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Mercado aguarda manutenção da Selic e torce por consenso do colegiado
Independentemente da decisão, juro real segue restritivo e entre os maiores do mundo, com impacto nas diferentes classes de ativos
Fernando Gonçalves, superintendente de Pesquisa Econômica do Itaú
Fernando Gonçalves, superintendente de Pesquisa Econômica do Itaú

O Comitê de Política Monetária (Copom) decide nesta quarta-feira (19) a nova taxa de juros (Selic) da economia sob os olhares atentos do mercado, que espera uma decisão unânime do colegiado. Na visão da ampla maioria dos economistas ligados ao mercado financeiro, que projetam manutenção da Selic em 10,50% ao ano, o consenso é importante para afastar a visão de alinhamento político do colegiado, reforçada após o placar de 5 a 4 no encontro de maio.

Quem defende a interrupção no afrouxamento monetário destaca a piora no quadro doméstico, com a desancorajem da inflação, riscos fiscais em alta e dólar pressionado, na casa dos R$ 5,40, mesmo que o pano de fundo externo tenha apresentado substancial melhora. Dados de inflação nos Estados Unidos cederam e a possibilidade de corte na taxa, hoje 5,25% a 5,50%, ainda neste ano, volta a ser considerada. Quem defende mais uma redução de 25 basis point (bps) foca os argumentos no juro real, um dos maiores do mundo, que seguirá alto mesmo com uma Selic menor e, portanto, mantém o efeito restritivo na economia. Cálculos do portal MoneYou, para 12 meses, aponta juro real em 6,79%, em caso de manutenção da Selic, perdendo apenas para Rússia, com 8,91%. Se houver corte de 25 bps, o juro real no Brasil fica em 6,36%, na terceira posição, atrás também do México.


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Na reunião do Copom de maio, o que chamou a atenção do mercado foi o placar dividido da decisão, por 5 x 4, sendo que o voto de minerva coube ao presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto. No empate de 4 a 4, votaram a favor de uma redução maior (0,50) integrantes indicados pelo atual governo Lula, enquanto os egressos do governo anterior, assim como Campos Neto, preferiram a cautela. “Ficou uma sensação de que, de fato, são banqueiros centrais de tipos diferentes. Um grupo mais conservador do que o outro. Esse tipo de questionamento, quando se aproxima a transição no comando do BC, pode sugerir que teremos um futuro banco central que tome riscos maiores com a inflação”, comenta Fernando Gonçalves, superintendente de Pesquisa Econômica no Itaú.

A previsão do banco é manutenção do juro em 10,50% ao ano não apenas nesta reunião, mas ao longo de 2024. “A mensagem com o dissenso em maio não foi boa e colaborou para a desencorajem das expectativas desde então”, acrescenta Gonçalves. A comparação entre o Boletim Focus pré-Copom de maio e o desta semana mostra a piora na visão do mercado, com elevação do IPCA para dezembro, do dólar e da Selic, de 9,5% no fim do ciclo para os atuais 10,50%, já indicando manutenção. “A desencorajem é relevante, inclusive com piora nas expectativas para os próximos anos 2026 e 2027, na margem. É particularmente complicada, porque no curto prazo você pode ter desvios na inflação em relação à meta, por choques que a economia está sofrendo. Um horizonte maior não é bem esse o caso.”

Selic, Mercado aguarda manutenção da Selic e torce por consenso do colegiado, Capital Aberto

Hudson Bessa, especialista em Estratégias Financeiras, Finanças Corporativas e Mercado Financeiro da Fipecafi, tem visão semelhante sobre a tendência de manutenção do juro na reunião desta quarta. “O maior problema é a deterioração das expectativas. Nesse sentido, como a taxa já está em terreno restritivo, o relevante é sinalizar o compromisso com a inflação. A batalha de hoje é para domar as expectativas”, comenta Bessa. Sobre o desejo do mercado pelo consenso, ele tem visão menos restritiva. “Não acho que uma divisão vá criar tumulto, exceto caso seja um placar como o anterior (todos os indicados do atual governo mais “complacentes”). Contudo, avalio que a decisão será unânime, haja vista a fragilidade no campo das expectativas.” Para a Fipecafi, há ainda possibilidade de pelo menos um corte de 0,25 ponto percentual na Selic mais para o final do ano.

