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A distribuição de produtos de investimento no Brasil está prestes a mudar completamente
Este artigo aborda as semelhanças com a indústria americana, os motivos pelos quais os assessores oferecerão mais transparência em relação aos seus ganhos e como isso impactará a indústria de FIIs e Fiagros
investimento, A distribuição de produtos de investimento no Brasil está prestes a mudar completamente, Capital Aberto

Breve Histórico

A indústria de assessoria de investimentos vem se desenvolvendo formalmente desde 2001 – e hoje conta com mais de 25 mil assessores PF e mais de 1.300 assessores PJ registrados na CVM. É uma indústria em contínuo crescimento desde seu início.

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Esse crescimento da indústria de assessoria de investimentos está diretamente ligado ao crescimento da distribuição de produtos de investimentos no Brasil – e um aumento significativo de corretoras que possuíam um exército de agentes autônomos – antigo nome dos atuais assessores de investimentos, antes da regulação atual (RCVM 178 e RCVM 179).

A distribuição de produtos de investimentos antes tinha sua força nos bancos, que através de seus gerentes fazia a distribuição dos produtos que estavam incentivados em suas grades de bonificação – por muitas vezes produtos de captação bancária ao invés de produtos de investimentos per se.

A educação financeira, especialmente sobre como investir e em quais produtos investir, continua sendo fundamental. Desde que as corretoras e seus assessores de investimentos passaram a atuar como “tradutores” do complexo glossário financeiro – CDB, LCI, LCA, CRI, CRA, entre outros – houve um avanço significativo. Isso representou uma contribuição expressiva para o mercado de investimentos como um todo.
Valsa no palácio de Versalhes aqui no Brasil

Há entretanto o tema do conflito de interesses. O conflito de interesses ocorre quando um assessor de investimentos, ao fornecer informações sobre produtos, age mais em benefício próprio do que no interesse do cliente. Isso acontece ao focar mais na própria remuneração do que na qualidade ou adequação do produto ao perfil de risco do cliente, ou até mesmo na potencial performance futura do produto.

É um tema antigo na indústria de investimentos – e não é uma realidade exclusivamente tupiniquim, na terra do Tio Sam e no “Velho continente” também é uma pedra no sapato e os órgãos reguladores lá de “fora” já estão atuando no assunto – e a CVM está dando passo na mesma direção. Em verdade, a CVM já está tentando atuar neste nó do mercado desde fevereiro/2023 quando editou a Resolução CVM 179 e acionou à RCVM 35 o “CAPÍTULO VII-A” que trata de informação sobre a remuneração dos assessores de investimentos e sobre os possíveis conflitos de interesse.

As alterações promovidas pela RCVM 179 à RCVM entrariam em vigor inicialmente em junho/2023, e especialmente o fornecimento de informações da remuneração específica por produto investido ou desinvestido pelo cliente entraria em vigor em janeiro/2024. Em dez/2023 a CVM editou a RCVM 196 que prorrogou o início da vigência das sessões III e IV do referido Capítulo VII-A para novembro/2024, a pedido da ANBIMA, embasando seu pedido em vários pontos para justificar a necessidade de prorrogação, incluindo a complexidade das mudanças, a necessidade de clareza sobre os novos procedimentos, e os desafios associados à integração de diversos sistemas legados – algo natural e justo dado a complexidade do tema.

Enquanto o tema tem se desenvolvido como uma valsa no palácio de Versalhes aqui no Brasil, nos Estados Unidos tem se desenrolado mais como um risca-faca e polícia na porta.

Risca-faca na terra do Tio Sam

Por lá o forró começou a tocar na administração do presidente Obama, quando o Departamento de Trabalho (“Department of Labor” ou “DOL”) publicou em abril de 2016 a “Regra Fiduciária” – definindo quem é fiduciário como resultado de dar assessoria financeira ou recomendações de investimentos – e ajudando a assegurar que o assessor de investimento ou broker faça recomendações ou assessoria focado no melhor interesse do investidor[1].

Entretanto, em março/2018 o Tribunal de Apelações do 5º Circuito dos EUA revogou a “regra fiduciária” promovida pelo DOL – argumentando que a regra aumentaria os custos de conformidade e tornaria os serviços da indústria inacessíveis para alguns investidores.

Em abril/2024, o DOL, na administração Biden-Harris, introduziu uma nova versão da regra fiduciária, conhecida como “Retirement Security Rule”[2]. Esta nova regra, que entrará em vigor (ao que tudo indica) em setembro de 2024, redefine o conceito de fiduciário de aconselhamento/assessoria de investimento, ampliando a definição para incluir assessores que forneçam recomendações de investimento em troca de uma compensação financeira e onde há uma expectativa razoável de que o conselho é feito no melhor interesse do investidor.

Ainda que tenha acontecido esse “vai e volta” na regra fiduciária desde 2016 e a nova regra entre em vigor somente em setembro deste ano, nos últimos 10 anos a indústria de assessores de investimentos (Investment Adviser Industry) evoluiu, reduzindo significativamente as comissões recebidas por venda de produtos (redução de 8,3%) e aumentando valores recebidos por performance da carteira (15,9%), valores fixos e valores baseados no volume de ativos (12%), segundo a Investment Adviser Association[3], associação que agrega os assessores de investimento naquele país.

Guardadas as devidas proporções, no Brasil também houve uma postergação deste nível de transparência, embora aqui tenha sido uma “negociação” muito mais suave do que nos EUA.

O futuro da indústria de assessores de investimento no Brasil

Embora já existam algumas casas que optam pelo fee fixo ou percentual sobre o valor administrado, uma parte relevante dos assessores de investimentos hoje optam pela comissão (ou spread) sobre produto vendido – e assim também incorrendo em um alto giro para poder gerar maior receita (ou até alguma receita no mês, visto também que parte relevante dos assessores não possuem remuneração fixa, dependem totalmente dos valores que recebem das transações).

