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Inconformados
CVM disciplina a atividade dos agentes autônomos de investimentos, mas profissionais se revoltam e preparam recurso na Justiça

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Há um bloco de insatisfeitos mobilizado em torno da Instrução 497. Editada no mês passado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a norma regula a atividade de agente autônomo de investimento. Trouxe luz à profissão, até então carente de regras claras. Mas também gerou muito burburinho, especialmente por exigir que os agentes atuem para apenas um intermediário. A proposta de exclusividade gera alvoroço desde a audiência pública sobre as novas normas, realizada no ano passado. E segue polêmica mesmo com a instrução editada e pronta para vigorar a partir de janeiro de 2012. A norma revelou-se tão incômoda que já há quem se mobilize para recorrer ao Poder Judiciário.

Um deles é Valério Marega, agente autônomo da XP Investimentos e também distribuidor de fundos da BNY Mellon. Pela nova regra, terá de escolher uma das duas instituições para atuar com exclusividade. O problema é que cada um dos intermediários gera cerca de 50% da sua renda. Por isso, a saída que Marega vislumbra é a mobilização: criar uma associação de profissionais para, em conjunto, entrar com uma medida cautelar contra a CVM. “Estão cerceando nosso direito de trabalhar. A decisão foi arbitrária e me obriga a ser funcionário de uma única empresa”, reclama.

Outro exemplo vem de Franca, interior paulista, onde exerce essa função Washington Luiz Bueno de Camargo Júnior. O agente está disposto a entrar com a medida cautelar contra o órgão regulador. Apesar de ter se enquadrado espontaneamente à regra de exclusividade ainda na fase da audiência pública — hoje, ele trabalha apenas para a corretora Link — e não ter perdido dinheiro por força dessa escolha, Camargo Júnior não esconde a insatisfação. “Estudamos, fazemos cursos, adquirimos um direito e ele nos foi retirado. Isso é injusto”, diz.

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O coro das reclamações tem vozes espalhadas por todo o País. “Agora Inês é morta”, lamenta Fausto de Arruda Botelho, profissional de São Paulo habilitado para as atividades de agente autônomo e consultor de investimentos. Em geral, os agentes argumentam que a CVM estaria sendo arbitrária ao prejudicar a livre concorrência. “Isso nos impede de conhecer produtos e serviços de outras corretoras”, afirma Mauro Lúcio dos Santos, que atua em Patrocínio, no estado de Minas Gerais. Eles comparam o agente autônomo ao vendedor de seguros, profissão da mesma forma regulamentada e caracterizada pela distribuição simultânea de produtos de firmas diferentes.

A CVM, por sua vez, rebate as críticas. “A função do agente é ser um distribuidor. A diferença é que, nesse mercado especificamente, ao atuar sem exclusividade, o agente assume uma outra função”, ressalta Otávio Yazbek, diretor da CVM, referindo-se à transformação dos agentes em consultores de valores. Leandro Ruschel, agente autônomo sócio fundador da Leandro & Stormer, reconhece que, do ponto de vista dos agentes, a nova norma pode trazer
prejuízos. No entanto, o formato escolhido ajuda a monitorar a atividade. “Com os agentes atrelados à corretora, ela fica forçada a fiscalizá-los”, observa.

Mas a Instrução 497 não gerou apenas descontentamento. Diversos participantes apoiam a norma, como é o caso de Guilherme Benchimol, diretor geral da XP Investimentos. Antes de ser uma corretora, a XP era uma empresa de agentes autônomos. Atualmente, grande parte do trabalho de distribuição continua nas mãos desses profissionais. No total, são 1,3 mil agentes atuando com exclusividade por todo o Brasil. “A regra é coerente. Se sou o responsável pelo agente, faz sentido ele trabalhar apenas comigo”, conclui. Na prática, Benchimol via dificuldades no trabalho simultâneo com várias corretoras devido às particularidades de cada casa.

O formato escolhido ajuda a monitorar a atividade. “Com os agentes atrelados à corretora, ela fica forçada a fiscalizá-los”

O vínculo trabalhista, temor de muitos participantes quando a proposta de exclusividade foi lançada para comentários do mercado, parece não incomodar. “O risco existe quando o agente está alocado dentro da sua estrutura física, no lugar de um funcionário. Aqui cada um tem a sua própria empresa. São, na verdade, empreendedores”, declara o diretor da XP.

André Luiz Dumortout de Mendonça, advogado e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Agentes Autônomos de Investimento (Ibaai), sediado no Rio de Janeiro, minimiza a discussão. Segundo ele, o Instituto, que tem mais de 80 associados, não foi procurado por nenhum agente insatisfeito ou disposto a recorrer ao Judiciário. “A CVM tem competência legal para disciplinar a atividade e está protegendo o investidor e as corretoras”, considera. Além da imposição da exclusividade, ele não vê novidades substanciais na nova regra.

