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Ofício emergente
Ainda raros no Brasil, os secretários de governança começam a mostrar a que vieram

, Ofício emergente, Capital AbertoEles existem há mais de um século lá fora. Denominados “chartered secretary” — ou secretários de governança, como se convencionou chamá-los no Brasil —, são a “consciência” de uma corporação, segundo a definição entusiasmada da mais importante associação da categoria, o Institute of Chartered Secretaries and Administrators (ICSA). Cabe a esse profissional ser uma fonte primária de aconselhamento sobre a condução dos negócios, desde situações que envolvam conflitos de interesses até o planejamento e a estratégia da companhia. É ele o responsável por defender a adoção das melhores práticas de governança e monitorá-la. No Brasil, a despeito da evolução do engajamento das companhias com as boas práticas de governança nos últimos anos, a presença desse profissional nas organizações ainda é mínima. Mas esse quadro está mudando lentamente.

“Após a última crise, as empresas americanas têm dado mais importância à posição de secretário de governança. No Brasil, esse movimento começa a acontecer”, afirma Paulo Amorim, sócio diretor da Korn/Ferry, que atua com recrutamento de executivos. Se nos Estados Unidos foram as falhas na governança que levaram ao fortalecimento dessa posição, por aqui o aumento da carga regulatória é a principal razão para o interesse crescente. Novas regras emitidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) elevam a demanda de conselheiros de administração e fiscais por informação, segundo Amorim.

A Fesa, que também recruta executivos para empresas, conduziu três processos do gênero nos últimos 12 meses, segundo o sócio Fernando Lohmann. “No Brasil, ao contrário dos Estados Unidos, onde o cargo é difundido, ainda são poucas as companhias com capital pulverizado”, diz ele. Nas corporações, a demanda por secretários de governança costuma ser maior, porque o conselho de administração nunca se confunde com o corpo executivo — daí a necessidade de um profissional que cuide da integração entre as duas estruturas. Dentre as pioneiras a contratar um executivo com esse perfil no Brasil estão Natura, CPFL e Sabesp.

, Ofício emergente, Capital AbertoNa fabricante de cosméticos, o diretor de governança corporativa, Moacir Salzstein, é quem exerce a função. Dentre suas tarefas estão o acompanhamento das práticas de governança em vigor no mercado, a avaliação de sua adequação à empresa e, quando é o caso, a sua implementação. Ele também atua como secretário do conselho de administração e de três dos quatro comitês que assessoram o conselho: o de pessoas, o estratégico e o de governança. Apenas não secretaria o comitê de auditoria. Salzstein faz uma espécie de controle de qualidade das informações, repassando-as aos conselheiros apenas quando tem certeza de sua consistência e relevância. “Quanto mais importância a companhia dá para a governança, mais esse cargo se aproxima do modelo britânico”, diz Salzstein.
Sua trajetória dentro da Natura é uma amostra da evolução da governança corporativa no Brasil e na companhia. Antes de a Natura abrir o capital, no início dos anos 2000, Salzstein era diretor de planejamento estratégico e, até 2005, atuava também como secretário do conselho de administração — uma atividade que lhe tomava apenas 10% do tempo. Quando a empresa abriu o capital, em 2004, a necessidade de ter uma pessoa dedicada à governança foi se mostrando mais premente. A tarefa de coordenar a melhoria das práticas de governança seria excessiva para a área de relações com investidores (RI), que cumpre agendas de visitas, além de lidar com a entrega de informações a órgãos reguladores e a analistas. No cargo de diretor de governança há dois anos, Salzstein — formado em engenharia química, com pós-graduação e MBA em administração pela Fundação Getulio Vargas — afirma que hoje tem mais atribuições, porque a governança corporativa vem se sofisticando e demandando mais atenção.

