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Caminho alternativo
Em linha com a tendência internacional, fundos de hedge brasileiros entram na área do private equity

 

No final de maio, o fundo de hedge para países emergentes Ashmore Investment Management gastou US$ 2,1 bilhões para adquirir uma participação na Prisma Energy International. No ano passado, os hedge funds Och-Ziff e Perry Capital entraram em consórcio com outros investidores para comprar a varejista de descontos inglesa Peacock Group, por US$ 404 milhões. Em comum, as duas histórias têm o fato de serem protagonizadas pelos capitalizados e agressivos fundos conhecidos como hedge. E, mais do que isso, o detalhe de que, até bem pouco tempo atrás, não era nada comum esse tipo de fundo adquirir participações acionárias relevantes em companhias.

Os fundos hedge sempre se caracterizaram por buscar retornos diferenciados a partir de operações combinadas de ativos financeiros com prazos de maturação menores como moedas, taxas de juros, commodities ou títulos de dívidas. Nos últimos meses, porém, eles começaram sem muito disfarce a fazer pesados investimentos em ações de companhias subavaliadas, usualmente de capital fechado e com alto potencial de crescimento — exatamente o nicho em que sempre atuaram os chamados fundos de private equity (PE). Sim, é isso mesmo, os fundos hedge estão invadindo a praia dos PE, também conhecidos como fundos de capital de risco. E a novidade para nós, brasileiros, é que isso não está acontecendo só lá fora. Já há claros sinais de que, por aqui, esta idéia já começou a ser copiada.

Um dos projetos em pleno andamento encerrou a fase de captação de recursos há poucas semanas. Sob o comando do ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, a Gávea Investimentos, que sempre se caracterizou por apostar em ativos menos líquidos em busca de retornos diferenciados, agora está à caça de bons projetos para compor a carteira do seu primeiro fundo de private equity. Outra tradicional administradora de fundo hedge que está olhando para este mercado é a Neo Investimentos, que contratou recentemente John Michael Streithorst, até então principal executivo do Icatu Equity Partners — um fundo PE de US$ 125 milhões — para pilotar a área que denominou de “produtos estruturados”. Mas quem saiu na frente mesmo foi a inglesa Spinnacker Capital, gestora de mais de US$ 4 bilhões em fundos hedge dedicados a países emergentes. Com uma equipe baseada em São Paulo, adquiriu este ano, por valor não revelado, uma participação minoritária na construtora e incorporadora Even, que atua nas áreas residencial, comercial e hoteleira.

“Estamos prontos para buscar boas oportunidades de investimento em companhias de capital fechado do mercado brasileiro”, conta Claudio Citrin, diretor da Spinnacker Capital. Segundo ele, o objetivo é investir entre US$ 50 milhões e US$ 100 milhões por projeto nos próximos dois anos. Seu plano para o Brasil segue a estratégia global da Spinnacker, que recentemente realizou investimentos de private equity em uma empresa de cimento e outra de telecomunicações, ambas asiáticas. Ao contrário do que pretendem fazer a Neo e a Gávea, a Spinnacker investe em private equity diretamente a partir de seus fundos hedge, uma vez que já possui prazos longos para resgate nestas carteiras, em torno de três anos.

A Neo Investimentos planeja fazer suas aplicações em private equity por meio de fundos de investimento em participações (FIPs). “Esperamos vir com novidades no curto prazo”, conta Henrique Alves, sócio da Neo. Em sua visão, o Brasil ocupa hoje uma posição que abre grandes oportunidades para quem dispuser de uma capacidade de análise fundamentalista mais aprofundada. Por isso mesmo, a gestora não apenas estruturou uma área para investir em companhias fechadas como também reforçou a equipe que analisa as ações de empresas abertas. Contratou um profissional que ficará dedicado a realizar análises mais completas sobre as companhias com o objetivo de ter um fundo concentrado em ações pouco líquidas e com alto potencial de retorno — um modelo que internacionalmente é conhecido como Private Investments in Public Entities (Pipe) e ficou consagrado pela estratégia muitíssimo bem sucedida do bilionário Warren Buffett.

