As especificidades dos conflitos societários encontram na arbitragem um instrumento apto para sanar as mais diversas situações de forma ágil e discreta e também mais eficiente do que o Judiciário — considerando-se a provável especialização dos árbitros em relação às matérias em disputa. É por essas razões que tem aumentado a quantidade de instrumentos societários originários e contratos derivados (como acordos de cotistas ou acionistas e contratos de investimento) que preveem cláusulas compromissórias para resolução de litígios internos à sociedade.
Embora até 2001 não houvesse previsão legislativa expressa — lacuna preenchida pelo acréscimo do §3º do artigo 109 da Lei das Sociedades por Ações —, a inserção de cláusula compromissória no estatuto social já é prática tradicional e consolidada no mercado brasileiro, e sua expansão tende a prosseguir. Provas do sucesso do uso da arbitragem na resolução de litígios societários são os requerimentos de governança coorporativa da B3: para entrarem no Nível 2 ou no Novo Mercado as empresas devem aderir à Câmara de Arbitragem do Mercado (CAM).
Durante muito tempo, porém, persistiram algumas incertezas quanto ao alcance e a eficácia das cláusulas compromissórias inseridas em contratos sociais e estatutos sociais. Dada sua natureza mista — contratual e jurisdicional —, a submissão à arbitragem depende, incontestavelmente, da manifestação de vontade das partes; foi por isso que pairaram dúvidas em torno da aceitação compulsória de cláusula compromissória diante da ausência de consenso entre todos os acionistas.
Recentemente, a Lei 13.129/15, que reformou a Lei de Arbitragem (Lei 9.307/96), acrescentou o artigo 136-A à Lei das Sociedades por Ações e subjugou grande parte da insegurança que ainda havia quanto aos efeitos da convenção arbitral em um instrumento societário. A nova regra estabelece quórum especial para a inclusão de cláusula compromissória e, tratando-se de companhia fechada, garante o direito de retirada, mediante reembolso do valor das ações, daqueles acionistas que discordem da deliberação assemblear.
Outra inovação salutar diz respeito à eficácia da convenção arbitral, que deverá aguardar o decurso do prazo de 30 dias, contado da publicação da ata da assembleia geral que a aprovou. Evita-se, com isso, a retroatividade da cláusula e também surpresas quanto à sua aplicação a um litígio já nascente.
Assim, a cláusula compromissória incluída no estatuto social vinculará a sociedade e todos os seus acionistas, aplicando-se à resolução dos conflitos sobre direitos patrimoniais disponíveis que sejam oriundos ou relacionados a todo e qualquer relacionamento das partes signatárias a propósito da sociedade. Como não apenas as cláusulas específicas do estatuto social estarão, regra geral, abarcadas pela arbitragem, é importante que os demais instrumentos societários prevejam, de modo uniforme, como se dará a resolução de conflitos — a fim de se evitar entraves e discussões suplementares prévias à instauração do procedimento arbitral.
Apesar de enfrentar cada vez menos resistência da doutrina, a vinculação de administradores que não compõem o quadro de acionistas da sociedade ainda é capaz de gerar algumas dificuldades práticas. Por precaução, recomenda-se que o termo de posse do administrador faça referência expressa à sua anuência a todos os termos do estatuto social, e em especial sua concordância com a aplicação da cláusula compromissória nele contida aos litígios porventura decorrentes dessa relação.
*Por Vamilson José Costa ([email protected]) e Maria Cibele C. Affonso dos Santos ([email protected]), sócios de CTP Advogados, e Marina Santos Fusinato ([email protected]), advogada plena do escritório
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