Na Sabesp, Liège Oliveira Ayub, assessora do diretor financeiro e de RI, exerce a função de secretária de governança. Ela auxilia o comitê de auditoria, faz a interação entre ele e a diretoria executiva e garante que as informações cheguem aos conselheiros nas datas certas, com o conteúdo pertinente. Liège também é responsável por apoiar o trabalho dos novos conselheiros, o que de tempos em tempos lhe exige bastante atenção. Por ser de capital misto, a Sabesp passa por constantes renovações dos conselheiros após as eleições. Ela também responde a questionamentos sobre a adequação da companhia (compliance), fazendo a interface com os órgãos reguladores, as partes interessadas e as agências de rating. E ainda se incumbe de trazer as novidades de governança corporativa para a empresa. “Meu trabalho vai do mais estratégico ao mais burocrático”, reconhece. “O secretário de governança pode se tornar uma pessoa-chave, porque detém uma gama enorme de informações relevantes para a empresa”, conta.

Gisélia Silva, gerente da assessoria do conselho de administração da CPFL, é uma pioneira dessa função no Brasil. A empresa foi uma das primeiras a criar esse cargo. “Da minha área, saem as diretrizes de governança da companhia”, assegura Gisélia. Em 2009, por exemplo, as diretrizes foram atualizadas e passaram a constar em regimento do conselho de administração, a partir de um trabalho conduzido por ela. Gisélia mantém o portal de governança da CPFL atualizado, apoia o trabalho dos conselheiros, faz o secretariado do conselho e avalia a sua atuação, além de dar suporte ao trabalho das empresas que fazem avaliações de rating de governança da CPFL. Antes, trabalhava na área jurídica da empresa e secretariava as reuniões do conselho. Fez parte do grupo que montou a atual estrutura de governança. Em 2006, a companhia reduziu o número de conselheiros de 12 para 7, e a área de governança passou a ser subordinada ao conselho de administração.

“O chartered secretary é uma espécie de consultor do presidente do conselho de administração. É um cargo novo no Brasil, que começa a ser valorizado”, avalia Heloísa Bedicks, superintendente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). A função é importante, principalmente, nas empresas em que o conselho tem uma agenda própria, e o presidente do conselho não assume o cargo de principal executivo da companhia – como mandam, aliás, os manuais da boa governança. Nessas situações, a tarefa de integrar o trabalho do órgão colegiado com o da gestão demanda tempo. O “chartered secretary” avalia sistematicamente como a empresa está em relação às suas práticas de governança.“Governança é um assunto da alta gestão, e os conselhos deveriam se preocupar mais com isso”, atesta Alexandre di Miceli da Silveira, professor da FEA – USP.

Para se ter uma ideia da maturidade do “chartered secretary” no ambiente internacional, basta dizer que o ICSA existe desde 1891, na Inglaterra, e hoje está representado em mais de 70 países, com um total de 36 mil membros associados. Nos Estados Unidos, o cargo é conhecido como “company secretary”, “corporate secretary” ou “ corporate governance officer”.

É uma pena que a tradução do cargo para o português gere, por vezes, algum mal-entendido. Por essa razão, embora o termo mais apropriado para o cargo fosse secretário do conselho, a preferência é por chamá-lo de secretário de governança. Em vez de se dedicar somente a trabalhos burocráticos como a redação de atas e o encaminhamento de documentos para os conselheiros, esses profissionais trazem na bagagem conhecimentos de legislação societária, finanças, administração e, claro, governança. Para Liège, da Sabesp, um dos maiores desafios no Brasil é justamente tornar as percepções sobre o secretário de governança mais fidedignas. Em outras palavras, desfazer a ideia de que se trata de algo burocrático.

Para se tornarem efetivamente os líderes da implantação das boas práticas no dia a dia, dizem os consultores, os secretários de governança devem ter ótima capacidade de relacionamento, além de uma visão estratégia e de boa dose de determinação. Afinal, os benefícios que as melhores práticas podem trazer não são imediatamente identificáveis — e nem sempre é fácil convencer os administradores sobre sua importância.


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