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A ameaça tecnológica
Nos Estados Unidos, sistemas ultravelozes de negociação e ambientes alternativos são colocados na berlinda. A dúvida é se eles não são injustos com o investidor de longo prazo

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Os dilemas filosóficos que acompanham os avanços tecnológicos, quem diria, chegaram às bolsas de valores. As inovações criadas para aumentar a eficiência da execução de ordens são vistas como uma ameaça à credibilidade dos mercados de ações. A Securities and Exchange Commission (SEC) expressou neste ano sua preocupação com as negociações de alta frequência, o chamado high frequency trading. Em janeiro, colocou em audiência pública uma série de reformas relativas à estrutura do mercado de valores mobiliários. No começo de junho, organizou uma mesa-redonda a respeito. A grande dúvida é se a tendência de operações cada vez mais velozes prejudica o investidor de longo prazo, elo fundamental que une os projetos de crescimento das companhias com o mercado de ações.

, A ameaça tecnológica, Capital AbertoPor meio de computadores ultrarrápidos, as instituições são capazes de executar ordens em milissegundos, possibilitando ganhos com pequenas e efêmeras flutuações nas cotações. Em 2005, a velocidade média de execução de ordens na Nyse era de 10,1 segundos, caindo para 0,7 segundo em 2009. Na audiência pública, a SEC questionou se esse tipo de tecnologia seria justo. “É realmente necessário que o investidor de longo prazo gaste recursos com esses sistemas sofisticados? Se não for, o fato de profissionais usarem com frequência tais ferramentas não tornará o mercado injusto?”

Uma das práticas mais polêmicas é o serviço de “flash trading”, que consiste em informar ao cliente o melhor preço de uma ação frações de segundos antes de esse dado ser público. Nos Estados Unidos, quando uma bolsa se depara com uma ordem e não tem a melhor cotação, ela é obrigada a direcioná-la para o pregão que a tiver. Com o flash trading, a bolsa pode avisar antecipadamente os participantes do seu ambiente de negociação sobre o melhor preço para que eles cubram a oferta, sem ter de enviá-la para uma concorrente. Só são alertados, claro, aqueles que pagam pelo serviço.

, A ameaça tecnológica, Capital AbertoOs críticos veem essa prática como um tratamento não equitativo. “Saber das cotações milissegundos antes dos outros não fazia diferença alguns anos atrás, mas hoje é uma vantagem e tanto”, diz Marcio Castro, diretor de TI da área de sistemas de negociação da BM&FBovespa. Os defensores do flash trading argumentam que, por demandar altos investimentos, essa ferramenta só pode estar disponível àqueles que pagam por ela.

PREÇOS DISTORCIDOS? — A proliferação de ambientes alternativos de negociação, ou “alternative trading systems” (ATSs), como as “dark pools”, também preocupa o xerife do mercado norte-americano. Dark pools são ambientes oferecidos por bancos aos seus clientes para a negociação de grandes blocos de ações, sem a identificação das partes envolvidas. O objetivo é possibilitar a movimentação de lotes expressivos, causando o mínimo impacto nas cotações dos papéis. Atualmente, existem 32 dark pools nos Estados Unidos, que respondem por 7,9% das operações no país. Além dessas plataformas, crescem as negociações realizadas dentro das próprias corretoras.
Ao receber uma ordem, a corretora busca a contraparte na lista dos seus clientes. Hoje, 17,5% das transações com ações ocorrem dessa forma, promovidas por mais de 200 corretoras.

A consequência é a redução dos volumes nos pregões tradicionais. Existem atualmente dez bolsas de valores e mais de 50 sistemas alternativos de transação competindo pelo fluxo de ordens. Para se ter uma ideia da dispersão do mercado norte-americano, a Nyse executava, em 2005, mais de 79% do volume de ordens dos papeis nela listados. Em 2009, esse percentual havia caído para 25%. É nesse ponto que o regulador tem dúvidas. Sua preocupação é com a qualidade do processo de formação de preços. “Com operações ocorrendo em mercados paralelos, as bolsas podem estar gerando preços que não refletem a integralidade dos interesses de compra e venda dos ativos neles transacionados”, diz Gilberto Biojone, consultor de investimentos e ex-corretor de valores.

LUZ PARA TODOS — A sugestão da SEC é de que os ambientes alternativos de negociação sejam incluídos no National Market System (NMS), o sistema integrado de dados do mercado de capitais norte-americano. Assim, as cotações e os participantes dos ATSs se tornariam conhecidos do público, ajudando na formação de preços em geral. “Se a tendência de dispersão de negociações persistir, cada vez mais o mercado público representará uma pequena fatia das operações. É preciso aumentar a transparência dos ATSs”, diz um texto assinado pela Nasdaq em resposta à audiência pública da SEC.

O desenvolvimento de sistemas de negociação super-rápidos e de ambientes pouco transparentes transmite uma mensagem incômoda: o mercado pode estar caminhando para um estágio em que o fundamento das companhias será o que menos importa. Valerão mais as condições de negociação que cada um conseguirá obter. Os norte-americanos se indagam se vale mais a pena impor limites a esses sistemas — e assim perder liquidez — ou mantê-los como estão e sofrer com os efeitos de uma inversão de valores. “A prática do trading pelo trading, sem levar em conta os fundamentos econômicos de uma empresa, tira a razão de ser do mercado”, critica Biojone.

Ordens on-line reduzem IPOs e empregos

O estudo Market Structure is Causing the IPO Crisis, divulgado em novembro de 2009 pela consultoria Grant Thornton, atribui à estrutura atual do mercado norte-americano parte do crescente desinteresse de empresas, especialmente as de menor capitalização (small caps), por abrir o capital nos Estados Unidos. A implementação do sistema de corretagem online — em que as ordens são enviadas por computador —, em 1996, é tida como a grande vilã da história.

As corretoras cobravam comissões de cerca de US$ 250 mensais por pacotes de serviços que englobavam, além da corretagem em si, análise e consultoria. Com a corretagem on-line, essas comissões despencaram para algo como US$ 25. Os baixos custos atraíram um novo perfil de investidor, mais propenso a girar a carteira, como os “day traders”. Fortalecidos, eles começaram a ganhar espaço. E como o interesse desse investidor é mais voltado aos papéis de alta liquidez, os grandes emissores acabaram se beneficiando, em detrimento dos menores.

Entre 1991 e 1995, o número médio de IPOs por ano foi de 520, sendo mais da metade formada por captações pequenas, de até US$ 50 milhões. A partir de 1997, um ano depois do advento da corretagem on-line, a proporção de IPOs reduzidos caiu para 20%. Entre 2001 e 2009, a média anual do total de ofertas iniciais despencou para 122.

Segundo a Grant Thornton, o ambiente mais seletivo de IPOs teve consequências para a sociedade. De 1997 a 2009, cerca de 22 milhões de postos de trabalho deixaram de surgir nos Estados Unidos em função da falência de IPOs.
“Se tivessem tido sucesso na abertura de capital, muitas small caps teriam crescido e gerado empregos”, finaliza o estudo. (S.M.)

Leia, na íntegra, o estudo Market structure is causing the IPO crisis


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