Vida nova, código novo
Passados cinco anos da última revisão, IBGC lança nova versão do código de melhores práticas, incluindo temas como remuneração de administradores e poison pills

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Quando concluiu a revisão do seu código de melhores práticas, em 2004, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) não podia imaginar que o material ficaria velho em tão pouco tempo. Daquele ano em diante, muita coisa mudou no mercado de capitais brasileiro. Companhias animaram-se com a possibilidade de vender ações para investidores e apressaram-se para reformular seus modelos de governança. Figuras estatutárias inéditas foram criadas. Estruturas de capital pulverizadas começaram a emplacar. Seria um novo tempo para o mercado e para as referências de governança. As mudanças foram acompanhadas de perto pelo IBGC e estão contempladas na quarta versão do código de boas práticas, a ser lançada em breve.

A novidade que promete causar mais barulho diz respeito à divulgação de informações sobre a remuneração de executivos e conselheiros de administração. O IBGC passa a recomendar que os salários sejam divulgados individualmente ou, ao menos, em dois blocos: conselho de administração e diretoria. Além disso, as companhias deverão explicitar as parcelas fixa e variável na composição da remuneração, considerando bônus, benefícios com ações e outros honorários. É um passo grande à frente do que é exigido hoje por lei e praticado pela grande maioria das companhias brasileiras. Elas são obrigadas a informar apenas a remuneração global, de executivos e conselheiros, sem detalhes.

Se a empresa optar por não informar os valores individuais, deverá “justificar sua opção de maneira ampla, completa e transparente”, recomenda o código. A semelhança não é mera coincidência. Com a iniciativa, o IBGC tenta introduzir características do sistema inglês conhecido como “comply or explain” —, no qual a adesão é voluntária, mas a justificativa em caso de não conformidade é obrigatória. O IBGC pede que, no caso de não serem divulgados os valores individuais, a companhia informe ao menos a média dos valores pagos e a diferença entre a maior e a menor quantia, com a respectiva justificativa para a disparidade. A transparência sobre remuneração também é discutida no campo regulatório. Na reforma da instrução da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que trata do registro de companhias abertas — conhecida como “nova 202” —, a autarquia sugere a abertura individual dos ganhos dos administradores.

O novo código toca em outro ponto polêmico: a remuneração de conselheiros de administração com instrumentos de renda variável, como ações ou opções de ações. O IBGC recomenda que a remuneração baseada em resultados de curto prazo seja evitada para o conselho. Segundo o instituto, o acesso do conselheiro à parcela variável só deve ser permitido se o prazo for superior ao definido para os executivos.

CUIDADO COM O VENENO — A nova versão também faz referência às poison pills — cláusulas de proteção à dispersão acionária que obrigam o adquirente de parcelas superiores a determinado percentual a realizar uma oferta a todos os demais acionistas. Segundo o IBGC, esses dispositivos societários devem ser encarados com reserva. Nas companhias que possuem controlador definido — ou uma parcela do capital em circulação no mercado insuficiente para assegurar a alguém o controle acionário —, o uso desses mecanismos é ainda menos recomendado, diz o código.

As poison pills viveram um boom durante o período de bonança de ofertas públicas iniciais (IPOs, na sigla em inglês). Foram incluídas a torto e a direito nos estatutos sociais das novatas. Das 103 companhias que abriram capital entre 2004 e julho de 2008, 65 detinham pílulas de veneno. A estratégia de blindar a companhia contra aquisições hostis, no entanto, se provou um verdadeiro tiro no pé. “Com a crise e as cotações lá embaixo, houve muitas oportunidades de fusões e aquisições que não se concretizaram devido a essas cláusulas”, lembra Heloísa Bedicks, secretária geral do IBGC.

Outra novidade do código é o manual de assembleia. Inimaginável na realidade brasileira de 2004, o documento é símbolo do dinamismo adquirido pelas companhias. A recomendação é para que as empresas, em especial as de capital pulverizado, distribuam o material, antes da assembleia, com informações detalhadas sobre cada matéria a ser discutida na reunião, assim como o posicionamento da administração sobre esses temas. O manual também deve estar disponível no site de RI da companhia e ser arquivado regularmente na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e na bolsa em que as ações estiverem listadas.

CONSELHOS EFETIVOS — Um dos assuntos mais elaborados pelo novo código é o conselho de administração. O conceito de conselheiro independente ficou mais detalhado. Dentre outros pré-requisitos, ele não pode: depender financeiramente da organização; ter sido sócio, nos últimos três anos, da auditoria independente que trabalha para a companhia; ser membro de entidades sem fins lucrativos que recebam recursos relevantes da companhia.

Heloísa conta que as discussões sobre o papel do conselheiro no instituto tiveram a preocupação de frisar a efetividade do trabalho do profissional e ir além do mero cumprimento formal de regras. Exemplo disso é o cuidado com a dedicação ao cargo. Ausente na versão anterior, o item “disponibilidade de tempo” salienta: “Para poder exercer esse papel, o conselheiro deve observar minuciosamente os compromissos pessoais e profissionais em que já está envolvido para avaliar se poderá dedicar o tempo necessário para o novo conselho. A participação de um conselheiro vai além da presença nas reuniões do conselho e da leitura da documentação prévia”.

O conselheiro deve informar aos demais membros eventual participação em outros conselhos — seja de administração, fiscal, consultivo, ou de organizações do terceiro setor. “O objetivo é diminuir a incidência de conselheiros que atuam em muitas companhias e não conseguem agregar valor a nenhuma delas por falta de tempo”, conta Heloísa. Conselheiros externos e independentes devem participar, no máximo, de cinco conselhos.

Remuneração gera alvoroço na esfera pública
A questão da transparência sobre remuneração transcendeu o cenário corporativo e atingiu a esfera pública, com a polêmica sobre a divulgação dos salários de servidores municipais em São Paulo. Mais do que nunca, ficou claro que a discussão tem um forte componente cultural.

Todo o rebuliço começou quando a prefeitura de São Paulo lançou, no dia 16 de junho, um website chamado De Olho nas Contas, em que se podem verificar os nomes de todos os 162 mil servidores e seus respectivos cargos e salários — além de outros dados do orçamento do município, como gastos de todas as secretarias, empresas, autarquias e subprefeituras.

A gritaria dos funcionários públicos foi geral. Eles argumentaram à imprensa que o fato exporia o profissional e sua família a graves riscos de segurança e a constrangimentos perante seus pares. No dia 19 de junho, o Tribunal de Justiça ordenou a retirada dos dados referentes à remuneração de funcionários da área de educação, por conta de ação movida pelo Sindicado dos Especialistas de Educação do Ensino Público Municipal (Sinesp). Outras seis entidades ligadas a servidores públicos também acionaram a Justiça para proibir a abertura dos ganhos.

Lá fora, a informação privada que é de interesse público é tratada com mais naturalidade. No último dia 25, a BBC, emissora pública de TV e rádio do Reino Unido, divulgou em site dados sobre os ganhos de seus principais executivos. A abertura ocorre em meio à pressão popular por maior transparência nos gastos do governo. Em maio, o presidente da Câmara dos Comuns, Michael Martin, renunciou ao cargo depois da descoberta de que deputados usavam o dinheiro do contribuinte para reembolsar gastos pessoais. (S.M.)


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