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Direitos iguais
Destaque entre as novidades da lei, o tag along conquistou fama e adeptos ao longo dos anos, mas ainda está longe de ser unanimidade

, Direitos iguais, Capital AbertoO tag along chamava-se Emenda Lehmann naquela época. De resto, a controvérsia em torno da obrigatoriedade de oferta pública em casos de alienação de controle era praticamente a mesma. Há trinta anos, a maior alteração feita pelo Congresso Nacional ao projeto da Lei das S.As causou rebuliço, provocou pedidos de veto ao presidente Ernesto Geisel e iniciou uma trajetória de idas e vindas na lei, marcadas por pressões políticas e econômicas.

Para começar, antes de 1976 não havia tag along, e tampouco essa expressão — que seria importada da língua inglesa mais tarde. O seu primeiro grande defensor político foi o deputado Herbert Levy, então dono da Gazeta Mercantil, que já tivera rejeitada pela Câmara dos Deputados, antes mesmo da tramitação da Lei das S.As, uma proposta de emenda com o objetivo de garantir a igualdade de tratamento entre controlador e minoritário nos casos de alienação de controle. Quando o projeto das S.As chegou ao Congresso, no dia 7 de agosto, a emenda foi novamente apresentada pelo deputado. E chegou a ser aprovada pela Câmara, junto com outras 55 emendas, mas depois foi derrubada no Senado — que, ao final, a substituiu por outra emenda bastante semelhante, apresentada pelo senador paulista e advogado Otto Cyrillo Lehmann.

“Lehmann era da Arena, mas tinha uma grande visão”, diz o advogado Modesto Carvalhosa, um dos maiores críticos ao projeto na época. “Ele propôs a emenda porque fizemos pressão, queríamos defender os minoritários.” O senador diz que se inspirou no contato com clientes aposentados e viúvas, prejudicados nos seus rendimentos, que dependiam de ações desvalorizadas pela venda de companhias na época (ver entrevista na página 33). Os opositores à emenda denunciavam a ação de lobistas, que teriam municiado o senador com o texto apresentado no parlamento.

O fato é que os jornais daqueles tempos já continham casos parecidos com alguns recentes — como Ambev e Pão de Açúcar — em que acionistas minoritários reclamavam a perda de seus direitos em casos de alienação de controle. A comoção em torno do assunto acontecia por conta do processo de concentração das instituições financeiras. “Foi a venda do controle do Banco da Bahia (ao Bradesco, em 1973) que levou à emenda Lehmann”, aponta o advogado Paulo Aragão. Já o professor Ary Oswaldo Mattos Filho recorda- se de outro caso de repercussão na época: “A emenda nasceu no bojo da crise da Santa Casa de Misericórdia, que tinha ações do Comind e foi prejudicada. Isso causou uma grande repulsa no meio financeiro. Houve uma pressão grande e a emenda foi proposta pela Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).”

Os autores da lei argumentavam que os abusos do passado seriam evitados pelo artigo 255, que submetia a transferência de controle de instituições financeiras à aprovação do Banco Central. E pediram o veto presidencial à emenda, que, se aprovada, eliminaria a “característica fundamental do modelo de sociedade anônima, que explica seu sucesso como instrumento para associar milhares de acionistas à mesma empresa” — conforme carta enviada ao ministro do Planejamento, Mário Henrique Simonsen. A Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) também enviou telex ao presidente solicitando o veto.

O PRIMEIRO REVÉS — Em 15 de dezembro, Geisel sancionou o projeto sem vetos. Mas o primeiro capítulo da história do tag along ainda não estava encerrado. O artigo 254, além de assegurar tratamento igualitário aos acionistas minoritários mediante oferta pública de ações em casos de alienação de controle, dava competência de regulamentação à matéria ao Conselho Monetário Nacional (CMN). O órgão, uma semana depois da promulgação da Lei das S.As, baixou a resolução 401, na qual dava a interpretação de que os “acionistas minoritários” mencionados no texto do artigo seriam apenas os titulares de ações com direito a voto.

“A resolução acalmou todo mundo”, conta Norma Parente, ex-diretora da CVM. “Praticamente acabaram com o efeito da lei”. Já Paulo Aragão acha que a regulamentação “explicitou a lei e evitou que prevalecesse a tese de que a CVM poderia aprovar ou não a alienação de controle.” O texto original dizia que a venda do controle de uma companhia aberta dependeria de prévia autorização da CVM, cujo dever seria zelar pelo tratamento igualitário aos acionistas minoritários.

A regra ficou vigente até a primeira grande reforma da Lei das S.As, em 1997, com a Lei 9.457. O principal objetivo da revisão era justamente revogar o artigo 254. Na verdade, a motivação do projeto apresentado pelo deputado Antônio Kandir era de curto prazo: maximizar o valor arrecadado pelo governo no processo de privatização das empresas estatais descartando a hipótese de que o Estado precisasse dividir o prêmio de controle com os demais acionistas que tivessem ações ON. A pressão dos grandes investidores pela volta do tag along foi grande e resultou, em 2001, numa nova reforma, dessa vez mais ampla e favorável aos acionistas minoritários.

O tag along, mais uma vez, esteve no meio das discussões desta reforma. O resultado foi a volta do artigo 254, desta vez na forma 254-A, instituindo para o controlador um prêmio de 20% em caso de alienação do controle. Dito de outra forma, em situações de mudanças de controle, minoritários detentores de ações com direito a voto têm hoje direito a receber um valor equivalente a 80% do preço pago ao controlador.

Fim da novela? Nem tanto. Além dos questionamentos sobre o percentual “aleatório” estabelecido como prêmio de controle, o tag along continua sendo alvo de batalhas jurídicas e consultas à CVM. “A mudança trazida no 254-A foi muito ruim, em todos os aspectos, porque a regra não é clara e dá a falsa sensação de proteção ao minoritário”, diz o advogado Luiz Antônio Sampaio Campos. “Há muitas dúvidas sobre em que situações a oferta é obrigatória ou não”, concorda Pedro Rudge, sócio da Investidor Profissional. Dúvida que, inclusive, acabou de ser vivenciada na aquisição da Arcelor pela Mittal. Há opiniões absolutamente convictas tanto no sentido de que a indiana Mittal deveria estender sua oferta aos minoritários da Arcelor brasileira, quanto em favor de que não há qualquer embasamento para a aplicação do 254-A nesta hipótese.

Pelo visto, a novela do tag along, iniciada com a Emenda Lehmann, está longe do fim. Numa próxima reforma, o artigo 254-A parece forte candidato a sofrer ajustes.


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