Analistas também citaram falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista à rádio CBN, com duras críticas a Campos Neto pela aproximação dele com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, sugerindo que ele tem pretensões políticas. “Nós só temos uma coisa desajustada no Brasil neste instante. É o comportamento do Banco central. Esta é uma coisa desajustada. Um presidente do Banco Central que não tem nenhuma capacidade de autonomia, que tem lado político e que, na minha opinião, trabalha muito para prejudicar o país. Porque não tem explicação a taxa de juros como está”, disse o presidente. Na visão dos analistas, o tom e as críticas de Lula adicionam pressão para a decisão de hoje do Copom. Nas últimas semanas, Campos Neto não apenas foi à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) ser homenageado, como também foi recebido em jantar no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, com direito a 70 convidados.

No grupo das instituições que veem espaço para uma redução no juro no encontro de hoje está o Bank of America (BofA), que projeta corte de 0,25 pp, mantendo o ritmo da redução anterior. Em relatório assinado por David Beker, chefe de economia para Brasil e de estratégia para América Latina do BofA, há uma ponderação entre fatores pró e contra novo corte. “As condições financeiras estão mais restritivas após a última reunião, enquanto a inflação continua bem comportada, permitindo um último corte nas taxas. A desvalorização cambial, as previsões mais elevadas do BC e as expectativas de inflação desancoradas sugerem uma manutenção até o final de 2024”, consta do documento.

“Esperamos que o Copom corte 25 bps em decisão unânime e que destaque condições financeiras mais restritivas para justificar a manutenção do ritmo dos cortes, bem como o comportamento benigno da inflação atual”, afirma Beker, destacando o juro real muito alto. “A política monetária continua contracionista, mesmo com um corte para 10,25% ao ano, a taxa de juros real ex-ante de 12 meses estaria perto de 7,3%, e muito longe dos 4,5% que o banco central vê como neutros.” Nas projeções do BofA, a Selic permaneceria em 10,25% ao ano até dezembro, com retomada do ciclo de cortes no início de 2025, “com composição do quadro de notícias e com corte do Fed nos juros”.

Com a Selic mantida estável, ou mesmo com uma redução pequena, o juro real seguirá entre os maiores do mundo, com impacto na atividade econômica, no consumo e reflexos, maiores ou menores, em todos os ativos, como títulos de dívida, câmbio e mercado de ações. A Capital Aberto foi ouvir especialistas nas áreas para entender o impacto da decisão desta quarta-feira nas diferentes classes de ativos. Confira.

Ações devem sofrer mais

Do ponto de vista da renda variável, embora alguns ainda acreditem no corte de 0,25 pp, as perspectivas são desanimadoras. Marcos Duarte, analista da Nova Futura Investimentos, contrariando a maioria dos que creem na manutenção da Selic, vê espaço para cortes. Ele destaca que o momento deve continuar complicado para as ações. De primeiro de janeiro a 18 de junho, o Ibovespa já acumula queda de quase 11% e a tendência é de um cenário ainda deteriorado. 

“A previsão é a mesma, ainda é mercado para baixo. O Ibovespa tem um suporte importante na casa dos 114 mil pontos, e o mercado realmente está olhando para lá. Temos até hoje, inclusive, um movimento de repique, aquela pequena parada na queda, mas ainda é bem prematuro dizer que o mercado vai voltar a subir no curto prazo, por enquanto, realmente vemos o mercado para baixo”, aponta Duarte.

Além do desempenho aquém do desejado, a bolsa brasileira tem sofrido com a fuga constante de capital estrangeiro, com retiradas acumuladas de R$ 7,22 bilhões até 12 de junho. Com os juros reais altos por mais tempo e as incertezas causadas pelo ruído fiscal, a situação deve se manter ou até piorar, embora haja oportunidades para um setor específico.

