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Finanças em sala de aula
Governo e mercado ampliam programas de educação financeira para abranger crianças, aposentados e beneficiários do Bolsa Família

, Finanças em sala de aula, Capital AbertoA base para a popularização do mercado acionário brasileiro está dada. Com uma taxa de juros real em 2,6%, correr o risco de investir em ações finalmente faz algum sentido. As pessoas físicas, entretanto, ainda se mantêm distantes do pregão. A BM&FBovespa conta, hoje, com cerca de 600 mil CPFs registrados. Há oito anos, esse número girava em torno de 450 mil. A evolução lenta reflete o desempenho tímido do mercado de ações (desde 2007, o Ibovespa acumula alta de cerca de 25%), mas não é só isso. A dificuldade da bolsa em se popularizar passa pela falta de educação financeira dos brasileiros — problema que a Estratégia Nacional de Educação Financeira (Enef), criada pelo Decreto 7.397, de 2010, pretende abordar.

Maior política pública com foco em educação financeira já implementada no País, a Enef visa conscientizar a população sobre a importância de poupar mais e investir melhor, duas deficiências comuns aos brasileiros. A necessidade de criar o programa ficou evidente em 2008, após um grupo de trabalho instituído pela Deliberação Coremec 3/2007, com o apoio da BM&FBovespa, promover uma pesquisa de âmbito nacional para mensurar o grau de educação financeira da população (veja tabela ao final), compreendendo os mercados regulados pelo Banco Central, pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) e pela Superintendência de Seguros Privados (Susep). A sondagem, realizada pelo Instituto Data Popular, ouviu 1.809 pessoas em seis capitais: Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador e Recife, com diferentes perfis de renda e graus de escolaridade.

Entre os dados do estudo, chama a atenção que apenas 40% dos entrevistados declaram fazer algum investimento com o dinheiro que sobra após pagar suas despesas — dos quais 78% escolhem aplicar na poupança. As razões para não investir vão desde a falta de conhecimento até o medo de perder dinheiro, a burocracia exigida em algumas aplicações e a falta de liquidez de certos produtos financeiros. Para os entrevistados, investir na bolsa ainda é uma prática “distante e desconhecida”. Questionados sobre como veem esse tipo de aplicação, disseram ser um investimento “arriscado, com linguagem complicada, que implica pagamento de taxas, e associado a grandes quantias de capital”. Apenas a partir de R$ 20 mil disponíveis, a ideia de comprar ações passaria a ser considerada por uma parte, ainda que pequena, dos entrevistados: 17%.

Diante dessas constatações, fica fácil entender a importância da disseminação da educação financeira, principalmente entre os jovens. Foi exatamente com foco nesse grupo que a Enef instituiu o Programa de Educação Financeira nas Escolas, aplicado em instituições de ensino fundamental e médio. A primeira fase do projeto, implementada entre agosto de 2010 e dezembro do ano seguinte, contemplou alunos de nível secundário de 891 escolas públicas municipais e estaduais de seis unidades da Federação (São Paulo, Rio de Janeiro, Tocantins, Ceará, Distrito Federal e Minas Gerais). A estratégia pedagógica usou três livros — um por semestre — que introduziam a educação financeira no currículo escolar dos jovens de maneira transversal: dentro das tarefas de matemática, português, ciências, história e geografia, por exemplo, foram inseridas 72 lições de finanças pessoais básicas.

Ao todo, a iniciativa atingiu quase 27 mil jovens. As famílias desses adolescentes também foram entrevistadas, para a coordenação do programa verificar o nível de educação financeira que tinham em casa. A pesquisa revelou que 44% dos núcleos familiares tinham conta na poupança e 89% já haviam recorrido a empréstimos, de bancos ou pessoas próximas, para comprar imóveis, veículos e outros itens.

Especializado em avaliar o desenvolvimento de iniciativas de educação financeira ao redor do mundo, o Banco Mundial fez um diagnóstico positivo dessa primeira fase da Enef. Os resultados apontam que, entre agosto de 2010 e dezembro de 2011, o conhecimento dos alunos sobre o tema cresceu 7%, e a intenção de poupar evoluiu 10%. Em 2014, a mesma metodologia aplicada aos estudantes do ensino médio será colocada em prática no fundamental. A proposta é disseminar os conceitos de educação financeira a partir de atividades lúdicas e livros didáticos, em aproximadamente 820 escolas das mesmas regiões da primeira fase. Essa etapa deve envolver 7.380 mil professores e 164 mil alunos. “Os jovens são os grandes vetores de transformação da cultura de educação financeira no País. Eles aprendem a gerir seu dinheiro na escola e levam essa informação para a sua família, ajudando a organizar as contas da casa”, diz Elvira Ferreira, chefe do departamento de educação financeira do Banco Central.

Também no ano que vem a Enef iniciará sua atuação com o público adulto. Serão criadas duas metodologias educacionais: uma voltada para aposentados que recebem até dois salários mínimos e outra direcionada às mulheres beneficiárias do Programa Bolsa Família. Os idosos, segundo o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), são grandes tomadores de crédito, expostos muitas vezes a situações de superendividamento. Até 2025, eles serão 32 milhões, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Quanto às mulheres, dados do Ministério de Desenvolvimento Social indicam que 92,5% dos beneficiários do Bolsa Família são do sexo feminino. Se bem orientadas, elas podem fazer diferença na organização do orçamento familiar.

