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Iniciativas nos Estados Unidos e Inglaterra mostram que a internet é uma via eficiente para ampliar a participação de acionistas nas assembléias. No Brasil, porém, ainda será preciso mexer na lei para caminhar por ela

 

Atrair acionistas minoritários para assembléias gerais é missão quase impossível para os nossos profissionais de Relações com Investidores (RI). E eles não estão sozinhos nesta empreitada, visto que os índices de abstenção em companhias americanas e inglesas têm ficado, nos últimos anos, em torno de 50%. Muitas são as teses que explicam a falta de apelo, incluindo inconveniência de horários, pouco interesse pelos assuntos em pauta e a idéia de que estas reuniões não passam de mera formalidade.

No entanto, o crescimento da participação de investidores pessoa física no mercado brasileiro, o aumento do percentual de ações em circulação e o surgimento das primeiras companhias com controle difuso (exemplo de Lojas Renner e Submarino) fizeram crescer a importância de se reverter este quadro, estimulando o senso de propriedade do acionista e seu maior envolvimento com a realidade da companhia à que ele destina parte de seus investimentos.

O último item é particularmente importante. Quando a companhia possui a figura do controlador, tudo está resolvido porque as decisões se dão pela maioria de votos detida por este acionista (ou bloco de acionistas), que certamente estará presente ou representado na assembléia. Mas a situação se complica quando o controle está no mercado, como é o caso da Renner, e a votação por maioria depende da presença de um quórum mínimo para que haja representatividade.

Foi exatamente isso, a propósito, que aconteceu com a Renner na sua primeira assembléia. Diante da falta de quorum mínimo (25% dos acionistas com direito a voto), a reunião precisou ser cancelada. Isso apesar de a companhia ter se precavido e, por reconhecer que a participação em assembléias não faz parte da cultura do acionista minoritário brasileiro, ter enviado explicações detalhadas das matérias que seriam discutidas a todos os investidores e colocado procuradores à disposição para que estes pudessem ser representados. Até 72 horas antes do encontro, contudo, apenas 24% dos investidores haviam confirmado presença, o que obrigou a convocação em segunda chamada, quando o quórum mínimo deixa de ser obrigatório.

Outro ponto a ser considerado na reflexão sobre o absenteísmo dos acionistas nas assembléias — e as formas de se revertê-la utilizando a tecnologia disponível — é o incremento da quantidade de acionistas com direito a voto, graças à ascensão do Novo Mercado, que permite apenas ações ordinárias, ou até mesmo do Nível 2, no qual os preferencialistas ganham voto em situações especiais. Com a participação nesses dois níveis cada vez mais freqüente, é de se esperar um ambiente regulatório que favoreça o exercício do voto e a presença dos acionistas nas assembléias.

Quem bateu de frente com essa necessidade logo que entrou no Novo Mercado foi a Natura. Helmut Bossert, seu gerente de RI, conta que a primeira experiência da indústria de cosméticos com uma assembléia fugiu às expectativas. “Em março do ano passado, na nossa primeira AGO, todo o conselho de administração, presidência e diretoria se prepararam para receber pessoalmente os acionistas. Mas apareceram apenas dois indivíduos, ambos representantes legais de fundos de investimento”, lembra Bossert, lamentando que a oportunidade de tirar dúvidas diretamente com os principais executivos da empresa tenha ficado perdida. Para mudar essa situação, a Natura vem pensando em investir um pouco mais para chamar a atenção dos acionistas. A idéia é enviar para cada um deles um convite, assinado pelo principal executivo da companhia.


MAIS ECONOMIA – O gasto com impressão e distribuição de material para convocação de acionistas às assembléias é justamente o que vem sendo questionado pelos norte-americanos nos últimos tempos. Lá, diferentemente daqui, as companhias enviam a cada acionista um calhamaço chamado proxy statement, no qual constam todas as proposições a serem apresentadas na assembléia, acompanhadas de textos que fazem defesa de cada uma das idéias e a análise dos seus impactos na companhia. Um costume que não sai nada barato para as empresas daquele país — a estimativa é de gastos superiores a US$ 1 bilhão por ano —, especialmente se considerado que a internet seria um canal muito mais econômico e com resultados bastante semelhantes.

Sensibilizada com a questão, a Securities and Exchange Commission (SEC) colocou finalmente em audiência pública uma proposta que, se aprovada, permitirá a divulgação deste tipo de material pela rede mundial de computadores. O resultado dos comentários será conhecido no final de fevereiro e seus defensores falam em economias para as companhias abertas de até US$ 500 milhões.

Denominado “Notice and Access”, o projeto da SEC prevê que as companhias enviem pelo correio um aviso de disponibilidade dos materiais em seu website, no mínimo 30 dias antes da data da assembléia. Os investidores que, ainda assim, desejarem receber o material impresso poderão solicitá-lo através de um endereço de e-mail ou de um serviço de chamadas gratuitas especificamente criados para este fim.

Os acionistas que queiram propor alguma questão a ser votada também serão beneficiados pela medida. De acordo com a legislação em vigor, eles precisam adotar os mesmos procedimentos de envio do material quando querem adicionar algum tema à pauta da assembléia apresentada pela administração. Para o presidente do órgão regulador norte-americano, Christopher Cox, a mudança torna o processo não apenas menos dispendioso mas, também, mais democrático, por facilitar o procedimento para que os acionistas adicionem suas questões à pauta.

