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Três visões diferentes sobre a bolsa brasileira
O potencial de alta do mercado de ações leva a uma grande expectativa quanto à volta dos investidores locais
Alexandre Povoa

Os principais compradores de bolsa brasileira têm se comportado de forma diversa nos últimos anos. Mas o que leva alguém ou algum ente a comprar ações em certo momento do tempo? Esse artigo vai analisar os três players principais: o estrangeiro, o investidor institucional e a pessoa física.

Interessante notar que, enquanto o estrangeiro aplicou fortemente na bolsa brasileira nos últimos tempos, o investidor local (institucional + pessoa física) retirou recursos com força. Entre janeiro/2022 e outubro/2023, o fluxo estrangeiro para a B3 foi de R$ 112 bilhões.

Cabe observar que, desde 2008, o valor do Ibovespa em dólar caiu praticamente pela metade (de 44 mil para 23 mil pontos). Atualmente, o indicador preço/lucro (P/L) de 2024 da bolsa brasileira atinge 8,2. Somente acima, no universo dos emergentes, do Egito (problemas geopolíticos), da Turquia (alta inflação) e da Rússia (em guerra). Os principais concorrentes de fluxo de recursos apresentam números bem maiores: Índia (21,7), México (13,5), China (11,4), Chile (9,9) e África do Sul (9,5). O risco-retorno, portanto, para as ações locais, parece bem interessante.

Cenário favorável

Saltam aos olhos algumas questões de quem está observando o mercado acionário do ponto de vista do estrangeiro. Dada a situação externa do Brasil extremamente confortável — reservas internacionais de US$ 350 bilhões e déficit em transações correntes de 2,7% do PIB coberto mais de duas vezes pela entrada de investimento externo direto — não há perspectivas de desvalorização significativa do real, o que gera conforto para o investidor em dólar.

Além disso, o Brasil foi um dos primeiros países a contrair a política monetária e também a começar o processo de afrouxamento. Isso sem um custo significativo do PIB, que deve crescer ao redor de 3% em 2023, repetindo o desempenho de 2022.

Internamente, ao final de outubro, apenas R$ 514 bilhões estavam investidos em produtos de ações na indústria brasileira de fundos, de um total de R$ 8,1 trilhões de patrimônio. Isso equivalia a 6,3 % do total.

Os investidores institucionais — leia-se fundos de pensão (EFPC), regimes próprios de estados e municípios (RPPS) e seguradoras — retiraram, nada mais nada menos, que R$ 256 bilhões desde 2020 das bolsas brasileiras até outubro de 2023. Os destinos desse dinheiro foram os fundos de renda fixa, NTN-Bs e ativos “incentivados” como debêntures, CRIs e CRAs, aproveitando o alto patamar da renda fixa.

Ademais, na maioria dos casos, as metas atuariais dessas instituições encontram-se ao redor de IPCA +5% ao ano. É totalmente racional, para quem tem um objetivo fixo a atingir, a proteção em uma NTN-B que chegou a pagar acima de IPCA + 6% ao ano.

Porém, olhando adiante, a perspectiva é que esse cupom convirja para o juro real de equilíbrio brasileiro (entre 4% e 4,5% a.a.) no médio-longo prazo. Quase que “obrigando” esses players, portanto, a buscarem ativos de maior risco, como ações.

Os investidores pessoas físicas também saíram da bolsa: R$ 24 bilhões desde 2022 até outubro de 2023. O cenário de uma Selic muito alta, durante muito tempo, certamente não ajudou. Quem colocou dinheiro em um fundo DI entre janeiro de 2022 e outubro de 2023 auferiu retorno de 24,5%. Já quem investiu no Ibovespa ganhou apenas 9,2% (ambos desconsiderando taxas). A relação custo-benefício da renda fixa era flagrantemente superior à das ações. A pergunta que vinha à cabeça era:  por que, então, arriscar?

Novas escolhas

Agora, contudo, o horizonte parece estar começando a mudar. O Copom já começou a reduzir a taxa básica da economia, que pode chegar a um dígito ao final de 2024. Apesar do patamar ainda elevado, o custo de oportunidade será diferente de quando comparado a uma Selic de 13,75% ao ano. Além disso, o investidor local vai se deparar também com o seguinte quadro: o P/L médio histórico (últimos 15 anos) do Ibovespa foi de 11. Levando em conta o P/L para 2024 de 8,2, se houver uma convergência, temos somente aí aproximadamente 35% de potencial de alta.

Portanto, a bolsa brasileira parece barata. Tanto em termos absolutos (quando comparamos ela mesma com o seu passado) quanto relativos (vis a vis os seus pares emergentes).

Fica a questão: por que o investidor estrangeiro, que tem aplicado recursos nos pregões do Brasil, não opta também pela compra de renda fixa, como fazem os investidores institucionais e pessoas físicas brasileiros? A razão é simples: estamos falando de investidores dedicados a ações (globais ou países emergentes). Não existe a opção de investir em ativos fixos. O que não quer dizer que outros estrangeiros não possam, por exemplo, aplicar em títulos públicos soberanos. Aliás, a participação de investidores externos atingiu, em outubro, 9,5% do total da dívida pública interna.

Fatores de risco

Nesse contexto, dois fatores podem atrapalhar a migração de recursos para a bolsa nos próximos meses. Primeiro: a indefinição em relação ao teto de juros nos países desenvolvidos. Mercado não gosta de incerteza. Para os investidores é melhor subir mais (os juros) e dizer que acabou o processo do que subir menos (ou não subir) e deixar a dúvida em relação ao futuro. Isso juntamente com o risco da guerra no Oriente Médio, que tem puxado para cima as curvas de juros em todo o mundo, criando instabilidade nos preços e fuga de ativos de risco.

Em seguida, sobrepõe-se o risco brasileiro. Apesar de o arcabouço fiscal do governo Lula ter sido bem recebido pelo mercado, a sua execução começa a preocupar. Há forte pressão da base aliada para que o governo desista de buscar o resultado primário zero em 2024. O presidente Lula e o ministro Fernando Haddad já reconheceram que a meta é inatingível. Ou seja, a confiabilidade fiscal começou muito mal. O próprio Boletim Focus aponta para uma estimativa de déficit primário de -0,75% a.a. do PIB para 2024. Essa desconfiança certamente iria impactar o espaço para a queda de juros estrutural no Brasil.

O potencial de alta da bolsa brasileira leva a uma grande expectativa em relação à volta, sobretudo, dos investidores locais (institucionais e pessoas físicas), ao mercado acionário brasileiro. Razões é que não faltam. Os investidores estrangeiros, que sustentaram os preços nos últimos dois anos, também são bem-vindos, mas talvez não devamos contar com esse dinheiro enquanto o processo de elevação de juros não terminar. Resta saber se — e quando — as conjunturas externa e local irão permitir que os fluxos de aplicações, escassos ultimamente nas bolsas, retornem.  

Alexandre Póvoa ([email protected] ) é  estrategista da Meta Asset Management e autor dos livros Valuation, como precificar ações e Mundo financeiro, o olhar de um gestor

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