Pesquisar
Close this search box.
Tempo de reestréia
Em boa forma, veteranas aproveitam o embalo dos IPOs para começar uma nova história em bolsa de valores

Um dos termômetros mais utilizados para se medir o aquecimento do mercado de ações brasileiro é o número crescente de ofertas públicas iniciais dos últimos três anos. Mas, de carona nessa locomotiva, há passageiras com muito tempo de estrada. São companhias que, embora listadas na Bovespa desde muito antes da onda de IPOs, só agora redescobriram, em sua plenitude, as vantagens de ter o capital aberto. Por razões diversas — uma reestruturação societária, a necessidade de expansão ou até mesmo o reinício das atividades —, essas empresas encontraram no mercado uma atraente fonte de recursos. E vêm injetando mais combustível na bolsa.

Veja o caso da catarinense Cremer, fabricante de produtos médicos e hospitalares. Mal administrada e endividada, a companhia quase entrou em falência na década de 90. A recuperação começou timidamente em 1997, quando a gestão foi entregue à consultoria paulista Applied. E foi justamente nessa Cremer fragilizada que o Merrill Lynch, por meio de fundo private equity, detectou uma grande oportunidade. Em 2004, aportou R$ 102 milhões na firma e, de posse de 81% do capital, preferiu fechá-lo para reestruturar os negócios, num modelo de operação conhecido internacionalmente como “going private”. A virada culminou no IPO de abril, em que a companhia saiu cotada a mais de R$ 500 milhões. Uma arrancada e tanto para quem valia menos de R$ 25 milhões em dezembro de 2003. “Foi uma clássica operação de fundo de private equity”, classifica Rodolfo Riechert, diretor do banco UBS Pactual.

Na galeria de empresas que “reestréiam” na bolsa, é comum encontrar sociedades que enfrentaram dificuldades financeiras no passado. Como tinham potencial de crescimento, tornaram-se alvos de investidores arrojados. De olho no setor energético, os fundos de private equity da GP Investimentos adquiriram o controle da Companhia Energética do Maranhão (Cemar), em 2004, por meio da holding Equatorial Energia. A holding realizou um IPO em 2006, mas seu único ativo ainda é a distribuidora maranhense, aberta desde a década de 90. “Era uma empresa que apresentava prejuízos e trabalhava com uma rede de transmissão debilitada”, descreve o diretor de Relações com Investidores (RI) da Equatorial, Leonardo Dias. Para reverter o quadro, afirma ele, a GP inseriu um modelo de gestão condizente com o perfil de uma companhia aberta, alinhando interesses entre executivos e acionistas.

Hoje, todos os profissionais da Cemar, de baixo e alto escalão, são incentivados por programas de bônus salariais. A companhia ganhou produtividade. Mesmo com o aumento da base de consumidores, de 1,1 milhão para 1,3 milhão, de 2004 para cá, o número de colaboradores diminuiu 15 %, de 1.359 para 1.155. O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) em 12 meses, de R$ 85,2 milhões há três anos, alcançou R$ 79 milhões só no primeiro trimestre de 2007. Com a casa arrumada, a Equatorial pretende engatar seu projeto de expansão, comprando partes ou o todo de distribuidoras das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. “O potencial é enorme”, comenta Dias.

IMOBILIÁRIAS — As apostas de crescimento também são altas no mercado imobiliário e de construção. Por isso, veteranas representantes desse setor se enveredaram pelo Novo Mercado mirando novos sócios. A Rossi Residencial migrou para o mais elevado segmento de governança corporativa em janeiro de 2006. No mês seguinte, captou mais de R$ 1 bilhão numa oferta mista com o objetivo de ganhar fôlego para expansão e saldar dívidas. Sua história pregressa com a bolsa, porém, não é das mais felizes. Fez a primeira emissão de ações na Bovespa e de American Depositary Receipts (ADRs) na Bolsa de Valores de Nova York em 1997, poucas semanas antes de a crise asiática desencadear a fuga de capitais. “Não só a Rossi como o mercado inteiro ficou esquecido”, comenta Sérgio Rossi, diretor de RI. “Não tínhamos financiamento e os bancos não gostavam do setor.”

Em 2003, a Rossi aderiu ao Nível l e empreendeu uma oferta pública 100% subscrita pelos controladores, que passaram a deter 91% do free float. Mesmo com poucos investidores aos quais precisaria prestar contas, cultivou um contato constante com analistas. “Essa postura pavimentou nosso caminho para a nova emissão”, observa Ciro Piovesana, profissional da área de RI. De acordo com Sérgio Rossi, a transição para o Novo Mercado foi um percurso tranqüilo. Contudo, para algumas companhias do mesmo setor, a migração ocorreu num momento de transformação radical. O diretor de RI da Cyrela Brazil Realty, Luís Largman, por exemplo, nem considera o seu caso uma “reestréia” na bolsa, mas, sim, uma verdadeira estréia. “Somos uma empresa completamente diferente”, afirma.

Largman se refere ao fato de a sociedade atual ser fruto da união de uma companhia aberta, focada em edifícios comerciais — a Brazil Realty — e outra fechada, dedicada a imóveis residenciais — a Cyrela. A Brazil Realy foi a primeira do ramo a se listar, em 1996. Mas seus papéis repercutiram somente após a incorporação da Cyrela, em maio de 2005, e a oferta pública primária e secundária, quatro meses depois. A “reinvestida” na bolsa rendeu frutos: o número de lançamentos do grupo cresceu de 19, há dois anos, para 42, em 2006.

