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Profissão renovada
Boom de IPOs altera perfil dos diretores financeiros, que agora precisam ir além das planilhas de custos e do orçamento para dominar a gestão de riscos e a comunicação com o mercado

ed50_p54-56Esqueça a figura do executivo introvertido, concentrado em planilhas, preocupado somente com as finanças, o planejamento tributário, a administração de recebíveis, os cortes de custos. Bom de cálculo, mas nem tão habilidoso assim no trato com pessoas. O boom de ofertas públicas iniciais (IPOs) dos últimos anos na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) está transformando o perfil dos profissionais responsáveis pelo gerenciamento da saúde financeira das empresas, mais conhecidos pelo termo em inglês chief financial officers (CFOs). O diretor financeiro desejado pela maioria dessas companhias veste também o chapéu de Relações com Investidores (RI). Passeia por todas as áreas, do chão-de-fábrica ao conselho de administração, e tem traquejo com o público. Ele é o CFO do século XXI.

A sofisticação do ambiente regulatório no Brasil e o advento dos segmentos especiais de governança corporativa da Bovespa (níveis 1, 2 e Novo Mercado), há seis anos, colocaram as melhores práticas de gestão no foco desses profissionais. E eles têm procurado se aprofundar no assunto. O número de CFOs inscritos nos cursos do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) passou de 8, em 2005, para 18, até setembro deste ano. As exigências também vêm de fora. Nas multinacionais ou em qualquer uma das 33 empresas brasileiras com ações listadas nos Estados Unidos, a legislação norte-americana Sarbanes-Oxley faz parte do dia-a-dia dos executivos financeiros desde 2002. Por imposição da lei, a certificação dos controles internos, o gerenciamento de riscos e a conformidade com as regras (compliance) ganharam mais espaço na agenda dos CFOs. A convergência das normas contábeis brasileiras para os padrões internacionais (IFRS) é outro elemento em voga que não pode ser ignorado. “São temas que o CFO moderno necessita dominar”, diz Walter Machado de Barros, presidente do conselho de administração do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de São Paulo (Ibef-SP), que reúne cerca de 1,2 mil profissionais da área.

Nos mercados mais desenvolvidos, a pressão sobre os CFOs cresceu tanto que há casos de executivos badalados abandonando seus postos

DE “INÚTEIS” A ESTRATEGISTAS — Um estudo divulgado em março, elaborado em conjunto pela editora britânica CFO Publishing e a consultoria PricewaterhouseCoopers, mostra que o atendimento aos requisitos regulatórios, o apoio à tomada de decisão e a gestão da performance absorvem boa parte da energia das equipes norteamericanas de finanças. “Os CFOs eram considerados inúteis, estavam sempre exigindo respostas a questões triviais sobre variações do orçamento ou restituições de despesas”, descreve Jeremy Hope no livro Gestão Moderna: Reinventando o CFO, editado pela Harvard Business School Press e lançado no Brasil pela editora Elsevier. “Agora, eles devem ser generalistas, especialistas em gestões de riscos e fontes de informações empresariais”, arremata o autor. Isso, é claro, sempre tendo em mente os processos de redução de custos.

Nos mercados mais desenvolvidos, a pressão sobre os CFOs cresceu de tal modo que há casos de executivos badalados abandonando seus postos. Em entrevista à revista Fortune, Alvaro de Molina disse ter deixado o cargo de CFO do Bank of America no fim de 2006, depois de 18 meses, por achar que o trabalho havia se tornado “sufocante” e “menos divertido”. Ele é um dos, pelo menos, 12 diretores financeiros de companhias do ranking Fortune 50 que abriram mão de suas posições em 2006.

No Brasil, por enquanto, o ar ainda não está tão asfixiante para o CFO. Mas os executivos estão sentindo na pele a dose extra de responsabilidades. O paulistano Jaime Rebelo, de 49 anos, contador de formação, nunca enfrentou tantas atribuições no trabalho. E olha que sua trajetória profissional começou cedo. Aos 15, foi contratado pela fabricante de filtros Mann para ser office-boy. Em uma semana galgou o posto de assistente administrativo e não parou mais. Acumulou passagens em multinacionais como Dupont, Motorola — onde ocupou o cargo de CFO — e TIM, da qual saiu como diretor de serviços administrativos e financeiros. Há um ano é diretor financeiro e de RI da Fertilizantes Heringer. Descreve orgulhoso a ascensão da empresa, cujo valor de mercado era de R$ 830 milhões na oferta pública inicial (IPO), em 12 de abril de 2007, e chegou a bater em R$ 1,3 bilhão, em 21 de setembro último. Mas o sucesso também tem seu preço. Ser CFO de uma companhia listada em bolsa é algo “absurdamente mais complexo” do que atuar numa empresa de capital fechado, admite. “Tenho de prestar contas para muito mais gente. O desafio é bem maior.”

