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Além dos balanços
Na maior conferência de RIs do mundo, profissionais discutem o próximo desafio de suas carreiras: aprender a vender a história de governança da companhia - e ser bem-sucedido

, Além dos balanços, Capital Aberto

 

De Seattle.
Diretor de relações com investidores (RI) da Curtiss–Wright Corporation, Jim Ryan se viu diante de uma situação delicada em 2011. Cerca de 60% dos acionistas da fabricante de componentes mecânicos para as indústrias de energia, aeronaves e defesa votaram contra o pacote de remuneração proposto para os altos executivos. O ingresso da Curtiss–Wright na lista de empresas norte–americanas reprovadas, em 2011, no processo de say on pay — sistema implantado pela Securities and Exchange Commission (SEC) que submete os salários da diretoria ao voto consultivo dos acionistas — foi um alerta para Ryan. Estava na hora de ele tomar as rédeas, também, dos assuntos de governança corporativa da companhia. “Essa é mais uma função que os profissionais de relações com investidores precisam assumir”, acredita o executivo, que participou da conferência anual do National Investor Relations Institute (Niri), realizada entre 3 e 6 de junho, em Seattle (EUA).

A sensação de Ryan de que os RIs precisam se engajar mais em assuntos que extrapolam os dados financeiros da companhia vai ao encontro do tema “Great expectations”, escolhido para o evento do Niri deste ano. O mote faz uma alusão ao aumento das expectativas dos diversos stakeholders em relação à atuação do RI. Se antes era suficiente esse profissional ser expert nos negócios e nas estratégias da companhia para satisfazer os investidores, agora ele precisa também conhecer em profundidade a política de remuneração dos executivos e os critérios para nomeação dos membros do board, dentre outros aspectos. “É cada vez menos aceitável que um RI precise recorrer a um terceiro para responder a questões de governança”, afirma Stephen Brown, diretor de governança corporativa da TIAA–CREF, fundo de pensão norte–americano com US$ 487 bilhões sob gestão.

Desde que a Curtiss–Wright foi reprovada no say on pay, Ryan tem todos os detalhes do programa de remuneração dos executivos na ponta da língua. Apesar de o voto sobre a remuneração ser apenas consultivo, a companhia fez questão de revisar os pontos críticos de seu plano de compensação e promover mudanças com o objetivo de obter a aprovação dos investidores em 2012. As alterações foram comunicadas por meio de um webcast organizado em outubro. Para mostrar a disposição da Curtiss–Wright em manter um diálogo aberto e transparente, Ryan e o CFO entraram em contato com os 20 principais acionistas e com aqueles que votaram “não” no say on pay, convidando–os a assistir ao webcast. Após a conferência em vídeo, o trabalho continuou. Ryan, o diretor financeiro e o secretário de governança ligaram para cada um dos acionistas convidados. O objetivo era saber se havia restado alguma dúvida ou ponto de preocupação. O esforço valeu a pena. Este ano, o plano de remuneração da diretoria da Curtiss–Wright foi aprovado por 97% dos acionistas.

MAIS VIGILÂNCIA — A história da Curtiss–Wright, retratada no painel “Year two of say on pay: investors had great expectations, did issuers meet them?”, ilustra bem o ambiente de pressão que incide sobre os RIs. Desde a crise financeira mundial de 2008, a fiscalização dos investidores em relação à administração e à remuneração dos executivos das companhias abertas aumentou significativamente. De acordo com dados do website de governança corporativa The Corporate Counsel, até 12 de junho, 49 empresas norte–americanas tiveram seus pacotes de remuneração reprovados pelos acionistas no say on pay. O número já ultrapassava o de 2011, quando 44 companhias enfrentaram essa situação. “E a tendência é essa estatística piorar”, prevê Daniel Burch, presidente da consultoria MacKenzie Partners.

Esse cenário torna evidente a necessidade de os profissionais de RI passarem a “vender” mais intensamente, nos seus encontros com os investidores, a história de governança da empresa. A Intel, por exemplo, organiza há anos road shows voltados a discutir suas práticas ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês) — uma iniciativa não tão usual, mas bastante apreciada pelos gestores de recursos. Uma pesquisa feita pela Harvard Business School mostra que, dessas três letras, as que mais interessam aos investidores são a E (environment) e a G (governance). O motivo, segundo os autores do estudo, é que as implicações ambientais e de governança têm impacto direto no valor da ação.