A preocupação com as despesas para anúncio da assembléia seria equivalente, no Brasil, às queixas das companhias quanto à publicação obrigatória dos balanços completos no Diário Oficial e em jornais de grande circulação. Quanto às assembléias, contudo, o procedimento por aqui é mais simples, embora não necessariamente tão mais barato. As companhias devem publicar a convocação também no Diário Oficial e em jornal de grande circulação da cidade onde está localizada a sede, além de colocá-la à disposição no próprio site e no da CVM.

A adesão das companhias britânicas ao sistema de voto eletrônico elevou o nível médio de participação nas AGEs de 50% para 61%

PRATICIDADE – Nos Estados Unidos, o próximo passo na discussão sobre as formas de utilização da internet para aproximar acionistas e companhias será o voto eletrônico. Autorizado na Inglaterra no início desta década, o sistema foi responsável por 42% dos votos colocados em 2005. No ano anterior, este percentual ficou em apenas 22%. Segundo pesquisa realizada pelo Shareholder Voting Working Group, o nível médio de participação em assembléias passou de 50%, em 2003, para 61%, em 2005, graças à adesão da quase totalidade (89%) das maiores companhias abertas britânicas (FT-100) ao voto eletrônico.

Por aqui, a possibilidade do voto eletrônico também vem sendo questionada. Chegou até a ser aventada pela Lojas Renner, logo após a sua experiência de uma assembléia vazia, como forma de solucionar a questão e estimular a participação de investidores institucionais e pessoas físicas. A adesão a essa prática no Brasil, contudo, é mais complicada. Dependeria de uma mudança no artigo 127 da Lei das S.As, que torna a presença física dos acionistas obrigatória para a validade das decisões.

O artigo se refere ao “Livro de Presença”, que deve ser assinado por todos aqueles que comparecerem à assembléia. Segundo o advogado e ex-presidente da CVM, Luíz Leonardo Cantidiano, esse seria o único ponto da lei que proibiria a adoção do mecanismo, que ele considera ser “extremamente eficaz e válido”.

A opinião do advogado é compartilhada pelos RIs, advogados e especialistas do mercado de capitais ouvidos por esta reportagem. Elizabeth Machado, superintendente de relações com empresas da Comissão de Valores Mobiliários, comenta que vê como “bastante positiva qualquer possibilidade de utilização da internet para facilitar a vida do acionista e promover a maior participação nas decisões da companhia”. No entendimento de Alfredo Setúbal, presidente da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), o voto eletrônico também poderia estimular a participação dos investidores institucionais nas assembléias.

Mas o fato é que, no Brasil, essa discussão começa antes das questões práticas para a adesão a esses encontros. Em muitos casos, não há interesse dos investidores em participar dessas reuniões, principalmente quando as ações que possuem são preferenciais. “Tenho certeza de que a participação aumentaria, apesar de considerar que a motivação para o voto ainda seja um tema complexo de equacionar”, pondera Setúbal. No final do ano passado, a Anbid discutia, justamente, as situações em que os gestores de fundos de investimentos deveriam, de maneira obrigatória, expressar o seu voto.

A preocupação com as despesas com assembléias nos EUA é equivalente, no Brasil, às queixas relacionadas à publicação de balanço
A adesão ao voto eletrônico dependeria de uma mudança no artigo 127 da Lei das S.As, que hoje torna a presença física obrigatória

QUESTÕES DE SEGURANÇA – Apesar de classificar a mudança como desejável, Helmut Bossert, da Natura, se preocupa com as questões de segurança a que a internet ainda está sujeita. Para o executivo, é desejável que aqueles que eventualmente estudem a adoção da medida tomem contato com as soluções tecnológicas que impediriam a colocação de votos por hackers, por exemplo.

Fora os aspectos de segurança, cabe considerar a efetiva disseminação do uso da rede mundial de computadores pelas companhias abertas no País. Certamente esta é uma prática bem difundida entre as companhias com maior liquidez e mais antenadas com as boas iniciativas de Relações com Investidores. Mas está longe de ser unanimidade no conjunto das empresas de capital aberto.

Um estudo realizado em 2002 por Wesley Mendes-da-Silva, professor da Faculdade Integrada do Recife, mostrava que apenas metade das companhias abertas brasileiras utilizavam suas páginas de maneira adequada para abrir informações aos investidores. Ele constatou, por exemplo, que somente 49,5% de uma amostra de 291 empresas não-financeiras listadas na Bovespa divulgava o seu relatório anual pelo site.

Os instrumentos mais modernos também estão pouco disseminados. A despeito do crescimento de 25% no último ano, as reuniões com analistas transmitidas por internet (webcasts), de acordo com estimativas da PR Newswire, são utilizadas por pouco mais de um terço das companhias listadas em bolsa. Uma pesquisa do Ibope, publicada em setembro de 2005, considerava que as páginas de RI brasileiras ainda tinham muito a melhorar no que diz respeito às facilidades de uso pelo internauta. A maioria ainda precisa realizar ajustes de conteúdo e intensificar a periodicidade de atualização. A possibilidade de turbinar a participação de acionistas em assembléias pode ser o estímulo perfeito para que as nossas companhias dêem à internet a prioridade que ela merece.


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