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CVM acerta ao conciliar sigilo com transparência nas arbitragens
Resolução 80 exige divulgação em casos relevantes para o investidor ao mesmo tempo em que inibe devassa inconveniente
Nelson Eizirik
Nelson Eizirik é advogado no Rio de Janeiro e em São Paulo e professor da FGV Direito Rio ‎| Ilustração: Julia Padula

Na regulação do mercado de capitais, a plena divulgação de informações desempenha uma função fundamental. Na legislação federal sobre valores mobiliários promulgada na década de 30, nos Estados Unidos, privilegiou-se a transparência de informações como o princípio básico na disciplina das companhias emissoras de títulos vendidos no mercado. Ao invés de uma disciplina substantiva, que permitisse ao Estado, mediante sua agência reguladora (a Securities and Exchange Commission – SEC), uma análise do mérito da emissora e dos títulos oferecidos ao público, optou-se por uma legislação que a obrigasse a divulgar todas as informações relevantes e necessárias para que os investidores pudessem fazer a sua opção de comprar ou não tais títulos. Assim, entende-se que o investidor, uma vez bem informado, estará protegido, não cabendo ao Estado escolher quais companhias podem abrir seu capital. Como então resumiu um ministro da Corte Suprema: “a luz do sol é o melhor desinfetante”.


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Entre nós, foi acolhido integralmente o princípio do “disclosure” na Lei 6.404/76 (Lei das S.As.), na Lei 6.385/76, assim como na regulamentação da CVM, que não pode analisar a qualidade das companhias emissoras, mas apenas se as informações estão sendo devidamente fornecidas aos investidores. Presume-se que o investidor bem informado estará assim protegido por ocasião de uma oferta pública de venda de valores mobiliários.

No mercado secundário, a transparência de informações sobre deliberações dos órgãos sociais e fatos relevantes ocorridos nos negócios da companhia aberta contribui para uma maior eficiência do mercado de capitais. O mercado é mais eficiente na medida em que a cotação das ações reflete o impacto sobre elas das informações publicamente disponíveis; com o “disclosure” evita-se a assimetria de informações e minimiza-se a utilização de informações confidenciais por parte dos “insiders”, aqueles que estão “por dentro” dos negócios da companhia. As informações, para que tais objetivos sejam alcançados, devem ser completas, precisas, redigidas em linguagem acessível e úteis ao processo de tomada de decisão por parte dos investidores.

Sigilo versus transparência

Ainda que não decorra de lei, a confidencialidade é tida como uma das principais vantagens dos procedimentos arbitrais. Quase todas as arbitragens são instauradas sob a regra do sigilo, estabelecida no termo de arbitragem ou no regulamento da Câmara, visando a proteger interesses legítimos das partes envolvidas.

Devem todas as arbitragens envolvendo companhia aberta ser objeto de divulgação? A meu ver, não. É perfeitamente possível que não exista um fato relevante no procedimento arbitral, dada a imaterialidade dos valores envolvidos, ou a inexistência de interesses coletivos de investidores a demandarem proteção. Embora consagre o dever de informar os fatos relevantes — aqueles que seriam levados em conta pelo investidor médio —, a Lei das S.As. também protege o sigilo quando envolve interesse legítimo da companhia.

A Resolução 80 da CVM, de 29 de março de 2022, conciliou bem o sigilo do procedimento arbitral com o princípio da transparência. Em primeiro lugar, devem ser divulgados os procedimentos arbitrais relevantes, ou seja, aqueles que o investidor médio levaria em consideração para tomar sua decisão de comprar, vender ou manter os valores mobiliários emitidos pela companhia aberta. Ademais, devem ser informadas ao público as demandas societárias judiciais ou arbitrais que envolvam interesses ou direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos, assim como aquelas nas quais possa ser proferida decisão cujos efeitos atinjam a esfera jurídica da companhia ou de acionistas que não estão tomando parte no processo, como é o caso de ação de anulação de deliberação de órgão social, de responsabilidade do acionista controlador ou de administrador. Assim, por exemplo, uma arbitragem proposta por um investidor para anular uma deliberação tomada em AGE sobre aumento de capital deve ser divulgada para que os demais acionistas, que serão afetados pela decisão, possam, se assim quiserem, nela ingressar como partes. Nos casos acima mencionados o sigilo previsto na convenção de arbitragem não exime a companhia de divulgar o procedimento arbitral.

Para evitar que o “disclosure” acarrete uma “devassa”, a Resolução prevê que não é necessária a disponibilização das peças do procedimento arbitral. Incumbe à companhia divulgar apenas as principais informações, tais como a instauração do processo, as partes envolvidas, os direitos ou bens sob discussão, os principais fatos ocorridos, as decisões cautelares ou de urência, acordos, assim como as sentenças parciais ou finais.”  

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