trabalho, ética na relação com os fornecedores, apoio às comunidades onde atuam e proteção ao meio ambiente. As demandas refletem o apelo que as iniciativas ESG (sigla, em inglês, para princípios ambientais, sociais e de governança) vêm ganhando no mundo corporativo. Pouco antes da publicação do manifesto, Larry Fink, CEO da BlackRock, maior gestora de recursos do mundo, afirmou que companhias que desprezam valores sociais, ambientais e de governança ficariam para trás.  

O fato é que o capitalismo de stakeholders — nome dado a essa nova forma de olhar o papel das empresas — não é um conceito novo e vem sendo debatido há quase cinco décadas, desde que foi conceituado pelo alemão Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial. Porém, o avanço das mudanças climáticas, o aumento da desigualdade social e da escassez de recursos naturais nos últimos reforçaram a urgência de que esse tipo de capitalismo seja colocado efetivamente em prática. “Empresas que priorizam o lucro individual não se sentem incentivadas a enfrentar desafios globais compartilhados pela sociedade. E isso é um problema”, afirmou Andrew Winston, especialista em sustentabilidade global, em artigo publicado na Harvard Business Review logo após a publicação do manifesto da Business Roundtable.   

Ainda assim, a decisão tomada por grandes corporações de assinarem o documento veio acompanhada de uma chuva de críticas. Na época em que as diretrizes foram definidas, o Conselho de Investidores Institucionais (CII), associação de gestoras norte-americanas que administram mais de 40 trilhões de dólares em recursos, discordou do manifesto. Para o CII, ao priorizar os stakeholders, as empresas colocavam os acionistas “em último lugar”, tratando-os apenas como provedores de capital e não como proprietários.  

E não foram só os simpatizantes do capitalismo tradicional que alfinetaram o manifesto. Vozes pró-stakeholders também se mostraram descrentes com a iniciativa, a julgar pelo histórico de falta de compromisso social de algumas empresas que assinaram o documento. “Alguns dos CEOs de fato estão comprometidos em encontrar propósito para suas companhias e construir um legado. Mas é realmente difícil levar algumas das assinaturas a sério, o que acaba minando todo o esforço”, escreveu Winston, em seu artigo.  

Só no discurso 

A polarização em relação ao tema levou os acadêmicos da Harvard Law School, Lucian Bebchuck e Roberto Tallarita, a investigarem os resultados do manifesto, para avaliar se a adesão das empresas representou um compromisso sincero ou se foi principalmente uma jogada de marketing. E as conclusões as quais eles chegaram não foram positivas. Eles identificaram que, na prática, as empresas pouco têm feito para romper com a lógica da primazia do acionista.  

Um ano após a assinatura do manifesto, Bebchuck e Tallarita entraram em contato com as mais de 180 companhias integrantes da Business Roundtable para saber em qual instância o assunto estava sendo discutido. Das 48 que responderam, apenas uma informou que as diretrizes foram aprovadas pelo board. A explicação mais plausível para isso, na visão dos pesquisadores, é que os CEOs não consideraram o manifesto como um compromisso de fato, a ponto de levarem o tema para o conselho, responsável por desenhar as estratégias de longo prazo das empresas. 

A investigação de Bebchcuck e Tallarita não parou por aí e novas evidências foram colhidas nos anos seguintes e publicadas no estudo “Will Corporations Deliver Value to All Stakeholders?”, divulgado em maio deste ano. E, novamente, as descobertas foram desanimadoras. De acordo com eles, 105 empresas mudaram suas diretrizes de governança após a assinatura do manifesto, porém apenas nove afirmam explicitamente que buscam criar valor para todos stakeholders. Em 75, a primazia do acionista continua sendo informada como uma prioridade. “O propósito primário do board é construir valor para o acionista no longo prazo”, diziam as diretrizes da Amazon, dois anos depois de a empresa ter assinado o manifesto.  

O estudo também não identificou entre as empresas pesquisadas qualquer tipo de alinhamento entre a remuneração dos executivos e a entrega de resultados aos stakeholders. O que significa que, nessas companhias, as compensações financeiras, como pagamentos de bônus, continuam atreladas à performance entregue ao acionista. Os pesquisadores verificaram, ainda, que 26 empresas signatárias receberam propostas dos acionistas para que as diretrizes do manifesto fossem implementadas. Porém, todas se opuseram às propostas e tentaram excluí-las das pautas das assembleias, orientando que os acionistas votassem contra. Preocupantes, essas evidências denotam que o capitalismo de stakeholders ainda é tratado como uma estratégia de marketing em muitas empresas. Para que esse cenário mude, a pressão dos investidores — e da sociedade — será cada vez mais crucial.    

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