“O mercado está passando por um momento de ajuste e um momento de correção. O capital do estrangeiro está sendo aportado sempre no que é mais seguro e mais fácil, o mercado americano. O dinheiro que sobra aqui é de risco, e mesmo assim, o investidor estrangeiro tem vendido suas posições no mercado à vista, porque tem ficado mais barato, mas não interessante. Nem sempre um preço baixo é sinal de um mercado interessante, mas o dólar está muito atrativo, assim como o mercado americano”, comenta o analista. 

Por outro lado, segundo Duarte, cada vez mais as ações do setor financeiro, mais especificamente de principais bancos como Itaú, Bradesco e Banco do Brasil, devem estar no radar dos investidores, uma vez que o setor é o primeiro a sentir os reflexos de qualquer mudança, não só na taxa de juros, mas também na econômica. 

Com o Ibovespa caindo, principal termômetro das ações, no cenário de ofertas públicas iniciais (IPOs, na sigla em inglês) a demanda tende a ser fraca e há um certo desinteresse. O investidor fica receoso e as empresas evitam fazer grandes movimentos, como IPOs, recompra de ações ou aumentar posições. Levando em conta a mudança na curva de juros, as questões fiscais a serem resolvidas, e essa queda das ações, a tão aguardada janela para os IPOs parece ter ficado para trás. Se o mercado acreditava que havia uma chance de retomada no final de 2024, talvez o cenário recente tenha feito os investidores repensarem. 

“A retomada de IPO é um processo extremamente lento, não acredito em nada agora para 2024, eu vejo para meados de 2025”, comenta o analista da Nova Futura. 

O mercado deve esperar um pouco desse apaziguamento das informações também para entender como vai funcionar o cenário político no segundo semestre. “O que eu vejo, basicamente, é a cautela. O investidor, seja ele institucional, pessoa física ou estrangeiro, está indo naquilo que é mais fácil, que é ganhar dinheiro em dólar, colocar o dinheiro nos mercados nas treasuries americanas, conseguir taxas de juros aqui, do que operar posições mais agressivas, mais alavancadas”, diz o analista.

Cenário desafiador para os fundos

As ações não são as únicas a passar por um momento difícil. A indústria de fundos também tem sofrido, mais especificamente os multimercados e de ações, tanto no quesito desempenho quanto na captação. De janeiro a maio, os multimercados apresentaram captação negativa em todos os meses e, apenas na primeira semana de junho, entre os dias 03 e 07, registraram R$ 7,2 bilhões de saídas líquidas, segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). 

Em relação ao desempenho, até o final de maio, a rentabilidade geral da categoria era de 1,2%, abaixo do CDI, principal benchmark da categoria.

Daniel Campanini, gestor responsável pela área de fundos multimercados da Western Asset, que vê uma pausa do ciclo de corte da Selic pelo BC, acredita que há fatores que convirjam para uma melhora do cenário, mas a um prazo indeterminado. Para ele, em relação ao posicionamento, é um desafio para a classe, tanto para os multimercados quanto para a renda variável. “Só olhar um pouco para trás e ver a dificuldade que os fundos multimercados e os de renda variável têm de navegar nesse ambiente de juros mais altos e de incerteza mais elevada”, diz o gestor, citando o fator fiscal, político e o período pós-pandemia.

Campanini aponta que existe um argumento que os juros altos são bons para o mercado financeiro e que os fundos gostam de volatilidade, mas que podemos ver, na prática, que isso não parece ser verdade. Por um lado, o juro alto é uma variável que pode ajudar ou pode não ajudar, mas somado a outros fatores como as incertezas. Por outro, ele também representa um desafio muito grande: um concorrente difícil de se competir.

“As pessoas buscavam os multimercados, os fundos imobiliários, tudo que pudesse trazer um retorno um pouco maior em relação ao juro e à inflação. Fazendo o fast forward para hoje, quando estamos numa dinâmica de juro alto e a perspectiva de permanecer alto, você traz um competidor muito cruel para essa indústria, porque, no fim do dia, o investidor não precisa correr esse risco, ou não enxerga que precisa”, comenta o gestor da Western.