VELHAS CONHECIDAS — Outra aparente estreante é a PPE Fios Esmaltados, que registrou oferta na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no início de maio. Sua origem está na antiga Pirelli Cabos. Outras velhas conhecidas como Romi e Hering também se aventuraram a buscar parcerias no pregão. Recentemente, ambas ingressaram no Novo Mercado e atraíram a atenção dos investidores. A esse grupo soma-se a Drogasil, mais uma veterana que, em maio, encaminhou à CVM um pedido de análise de distribuição de ações. A intenção é angariar fundos para expandir as operações.

Os motivos para tantos regressos não se resumem a planos de expansão. É fato que nenhuma empresa decide estreitar laços com o mercado de capitais sem alimentar projetos, seja no curto ou no longo prazo. Mas empresas consolidadas também vêem nele a chance de promover uma guinada em seu patrimônio. A oferta pública da Companhia Energética de São Paulo (Cesp), em julho do ano passado, significou uma segunda etapa da reestruturação de capital da empresa, avalia o diretor financeiro e de RI, Vicente Okazaki. A primeira começou em 1996. “Depois de um crescimento amplo, tivemos de mudar o foco de atuação, pois chegamos à conclusão de que levaríamos 19 anos para saldar as dívidas.”

Para cumprir o programa de eliminação de dívidas, vieram privatizações, como as vendas da Elektro e de usinas. Atualmente, a Cesp atende 90 clientes corporativos com uma estrutura de 1.270 empregados. Em nada lembra a empresa anterior, de 1,2 milhão de consumidores e 14 mil funcionários. A nova Cesp, do Nível 1, concede 100% de tag along — direito dos minoritários, exigido somente no Novo Mercado, à venda conjunta em caso de alienação de controle. Na última emissão, a companhia foi capitalizada em mais de R$ 1,2 bilhão, o que contribuiu para diminuir de 19 para cinco a relação de endividamento sobre Ebitda — e a idéia é que, em breve, caia para 3,5. Os baixos custos operacionais, o preço de energia crescente e a produção totalmente vendida até 2013 ajudam a explicar a folga no caixa. Mais uma história de um casamento reatado com o mercado.

Roupa nova não garante sucesso

Hering, Banrisul, Cremer e Romi. Além de abertas, essas companhias têm outro ponto em comum: passaram um bom tempo esquecidas na bolsa, mas voltaram — e agora estão se preparando para ganhar liquidez. Revitalizações desse tipo têm se dado tanto por novas ofertas quanto por escalada de nível de governança corporativa na Bovespa. Os investidores estão atentos a esse movimento e, de modo geral, satisfeitos com as iniciativas. “Isso prova que o mercado de capitais pode ser um parceiro de expansão com custos competitivos”, afirma Fernando Pires, sócio da Dynamo Administradora de Recursos. “Quando perceberam que há empresas bem precificadas, essas companhias passaram a considerar interessante a oportunidade de voltar.”

Mas, em meio à leva diversificada de empresas, como saber se elas vieram, desta vez, para ficar? A avaliação é necessária porque essas veteranas atuavam como se não fossem, de fato, abertas, comenta Pedro Rudge, sócio da gestora Investidor Profissional (IP). “Muitas delas tiveram razões para não serem transparentes.” Para tirar a dúvida, convém estudar o histórico da companhia e os motivos para o baixo comprometimento anterior com acionistas minoritários. Em suma, averiguar se, agora, a abertura é um compromisso verdadeiro ou uma mera decisão oportunista.

A leitura de prospectos e documentos não elimina as desconfianças. Pires e Rudge convergem no sentido de que somente o contato próximo com os controladores e administradores pode fornecer informações sólidas sobre a qualidade do investimento. “A gente espera que os administradores tomem as melhores decisões para a companhia. Por isso, avalio se o negócio tem relevância para eles”, diz Rudge. Para Pires, cabe ao investidor avaliar cada caso com cuidado. “Alguém que volta com nova roupagem é outra pessoa? Um novo estilo é o suficiente?”, instiga. Nessas análises, é preciso também ir além da estrutura de governança e avaliar se o negócio da companhia melhorou seus fundamentos. Afinal, observa o sócio da Dynamo, só a escalada de níveis na bolsa não é garantia de renovação. “Uma boa governança não conserta um mau negócio.”


Para continuar lendo, cadastre-se!
E ganhe acesso gratuito
a 3 conteúdos mensalmente.


Ou assine a partir de R$ 34,40/mês!
Você terá acesso permanente
e ilimitado ao portal, além de descontos
especiais em cursos e webinars.


Você está lendo {{count_online}} de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês

Você atingiu o limite de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês.

Faça agora uma assinatura e tenha acesso ao melhor conteúdo sobre mercado de capitais


Ja é assinante? Clique aqui

mais
conteúdos

APROVEITE!

Adquira a Assinatura Superior por apenas R$ 0,90 no primeiro mês e tenha acesso ilimitado aos conteúdos no portal e no App.

Use o cupom 90centavos no carrinho.

A partir do 2º mês a parcela será de R$ 48,00.
Você pode cancelar a sua assinatura a qualquer momento.