MAIS EXIGENTES — Por trás deste movimento orquestrado dos fundos hedge em busca de participações societárias relevantes em companhias está, como se pode imaginar, o abundante fluxo de capital dedicado a países emergentes nos últimos anos. Agora então, depois da volatilidade dos mercados financeiros deflagrada em maio, parece que as razões para sair em busca de ativos com maior potencial de valor tornaram-se ainda mais prementes. Com perspectivas de taxas de juros mais elevadas nos mercados centrais, investidores de países emergentes tendem a deslocar menores volumes de recursos para essas regiões e, de quebra, tornarem-se mais exigentes quanto à rentabilidade.

Mas o apetite dos estrangeiros não é a única razão do interesse dos fundos hedge pelo PE. Eles também estão de olho na oportunidade de saída aberta pela bolsa brasileira nos últimos anos — desde 2004, 15 fundos PE realizaram suas posições via oferta pública de ações —, na perspectiva de taxas de juros reais mais baixas no País e em potenciais sinergias entre os fundos hedge e os private equity. Sobre este último ponto, Rubens de Freitas e Paulo Passoni, dois brasileiros estudantes de Harvard que concluíram em maio um amplo estudo sobre o futuro da indústria brasileira de PE, afirmam que os fundos hedge poderão trazer a sua “tecnologia” de gestão de carteiras — diferenciada pelo arranjo de instrumentos de exposição a moedas e commodities, por exemplo — para os investimentos privados. Além disso, eles costumam chegar muito bem capitalizados, o que tende a reforçar os investimentos em private equity e favorecer os empreendedores de bons projetos. “Acreditamos que uma estratégia integrada PE-fundos hedge traz sinergias e cria valor além da simples soma das partes”, dizem Freitas e Possini no trabalho intitulado “Brazilian Capital Markets and Private Equity: a new reality or just a fad?”

A iniciativa dos fundos hedge é, também, um sinal do sucesso dos acordos de governança selados entre emissores e investidores, característicos dos fundos PE. “Eles agora querem o alinhamento de interesses conseguido pelos fundos private equity”, afirma José Luiz Osório, sócio da gestora de PE Jardim Botânico Partners. “Esse foi um dos maiores benefícios trazidos pelo PE para a indústria de investimentos”, diz.

Ao mesmo tempo, porém, levar a base de investidores dedicada a fundos de hedge para o private equity não será, necessariamente, uma tarefa fácil. Principalmente para os brasileiros. Por aqui, ao contrário do que ocorre lá fora, o período mínimo de carência para resgate num fundo hedge costuma não passar de um ano. Para levar o mesmo investidor a um private equity, o gestor terá de convencê-lo dos benefícios de deixar os seus recursos no fundo por três, quatro anos ou mais.

OPORTUNIDADE PARA IPOS — Mas a experiência internacional comprova que os investidores globais de fundos hedge têm aceitado correr o risco. Além dos casos de gestores de fundos hedge que passam a atuar no segmento de PE, existem aqueles que investem diretamente em ações de grandes fundos private equity. Trata-se de um movimento bem recente, mas suficiente para explicar a onda de abertura de capital de fundos PE iniciada nos últimos meses. Uma das principais operações deste tipo foi feita em maio pela gigante norte-americana KKR, que captou US$ 5 bilhões na Amsterdã Euronext com o fundo KKR Private Equity Fund e atraiu inúmeros fundos de hedge. Logo em seguida veio o IPO de um fundo PE da Apollo Management, que captou mais US$ 1,5 bilhão na mesma bolsa.

A abertura de capital tem representado uma promissora oportunidade de alavancagem de recursos para os gestores de private equity. Quando este é o caminho escolhido, são basicamente duas as opções: abrir o capital da empresa gestora (chamada no jargão internacional de General Partner) — uma tendência iniciada em 2004 — ou fazer a oferta inicial de cotas de um fundo em bolsa de valores, como nos exemplos recentes de KKR e Apollo. Embora os IPOs deste segmento ainda estejam dando seus primeiros passos no mercado global, o Brasil, em plena safra de aberturas de capital, já tem uma história para contar. A GP Investimentos, uma das mais tradicionais gestoras de fundos private equity do País, captou um total de R$ 644 milhões com a listagem de seus papéis na Bovespa no início de junho.

