Volta ao mundo real
Alta dos juros americanos e mudança na tributação da Cofins levam empresas a captar recursos em moeda local

 

 

Ninguém tinha dúvida de que a mudança nas normas para ofertas públicas de títulos privados – regulamentada pela nova Instrução 400 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) – aumentaria o entusiasmo pelas captações no mercado doméstico. Só que pouca gente esperava que o efeito fosse tão rápido. Apenas no primeiro trimestre deste ano, os lançamentos de debêntures já somavam R$ 1,76 bilhão, 700% mais que no mesmo período do ano passado. A retomada surpreendente, contudo, não significa necessariamente um fortalecimento do mercado de capitais doméstico. “Essa retomada tem basicamente duas razões”, explica Rabih Nasser, sócio do escritório Albino Advogados, de São Paulo. “É uma alternativa à alteração tributária e à perspectiva de alta nos juros americanos.”

O que mudou nas regras de tributação foi o fim do caráter cumulativo da cobrança da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Em dezembro, o governo votou a medida provisória que elevou a alíquota de 3% para 7,6%, passando a um sistema tributário não-cumulativo. “A decisão onerou as captações externas e contribuiu para que empresas migrassem para o mercado doméstico”, conta Luiz Felipe Centeno Ferraz, advogado tributarista do escritório Demarest e Almeida, de São Paulo. Daí a euforia em relação ao lançamento de títulos de dívida. A CVM ainda mantinha em análise, no fechamento desta edição, um montante de propostas para emissão de debêntures da ordem de R$ 2,1 bilhões.

É difícil saber quanto mais onerosas ficaram as captações externas, já que esse valor depende do tipo de operação. “Mas o fato é que agora há uma vantagem para o Brasil”, diz Nasser. O outro motivo para que essa retomada ganhe fôlego está na possível elevação das taxas americanas. O presidente do Federal Reserve (Fed), Alan Greenspan, já deixou claro, em mais de uma oportunidade, que a fase de juro nominal americano negativo está prestes a terminar. O que é, sem dúvida, um marco divisório no mercado financeiro internacional, encerrando uma fase de farta liquidez externa e tranqüilidade para os investidores com dívida em dólar. “Está havendo um refluxo da economia americana e isso deixa qualquer aplicador mais cauteloso”, afirma Nadine Baleeiro Teixeira, sócia do Demarest Advogados.

A cautela dos investidores em relação ao mercado externo vem bem a calhar com o momento mais estável da economia brasileira. Independentemente dos índices, a empresa que se volta para as captações em real baseia sua decisão também nas provas de amadurecimento que o mercado tem dado. “Não é uma questão de dizer se o Brasil está bem ou não, mas de admitir que há um caminho seguro sendo trilhado”, diz Nadine. A advogada usa como exemplo a medida provisória enviada pelo governo ao Congresso que trata do funcionamento das agências reguladoras. Entre os pontos dessa medida estão a definição de mandatos de quatro anos para os presidentes, sem opção de serem destituídos; a contratação de ouvidorias independentes das agências e a adoção de contratos de gestão.

ACERTO DE PASSIVOS – O que não se pode deixar de considerar é que esta não é ainda a tão esperada retomada do mercado de capitais como fonte de financiamento para expansão da economia. “Não há por enquanto uma retomada de captações para investimento e sim para acertar passivo e capital de giro”, afirma Alfried Plöger, presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca).

Para Plöger, a Nova 13 – como é a chamada a atual versão da Instrução 400 da CVM – também ajuda a animar o mercado doméstico, mas apenas entre as empresas que já consideravam a possibilidade de emitir papéis. Foram modificadas algumas regras para as ofertas públicas de ações, debêntures e valores mobiliários em geral, reduzindo a burocracia e os custos das operações. “Essas mudanças contribuem na medida que criam um ambiente mais seguro e confiável para os investidores que ainda tinham dúvidas entre as captações em real ou em dólar”, afirma Nadine.

O superintendente de engenharia de produtos da Câmara de Custódia e Liquidação (Cetip), Jorge Sant’Anna, teme que a alta dos juros americanos e a falta de uma estrutura sólida no mercado interno abram espaço para as operações informais de financiamento. “Já existe uma informalidade no financiamento empresarial, com muitas empresas captando recursos fora dos padrões legais e com alto índice de sonegação”, conta. A conseqüência disso seriam empresas menos habilitadas e desinteressadas em emitir títulos de dívida ou de capital.

Sant’Anna acredita que o segmento que mais sofre com a falta de recursos são as companhias de porte médio, com faturamento anual entre R$ 100 milhões e R$ 300 milhões. No Brasil existem cerca de 1.400 empresas com este perfil. “Esses grupos têm poucas alternativas para a expansão: recorrer ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), emitir títulos ou adotar investimento de risco.” Para o superintendente da Cetip, o mercado carece de criatividade. “Mantemos a retórica de alta carga tributária e não investimos em novas operações”, reclama.

Como modelo de nova operação, Sant’Anna indica o uso da Cédula de Crédito Bancário (CCB) como uma ferramenta para captação de recursos. “Essa é uma alternativa ainda pouco usada na formalização de financiamento”, conta. Nos últimos três anos, a Cetip registrou operações com o uso da CCB na ordem de R$ 800 milhões. O Banco Central já submeteu ao Conselho Monetário Nacional (CMN) minuta de resolução que permite aos bancos captar recursos com base em CCBs. “Falta criatividade e talvez mais conhecimento por parte do empresariado”, diz Jorge Sant’Anna.


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