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Revolução digital
Embora menos lembrada, a tecnologia é igualmente merecedora dos créditos pelos avanços do mercado de capitais no Brasil

 

ed35_p048-051_pag_4_img_001Quando Fernando Fontes fundou sua própria corretora, a Petra, as ordens de compra e venda de ações eram recebidas por telefone e atendidas uma de cada vez por um funcionário, que ainda tinha de checar o saldo disponível na conta do cliente antes de retransmiti-la ao operador no pregão. Naquela época, o sistema de operações da Bovespa não oferecia um controle de risco automático, como acontece nos dias de hoje. Era o tempo em que os departamentos de Relações com Investidores das empresas enviavam seus comunicados ao mercado via fax. E na CVM, os fatos relevantes eram entregues em disquete pelas mãos de um office-boy.

Quem pensa que o cenário acima reflete a realidade da década de 80 se engana completamente. A Petra foi fundada em 1999. Uma prova de que os avanços tecnológicos, de 2000 para cá, modificaram radicalmente as transações no mercado financeiro do País. A revolução digital foi tamanha que, há cinco anos, quase não se podia falar de um ambiente seguro, transparente, ágil, econômico e democrático. É como se as novidades surgidas na atual década representassem um salto eqüivalente ao das últimas cinco — o que hoje nos coloca numa posição confortável entre os grandes negociadores de renda variável no mundo.

“Só com a tecnologia foi possível dar conta do vertiginoso aumento do volume de negócios registrado na Bovespa nos últimos anos”, afirma Luiz Gonzaga Simões, diretor de informática da Bolsa, que reúne 92 corretoras. Ele lembra que, em 2002, eram negociados no pregão paulista uma média de R$ 558 milhões, num total de 28 mil operações de compra e venda de ações diariamente. No dia 14 de junho último, a Bovespa bateu o recorde de 129 mil negócios realizados com R$ 5 bilhões movimentados na data.

Em 1999, justamente o período referido no início desta reportagem, eram feitos 8 mil negócios por dia no País. Tudo dependia de uma infinidade de mímicas esquisitas e muitos berros ao telefone vindos dos cerca de mil operadores que se degladiavam no pregão da Bovespa. Segundo dados da Economática, nos três primeiros meses de 2006 foram realizados R$ 126,6 bilhões em negócios, contra R$ 97,6 bilhões no quarto trimestre do ano passado. O crescimento nominal de R$ 29 bilhões em um único trimestre é o maior já apresentado em toda a história da Bolsa no Brasil. “O pregão eletrônico possibilitou que a mesma quantidade de operadores realizasse muito mais transações”, orgulha-se Gonzaga. “Será que conseguiríamos fazer 100 mil negócios por dia naquela gritaria?” Claro que não.

O encerramento do pregão viva-voz, em setembro de 2005, não poupou apenas as cordas vocais dos operadores. Com a negociação eletrônica, o mercado ganhou mais agilidade, pois, do clique do mouse na compra escolhida à realização do negócio, passa-se menos de um segundo. A garantia de continuidade dos processamentos, em caso de alguma pane, vem de uma estrutura totalmente duplicada de equipamentos e serviços, em dois prédios da Bovespa. Assim, se um dos sistemas falhar, sempre existirá um segundo que evitará a paralisação das transações na bolsa.

NEGÓCIOS INTEGRADOS — Outra solução que facilitou e muito a vida das corretoras nessa última década foi o Megabolsa, um novo sistema que deixou a negociação eletrônica mais ágil e transparente. Com ele, diminuiu o delay — ou o intervalo — entre a operação processada e sua visualização no sistema das corretoras o que aprimorou a visualização de todos os negócios fechados no pregão nos terminais dos operadores. Com o delay, costumava acontecer de uma ordem não poder ser efetuada porque o preço ofertado não existia mais.

Fernando Fontes, da Petra, lembra que as inovações tecnológicas também melhoraram a relação dos investidores com as corretoras, que ganharam mais credibilidade perante esse público. Por exemplo, a corretora não era obrigada a informar, no momento da compra ou venda da ação, o nome do cliente que havia dado a ordem. “Assim, se a corretora conseguisse um preço muito bom naquele instante poderia, simplesmente, agir de má fé e registrar a operação favorecendo um outro cliente no final do dia”, explica.

Para Antônio Milano, diretor da Fator, a revolução digital dos últimos anos o faz sentir como se a cada dia fosse lançado um novo recurso tecnológico para o mercado. “Tudo é muito rápido”, diz. A Fator sabe bem o que os recentes avanços em TI representam para esse setor. Afinal, iniciou suas atividades em 1967, na idade da pedra do mercado financeiro, quando as ordens de compra e venda eram anotadas em giz numa lousa pendurada no pregão e registradas pelos operadores em planilhas de papel. “Mas isso não era do meu tempo”, alerta o brincalhão Milano. A partir da década de 70, a velha lousa virou um painel magnético, e as informações de compra e venda passaram a ser transmitidas via cartões codificados que, uma vez lidos pelos computadores, enviavam os dados aos aparelhos de vídeo espalhados pelo pregão.

Hoje, diante da corretora que se transformou em banco, Milano exibe com orgulho sua mesa de operações onde um único funcionário conversa simultaneamente com até 12 clientes por telefone. “Antes, se tivéssemos cinco ordens necessitaríamos de cinco operadores gritando no pregão. Já no sistema automatizado, basta programar a operação de compra ou venda, que será efetuada quando aquela oportunidade for detectada”, explica.

