A chegada da temporada de assembleias gerais ordinárias das companhias e a necessidade de renovação de mandatos ou eleição de novos membros dos órgãos de administração e fiscalização trazem dúvidas importantes sobre a forma de eleição e os requisitos legais dos candidatos.
Apesar da Lei 6.404/76 (Lei das S/A) ser um marco legal muito avançado para a época em que foi editada, os requisitos para os conselhos fiscais têm se mostrado anacrônicos e afetam diretamente o seu funcionamento e o exercício de suas funções.
O primeiro anacronismo se refere à vedação de pessoas não residentes no Brasil para o conselho fiscal, conforme o caput do artigo 162 da Lei das S/A. Inicialmente, o fato de ser residente no país, não significa que o fiscal será residente na localidade da sede da companhia, como sugere o parágrafo 1º do artigo 162. Além disso, com os avanços tecnológicos, especialmente tecnologias de reuniões virtuais e validação e assinatura de documentos de forma remota, parece não haver motivo razoável para insistir numa regra que, na prática, se mostra dispensável.
Essa inadequação fica ainda mais evidente com o fato de que a Lei nº 14.195/2021 (Lei de Liberdade Econômica) alterou o artigo 146 da Lei das S/A para permitir que diretores possam ser domiciliados ou residentes no exterior, desde que tenham representante legal no Brasil. Ora, se é possível àqueles que exercem funções executivas serem exercidas por não residentes no país, não há como se argumentar que o exercício das funções fiscalizatórias também não pode ser feito por tais pessoas.
A superação dessa vedação se torna ainda mais importante para companhias multinacionais e investidores estrangeiros, o que pode permitir a presença de membros com experiência em temas e indústrias pouco conhecidas no Brasil, bem como fomentar maior ativismo e transparência.
O segundo diz respeito à formação dos seus membros. De acordo com o caput do artigo 162, o candidato deve ser diplomado em curso de nível universitário ou tenha ocupado cargo de administrador de empresas ou de conselheiro fiscal por três anos. O requerimento de diplomação em nível superior é genérico e pouco efetivo, uma vez que autoriza a eleição de pessoas com qualquer tipo de formação e sem qualquer experiência com os temas com os quais vai lidar.
Na realidade, a lei deveria prever que a diplomação em nível superior deve ser compatível com as funções a serem exercidas, como por exemplo, Direito, Economia, Administração de Empresas ou Contabilidade. Nesse sentido, a Lei 13.303/16 (Lei das Estatais) já realizou essa correção para membros do conselho fiscal de empresas públicas e sociedades de economia mista.
Embora a doutrina divirja sobre o assunto, as companhias podem estabelecer a necessidade de compatibilidade de formação do candidato ao conselho fiscal em seus estatutos sociais.
Finalmente e talvez o mais difícil de ser superado, diz respeito à possibilidade de eleição de pessoas jurídicas para o conselho fiscal. A presença de firmas de auditoria ou empresas especializadas – representadas por sócio ou funcionário qualificado – pode ser muito interessante ao trazer expertise e experiência para os conselhos, elevando a atuação do conselho e garantindo a satisfação de seus objetivos.
O possível argumento de que pessoas jurídicas não poderiam se sujeitar às responsabilidades previstas no artigo 165 não se sustenta diante da própria Lei das S/A que estabelece a responsabilização de pessoas jurídicas que atuem na qualidade de controladoras de companhias (artigos 117 e 246) ou avaliadores (artigo 8º). Além disso, os auditores independentes também estão sujeitos à responsabilização, conforme artigo 26 da Lei 6.385/76. Vemos que ainda existente espaço para discussão e revisão da forma de organização das companhias brasileiras, podendo permitir maior transparência e eficiência.
Levi Custódio Santos é bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo e integrante da banca Veirano Advogados
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