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Balanço para todos
Linguagem XBRL ganha adeptos no Brasil e no mundo e se consolida como a grande promessa de democratização das informações contábeis

 

ed32_p046-049_pag_3_img_001Você já deve ter passado pela experiência de tentar acessar um arquivo na internet e não conseguir, por falta de um programa adequado. Ou de querer transferir um banco de dados de um sistema para outro e precisar reformular todos os parâmetros ao descobrir que os dois formatos não se conversam. Sem risco de exagero, podemos dizer que, hoje, esse é o grande desafio do uso de meios eletrônicos para uma comunicação sem barreiras. Agora, imagine se as informações em questão fossem relativas ao balanço de uma companhia aberta listada em alguma parte do mundo? Como acessá-las sem tropeçar nas dificuldades que decorrem da multiplicidade de sistemas e plataformas hoje existentes? A solução para este problema está próxima.

Neste exato momento, o mundo se prepara para adaptar seus balanços contábeis a uma linguagem revolucionária que permitirá a qualquer um, independentemente do meio eletrônico utilizado, enxergar os dados do balanço de uma companhia. Estamos falando da XBRL, sigla que, em inglês, significa eXtensible Business Reporting Language e representa uma nova linguagem mundial para relatórios financeiros derivada de uma outra, a XML, cujo propósito é facilitar o compartilhamento de informações, principalmente através da internet.

Explicando melhor: o executivo que hoje tem o seu balanço em Excel e quer transferi-lo para html, por exemplo, precisa redigitar tudo ou tentar o modo “copiar e colar”. Mas se estiver usando um software que entende a linguagem XBRL, não precisará fazer nada além de movimentar os arquivos. Seria como se os dados digitados permanecessem “grudados” na sua categoria contábil, independentemente do programa utilizado para lê-los.

Empresas de softwares já disponibilizam programas para a conversão ao novo sistema por módicos US$ 200. Dezenas de companhias fazem testes na confecção dos balanços em XBRL e a Securities and Exchange Commission (SEC) também sinalizou positivamente sobre a iniciativa. Entre agosto de 2005 e o mês passado, o órgão regulador norte-americano incentivou as empresas do país a enviarem seus futuros relatórios em XBRL, em caráter de teste, numa iniciativa que ficou conhecida como Voluntary Filing Program. O programa de voluntários do XBRL também foi estendido às corporações estrangeiras, incluindo as brasileiras que possuem American Depositary Receipts (ADRs) listados por lá. À reportagem da Capital Aberto, Jeffrey Naumann, da equipe de Chief Accountant da SEC, afirmou que nas próximas semanas deverá sair o balanço oficial de quantos se candidataram a essa primeira experiência.

Quando isso começou? Precisamente, há sete anos, com uma organização sem fins lucrativos — a XBRL International (www.xbrl.org). Hoje reúne mais de 400 empresas para tratar de assuntos como o custo das companhias para ter acesso à tecnologia, o momento em que isso será uma exigência legal e o papel do profissional de RI na hora de readaptar os dados contábeis à recente plataforma eletrônica. Quem participa dessas reuniões mal consegue esperar o dia em que o mundo poderá comparar instantaneamente qualquer resultado financeiro, não só entre períodos, mas entre companhias distintas. “Com o XBRL será possível, a qualquer um, comparar com muito mais facilidade qualquer dado dos balanços das empresas da Nyse, por exemplo”, sentencia Bruce Ledesma, diretor da MZ Consult. “É o fim do copiar e colar”, acrescenta.

Contudo, sejamos realistas. Uma coisa é a promessa, e outra, a vida real. O Brasil, por enquanto, está na etapa das discussões. A boa notícia é que elas vêm avançando gradualmente. O Banco Central, a Comissão de Valores Mobiliários, a Bovespa e a USP são algumas das entidades que formam o chamado Grupo de Pesquisa Brasileiro de XBRL. Dois workshops sobre o tema já foram realizados. No último, em outubro do ano passado, foi lançado o primeiro livro relacionando o uso dessa linguagem à realidade brasileira: A Divulgação das Informações Empresariais em XBRL (Ed. Ciência Moderna). “O objetivo dos encontros foi discutir uma jurisdição brasileira para o XBRL”, conta o professor Edson Luiz Riccio, do Laboratório de Tecnologia e Sistemas de Informações (Tesci) da FEA/Usp e autor da publicação. Dos eventos também vieram sugestões que vão desde confeccionar cartilhas informativas para um público não-técnico, até recomendar à Bovespa que exija a nova linguagem das empresas do Novo Mercado.

Tudo, porém, ainda não passa do plano das idéias. Na prática, o que atrasa qualquer discussão sobre o XBRL no Brasil é a polêmica ausência de uma definição sobre o padrão de contabilidade a ser adotado no País. Não se sabe ainda, ao certo, em que medida ocorrerá a convergência com as normas contábeis internacionais. O universo XBRL exige uma condição chamada de taxonomia, isto é, um dicionário a ser utilizado para classificação de todos os dados. Nos Estados Unidos, a taxonomia adotada será o padrão US GAAP. Na Europa, eles irão usar o IFRS. E aqui?

“Sem taxonomia, não é possível sequer pensar em XBRL no Brasil”, adianta Maria Helena Santana, superintendente de relações com empresas da Bovespa. No grupo nacional de pesquisadores, existem duas vertentes. A primeira defende o uso do modelo contábil hoje usado no País, apelidado de BR GAAP, para agilizar a criação de um modelo de XBRL aplicável às empresas brasileiras. Mas quem pensa diferente contesta: se a idéia da nova linguagem é, justamente, criar um padrão internacional, adiantará fazer todo um trabalho em cima de um sistema que só servirá internamente? “Não esperem que a Bovespa decida ou imponha algo sozinha. É uma discussão que precisa ter a participação de todos os envolvidos”, acrescenta a superintendente.