Dado que esta parte relevante ainda está recebendo por comissão/spread sobre produto vendido, quando este tipo de informação estiver disponível a partir de novembro/2024, existe uma tendência grande aos investidores que sejam assessorados neste modelo, observem que talvez haja um conflito de interesse sobre como seu assessor está sendo remunerado e o foco dele ao “direcionar” produtos de investimentos. O Capítulo VII-A nas suas seções III e IV passa a exigir não só o valor de remuneração, mas também possíveis conflitos de interesse que possam existir entre o assessor e o interesse de seu cliente.

Qualquer investidor que observar algum tipo de conflito que não o beneficie, certamente irá optar por trocar o tipo de remuneração que seu assessor recebe, de maneira a ficar mais alinhada com a performance e o crescimento de sua carteira de investimentos, ao invés de uma “rotatividade” de produtos na carteira – algo que acontece com alguma frequência hoje.

A indústria irá se movimentar para aquele tipo de remuneração que reduza os conflitos de interesse entre o assessor e o cliente/investidor, tanto por movimento dos clientes exigindo mais alinhamento, mas também pelas próprias casas buscando se diferenciar daquelas outras casas que tenham um menor alinhamento com os interesses do cliente que elas. Inclusive já tem até propaganda por aí nessa linha.

O impacto na indústria de FIIs e Fiagros

Desde 2018 a quantidade de investidores em FIIs mais que decuplicou chegando a 2,6 milhões e quantidade de investidores em Fiagros saiu do zero para mais de 500 mil. Esse crescimento vertiginoso se deu com certeza pela qualidade dos produtos, e também por serem produtos com renda mensal, facilitando o interesse dos clientes por este tipo de investimento – além é claro da isenção de imposto de renda nos rendimentos destes ativos.

Entretanto, parte do combustível do crescimento desta indústria foi sim o fee de distribuição que a maior parte dos fundos pagam para as corretoras e assessores de investimentos. Determinados ativos chegam a pagar 4% ou até 5% de fee de distribuição para chegarem às mãos dos clientes – que até novembro não saberão (em sua maioria) que estão pagando “tanto” para ter acesso ao produto. Especialmente investidores “entrantes” nestes produtos. Alguns poucos fundos conseguiram captar sem pagar esta taxa de distribuição – mas são exceção, sem dúvida.

Como novos fundos entrantes pagavam a taxa alta de distribuição, eles tinham uma “porta de entrada” bem definida o que acabou gerando também a possibilidade de diversas novas gestoras entrantes no mercado. Com a transição da indústria para uma redução na taxa de distribuição para a taxa sobre volume investido e performance da carteira é natural também que novos produtos tenham menos espaço nas prateleiras de investimentos, visto o nível de incerteza que tenham – e produtos mais estabelecidos de casas com entregas consistentes tenham naturalmente também mais espaço. Os fundos novos provavelmente terão que seguir iniciando somente com investidores institucionais, indo ao varejo somente depois de uma performance já comprovada – afinal os assessores tendem a estar mais alinhados com o sucesso dos investimentos dos seus clientes.

Outro impacto para a indústria será um menor “giro” após a oferta – efeito que acontecia também com grande frequência. O assessor encaminhava a oferta para os clientes, e logo após a alocação da oferta já iam para outro produto – fazendo com que diversos FIIs tivessem o seu preço no mercado reduzindo 3% a 4% logo após a oferta. Efeito positivo para a indústria aqui.

Outro efeito será uma procura maior de awareness pelos fundos (FII e Fiagro) perante os investidores diretamente, mas também perante os assessores de investimentos. Como a taxa de distribuição deve ser ou direcionada para o cliente final – ou até mesmo deixará de existir como incentivo, aqueles fundos “top of mind” terão mais facilidade de encontrar distribuição nas prateleiras das plataformas de investimentos.

A indústria vai mudar muito e parece que para melhor. Assessores de investimentos mais alinhados com os interesses de seus clientes também me parece uma vitória grande não só para os clientes – mas no longo prazo para os assessores de investimentos e indústria de investimentos como um todo. Afinal, investidores felizes, trazem novos investidores e quanto mais pessoas investindo mais produtos, mais casas de gestão.


Felipe Ribeiro é Sócio Diretor de Investimentos Alternativos do Clube FII, atua apoiando a regulação e autorregularão de securitização do mercado desde 2012, e é autor do primeiro livro dedicado a FIIs de CRI no Brasil


[1] Definition of the Term “Fiduciary”; Conflict of Interest Rule-Retirement Investment Advice; Best Interest Contract Exemption (Prohibited Transaction Exemption 2016-01); Class Exemption for Principal Transactions in Certain Assets Between Investment Advice Fiduciaries and Employee Benefit Plans and IRAs (Prohibited Transaction Exemption 2016-02); Prohibited Transaction Exemptions 75-1, 77-4, 80-83, 83-1, 84-24 and 86-128, acesso em 08/06/2024 – https://www.federalregister.gov/documents/2017/04/07/2017-06914/definition-of-the-term-fiduciary-conflict-of-interest-rule-retirement-investment-advice-best

[2] Retirement Security Rule: Definition of an Investment Advice Fiduciary, acesso em 08/06/2024 – https://www.federalregister.gov/documents/2024/04/25/2024-08065/retirement-security-rule-definition-of-an-investment-advice-fiduciary

[3] Investment Adviser Industry Snapshot 2021 – acesso em 08/06/2024 – https://www.investmentadviser.org/wp-content/uploads/2021/10/Investment_Adviser_Industry_Snapshot_2021.pdf


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