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Será que agora vai?
Com a Nutriplant, Bovespa Mais promete sair do papel no mesmo clima de ceticismo que, há alguns anos, marcou o lançamento do Novo Mercado

No mercado de capitais brasileiro, algumas novidades custam a emplacar. Foi assim com o Novo Mercado, criado em 2000. O primeiro ingresso demorou mais de um ano, o segundo, outros 26 meses, mas hoje a realidade é bastante diferente. O segmento totaliza 89 companhias listadas, e a fila de novas candidatas é crescente. O Bovespa Mais, um nicho de listagem criado pela Bolsa para abrigar companhias de médio porte, lembra muito essa história, ou pelo menos a primeira parte dela. Apenas agora, dois anos após a sua criação, apareceu uma candidata a estreá-lo: a paulista Nutriplant, fabricante de micronutrientes (complementos para o solo) de uso agrícola, que está disposta a inaugurar o segmento e, até o fechamento desta edição, aguardava apenas o aval da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para ofertar ações.

Há muito esperam-se sinais concretos sobre a demanda e a liquidez do Bovespa Mais. Com o surgimento da primeira candidata, está lançado o teste da viabilidade do segmento. Teme-se, porém, que a Nutriplant não seja o caso ideal para a estréia. Há a possibilidade de o desempenho dos papéis ser prejudicado pelo histórico financeiro da empresa, concordatária até novembro do ano passado, causando uma má impressão generalizada. Fundada em 1979, a Nutriplant foi duramente afetada, no início da década, por perdas geradas pela exposição cambial (tinha alto endividamento em dólar) e por uma estratégia de preços equivocada, informa o prospecto preliminar da oferta. Atualmente, seu passivo é de R$ 29,7 milhões — valor próximo ao faturamento do último exercício (encerrado em março), de R$ 28 milhões. Neste mesmo período, a companhia teve um lucro líquido de R$ 3 milhões. Nos dois exercícios anteriores, registrou prejuízos de R$ 4 milhões e R$ 4,6 milhões, respectivamente.

Por causa dos resultados pouco atraentes, parte dos recursos captados na oferta será usada para reforçar o capital de giro. O restante vai para ampliação da capacidade produtiva, aquisição de concorrentes e investimentos voltados a ganhos de produtividade e qualidade. A seu favor está a área de atuação, o agronegócio e também a carteira de clientes, com nomes de peso como Bunge Fertilizantes e Fertilizantes Heringer — esta última no Novo Mercado desde abril. Ainda que longe da perfeição, a Nutriplant promete ser o impulso que faltava ao Bovespa Mais. Poderá significar o começo de uma era em que o Novo Mercado deixa de ser um concorrente do segmento alternativo para se tornar um destino almejado pelas empresas nele listadas.

A dúvida é se existem as próximas da lista. De acordo com João Batista Fraga, superintendente de relações com empresas da Bovespa, pelo menos quatro empresas mantêm conversas com a comissão de abertura de capital da Bolsa, entre outras que já fizeram contatos. A lista conta com exemplos como o da DBA Engenharia de Sistemas, participante da última edição do Fórum de Abertura de Capital, em 2006, realizado pela Bovespa em parceria com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Devido ao tamanho da oferta — a intenção é captar entre R$ 25 milhões e R$ 50 milhões —, o Bovespa Mais tem tudo para ser o seu primeiro pouso no mercado de capitais. No entanto, os planos não são imediatos. “Esperamos conseguir abrir o capital nos próximos três anos”, comenta o sócio Danilo Meth.

Em situação semelhante está a Freios Controil. O faturamento em torno de R$ 100 milhões faz do acesso gradual ao mercado de capitais uma realidade mais plausível. “Não estamos longe do IPO”, conta o diretor Gilso Gotardo, referindo-se à cultura de implantar práticas sempre semelhantes às de uma companhia aberta. A empresa tem auditoria externa e gestão profissional, e os fundadores atuam apenas no conselho de administração. “O projeto do IPO será retomado em 2008”, completa.

Outra pista sobre a lista de candidatas ao Bovespa Mais está nas consultorias. Na Cypress Associates, especializada em fusões, aquisições e preparação para IPOs, cinco clientes das áreas de tecnologia, mineração e serviços têm chances de acessar o segmento. Na Proinvest Finanças Corporativas, a expectativa é lançar até dois clientes em 2008. “Imagino que, no ano que vem, assistiremos ao ingresso de pelo menos dez companhias, o que consolidaria o segmento”, aposta o sócio Paulo de Tarso.

A Conterv, do consultor Roberto Vieira, tem duas potenciais candidatas, dos setores de alimentos e bens de capital. Elas cogitam chegar ao mercado em 2008, mas paralelamente avaliam a possibilidade de adiar os planos e partir direto para o Novo Mercado. O escritório Barbosa, Müssnich & Aragão também trabalha com uma aspirante, do setor de tecnologia. “Estamos conversando, mas a abertura de capital não é certa, porque existe a possibilidade de aporte de recursos por um fundo de private equity”, conta o advogado Alexandre Garcia.

Com planos de uma oferta de ações entre R$ 25 milhões e R$ 50 milhões, a DBA Engenharia espera começar pelo Bovespa Mais

CONCORRÊNCIA — Apesar dos planos otimistas, é fato que, durante os últimos anos, alguns fatores impediram a estréia do Bovespa Mais. O principal deles, paradoxalmente, foi o bom momento do mercado de capitais, que permitiu a algumas empresas acessar diretamente o Novo Mercado. “Ao diminuir essa febre pelos IPOs, os investidores passarão a olhar mais atentamente para as companhias menores”, acredita Tarso. Mas há outras questões que prometem desafiar o Bovespa Mais, a começar pelas fontes alternativas de captação de recursos.

