Embora você possa encontrar este livro na seção de “finanças e investimento” na Amazon, diria que ele merece mais o rótulo de autobiografia, ou de livro de memórias. Incrível como, após pelo menos 20 anos lendo sobre finanças, ainda me surpreendo com histórias de ilustres desconhecidos — a despeito de sua importância para o desenvolvimento dessa área. Nesse caso, trata-se da história de Edward O. Thorp, matemático que virou jogador profissional de 21 e gestor de recursos de sucesso.
Em A Man for All Markets: From Las Vegas to Wall Street, How I Beat the Dealer and the Market, Thorp descreve sua trajetória de forma humana e convencional, sem o glamour tipicamente associado a quem faz muito sucesso. Sua origem humilde nos anos 1930, pós-depressão americana, o privou de frequentar a escola por vários anos, mas ensinou-lhe desde cedo o caminho da autossuficiência na busca pelo conhecimento. Na falta de sala de aula e professor, ele sempre foi livre para exercitar sua curiosidade intelectual, que não foi encaixotada pela sabedoria convencional. Aos 12 anos já desenvolvia grande aptidão para matemática e ciências, e chegou a construir sozinho um rádio amador. Participou de várias olimpíadas de matemática e acabou escolhendo esse curso em uma universidade desconhecida na Califórnia — apenas porque cabia em seu então limitado orçamento.
Na segunda parte do livro, o jovem Thorp fica intrigado com um ditado popular: “ninguém ganha da banca”. Tomando interesse pelo jogo de 21 (black jack), ele desenvolve sua técnica de contagem de cartas e uma estratégia para aumentar a probabilidade de ganho, apostando desproporcionalmente alto quando as probabilidades lhe favoreciam. Em 1962, ele publica o resultado de suas pesquisas no que se tornaria o clássico Beat the dealer (“vença a banca”). Alguns anos depois, com um bom maço de dólares no bolso, ele já sofria da “maldição dos ganhadores”: era barrado na entrada da maioria dos cassinos americanos.
Ao mesmo tempo em que desenvolvia suas habilidades no 21, Thorp se interessou pelo jogo de roleta, e chegou a desenvolver o primeiro “wearable computer” do mundo, para ajudá-lo a aumentar sua chance de sucesso quando estivesse na frente da roleta. Foi então que outro ditado popular atravessou seu caminho: os mercados são eficientes, então ninguém consegue batê-los consistentemente.
A terceira parte do livro se dedica à trajetória de Thorp como gestor de recursos, com sua estratégia baseada em arbitragem de opções, em uma época anterior ao desenvolvimento da fórmula de Black-Scholes. Sua empresa, a Newport Princeton, operou por cerca de 20 anos exibindo retornos consistentes e baixa volatilidade a seus afortunados clientes, sempre orientada pela estratégia de explorar desvios na precificação de ativos.
A seção derradeira do livro constitui uma miscelânea de impressões do autor sobre mercados, carreira e a própria vida. A linha de condução da narrativa torna-se frágil e o combustível para reflexões, menos potente. A despeito desse final errático, é fascinante essa trajetória pontuada por tantas conquistas em campos diversos do conhecimento por alguém que voa abaixo do radar e não busca a fama. O perfil do autor, destilado pelas páginas, é de uma alma intelectualmente inquieta, e sua busca por desafiar o status quo é quase quixotesca. Nem livro de finanças, nem autobiografia: provavelmente o melhor rótulo é o de uma leitura inspiradora.
A Man for All Markets: From Las Vegas to Wall Street, How I Beat the Dealer and the Market
Edward O. Thorp
Editora: Random House
416 páginas
1a edição, 2017
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