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Tribo alternativa
O sucesso da “sociologia Dynamo” e de um modelo de gestão que, no mais autêntico estilo Warren Buffett, mira os negócios certos

, Tribo alternativa, Capital Aberto

Na sala de reuniões da Dynamo, uma das mais antigas e respeitadas gestoras de recursos independentes do Brasil, você não vai encontrar uma mesa comprida rodeada de cadeiras com design elegante. O clima ali é outro. Duas poltronas e um sofá aconchegantes compõem a decoração e o espírito do lugar, que ainda oferece como cortesia aos visitantes uma vista adorável do mar do Leblon, o bairro preferido das “assets” cariocas. A performance do fundo Cougar, a carteira âncora da gestora, em 2010 — uma rentabilidade de 19,5% até o dia 19 de dezembro, ante as variações negativas de 1,87% do Ibovespa e de 0,47% do IBX — não era o foco daquela entrevista com os sócios Pedro Damasceno e Luiz Orenstein. A proposta era entender o jeito de ser dessa gestora que poderia muito bem ter se transformado em um ícone da contracultura no mundo das finanças não fosse o absoluto desinteresse dos seus donos em levantar essa bandeira. “O nosso jeito de trabalhar não é melhor que o de ninguém”, ressalva Orenstein, membro do time desde 1997. “É apenas o nosso jeito.”

A baixíssima rotatividade dos profissionais da Dynamo é uma das principais evidências de que o modelo, se não for melhor, é no mínimo singular. Quem virou sócio a partir de 1993, ano de fundação da gestora, está lá até hoje. Os “garotos”, assim chamados pelos “mais velhos”, são contratados enquanto estão na faculdade ou logo depois de formados. Passados dois anos, aqueles que forem “compatíveis” são convidados a se tornarem sócios. Os que não forem, provavelmente, já terão saído.

No vocabulário da Dynamo, ser compatível significa, em primeiro lugar, gostar mais de analisar empresas do que de ganhar dinheiro. A recompensa financeira vem, sim, mas pode demorar. Diferentemente do que ocorre na maioria das gestoras e dos bancos, não há bônus atrelados a metas específicas. Os lucros são divididos entre todos, conforme a participação de cada um, o que certamente pode virar um problema para os jovens ansiosos da geração Y. Lá, os grandes feitos individuais não têm impacto direto no bolso. Com o tempo, o mérito às contribuições de cada um é reconhecido na forma de um incremento da participação na sociedade. “A Dynamo não é um trabalho, mas um projeto de vida”, define Oreinstein, que é também autor do livro A Estratégia da Ação Coletiva (editora Revam).

A longevidade é um componente que aparece com frequência nas falas dos dois sócios. Em vários momentos, a combinação de simplicidade com visão de longo prazo faz lembrar os pensamentos do megainvestidor Warren Buffett.
“Nós fazemos a mesma coisa há muito tempo e queremos continuar fazendo”, garantem. Por essa “coisa”, entenda-se analisar as empresas e procurar negócios excelentes que estejam subavaliados pelo mercado. No dia a dia, isso significa ficar horas no telefone com os executivos das empresas — e não só com presidentes ou diretores financeiros, mas também, e tão importante quanto, com os gerentes e supervisores; fazer diversas visitas às empresas; perguntar o que pensam os clientes, fornecedores e ex-funcionários; estudar a fundo o setor no plano global e seus principais players mundo afora; frequentar as assembleias de acionistas; e conhecer bem quem são e o que querem os administradores. “Nosso lema é saber mais sobre as companhias do que qualquer insider”, afirmam. Portanto, para ser “compatível” com a Dynamo, é preciso adorar esse trabalho. Ações são o único ativo em que a gestora investe.

“Nosso lema é saber mais sobre as companhias do que qualquer insider”

No mercado de capitais atual, agraciado com padrões de governança corporativa bem mais elevados que os do passado não muito distante, é plausível pensar em uma asset que se dedique apenas a investir em ações. Em 1993, quando a Dynamo surgiu, o cenário era bem diferente. A inflação atingia 2.400% ao ano, as ofertas de títulos públicos do Banco Central (o open market) ainda dominavam as mesas de operações, e a Bolsa era um ambiente pequeno e concentrado. Várias empresas tinham ações listadas porque haviam recebido algum incentivo fiscal para estar ali, mas não davam a mínima atenção para os sócios minoritários. Só que algumas delas tinham excelentes negócios que, aos olhos de Bruno Rocha (ex-Banco Garantia) e Pedro Eberle (ex-Gardi, uma gestora do Garantia), os dois fundadores da Dynamo, poderiam ficar ainda melhor com a colaboração de investidores que lhes dessem bons conselhos. A contraindicação seriam os riscos de liquidez. As ações dessas companhias eram muito pouco transacionadas e, por essa razão, alinhar os interesses com os acionistas controladores tornava-se crucial. “Foi aí que desenvolvemos nossos conhecimentos sobre as questões jurídicas e de governança”, explica Damasceno.