CADA UM COM SEU CHAPÉU — Além da exclusividade, a Instrução 497 proibiu a sobreposição de atividades. Um agente autônomo não poderá exercer as funções de consultor de investimentos ou administrador de carteiras, ainda que tenha as devidas habilitações. Na visão do regulador, usar chapéus diferentes simultaneamente leva a situações de conflito de interesses, porque o agente autônomo é um vendedor dos produtos da corretora e por ela é remunerado. Ou seja, quanto maior o volume de negócios gerados, maior será a sua comissão. Consultores e administradores de carteiras, ao contrário, são contratados e pagos pelos investidores. Devem atuar em benefício do cliente, independente do produto que cada corretora ofereça. O exercício simultâneo das atividades faria com que uma das duas pontas ficasse em segundo plano — ora o investidor, que poderia ser levado a aplicar no produto que paga a maior comissão para o agente, ora a corretora, que não teria um profissional 100% dedicado a distribuir somente os seus produtos.

Aqueles que acumulam atividades terão até o começo do próximo ano para escolher em qual vão atuar. E aí surge mais uma reclamação. A regra para os agentes autônomos já saiu do forno, enquanto as demais ainda nem entraram em audiência pública.

A CVM promete resolver a questão. Yazbek avalia que as discussões sobre a reforma da Instrução 306, que regula os administradores de carteiras e, por tabela, é aplicada aos consultores, estão adiantadas. A meta é colocar duas novas instruções em audiência pública, uma para cada atividade, nos próximos meses.

Enquanto isso, quem tem mais de um chapéu se prepara para a transição. Um agente autônomo carioca, que preferiu não se identificar, pretende deixar essa atividade para atuar como administrador de carteiras, habilitação que até então ficava guardada na gaveta. Seu argumento para a troca é a relação de risco e retorno de cada uma das atividades. “O agente autônomo virou um papagaio que ouve a ordem de um lado e a repassa de outro. Ao mesmo tempo, continua responsável pela inadimplência dos clientes”, pondera. A Instrução 497 definiu a função dos agentes como prepostos das corretoras, mas não regulou a questão da responsabilidade pelos não pagamentos, usualmente assumidas pelos autônomos. Na prática, os agentes vão tomar para si os riscos de clientes, apesar de a nova norma fazer questão de enfatizar que esses clientes são da corretora e não seus. “A regra impõe riscos financeiros e legais elevados (para os agentes), enquanto a competição entre as corretoras e os descontos nas corretagens são cada vez maiores”, provoca o agente.

No relatório da audiência pública, a CVM avisa que vai ficar de olho no procedimento de delegar aos agentes a responsabilidade pela inadimplência. “Optamos por não proibir, mas demos a sinalização clara de que essa prática é inadequada e tem de ser coibida”, alerta Yazbek. Tudo indica que a inibição efetiva, se ocorrer, virá pelos braços da autorregulação.

Profissão do passado ou do futuro?

Os agentes autônomos são mais antigos no mercado de capitais que a própria CVM. Quando o órgão regulador foi criado, em 1976, eles já atuavam distribuindo produtos de intermediários financeiros desde 1967. Estrearam no normativo brasileiro através da Resolução 76, do Conselho Monetário Nacional (CMN). Na ocasião, foram definidos como as “pessoas físicas que se dedicarem, sem vínculo empregatício, à atividade de venda ou colocação de títulos por conta de uma sociedade corretora”. A profissão ficou sob escopo do Banco Central até 2001, quando a CVM editou a Instrução 355, primeira norma a regular a atividade.

A linha do tempo dos agentes autônomos evidencia sua importância histórica. Mas como continuar sendo essencial em um mercado cada vez impactado por inovações tecnológicas? Para que serve o agente autônomo se o investidor pode, através dos sistemas de homebroker, enviar suas ordens por conta própria?

A primeira razão para o profissional manter o seu apelo é o custo. “Os clientes que atendo têm, pelo menos, 50% de desconto na corretagem. Alguns chegam a receber 80%”, revela um agente que prefere não se identificar. Com o abatimento, o gasto do investidor com a negociação se aproxima do competitivo mercado de homebrokers, com a vantagem de desfrutar de um atendimento personalizado. Na prática, essa negociação de descontos é baseada no relacionamento dos clientes com os agentes, e não necessariamente com as corretoras. Seria uma evidência de que os agentes têm, sim, uma carteira própria de clientes.

Para alguns, o trabalho de distribuição dos agentes continua sendo essencial. “Agente autônomo é a profissão do futuro”, enfatiza Guilherme Benchimol, diretor geral da XP Investimentos. “Temos convicção de que, num país que não tem demanda por edifícios, a profissão de engenheiro não cresce. Agora, que há demanda por investimentos, com a classe média cada vez mais poupadora, é essencial ter o agente como distribuidor dos produtos da corretora.” (Y.Y.)


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