Guilherme Horn, diretor de tecnologia da Agora Sênior, aborda esse tema falando do home broker — o sistema implantado em 1999 que permite ao investidor, via internet, visualizar as cotações do mercado, enviar uma ordem de compra ou venda de ações e receber a confirmação da mesma com os impactos sob seu saldo financeiro. “Sem intervenção humana, essa tecnologia trouxe comodidade, transparência e agilidade para a pessoa física.”

Só com a tecnologia foi possível dar conta do vertiginoso aumento do volume de negócios registrado na Bovespa nos últimos anos
Há cerca de dez anos, atas, fatos relevantes, editais e informativos contábeis da companhia eram enviados à CVM na forma impressa, via correio

SOLUÇÕES JÁ — Por fim, conversamos também com a xerife de todos esses processos do universo financeiro, a Comissão de Valores Mobiliários. Ora, como esses agentes sairiam por aí disparando e-mails e usufruindo de terminais eletrônicos de última geração sem que o regulador tivesse tecnologia disponível para supervisionar esses avanços? A superintendente de Relações com as Empresas, Elizabeth Lopez Rios Machado, tem boas histórias para contar de um passado não muito distante.

Há cerca de dez anos, por exemplo, toda a documentação de uma companhia — atas, fatos relevantes, editais e informativos contábeis — era enviada ao órgão na forma impressa, via correio ou pessoalmente na sede do Rio de Janeiro. Isso ficava arquivado no chamado Centro de Consulta da CVM. As empresas tinham suas respectivas pastinhas, arrumadas numa espécie de mini biblioteca que, por sua vez, só era acessada com hora marcada, por ordem de chegada do investidor. “Para ter informação privilegiada era só ser o primeiro da fila”, brinca Fontes, da Petra Corretora.

A partir de 1996, a CVM ofereceu às companhias a possibilidade de preencherem formulários padrões que poderiam ser entregues em disquetes, eliminando o papel. Mesmo assim, o órgão ainda precisava salvar as informações — “dar carga”, como costumavam dizer na época — para depois disponibilizá-las à consulta pública no site. E isso ocorreu até o ano de 2000. “Entre a chegada do disquete e sua publicação na internet demorava um dia”, conta Elizabeth. “Hoje, isso nos parece muito rudimentar. Mas, naquela época, era o único modo possível de se trabalhar.”

Só a partir da atual década que começaram a chegar pela internet os primeiros dados enviados por e-mail, começando pelas demonstrações contábeis (anuais e trimestrais) e os formulários padronizados. Já as atas, os editais e os fatos relevantes continuaram sendo enviados via disquete até 2003, quando foi criado o sistema IPE, sigla de Informações Periódicas Eventuais. “Foi a grande revolução tecnológica da CVM”, descreve Elizabeth. Com ele, todos os dados hoje enviados ao órgão são armazenados automaticamente no sistema, o que possibilita a visualização em tempo real da informação no site.

O futuro? “Não sei, talvez a CVM tenha um sistema em que você digita o nome da empresa e venham todas as informações, por ordem da sua preferência, já que seria um programa customizado”, imagina a superintendente. “Mas uma coisa é certa: mesmo com as facilidades, a tecnologia não vai nos fazer trabalhar menos.” Alguém duvida?

A vida antes dos e-mails de alerta

As companhias também tiveram sua parte na revolução tecnológica do mercado nos últimos anos com iniciativas promovidas, principalmente, pelos departamentos de Relações com Investidores. Elas contaram, é claro, com a ajuda de prestadores de serviços que, percebendo as necessidades desse filão, passaram a oferecer avançados aplicativos — conferências ao vivo via internet, mapeamento de perfis estratégicos de investidores, envio de dados por e-mail ou celular, monitoramento de notícias etc. — para aproximar as S.As de seu público. O próprio site do RI, que despontou no mercado a partir do ano de 2000, já fez uma diferença e tanto num setor da economia em que a informação vale muito dinheiro.

O Bradesco inaugurou a homepage voltada exclusivamente ao investidor em julho de 2001. Até então, quem quisesse buscar algum dado específico contábil deveria procurá-lo em meio a outras informações na página institucional do banco. Mas para o superintendente executivo de RI, Jean Philippe Leroy, o grande ganho tecnológico de seu departamento foi a implantação do sistema conhecido como Customer Relationship Management (CRM) que permitiu a criação de um banco de dados dos acionistas. “Quando passamos a entender quem é o investidor fica mais fácil atendê-lo.” Leroy lembra que, até esse processo ser automatizado, anotava a lápis na ficha de cada acionista toda vez que o sujeito entrava em contato com o RI do banco. “Na hora de elaborar um plano de targeting, por exemplo, tínhamos de checar ficha por ficha.”

E como seria a vida dos RIs sem os e-mails de alerta? “A gente enviava tudo via fax”, responde a diretora de RI da Companhia Brasileira de Distribuição (CBD), Daniela Sabbag. E quem não estava no mailing — lê-se, na agenda de números de fax da companhia — ficava sem receber. Para Daniela, o site, no caso da CBD, lançado em 2000, possibilitou que esses profissionais tivessem tempo livre para outras funções, além da divulgação. A companhia foi uma das primeiras a testar a conferência via telefone e dois anos depois as apresentações já eram feitas com transmissão via internet, de modo interativo. “Bem diferente do tempo em que tinha de parar toda hora para atender o telefone para dar informações básicas sobre a empresa. Hoje tudo é facilmente encontrado no site.”


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