Essa experiência levou a Dynamo a participar, em 1998, do programa Valor e Liquidez do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A iniciativa previa que a gestora criasse um fundo integralizado com as participações societárias dos principais investidores institucionais do País. O objetivo era aglutinar essas posições e ganhar representatividade nas companhias para batalhar por melhores práticas de governança e mais liquidez. O Puma, como foi chamado o fundo, terminou em 2005, mas rendeu à Dynamo um histórico de embates com acionistas controladores pela defesa dos minoritários, que lhe confere a estampa de “ativista” até hoje. E não foi só o Puma. As experiências do Cougar com investimentos em empresas de menor capitalização — chamadas de segunda linha — também transformaram a Dynamo em um porta-voz dos direitos que os minoritários deveriam fazer constar nos estatutos sociais.

Mas o termo agrada menos a gestora do que se poderia supor. “Ativismo era uma coisa antes do Novo Mercado e agora é outra. Nós preferimos dizer que nossa postura é colaborativa, não ativista”, diz Damasceno. Esse lado mais combativo da gestora, observa Orenstein, só vem à tona quando surgem situações indesejadas. “O que a gente busca são empresas redondas, bem administradas, com ótimos modelos de negócios e que não tenham isso tudo refletido no preço. O ativismo só aparece quando, no meio do caminho, algo dá errado”, justifica. “Essa é sempre uma situação desconfortável para nós.”

A postura “colaborativa”, ao contrário, é valorizada pela gestora. “Hoje, as empresas nos procuram para pedir opinião, porque nos veem como uma parte isenta”, conta Damasceno. Mas essas consultas também podem trazer problemas. Se ficarem sabendo de alguma informação relevante que ainda não é pública, os gestores ficam impedidos de negociar as ações da companhia. “Esse é o lado complicado de ser praticamente um private equity em empresa pública. É preciso tomar muito cuidado.” Para lidar com essas situações delicadas, a Dynamo recorre à gênese da sua “sociologia”: as decisões em conjunto. Os sete sócios mais antigos constituem uma espécie de comitê de ética e discutem se a posse de determinada informação deve impedir ou não a negociação do papel. “Nesse grupo, todos têm o poder de veto. Se um disser que há conflito, a gente não faz nada”, conta Orenstein.

CHANCE DE ESGOTAMENTO? — As decisões coletivas fazem parte da rotina da Dynamo. Hoje são 14 sócios ao todo, e não há hierarquia de cargos. “Temos um modelo tribal, em que os mais velhos são ouvidos, mas ninguém exerce autoridade sozinho. ” Nesse ambiente, prevalece a liberdade para cada um definir os próprios horários e hábitos de trabalho. Como a Dynamo consegue ter tanta leveza e ser competitiva num setor tão agressivo? “Nós trabalhamos muito, 10 a 12 horas por dia, às vezes nos fins de semana e nos feriados. A diferença está no jeito que a gente se relaciona e no fato de que fazemos o que mais gostamos”, tenta explicar Orenstein. O clima de trabalho da gestora é um dos seus maiores orgulhos. Damasceno lembra com alegria do dia em que um cliente perguntou a um dos “garotos” o que ele gostaria de fazer dali a alguns anos, e a resposta foi: “o mesmo que estou fazendo agora”. Era tudo o que os veteranos queriam ouvir.

O ponto de interrogação era até quando esse entusiasmo continuaria. Para manter o ambiente de trabalho descolado e o foco no investimento em ações, a Dynamo não poderia crescer muito em volume de recursos administrados. Se isso acontecesse, precisaria não apenas aumentar a equipe, como também investir em outros ativos, já que o mercado de ações é restrito no Brasil. O receio era a ausência de perspectiva de crescimento apagar o brilho nos olhos da garotada em algum momento.

Foi aí que eles decidiram montar, em 2005, uma filial em Londres. Bruno Rocha se mudou para lá com o plano de começar tudo do zero outra vez e abrir uma porta nova para a Dynamo. A ideia era fazer a mesma coisa (investir em ações), com a mesma cultura, mas num mercado muito maior. “Todo mundo perguntava o que nós íamos fazer lá se os investidores estavam vindo para cá. Mas nós queríamos tanto tocar esse projeto que fomos mesmo assim”, lembra Orenstein. Hoje, eles administram US$ 160 milhões na praça londrina, uma pequena lasca em comparação com os quase R$ 4 bilhões que a gestora tem sob o seu guarda-chuva no Brasil. “Mas o nosso crescimento está lá”, ressalvam.

Outra frente que eles querem desenvolver é a de empresas de capital fechado. Desde 2006, a Dynamo investiu em dois negócios com esse perfil — a Technos Relógios e uma empresa que eles preferem não divulgar —, e a expectativa é identificar novas oportunidades. “Queremos ser tão bons nisso quanto somos nos investimentos em bolsa”, afirmam. Um sonho para a Dynamo daqui a dez anos? Orenstein destaca três: “Os investimentos privados terem dado certo, Londres estar em crescimento, e o pessoal aqui conservar a felicidade que tem hoje em trabalhar na Dynamo”. Se tudo isso acontecer, diz ele, “você pode me perguntar sobre os próximos dez”.


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