Para ele, a questão da rentabilidade prejudicada “não dá para durar para sempre” e o Brasil já estava muito perto de uma inflexão, que talvez tenha sido adiada por esse barulho mais recente de incertezas. Os bancos centrais ao redor do mundo iniciando seus cortes e o endereçamento da política fiscal aqui, são variáveis que devem contribuir para uma normalização do contexto. “Acho que isso é fundamental para a gente ter uma recuperação tanto de performance quanto de captação. Uma coisa é consequência da outra. Pode ser que demore um pouco mais, um pouco menos. Se fosse responder isso agora, tenho a impressão de que vai demorar um pouco mais do que imaginava recentemente. Mas as coisas são muito fluidas.”

E no dólar, qual o impacto?

Para analistas consultados, caso o BC decida manter a taxa a Selic no patamar atual, o real pode ter um fortalecimento, enquanto se optar por reduzir os juros em reduzir 0,25 pp, como estima uma pequena parte do mercado, o real deve continuar enfrentando uma desvalorização, movimento esse que vem se intensificando desde a última semana. 

Somado a isso, ainda temos a deterioração fiscal no Brasil que gera uma pressão inflacionária, o que torna a decisão do Copom ainda mais difícil. “A sustentabilidade das contas públicas e o comprometimento com a responsabilidade fiscal são cruciais. Desafios fiscais podem diminuir a atratividade do Brasil para investidores, pressionando o real”, diz o sócio da Astra Capital Andreas Serpa.

Na visão do economista-chefe da Nippur Finance, Cristian Pelizza, a questão fiscal aumenta a percepção de risco em relação ao Brasil. Segundo ele, isso, inclusive, impactou o câmbio nas últimas semanas, com o dólar alcançando os R$ 5,40.

“Se tivermos um corte de juros, isso vai diminuir o diferencial de juros entre Brasil e EUA no curtíssimo prazo, num momento em que a percepção de risco em relação ao Brasil piorou”, comenta Pelizza.

Por outro lado, o economista da Nippur Finance explica que se os juros forem mantidos, como é a aposta do mercado, não deve ter grande impacto na moeda. “Se houver cortes, porém, a gente pode ver a taxa de câmbio se elevando marginalmente”.

Movimento já “no preço” do crédito privado

Enquanto um pedaço do mercado financeiro é altamente dependente das decisões de juros de curto prazo, outros não sofrem tanto assim, como o caso do crédito privado, no qual o investidor compra títulos emitidos por empresas e instituições privadas.

A captação desses fundos, inclusive, tem chamado a atenção este ano pelo tamanho do volume, que ultrapassa a casa de R$ 1 trilhão. Como a decisão do Copom já está no preço, seja de corte de 0,25 pp ou manter a Selic em 10,50%, de acordo com especialistas, a oferta e a demanda pelo crédito deve se manter o todo vapor.

“Muda zero. Já está no preço. Não faz a menor diferença manter ou cortar 0,25 pp. Essa pequena variação não faz diferença nenhuma”, conta o CEO da Sparta Ulisses Nehmi.

De modo geral, o corte da Selic tende a impactar o crédito privado se for contínuo, afirma a presidente da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP), Priscila Rodrigues. “Eu acho que para afetar tem que ter movimentações no curto e médio prazo. Tinha uma expectativa no começo do ano que tivessem quedas (juros) mais rápidas. Mas há consciência de que vai ser um pouco mais devagar esse caminho”.

Para a executiva, a dinâmica atual de juros impacta as oportunidades de alocação de capital, principalmente na hora de as empresas buscarem alternativas para a sua estrutura de capital. “Se os juros fossem cair pela metade, elas segurariam um pouco, mas nesse cenário não vão buscar nenhuma alternativa, vão continuar como estão”, analisa a presidente da ABVCAP.


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