Fontes paralelas de captação, como o BNDES e os fundos private equity, ainda desafiam a atratividade do segmento

A farmoquímica Blanver é um exemplo. Até 2006, cogitava acessar o mercado de capitais de maneira gradual, mas hoje em dia mira, num prazo mais longo, o Novo Mercado. Para viabilizar a necessidade de aumentar sua produção, através da compra de uma nova unidade industrial, recorreu ao financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e também a recursos próprios. “O banco de fomento tem taxas de juro muito atraentes”, observa o diretor Sérgio Forgione. O planejamento da Teikon, manufatureira de produtos eletrônicos, como medidores de energia, balanças fiscais, computadores e telefones celulares, também subtraiu o Bovespa Mais. A meta agora é chegar ao Novo Mercado no segundo semestre de 2009. A empresa alega que ficaria pouco tempo listada no mercado de acesso e, por isso, decidiu pular a etapa. “Como as exigências a cumprir são muito parecidas nos dois segmentos, decidimos esperar por uma oferta maior, que dará mais liquidez às ações”, justifica Paulino Rodrigues, diretor financeiro. Para financiar os projetos imediatos de expansão, ele recebeu investimentos do BNDESPar e de um fundo de private equity. A nova planta industrial, inaugurada neste mês, em Manaus, foi paga com um empréstimo a ser quitado com recursos do IPO.

Com a iminência da estréia do Bovespa Mais, vale também refletir sobre os pontos a serem melhorados. Na Cypress, a crença é de que a inexistência de um “ecossistema” próprio, com investidores focados nas empresas de pequeno e médio porte e prestadores de serviços dispostos a explorar este nicho de mercado, explica boa parte das dificuldades em emplacar um segmento voltado às empresas de menor capitalização. “Ainda não avançamos porque falta criar esse modelo de negócio”, diz Kan Wakabayashi, sócio da consultoria.

VANTAGEM FISCAL — Os bancos de investimento que dominam o mercado de IPOs atualmente demonstram pouco interesse pelas operações de volume menor. Uma remuneração atraente, por ser em grande parte comissionada, depende do montante ofertado. Por isso, desde o início do projeto, a Bolsa imaginava que as ofertas no Bovespa Mais poderiam ser um campo fértil para a atuação das corretoras como underwriters, mas isso também não aconteceu. No fim das contas, o HSBC será o coordenador líder da oferta da Nutriplant. Já o assessor jurídico, o Pinheiro Neto, pretende tirar proveito do segmento. Carlos Alexandre Lobo, advogado do escritório, reconhece que a remuneração é bem menor. No entanto, está interessado em estabelecer um canal de relacionamento com essas companhias.

Atrair empresas e prestadores de serviço é importante, mas o Bovespa Mais não atingirá seus objetivos sem a ponta final desta cadeia, os investidores. E, uma vez excluídos os estrangeiros — focados nos papéis de maior liquidez, capazes de comportar volumes de aplicação mais expressivos —, fica a pergunta: quem serão os investidores deste segmento? Fundos de investimento, fundos de pensão e family offices são os mais cotados. No entanto, o simples fato de as companhias oferecerem maior potencial de retorno, apesar do risco mais elevado, pode não ser suficiente para manter a atratividade. “Acredito que seja necessário oferecer algum tipo de benefício para atrair o investidor, como uma vantagem fiscal”, opina Marco Antônio Serra, da BrasilPar. Enquanto as mudanças esperadas não acontecem, o mercado assistirá curioso ao desempenho da Nutriplant. É nítido um certo ceticismo no ar, mas, ao mesmo tempo, é inevitável a lembrança de que o Novo Mercado, hoje sucesso absoluto, também começou assim.

Bolsa de Londres explica o sucesso do AIM

Desenvolvido em 1995 pela Bolsa de Londres, o Alternative Investment Market (AIM) é o exemplo mais bem-sucedido de um mercado com foco nas empresas de menor porte e alto potencial de crescimento. Desde sua criação, 2,3 mil empresas britânicas e outras 400 estrangeiras listaram-se no segmento, captando um total de 49 bilhões de libras. Foi nos últimos anos que os volumes captados aumentaram de forma expressiva: passaram de 2 bilhões de libras, em 2003, para 15,7 bilhões de libras no ano passado. Atualmente, o AIM reúne cerca de 1,6 mil empresas, que totalizam valor de mercado superior a 100 bilhões de libras. Dessas, cerca de 50% são de fora do Reino Unido.

Para entender melhor o desenvolvimento deste mercado alternativo, a London Stock Exchange encomendou um estudo à London School of Economics. Divulgado em novembro, o material evidencia o interesse crescente de companhias e de investidores dispostos a aplicar no segmento e atribui o sucesso a fatores como: a regulação adaptada às necessidades da companhia, os retornos superiores aos do mercado tradicional, a reduzida taxa de falência das empresas (abaixo de 3% nos últimos quatro anos, apesar de, em muitos casos, elas estarem em estágio inicial ou atuantes em setores de alto risco), o bom nível de liquidez e o suporte prestado pelo AIM às empresas listadas. Entre os destaques da regulação do segmento estão os nomads, consultores incumbidos de aprovar o ingresso das companhias e de mantê-las adequadas às regras de listagem.

Ainda de acordo com o estudo, os investidores que aplicam no mercado alternativo desejam qualidade ao invés de quantidade. Justamente por isso o mercado parece ter se auto-ajustado. Até junho deste ano, apenas 138 novas empresas ingressaram no AIM, enquanto em 2005 e 2006 foram, respectivamente, 519 e 462. (Y.Y)


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