Outro caso que vai na mesma direção é o da BrasilAgro, que abriu o capital em abril. A empresa tem como sócia a gestora de recursos Tarpon e dedica-se a investimentos em terras que, após cultivadas, tenham potencial para serem revendidas com retornos elevados. A despeito de estar constituída como uma companhia, a BrasilAgro muito se parece com um fundo PE que encara a ousada empreitada de levantar os recursos iniciais em bolsa. Listou-se em fase pré-operacional e, com o dinheiro em caixa, sairá à procura de bons projetos de aquisição de terras.

Freitas lembra que a abertura de capital pode ser a solução para um paradoxo que cerca a indústria de participações em empresas. As fases em que os fundos PE mais deveriam investir — ou seja, os momentos de baixa do mercado, em que as cotações estão subavaliadas — são justamente as que eles têm a maior dificuldade de captar recursos, justamente por conta do conservadorismo que costuma determinar os investimentos em épocas difíceis do mercado. Com a abertura de capital, esses fundos não precisam mais sair à caça de recursos de tempos em tempos nem se preocupar em obter todo o retorno esperado no prazo determinado para devolver o dinheiro aos cotistas. Podem contar com um capital perene e comprar os ativos que lhe apresentarem potencial no momento certo, tendo como meta apenas gerar retorno para valorizar as ações de seus acionistas e pagar dividendos.

Para os investidores dos fundos PE, a abertura de capital dos gestores desses recursos ou de suas carteiras também têm se apresentado como uma oportunidade atrativa. Ao contrário da aplicação direta em private equity, na qual tem os seus recursos congelados por um longo período até o resgate, nesse caso o investidor usufrui do mesmo risco de um PE (e dos seus retornos), mas com liquidez diária por serem os ativos negociados em bolsa. A alternativa interessa principalmente a investidores institucionais como fundos mútuos ou fundos de pensão que não queiram ter seus recursos retidos por prazos tão longos.

HEDGE NA ÁREA DO PE — Além da entrada dos fundos hedge no segmento de private equity e do investimento em papéis emitidos por esses fundos ou seus gestores, há uma terceira via para a convergência destas duas atividades: os gestores de PE que começaram a colocar um pé no segmento de fundos hedge. Assim como as outras duas, essa idéia começou no exterior e já tem histórico no Brasil. Grandes gestoras de fundos de participações como Blackstone, Bain Capital, Texas Pacific e a própria KKR entraram na seara dos fundos hedge lançando produtos para clientes que estivessem interessados em fundos de maior giro. No Brasil, a GP Investimentos, capitalizada após a abertura de capital, reforçou a equipe que comandava sua atuação na área e criou uma divisão separada só para a gestão desses fundos, segundo fontes do mercado. Procurada, a GP não atendeu ao pedido de entrevista.

Em comum, os fundos hedge e os private equity têm a vocação de identificar oportunidades de investimento que possam gerar um tipo de retorno especial que os acadêmicos gostam de chamar de alfa. Trata-se daquele “spread” com que sonham os investidores destes dois times e que se constitui por uma rentabilidade adicional àquela que seria a mínima esperada em razão do risco incorrido. Mundo afora, os investimentos destes “caçadores de alfa” costumam ser chamados de “alternativos” e, mais do que nunca, com a perspectiva de um movimento global de alta nas taxas de juros, eles estão sendo assediados pelos aplicadores que quiserem incrementar o retorno de seus portfólios.

A convergência que ora se desenha entre fundos hedge e PE, portanto, não passa de uma tentativa desses gestores de tirarem proveito do que ambos têm de melhor. Uma tendência que fica clara no prognóstico de David Rubenstein, co-fundador do fundo global de PE Carlyle, publicada na edição de 19 de junho do Financial Times: “Em dez anos não teremos mais fundos private equity, nem fundos hedge”, afirma. No futuro, segundo o gestor, eles serão conhecidos apenas como “fundos de investimento alternativos.”


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