Reflexões sobre a maturidade dos conselhos
Atenta observação das características e da dinâmica dos boards favorece perenidade das empresas
, Reflexões sobre a maturidade dos conselhos, Capital Aberto

Ana Siqueira* | Ilustração: Julia Padula

Na qualidade de instância máxima de uma organização, o conselho de administração é o guardião das boas práticas de governança e do cumprimento de leis e regulamentos. Já não se discute que a efetividade de seu trabalho é essencial para a perenidade das empresas, e essa eficácia está vinculada a três questões básicas: “quem”, pergunta relacionada ao perfil dos conselheiros; “o que”, referente aos assuntos tratados no conselho; e “como”, ligada à dinâmica de funcionamento do órgão.

Conselheiros precisam ser questionadores e curiosos e devem ter capacidade analítica, habilidade de comunicação e disposição para dedicar razoável tempo a todo esse processo. A reflexão é o fio que conecta conhecimento e competências, e a prática constante facilita o amadurecimento da observação crítica e o consequente aprimoramento desse processo. Questionamentos precisam ser feitos sempre, para que se verifique a pertinência dos caminhos trilhados, sua consistência e coerência.

E quem são os conselheiros no Brasil? Em geral, os boards de empresas brasileiras têm baixo grau de diversidade — considerando-se aspectos como competências, habilidades, vivências, gênero e geração —, o que limita o compartilhamento de diferentes visões, experiências, conhecimentos e informações que tanto cria valor. Mas como levar diversidade aos conselhos? Uma saída está na compreensão, por parte de quem elege os conselheiros (ou seja, os acionistas), do valor gerado pela diversidade. Há um número crescente de estudos bem fundamentados que comprovam a efetividade dessa opção; resta, portanto, a importância do reforço na comunicação e divulgação do tema entre os acionistas, de forma a sensibilizá-los e motivá-los para incluírem diversidade nos conselhos.

As empresas brasileiras normalmente têm estrutura de propriedade bastante concentrada, com acionista controlador ou grupo de acionistas organizados em bloco. Essa configuração faz com que a maioria dos membros dos conselhos seja eleita pelo acionista ou pelo grupo controlador. Historicamente, os investidores minoritários não tinham o hábito de se organizar para obter votos suficientes para eleger conselheiros; felizmente esse quadro está mudando, com uma crescente participação dos investidores institucionais nas eleições de conselheiros. Nesse particular, vale mencionar a atividade de stewardship, movimento global que promove o senso de propriedade nos investidores institucionais, criando padrões de engajamento responsável — o que, por sua vez, promove a adoção de boas práticas de governança corporativa e maior geração de valor. No Brasil esse movimento tem gradativamente avançado, o que é muito positivo.


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E o que os conselhos discutem? Estão entre suas atribuições a curadoria da cultura organizacional, o desenho de estratégias, a gestão de pessoas, a definição de políticas de sucessão e de remuneração, o monitoramento de performance e a avaliação do risco e da acurácia das demonstrações financeiras. Alguns conselhos tendem a dar grande ênfase aos resultados financeiros e a estratégia, mas é importante ressaltar que cultura organizacional e liderança caminham juntos com estratégia e resultados financeiros — afinal, estes reportam o passado, não sendo garantia do futuro. Questões-chave como cultura, ética e propósito precisam ganhar espaço nas pautas dos conselhos de administração. Cabe destacar que a estrutura de remuneração é importante instrumento de direcionamento de comportamentos e precisa ter coerência com os propósitos e a cultura da organização. Provavelmente muitos problemas corporativos que hoje se apresentam poderiam ter sido evitados caso essas questões-chave tivessem recebido a devida atenção.

O Financial Reporting Council (FRC) — órgão regulador independente do Reino Unido, responsável pelos códigos de governança e de stewardship do país — dedicou-se a pesquisar como os conselhos trabalham o tema da cultura organizacional, visando identificar boas práticas que pudessem ser compartilhadas. A recomendação do FRC é que se concentre esforços contínuos no fomento de uma cultura saudável em vez de se esperar por uma crise, pois um mau comportamento pode ser exacerbado quando a empresa está sob pressão. Uma cultura forte vai perdurar em momentos de estresse e mitigar seus impactos.

E como os conselhos funcionam? O diálogo e a prática incessante da escuta ativa são fundamentais para o trabalho dos conselheiros e a base para um relacionamento construtivo e colaborativo no âmbito do board. O presidente do conselho tem o importante papel de fomentar ambiente propício à participação ativa dos conselheiros, para que eles se sintam seguros para expressar suas opiniões, oferecer diferentes perspectivas e visões, fazer críticas construtivas e trabalhar de forma colaborativa. A dinâmica de funcionamento de um conselho pode potencializar ou reduzir a capacidade individual de cada membro de agregar valor para a empresa. De forma análoga: de que adianta o talento de um excelente artilheiro se a bola não chega até ele?

Conselhos de administração têm diferentes graus de maturidade, sendo muito importante que as empresas treinem o autoconhecimento para identificarem onde eles estão nessa curva. Assim se alcança a clareza necessária para um efetivo planejamento corporativo.


*Ana Siqueira, CFA ([email protected]) é sócia fundadora da Artha Educação

 


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