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Num mercado com forte tradição familiar — e,agora, com companhias de capital pulverizado —, eis um tema que não pode faltar na agenda do investidor: a sucessão de lideranças

Normalmente, nenhum líder gosta de falar sobre o que vai acontecer com sua empresa no dia em que ele não estiver mais nela. É um assunto delicado, especialmente porque essa saída nem sempre ocorre no momento planejado para a aposentadoria. Mas o destino tem lá os seus caprichos e, quando menos se espera, a companhia pode sofrer um processo de fusão ou aquisição, provocando a saída do fundador ou mesmo daquele CEO consagrado que fez carreira e fama na empresa. Sem contar que, mais cedo ou mais tarde, todo profissional chega a uma idade que o impede de continuar na dianteira.

Seja qual for o motivo para a troca do executivochefe, essa ausência pode comprometer o êxito de um negócio, principalmente quando o profissional em questão for a sua viga mestra. O único modo de evitar que isso aconteça é garantir que a receita de sucesso do líder se perpetue. O assunto, há muito discutido nos estudos sobre gestão, torna-se cada vez mais parte do universo dos investidores. Afinal, quando se adquire ações de uma companhia, leva-se o risco de uma gestão que pode fazer toda a diferença nas cotações do papel, para o bem ou para o mal.

Portanto, cabe aos acionistas minoritários, especialmente aqueles com vistas no longo prazo, cumprir mais essa tarefa. É preciso investigar como as empresas têm se preparado para uma eventual substituição do principal executivo — tanto as familiares, já bem conhecidas do meio empresarial brasileiro, como as de capital pulverizado, em que os diretores ganham papel ainda mais relevante na condução dos negócios. Será que as marcas da sua gestão estarão ameaçadas quando o líder deixar a companhia?

Não encontramos um estudo sobre a rotatividade das lideranças no Brasil. Mas um trabalho publicado em julho pela Universidade de Ohio (em parceria com a Chicago School of Business) revela que, num período de apenas sete anos — entre 1998 e 2005 —, cerca de 80 CEOs foram substituídos, ou 16,5% de uma amostra das 500 maiores companhias norte-americanas segundo a lista da Fortune. O levantamento contabilizou não só as demissões desses profissionais pelo conselho de administração, como também os afastamentos ocorridos em virtude de um processo de falência ou aquisição da empresa.

Se no Brasil houvesse uma taxa de substituição do CEO equivalente, e na hipótese de os 80 serem fundamentais para o desempenho do negócio, como os investidores teriam certeza de que os fundamentos da gestão estariam preservados? O modo que encontramos para responder essa questão foi levando-a até os porta-vozes de algumas companhias abertas.

Começamos pela Marcopolo que, neste exato momento, passa por um processo de afastamento progressivo de seus fundadores. Paulo Bellini, que criou a empresa há 57 anos, deixou a presidência em março deste ano, e o bastão foi passado a José Rubens de La Rosa. A fim de que a transição ocorresse de uma maneira “suave”, o fundador foi para um órgão estatutário criado exclusivamente durante esse processo. Trata-se do comitê executivo, subordinado ao conselho de administração, cujo objetivo é fazer com que o ex-CEO possa monitorar mais de perto as decisões operacionais.

Além de Bellini, o comitê executivo é composto pelos outros dois controladores — José Fernandes Martins e Valter Gomes Pinto —, pelo novo presidente e outros três diretores da Marcopolo. Por esse canal de informação, Rubens de La Rosa tem um contato direto com os valores da companhia e aprende como conduzi-los nos desafios do dia-a-dia. “O ‘jeito Marcopolo’ tem de ser incorporado em todas as instâncias da gestão. Não só nas suas atitudes, mas, principalmente, no significado que está por trás dessas ações”, afirma. Uma das grandes lições que gosta de citar é a importância que seu antecessor dá aos colaboradores da empresa. “Ele sempre me diz que os resultados do grupo Marcopolo vêm da capacidade de realização de seus funcionários.”

A próxima fase do processo de sucessão será quando Paulo Bellini avaliar que a perpetuação do “jeito Marcolopo de gerir” está garantida. Neste momento, o comitê executivo será extinto e os três controladores continuarão atuando apenas como membros do conselho de administração. E sobre a substituição de Rubens de La Rosa? Ele revela que uma política de sucessão para o CEO está, sim, nos planos da companhia. Mas essa discussão só será tratada numa segunda fase, quando for concluída a transição, o que deve acontecer ainda em 2007.

Quanto à preocupação do investidor sobre a eventual perda intangível da liderança anterior, o CEO afirma: “É perfeitamente possível manter esse ativo porque o conhecimento já não pertence mais a uma só pessoa. Ele se espalhou e está refletido no comportamento de todos”, ensina. Em outras palavras, os próximos presidentes podem até influenciar a gestão trazendo pontos de vista pessoais. Mas, se renovados sistematicamente, os valores plantados na origem vão estar sempre a postos.

