Quase dois anos se passaram desde que a sistemática processual civil foi alterada no País, mas muitas inovações relacionadas a essa mudança permanecem no limbo, na teoria ou na mera expectativa de que um dia virão a ser exploradas. Novas e ousadas regras ainda estão intactas, servindo apenas para avolumar o Código de Processo Civil — calhamaço de 1.072 artigos e centenas de incisos e parágrafos. Mas vale garimpar as boas inovações, inclusive no que se refere ao mercado imobiliário.
A fim de garantir aplicabilidade prática a alguns desses regramentos, cabe trazer à tona a relevante e expressa autorização legal conferida ao particular para, se assim desejar, promover mudanças antes inimagináveis no modo de funcionamento processual de suas relações jurídicas — com o objetivo de traçar sua própria sistemática processual se por ventura vier a acionar ou ser acionado em razão de alguma controvérsia. É uma revolução.
O legislador permitiu a alteração ou a criação de regras processuais próprias dentro de cada contrato firmado, por meio das denominadas cláusulas gerais de negociação processual.
Esse cenário é claro em todos os setores da economia brasileira, incluindo o imobiliário. Ainda é tímida a utilização dessas ferramentas nos negócios imobiliários, embora elas tenham condições de simplificar a resolução de demandas judiciais. Um bom exemplo está nos contratos de compra e venda de imóveis, que poderiam determinar soluções processuais para agilizar a tramitação das demandas — que geralmente permanecem em discussão por tempo inestimável, gerando prejuízos e embaraços aos envolvidos.
Parece complexo e até mesmo espantoso, mas o artigo 190 do Código de Processo Civil municiou a autonomia da vontade das partes e a liberdade de contratação, alargando a flexibilidade preexistente (a anterior lei processual já previa algumas dessas possibilidades para os contratantes).
A cláusula de eleição de foro e a opção pelo processamento de uma eventual disputa por arbitragem são exemplos corriqueiros de negócios processuais que se popularizaram no Brasil, retratos efetivos de afastamento do previsto na lei. Mais poder e liberdade aos contratantes.
Entretanto, para além dos negócios processuais típicos estabelecidos na lei processual anterior, foi instituída a cláusula geral de negociação processual ou negócio processual atípico, que permite o infinito da criatividade às partes para que venham a instituir — a par dos procedimentos comuns e especiais já expressos na lei — os assim chamados pela doutrina “procedimentos especialíssimos”, equivalentes a seu próprio processo civil, construído quase que privativamente.
É claro que não se pode esquecer dos princípios constitucionais e processuais elementares, que merecem ser considerados os ingredientes básicos de toda e qualquer relação jurídica; o restante é plenamente passível de mudança, no intuito de se ajustar o processo às especificidades da causa.
O controle de existência, validade e eficácia do conteúdo criado para esse fim cabe ao juiz, que pode atuar por ofício ou requerimento de qualquer das partes — inclusive para afastar a aplicabilidade da cláusula processual quando eivada de nulidade ou abusividade. Por meio do auxílio técnico de um processualista, tornam-se perfeitamente ajustáveis poderes, faculdades, distribuição do ônus de determinada prova e deveres processuais, antes ou durante o processo judicial ou arbitral.
O tema foi debatido no Fórum Permanente de Processualistas Civis, que criou diversos enunciados que buscam a conformação e o esclarecimento quanto ao uso e a aplicabilidade da cláusula geral de negociação processual. Merecem destaque: pacto de impenhorabilidade; acordo de ampliação de prazos das partes de qualquer natureza; acordo de rateio das despesas processuais; dispensa consensual de assistente técnico; pacto para dispensa do efeito suspensivo no recurso de apelação ou para que não se promova a execução provisória da sentença; acordo para realização de sustentação oral ou ampliação do seu tempo; e até mesmo acordo para estabelecer a redução de prazos processuais.
A indústria imobiliária poderá ser amplamente beneficiada pela utilização desses avanços na solução de parte de seus desafios característicos. Basta que as partes saiam da zona de conforto — com o apoio de juízes que tenham conhecimento e audácia — para se garantir o fortalecimento da cultura disruptiva que se almeja para o novo processo civil.
*Por Paula Veit Quinan ([email protected]), associada do NFA Advogados
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