Brown, da TIAA–CREF, ressalva que falta preparação dos profissionais de relações com investidores para esses encontros sobre governança. “Às vezes, eles chegam reclamando dos consultores de voto, como se nós utilizássemos as recomendações deles para votar (a TIAA–CREF não recorre a esses consultores). Esse é um sinal de que não entendem como operamos”, constata o diretor. Por isso, ele diz ter ficado impressionado com uma reunião com executivos da General Electric. “Eles tinham lido nossa política de governança e vieram com páginas marcadas e parágrafos sublinhados. Isso permitiu um diálogo realmente enriquecedor”, destaca.

Para evitar problemas com acionistas ativistas, John Siemann, sócio da Phoenix Advisory Partners, recomenda que os RIs sejam proativos e chamem seus investidores mais engajados para conversar. Não adianta, entretanto, iniciar essa aproximação em plena temporada de assembleias. “Nesse período, já pode ser tarde demais para convencê–los a mudar de ideia sobre uma decisão de voto”, lembra. O ideal, portanto, é realizar esse trabalho ao longo do ano todo. Para otimizar o processo, uma sugestão é focar os esforços nos 20 acionistas com maior participação na companhia. Se não for possível agendar um encontro com todos eles, uma ligação já pode ser suficiente para descobrir se há algo os incomodando.

Também vale usar a criatividade para saber o que os acionistas estão pensando sobre as práticas de governança da companhia. A provedora de produtos financeiros Prudential Financial tem encorajado os acionistas a escreverem, no verso da cédula de voto, se possuem alguma dúvida em relação à política de remuneração dos executivos ou sobre qualquer outro assunto. A empresa já recebeu mais de 2 mil feedbacks. A Intel, por sua vez, abre fóruns virtuais, antes e depois de sua assembleia anual, para os acionistas postarem perguntas e fazerem comentários. A iniciativa ajuda a evitar surpresas.

“É cada vez menos aceitável que um RI precise recorrer a um terceiro para responder a questões de governança”

FOCO NOS PROXY ADVISORS — Durante as conversas com os investidores é sempre bom perguntar se eles usam as recomendações da Institutional Shareholder Services (ISS) ou da Glass Lewis, consultorias especializadas na recomendação de votos em assembleias de acionistas. É a melhor forma de saber a influência que essas firmas têm sobre a base de acionistas. “Muitos investidores seguem as recomendações somente para se manifestar sobre algum item específico, como remuneração, ou como um auxílio para chegar a sua própria conclusão de voto”, explica Burch, da MacKenzie.

Ele recomenda que os RIs mantenham um relacionamento próximo com essas firmas e estejam a par dos critérios que norteiam suas decisões de voto — eles podem mudar de ano para ano. Para a temporada de assembleias de 2012 no Brasil, por exemplo, a ISS adotou como política recomendar voto contrário à eleição de chapas ou candidatos aos conselhos de administração de companhias do Novo Mercado que não resultem numa distribuição de, no mínimo, 30% dos assentos para independentes. No ano anterior, o percentual aceito era de 20%.

Dada a influência das consultorias de voto, o Niri, em parceria com o Business Roundtable, a Securities Transfer Association e a Society of Corporate Secretaries and Governance Professionals, pede que a SEC regule a atividade dos proxy advisors. O regulador norte–americano considera a possibilidade de acatar o pleito. As associações querem mais transparência dessas firmas sobre os padrões, os procedimentos e as metodologias usados para formular as recomendações, além de informações sobre o gerenciamento do conflito de interesses no caso de firmas que prestam consultoria de voto e de governança. Também pleiteiam que os proxy advisors sejam obrigados a enviar para as companhias, com antecedência, um esboço do relatório de recomendação de voto a ser encaminhado aos clientes. O objetivo é permitir que as empresas identifiquem possíveis erros factuais nas informações utilizadas e peçam a correção. “Estou ciente da frustração de muitos emissores com o trabalho dos proxy advisors”, afirmou Meredith Cross, diretora da SEC, no painel “Regulatory view from SEC leadership”.

