Visão pioneira
Fundos de pensão canadenses ampliam investimentos no Brasil e comemoram o fato de terem ‘redescoberto’ o País bem antes de ele ascender no cenário internacional

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Não é de hoje que os canadenses se interessam pelo Brasil. No início do século 20, o grupo Light & Power, com sede em Toronto, começou a investir aqui e ganhou um papel decisivo no fornecimento de eletricidade para sustentar a incipiente industrialização da época. Depois de vender seus ativos na área de distribuição de energia, os controladores da Light constituíram a Brascan, que continuou investindo em várias áreas, inclusive no mercado financeiro local. Essa antevisão do desenvolvimento tem sido uma marca do avanço dos fundos de pensão canadenses no País. Marcio Mello Silva Baptista, sócio de Tozzini Freire Advogados e responsável pelo escritório de Nova York, lembra que os investimentos de entidades de previdência privada do Canadá começaram a ser feitos no Brasil antes mesmo de as agências internacionais de classificação de risco terem conferido o selo investment grade ao País, em 2008.

Os fundos de pensão norte-americanos, em geral, resistem a investir em países que não têm essa graduação. Mas os canadenses confiaram em suas próprias avaliações e se anteciparam, investindo no mercado brasileiro diretamente, algumas vezes sem utilizar as gestoras de recursos como intermediadoras e sem fazer questão do rating. Como recompensa, fisgaram algumas oportunidades a preços baixos. “Nos detivemos aos fundamentos da economia brasileira, que nos pareceram bons”, declara Wayne Kozun, vice-presidente sênior de public equities do Ontario Teachers Pension Plan (OTPP), grande investidor canadense. Para Kozun, alcançar o grau de investimento era apenas uma questão de tempo para o Brasil.

O OTPP representa 289 mil professores em atividade ou aposentados da província de Ontário. Administra US$ 94,9 bilhões e investe principalmente em empresas de petróleo, mineração e shopping centers. O fundo começou a buscar oportunidades no Brasil em 2006, quando seus executivos fizeram uma viagem de prospecção e estudos ao País. Foram investidos inicialmente entre US$ 400 milhões e US$ 500 milhões em ações de corporações como Petrobras e Vale. Hoje, os investimentos do fundo no Brasil são de grande vulto: cerca de US$ 3 bilhões na petrolífera OGX, de Eike Batista, e aproximadamente US$ 1 bilhão na administradora de shopping centers Multiplan, de José Isaac Peres. Ambos são vistos como bons parceiros pelo fundo. Os canadenses gostam muito do fato de, além de terem fundado as companhias, esses dois empresários estarem diretamente ligados aos seus negócios até hoje.

Ao todo, o País já é o quarto destino mais importante dos investimentos do OTPP, atrás apenas de Canadá, Estados Unidos e Reino Unido. Dentre as quatro maiores participações acionárias do fundo, três são no Brasil, onde está aplicado mais de 5% do portfólio. A China e a Índia recebem menos de 1%. “A China ainda não voltou aos índices pré-crise”, afirma Kozun. No Brasil, os lucros vieram mais rapidamente. O OTPP comemora os resultados que o fundo obteve em reais no ano de 2009 (últimos dados oficiais disponíveis): retorno de 255% na OGX, 163% na Multiplan e 570% na LLX. Além dessas companhias, o fundo tem ações da MMX e da Brasil Foods. Nas grandes transações, o aporte é feito diretamente na companhia, mas existem operações em que foram utilizadas corretoras, cujos nomes o fundo não revela.

A partir deste ano, o OTPP deve passar a utilizar os serviços do BTG Pactual. Em 6 de dezembro, o fundo participou de um consórcio com outros investidores internacionais, como a Gestora de Investimentos do Governo de Cingapura (GIC), a Gestora de Investimentos da China (CIC) e o Conselho de Investimentos de Abu Dhabi (ADIC), para adquirir US$ 1,8 bilhão em novas ações do banco brasileiro. De acordo com Baptista, a orientação dos fundos do Canadá de investir no Brasil além do setor de mineração, tradicionalmente forte nos dois países, tem encorajado outros investidores a vir ao País. Ele prefere não dizer o nome, mas garante que um banco canadense está fazendo uma aquisição no Brasil. “É uma boa indicação de que há uma nova direção para os investidores”, comenta.

