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Os três “Rs” da economia circular
Como investidores e empresas podem contribuir para a reavaliação, redefinição e revisão de produtos, valores e atitudes
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Imagem: freepik

Fatores ESG já são tema corrente das conversas cotidianas nas gestoras de ativos, nas empresas e entre os investidores. O avanço dessa agenda nos últimos dois anos parece ter consolidado a ideia de que não é mais possível para os negócios ignorar ou — pior — negligenciar os impactos que têm sobre o entorno. Mas há um ponto particular ainda não tão explorado, mas que tem tanta relevância que perpassa simultaneamente as questões ambientais, sociais e também de governança. Trata-se da economia circular, sistema que se opõe à ainda predominante economia linear. Na primeira, as cadeias de negócios são montadas de forma que os componentes circulem dentro delas, sem “sobras”. No modelo linear, as atividades não têm essa preocupação com os resíduos que geram e com os efeitos negativos que todos conhecemos.

Embora no Brasil ainda esteja em estágio inicial, a economia circular tem avançado constantemente, na esteira das crescentes preocupações com os impactos que as operações das empresas provocam entre os stakeholders. E a continuidade dessa escalada depende muito de uma parceria bem-sucedida entre as várias partes envolvidas, com papel fundamental para os financiadores — o mercado financeiro e seus representantes são determinantes para a consolidação do modelo circular.

Serviços no lugar de produtos

A economia circular é mais que uma transformação: é uma verdadeira revolução, que no limite pode mudar completamente o tipo de operação das empresas. Alguns exemplos ajudam a deixar o conceito mais claro. Há organizações globais e bastante tradicionais que já perceberam que, para se perpetuarem, aos poucos terão que deixar de oferecer produtos para serem prestadoras de serviços. A fabricante Michelin, por exemplo, oferece aos consumidores a possibilidade de alugarem pneus em vez de comprá-los; a holandesa Philips hoje se vê mais como uma empresa de serviços de iluminação do que uma fábrica de lâmpadas e produtos afins; clientes da Levi’s já podem optar pelo serviço de assinatura de calças jeans. No lugar de consumidores, usuários. Nesses modelos, bastante característicos da economia circular, os bens circulam e retornam para o início da cadeia, de forma que possam novamente entrar “na roda”.

“Esse tema é de relevância global. E é importante que as pessoas saibam que vai muito além da reciclagem e de políticas como a referente a resíduos sólidos que hoje temos no Brasil. Tem a ver com a transformação dos negócios”, comenta Renato Paquet, fundador e CEO da Polen, cleantech que atua com créditos de logística reversa em blockchain. Como explica Beatriz Luz, fundadora da Exchange for Change Brasil (E4CB), essa agenda está mais avançada na Europa — onde o país de referência é a Holanda — e no Brasil hoje o ecossistema se dedica a encontrar maneiras de adaptar soluções globais para a realidade local. “É um processo que exige o envolvimento de toda a cadeia produtiva, de inovação e de financiamento”, ressalta.

Conscientização dos investidores

A parte do financiamento é particularmente importante, à medida que, sem a conscientização dos investidores quanto à pertinência da economia circular, a dinâmica pode não seguir adiante na velocidade desejável. Nesse contexto, é de extrema relevância a participação ativa das assets, que fomentam o processo com suas análises aprofundadas das empresas e dos ativos e a efetiva compra de papéis para as carteiras. A JGP, por exemplo, direcionou o foco de sua atuação para essas questões, e hoje ESG e economia circular são temas prioritários, como destaca o sócio José Pugas. A casa tem cerca de 30 bilhões de ativos sob gestão.

Segundo Luz, a economia circular requer um olhar ampliado das atividades das empresas. “É só imaginar essa questão como um iceberg. No topo estão os aspectos visíveis, como tratamento de resíduos, reciclagem e design de embalagens. Mas, por baixo disso, estão novas relações comerciais, novos formatos de responsabilidade corporativa, uma nova régua econômica”, ressalta. “A economia circular não acontece sozinha, depende da participação coordenada de muitos atores. O trabalho é de redesenho do sistema produtivo e não de uma simples ferramenta para resolver o passivo da economia linear”, afirma.

Reavaliação, redefinição e revisão

A especialista diz que o ecossistema deve operar com base em três “Rs”: reavaliação do processo produtivo (para não se criar algo que no final não tenha valor), redefinição de produtos e serviços conforme as aspirações das pessoas (diferencial não é mais preocupação com qualidade e custo, mas sim com proposta de valor) e revisão de valores, atitudes e padrões. “Os conceitos de investimento e retorno têm que considerar o ciclo reverso, o retorno do material à sua origem, sempre em escala”, acrescenta.

É bastante desafiadora a participação dos gestores nesse processo. Encarregadas de fazer boas análises para devolver retornos adequados para os investidores, as assets enfrentam também a tarefa de estabelecer parâmetros para interpretar uma dinâmica econômica nova levando em consideração as características de cada empresa e o afastamento da possibilidade de greenwashing. “Desenvolvemos frameworks robustos para lidar com essas questões e verificamos se as atitudes das empresas pretendem servir de paliativos para negócios moribundos ou se de fato estão empenhadas na transição para essa nova economia. Avaliamos se pertence ao futuro que imaginamos ou se carrega um modelo ultrapassado”, relata o sócio da JGP. “O mercado em geral já entendeu a necessidade de se discutir esses temas, mas ainda não tem ferramentas para tomar decisões. Na minha opinião, falta quebrar uma quarta parede e conversar também com especialistas. É uma mudança cultural”, complementa.

Sem respostas prontas

Embora caminhando a passos largos, o processo de economia circular no Brasil ainda carece de tração. De acordo com Luz, o momento atual é de implementação desse conceito nas empresas, que devem estar cientes de que não há respostas prontas, exatas e imediatas. “A economia circular é construída em parceria, com multiplicidade de atores. Não é um mero arredondamento da economia linear. As empresas devem conversar com os fornecedores, com o mercado e até com concorrentes se for o caso. Estamos falando da criação de um modelo que ainda não existe e que está sendo estruturado por muitos agentes”, sublinha. Do ponto de vista do investimento, a hora é de precificar os ativos intangíveis e de criar uma espécie de contabilidade ambiental, afirma Puga. E, da parte das empresas, a tarefa passa pela consolidação de governança adequada e transparência, aspectos que o próprio mercado pode ajudar a construir com suas pressões e cobranças. Como num círculo fechado, sem externalidades e com ganhos para todos os envolvidos.


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