SOB FOGO CRUZADO — Se antes Rebelo dava satisfações, basicamente, à companhia, agora ele tem pela frente a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a Bovespa e mais um batalhão de investidores e analistas prontos a questioná-lo. Outros agentes da recente mudança de postura dos CFOs são os agressivos fundos de private equity, que apostam suas fichas em empresas fechadas para lucrarem no IPO. “Eles estão exigindo a modernização da gestão, fazendo com que executivos sejam mais cobrados pelos controles internos e por compliance”, diz Walter de Barros.

Quando José Eurico de Carvalho, de 43 anos, assumiu a diretoria financeira da Klabin Segall, em 1997, nem imaginava que a construtora estrearia na bolsa de valores nove anos mais tarde. Nesse meio tempo, teve de aprender a realidade do mercado de capitais e a se pôr no lugar de acionistas minoritários. Sua gama de relacionamentos se ampliou. Hoje, a atividade de RI já ocupa 40% de seu tempo na empresa. Além de fazer milagres com o relógio, Eurico também teve de aperfeiçoar o jogo de cintura para contornar os humores e os rumores “infundados” do mercado. Ele diz que são freqüentes as fofocas que podem manchar a imagem da companhia. “Você precisa constantemente transmitir segurança e confiança. Tive de desenvolver habilidades políticas”, conta.

Os profissionais com estofo e experiência para encarar esse cenário repleto de desafios tornaram-se figuras disputadas. Na avaliação de Alfredo José Assumpção, sócio-fundador da Fesa Global Recruiters, as companhias listadas em bolsa procuram executivos do tipo “super-homem”: capazes de conciliar as tarefas de um diretor financeiro com as de RI. Entre outras características, o super-CFO deve saber se comunicar com todas as esferas da empresa e os interlocutores do mercado, administrar riscos, lidar com tecnologia de ponta e primar pela transparência. Para Assumpção, com tantas competências afloradas, as chances de os diretores financeiros se alçarem ao posto de chief executive officers (CEOs) ficaram maiores. “Antes, dificilmente você veria um CFO assumindo a presidência. Esse posto cabia ao diretor comercial, industrial ou de marketing”, ressalta. Mas executivos financeiros com esse perfil disponíveis no País suprem apenas 65% da demanda por CFOs, estima o headhunter. Só na Fesa, a procura por CFOs, vice-presidentes e diretores financeiros subiu 320% entre 2005 e agosto deste ano — de 5 para 21 profissionais.

AGREGANDO CREDIBILIDADE — Na Hays, a procura por CFOs nos últimos seis meses dobrou, segundo o diretor João Marcio Souza, responsável pela divisão de recrutamento para a área financeira. Geralmente, os contratantes exigem que o profissional seja oriundo de uma companhia de grande porte, que possa agregar credibilidade a uma empresa em processo de IPO e que já tenha vivenciado uma operação dessas. Jaime Rebelo, por exemplo, além de ostentar grandes corporações no currículo, também participou da preparação de uma companhia para a bolsa — a CMS Energy, que acabou sendo adquirida pela CPFL antes do IPO. Isso contou pontos a seu favor quando chegou à Fertilizantes Heringer. Ele diz que, às vezes, é assediado com ofertas de trabalho, mas as recusa pelo fato de estar empenhado na missão de ajudar a Heringer a crescer.

“Para aceitar uma proposta, o executivo pondera o tripé realização pessoal e profissional, perspectiva de crescimento e remuneração”, diz Felipe Assumpção, sócio da A2Z Consultores. Para o executivo decidir sair de uma empresa, é preciso que uma perna desse tripé esteja curta. Sob o aspecto salário, vários profissionais estão “amarrados”. Isso porque os contratos assinados prevêem o recebimento, ao longo de anos, de uma polpuda parcela do montante arrecadado no IPO, segundo Assumpção.

Os salários dos CFOs, conseqüentemente, acabaram inflando. “Ou você contrata um profissional competente, mas sem a experiência em companhia aberta, ou entra numa espécie de ‘leilão’”, diz Antonio Joaquim da Motta Carvalho, sócio-fundador da consultoria Panelli Motta Cabrera, que há 32 anos atua no recrutamento de executivos de alto escalão. De 2004 para cá, Carvalho observa uma elevação de 40% a 50% na remuneração de CFOs, principalmente por causa de um incremento na parcela variável.

De acordo com dados da Fesa, extraídos de 51 de seus clientes, um diretor financeiro e de RI, numa empresa com faturamento acima de US$ 2 bilhões, embolsa R$ 1,4 milhão por ano, sem contar benefícios e exercícios de opções de ações. Os bônus correspondem a mais de 50% desses ganhos. A dura labuta, afinal, tem lá suas recompensas.


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