O Brasil é o quarto destino mais importante do fundo de pensão dos professores de Ontario

FUGINDO DA BOLHA — Outro investidor de peso é a Caisse de Dépôt et Placement du Québec, gestora de recursos de fundos de pensão canadenses, que administra US$ 131,4 bilhões (os dados mais recentes disponíveis são referentes a 31 de dezembro de 2009). Em 2001, quando observaram que os preços nos Estados Unidos começavam a subir, eles passaram a procurar novos destinos para investir. “Nós vimos a bolha crescendo”, diz Pierre Lalonde, vice-presidente sênior de gerenciamento de portfólio da Ivanhoé Cambridge, gestora de investimentos imobiliários controlada pela Caisse. Ele conta que estudou os fundamentos da economia brasileira, observando suas taxas de desenvolvimento, o crescimento do poder de compra da classe média e o controle da inflação, e concluiu que era viável investir no País. “Outros investidores estão descobrindo hoje o que nós vimos em 2004”, observa. Naquele ano, a Caisse comprou participação acionária em shopping centers e começou a participar da construção de novos empreendimentos. Atualmente, o fundo investe em dez shoppings.

Dentre os próximos projetos de que participa, está a construção de um shopping em Campinas, com lançamento previsto para outubro de 2012. As cidades escolhidas são, em geral, capitais e centros econômicos, cidades de relevância em seus estados ou destinos turísticos. O crescimento do consumo tem tornado a escolha por esses centros muito bem-sucedida. As vendas nesses locais apresentam expansão mesmo em épocas de crise. Os negócios são realizados por meio da Ancar Invanhoe, parceria firmada com o grupo Ancar em 2006, que atua em todas as regiões do Brasil. O aporte inicial da Caisse foi de cerca de R$ 400 milhões.

James Mohr-Bell, diretor executivo da Câmara de Comércio Brasil-Canadá, em São Paulo, comenta que os canadenses são naturalmente fechados e, por isso, fazem pouca divulgação dos seus investimentos. Décadas atrás, suas apostas em Brasil eram pequenas, refreadas pelo histórico de inflação, as mudanças de moeda e outras incertezas que selavam a nossa economia. Quando muito, os investimentos vinham como forma de diversificação do portfólio. “O desenvolvimento do País, a não alteração das regras para investimentos externos, a perspectiva de realização de eventos como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos o tornaram um bom negócio para os fundos”, avalia Raul Papaleo, presidente da Câmara de Comércio Brasil-Canadá, sediada em Toronto. O bom desempenho do País durante a crise de crédito internacional, em 2008 e 2009, contribuiu para chamar os investidores estrangeiros. E a lenta recuperação das economias dos países desenvolvidos, particularmente a dos Estados Unidos, ajuda a manter o Brasil atrativo.

DO MESMO LADO DO GLOBO — Em uma pesquisa da Emerging Markets Private Equity Association (Empea) com 151 investidores de todo o mundo, 19% dos consultados têm a intenção de começar a investir no Brasil, enquanto apenas 3% pretendem reduzir seus aportes. Segundo o levantamento, produzido em abril de 2010, a China ainda lidera intenções de investimento, enquanto o Brasil ocupa a segunda colocação, seguido de perto pela Índia. Mas o País tem uma vantagem em relação a esses emergentes: por fazer parte do Ocidente, apresenta menos diferenças culturais em relação aos asiáticos.

Para Baptista, esse é um ponto muito importante. As formas de trabalhar de brasileiros e canadenses são parecidas, e a comunicação flui com facilidade. Um número cada vez maior de brasileiros fala inglês, e mais canadenses e americanos procuram aprender o português. “Os procedimentos para fazer negócios com a China são muito diferentes. É necessário ter sempre um parceiro local e obter permissões do governo. Já a Índia é extremamente burocrática”, constata. Lalonde, da Ivanhoe Cambridge, revela que tem muita afinidade com os brasileiros: “É um povo bem preparado e que entende do que faz”.

Empresas nacionais também procuram estreitar os laços com os canadenses. A HRT Participações em Petróleo, uma das novatas da BM&FBovespa, listada em seu pregão desde agosto de 2010, anunciou na última semana de fevereiro um acordo para aquisição de 100% da UNX Energy Corp, produtora independente de petróleo e gás natural do Canadá, com foco no mar da Namíbia, na África. A operação será feita por meio de troca de ações, e a HRT vai pedir registro para emissão de global depositary shares (GDS) que serão distribuídos aos acionistas da UNX e listados na Bolsa de Toronto. Também em fevereiro, o conselho de administração da Ventana Gold recomendou aos seus acionistas aceitar a oferta de compra feita pela AUX Canadá, uma empresa controlada da holding EBX do empresário Eike Batista. O negócio pode alcançar US$ 1,5 bilhão.


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