Ela encorajou os RIs a reportarem para o regulador erros que encontrem nos relatórios dessa consultorias. “Já ouvi casos de companhias que foram comparadas com pares que não eram lógicos”, observa. De acordo com Meredith, independentemente de qualquer regulação, é importante que os RIs mantenham diálogo com os consultores de voto, uma vez que é interesse de todos que as recomendações sejam baseadas em dados confiáveis. “Os proxy advisors têm o dever fiduciário de prover informações corretas para os investidores. A questão é que pode haver uma linha muito tênue entre um erro e uma diferença de pontos de vista”, pondera.

Para garantir que a Curtiss–Wright Corporation não fosse reprovada novamente no say on pay, Ryan se reuniu tanto com analistas da ISS como da Glass Lewis. Nos encontros, levou o CFO, o diretor de compensação e benefícios, e dois membros do conselho de administração. “As reuniões foram bastante produtivas. Aprendemos mais sobre como essas firmas funcionam e tivemos a oportunidade de detalhar e esclarecer dúvidas sobre nosso plano de remuneração”, avalia Ryan.

No Brasil, devido à forte concentração acionária das companhias locais, a atuação dessas firmas não costumava ser motivo de preocupação. Mas, de uns tempos para cá, as companhias — principalmente as de capital pulverizado — estão prestando mais atenção nelas. Ciente da influência da ISS, a Gafisa divulgou, há alguns meses, extratos do relatório da consultoria no qual era recomendada a aprovação de todos os itens em votação propostos para as assembleias–gerais ordinária (AGO) e extraordinária (AGE) de maio de 2012.

TRABALHO CONJUNTO — Para se envolver mais nos assuntos de governança, é vital que o profissional de RI trabalhe com a secretaria de governança e participe ativamente da organização das assembleias — algo que nem sempre acontece. Uma pesquisa divulgada em março de 2012 pela IR Magazine aponta que 92% dos secretários de governança estiveram envolvidos com os preparativos do say on pay no ano passado, contra 41% dos RIs. Ao todo, foram ouvidas 181 empresas norte–americanas. “A participação dos RIs nesse processo é fundamental; eles conhecem os investidores melhor do que ninguém e podem dizer se a companhia terá problemas para aprovar as propostas da administração”, ressalta Siemann, da Phoenix Advisory Partners.

Com essa percepção crescente, a tendência é que os profissionais de relações com investidores ganhem assentos nos comitês de governança corporativa e passem a se reportar, dependendo do tamanho da empresa, diretamente ao conselho de administração. Na CACI International, fornecedora norte–americana de serviços e soluções em tecnologia de informação (TI), um dos comitês de apoio ao board é o de relações com investidores. Essa estrutura, segundo David Dragics, vice–presidente de RI da CACI, permite que o conselho esteja sempre informado sobre o que se passa na cabeça dos investidores e atue proativamente para dissipar as preocupações dos acionistas. “Com o trabalho certo, é possível mudar o voto de uma acionista descontente”, avalia Dragics. As estatísticas do say on pay provam a teoria. Das 44 companhias que foram reprovadas em 2011, apenas quatro receberam uma negativa dos investidores também em 2012, mostram os dados da The Corporate Counsel.

Niri quer criar práticas globais de RI

Embora o say on pay não seja adotado universalmente, monitorar o que os acionistas pensam sobre a remuneração dos executivos é uma atividade que deve fazer parte da lista de afazeres dos RIs em geral. Os mercados hoje estão cada vez mais interligados, e as preocupações de um RI dos Estados Unidos têm boas chances de ser, até certo ponto, as mesmas de um profissional de relações com investidores da Ásia ou do Brasil. Considerando isso, o National Investor Relations Institute (Niri), atualmente a maior associação de RIs do mundo, pretende desenvolver um conjunto de práticas globais de relações com investidores.

Para atingir essa meta, o Niri pretende construir a plataforma no formato colaborativo (Wiki), podendo contar, assim, com comentários e contribuições da comunidade global de relações com investidores. A intenção do Instituto não é concorrer com outras associações de RI, uma vez que cada uma delas está mais bem equipada para dizer quais são as melhores práticas em seu país.

Apresentada na conferência anual, a iniciativa faz parte do plano estratégico do Niri para os próximos três anos. “Com a globalização, os investidores exigem certas práticas comuns dos RIs, independentemente do domicílio”, observa Jeff Morgan, presidente do Niri. (L.T.)


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