TUDO PROGRAMADO — A Localiza tem metas mais precisas quando o assunto é a substituição do CEO. E olha que o plano de sucessão foi feito há 30 anos pelo fundador Salim Mattar, ao lado de seus três sócios. Na ocasião, foi estabelecido que o presidente da Localiza nunca poderá ter mais que 65 anos. Mattar, por exemplo, atuará como CEO por mais oito. “Avaliamos que, até essa idade, as pessoas contam com mais ambição e agilidade para tocar os negócios”, justifica ele. “Não que, após os 65 anos, um executivo perca a disposição para o trabalho. Pelo contrário. Esse profissional terá na bagagem uma experiência valiosíssima e, por essa razão, continuará colaborando com a companhia no conselho de administração”, acrescenta.

O fundador conta ainda que a Localiza já definiu um plano de contingência caso ele venha a se afastar antes do prazo previsto. Os detalhes sobre a substituição — que aconteceria, segundo ele, só em caso de algum problema de saúde — não são revelados (apenas os conselheiros têm conhecimento). Por enquanto, a preocupação é solidificar, cada vez mais, a estrutura de gestão desenvolvida por Mattar a fim de que a companhia caminhe com as próprias pernas mesmo na sua ausência.

Nessa tarefa, conta com a vantagem de apenas um, entre os seus 14 diretores, ter menos de dez anos de Localiza. “Isso faz com que tenhamos uma gestão bastante estável, capaz de absorver os fundamentos construídos pelos fundadores ao longo desses anos”, acredita. Para ele, a melhor maneira de perpetuar o estilo de um líder é transferindo responsabilidades sobre decisões estratégicas. Porém, isso deve ocorrer de um modo gradual. “Nada aqui pode ser feito no vapt e vupt”, brinca. Assim como na Marcopolo, Salim e os demais controladores devem permanecer no conselho de administração após deixarem os cargos executivos.

QUANDO O RECADO ESTÁ DADO — Delegar funções estratégicas também é um ponto de partida no processo de sucessão da Randon. Desde 1992, quando iniciou um programa de profissionalização da gestão, a companhia vem se preparando para este momento. Até então, as decisões eram centralizadas na figura do fundador Raul Randon e dos filhos Alexandre e David. Apesar de os dois primeiros ainda ocuparem cargos no executivo — Raul é o presidente e Alexandre, o vice — estão ali mais para monitorar as tarefas operacionais que, a cada dia, vêm sendo repassadas às diretorias.

Para a continuidade da gestão, desenvolveram políticas de treinamento, com cursos no Brasil e no exterior. “Mesmo quando a família não estiver mais presente, a manutenção dos nossos valores está garantida. O recado que tínhamos para passar já foi assimilado”, afirma David Randon, vice-presidente do conselho de administração.

David não sabe dizer em que momento o pai, hoje aos 77 anos, irá se afastar da presidência. “É difícil prever quando uma pessoa que nasceu para ser um grande empreendedor e trabalha desde os 14 anos vai querer se aposentar”, diz. No entanto, admite que já há planos de atrelar à idade a política de sucessão elaborada para os próximos CEOs. “É um projeto para o médio prazo”, diz. Entre os diretores executivos, esse plano está mais maduro. A Randon implantou um sistema fechado de previdência para atender esses profissionais assim que completarem 60 anos. A eles seriam oferecidos cargos de consultores. “A idéia é, justamente, aproveitar o know how adquirido em todos aqueles anos”, explica David.

APRENDENDO A COMPETIR — Mesmo quando os valores da companhia não vêm exatamente da família fundadora, é imprescindível que os gestores preservem as características que fizeram do projeto inicial um negócio vitorioso. Veja o caso da América Latina Logística (ALL). Sergio Pedreiro, diretor de RI da ALL, afirma que a cultura da controladora, a GP Investimentos, já está consolidada. “Isso vai além da diretoria. É uma marca da ALL, não mais da GP”, define. O êxito desse processo, afirma, está no foco dado aos resultados da gestão.

Para o diretor, a melhor forma de disseminar a cultura de determinados gestores é dando o exemplo. Na ALL, dos maquinistas dos trens, ao CEO e membros do conselho de administração, todos têm metas para cumprir. A participação dos funcionários é incentivada por um programa de remuneração atrelado a resultados. Eles organizam, por exemplo, campeonatos internos a fim de medir a produtividade de suas equipes. É o caso da Copa Diesel, em que o time vencedor é o que consumiu menos combustível para desempenhar uma mesma função. “Quem é novo na empresa absorve logo esses princípios”, avalia Pedreiro.

O diretor não tem dúvidas de que, quanto mais a empresa conhecer o caminho das pedras para o sucesso, mais valorizada estará aos olhos do mercado. Mais do que em qualquer outra situação, as empresas não só precisam ter a sua própria face como fazer com que os investidores a reconheçam.


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