PIONEIROS — Enquanto o grupo decide como contornar esse contratempo, algumas companhias brasileiras dão seus primeiros passos independentes rumo ao XBRL. No Itaú, por exemplo, esse assunto não é novidade. O superintendente de Relações com Investidores do banco, Geraldo Soares, conta que ouviu falar do tema pela primeira vez há dois anos. Desde então, tratou logo de pensar numa solução eletrônica que garantisse ao departamento uma vantagem semelhante à da nova linguagem, ou seja, um sistema em que os dados contábeis pudessem ser automaticamente disponibilizados para qualquer programa, nas diversas áreas da instituição. O processo do Itaú foi batizado de DCC, ou Demonstrações Contábeis Completas. Hoje, tudo o que o contador do banco produz pode ser lido pelo RI e transformado por ele em formato PDF, html ou word.

Para Alexandre Germani, diretor- executivo da CorpGroup, ao evitar a redigitação de dados o XBRL já elimina eventuais erros humanos na transmissão das informações. Afinal de contas, quem nunca selecionou um bloco de texto e, ao tentar colá-lo numa outra página, notou que veio faltando um pedaço das informações selecionadas? “Outra grande facilidade do XBRL é que as empresas ganharão agilidade para disponibilizar os balanços contábeis”, afirma Germani. “Imagine, no futuro, o investidor recebendo os demonstrativos mensalmente ou, por que não, just in time?”

Tanto a CorpGroup como a MZConsult já convidaram alguns de seus clientes para participar de testes usando a nova linguagem. A primeira vai tentar implantar o XBRL, em caráter experimental, no próprio Itaú, usando como taxonomia — ou, se você preferir, como dicionário — o padrão de demonstração contábil US GAAP. Já a MZ Consult inscreveu, em março passado, as empresas Petrobras, Gol e NET no Voluntary Filing Program da SEC. “Vamos apoiar as companhias nesse processo. A idéia é enviar este ano até quatro documentos em XBRL de cada companhia”, diz Bruce, da MZ. “A vantagem é que as empresas receberão um feedback da própria SEC sobre o processo, além de orientações sobre aprimoramentos”, acrescenta.

Por todo o mundo, brotam manifestações em prol da novidade. Começando pelos países que disputam com o Brasil a atenção dos investidores estrangeiros, temos: a bolsa de valores da China fechou, em janeiro, uma parceria com um provedor de acesso mundial para oferecer às companhias listadas o serviço de conversão de dados para o padrão XBRL. Na Coréia, o órgão regulador local promete lançar um programa voluntário para receber balanços na nova linguagem a partir deste ano, seguindo os moldes da SEC. A Índia iniciou suas discussões em dezembro passado. Por lá, o tema deve caminhar a passos mais largos, pois as grandes empresas indianas já têm por hábito o uso do padrão IFRS nos seus demonstrativos, o que agilizará a criação da tal taxonomia.

Na prática, o que atrasa a discussão do XBRL no Brasil é a ausência de uma definição sobre o padrão de contabilidade a ser adotado no País

O mesmo pode-se dizer de países da América Latina, como o Peru, que hoje já aderiram ao padrão internacional contábil (IFRS). Colômbia e Argentina também discutem a criação de sua taxonomia. Aliás, entre os dias 19 e 21 de abril, Buenos Aires sediará o primeiro Congresso Internacional latino sobre XBRL, onde o Brasil participará com uma palestra do superintendente geral da Bovespa, Gilberto Mifano.

Na área de auditoria, a novidade também foi bem recebida. Associações de contadores da Europa e dos Estados Unidos participam dos debates com o intuito de criarem uma jurisdição em torno da nova linguagem, de modo que a torná-la obrigatória, no futuro, para a confecção de balanços. Segundo Edgar D’Andrea, sócio da PricewaterhouseCoopers, as vantagens para o auditor com a nova linguagem são diversas. Sem a necessidade de os dados serem redigitados, o controle das informações aumenta, pois elimina o trabalho de intermediários. Além disso, o profissional ganha tempo, já que a empresa tende a enviar os relatórios com mais rapidez.

Mas as soluções tecnológicas não dão jeito para tudo. Embora o XBRL permita que os meios eletrônicos de todo o planeta conversem entre si e dêem transparência aos balanços das companhias, ele não é capaz de alinhar os padrões contábeis. Ou seja, não pode resolver a polêmica briga entre US GAAP e IFRS para a adoção de um padrão internacional único. Enquanto os padrões forem diferentes, os softwares sempre trabalharão com taxonomias também diferentes, o que reduz substancialmente os efeitos da disseminação proporcionada pelo XBRL. Em outras palavras, o mundo continuará convivendo com pelo menos dois dicionários.

Ainda assim, é bom ficar de olho nas novidades. O assunto vem ganhando projeção e já mereceu ser tema de uma conferência internacional a ser realizada em Madri, entre os dias 16 e 19 de maio (www.xbrl2006.info). As palavras de recente discurso do presidente da SEC, Christopher Cox, são outro bom motivo para se conectar ao XBRL. Na abertura de um evento para 800 pessoas no dia 6 março, ele afirmou que o XBRL mudará a rotina de milhões de investidores. “Será a diferença entre um jogo à base de oportunidades e outro movido por competências. O campo de batalha estará igual para todos”.


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