Todos juntos

O governo não está sozinho na missão de levar educação financeira aos brasileiros. Consciente de que a popularização do mercado acionário depende dos jovens, a Bolsa, desde 2006, promove o Desafio BM&FBovespa, uma competição realizada anualmente entre escolas do ensino médio do Estado de São Paulo. A primeira fase do desafio reúne equipes de 210 instituições, que aprendem, durante todo o ano, ideias básicas sobre educação financeira e mercado de ações. Passada essa etapa, elas fazem uma avaliação cuja nota é revertida num “valor virtual” a ser usado na fase seguinte, que consiste em montar uma carteira de ações. No término do desafio, as cinco escolas que obtiverem as melhores rentabilidades serão declaradas campeãs. O programa recebeu mais de 2.700 inscrições e reuniu 3 mil escolas desde o lançamento.

A Bolsa também oferece cursos on-line gratuitos sobre planejamento financeiro pessoal e familiar, organização do orçamento, controle de despesas, alternativas de investimentos e formação de patrimônio no longo prazo. O público-alvo vai de adolescentes de 11 anos a adultos. No total, a BM&FBovespa estima ter atendido mais de 1,1 milhão de pessoas com seus cursos entre 2003 e 2013.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) também está atenta ao assunto. Em julho, em parceria com a Bolsa, inaugurou o 1o Concurso Cultural de Redação e Vídeo, cujo tema é: “Pequenas atitudes geram grandes mudanças: A importância de planejar, poupar e investir”. O público-alvo está organizado em duas categorias. A primeira, para adolescentes entre 12 e 15 anos, requer a produção de um vídeo, de um a três minutos, sobre assuntos como consumo, planejamento pessoal, formação escolar, dinheiro e comportamento. Na avaliação serão levados em conta critérios como criatividade, adequação ao tema e uso correto da norma culta da língua. A segunda categoria, de jovens de 15 a 18 anos, solicita uma dissertação argumentativa com 25 a 30 linhas sobre os mesmos assuntos. “Essa é a faixa etária ideal para os jovens desenvolverem o hábito de poupar”, diz o superintendente de proteção e orientação aos investidores da CVM, José Alexandre Vasco. Os três melhores trabalhos de cada categoria serão premiados com um tablet. As inscrições vão até 15 de outubro, e o resultado sai em 30 de novembro.

Antes mesmo de lançar o concurso, a autarquia vinha investindo em aperfeiçoar seus instrumentos de educação financeira. Em dezembro de 2012, lançou uma versão do Portal do Investidor voltada a todas as faixas de idade. As crianças, por exemplo, contam com um espaço exclusivo no site, em que podem testar suas aptidões matemáticas em situações cotidianas, como a realização de pequenas compras ou o cálculo para economizar energia. Entre janeiro e setembro deste ano, o portal contabilizou 205 mil visitas.

Também no ano passado, a CVM estreou uma página na internet para oferecer cursos à distância a investidores iniciantes. Os programas se estruturam em quatro temas principais: educação financeira, valores mobiliários, direitos e deveres de acionistas e matemática financeira básica. Entre março do ano passado, quando o canal foi lançado, e setembro de 2013, o e-learning da CVM arrematou 3.821 inscritos. Os cursos são divididos em módulos compostos de apresentações animadas do tema em estudo, avaliação dos tópicos vistos, glossários, links para pesquisas na internet e materiais para download. O aluno pode fazer o curso no prazo que lhe for mais conveniente.

A Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) também apresenta conceitos de investimentos e finanças num portal on-line. O site ensina, por exemplo, a aplicar em ações, debêntures e títulos públicos, tanto diretamente quanto por meio de fundos. As lições são transmitidas em textos e videoaulas. Porém, mais do que oferecer conteúdo didático para os investidores, a Anbima está preocupada em oferecer cursos de aperfeiçoamento para os profissionais da área. “Quanto mais preparados eles estiverem, maior será a sofisticação do mercado”, observa Ana Leoni, superintendente da área de educação para investidores da Anbima.

Experiências internacionais

A falta de educação financeira da população não é uma exclusividade de países em desenvolvimento. Estados Unidos, Reino Unido e Austrália também lançaram, no início dos anos 2000, políticas parecidas com a brasileira. Em 2006, o governo americano instituiu o programa nacional de educação financeira Taking Ownership of the Future, que tem como foco 13 diferentes áreas de interesse. Entre elas, formação de poupança, aquisição da casa própria, planejamento da aposentadoria, crédito, proteção do consumidor, direitos dos contribuintes, proteção dos investidores, inclusão bancária e educação financeira nas escolas.

O Reino Unido deu início à sua estratégia de educação financeira em 2003. Naquele ano, lançou a National Strategy for Financial Capability, com o objetivo de impulsionar a capacidade financeira da população. Antes de implementar a política, o governo promoveu uma pesquisa nacional. A conclusão foi que os cidadãos de 18 a 40 anos eram menos capacitados para gerir suas finanças do que os mais velhos. Com base nisso, a estratégia se esforçou para capacitar o grupo jovem, considerado “vulnerável”. O programa inglês pretendia atingir inicialmente cerca de 10 milhões de pessoas (a população do Reino Unido é de 63,2 milhões).

Em 2004, foi a vez de a Austrália lançar sua estratégia nacional de educação financeira. Ela prevê a inserção do tema nos currículos escolares e a capacitação de professores para transmitir esse conteúdo. Apesar de atrasado, o Brasil segue agora o caminho dos mais importantes mercados de capitais do mundo. Que isso seja um bom prenúncio.

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Fonte: Pesquisa Nacional do Grau de Educação Financeira da População Brasileira (2008).

 


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