Blockchain: 30 aplicações inovadoras
Como essa tecnologia está sendo usada para garantir transparência, incentivar sustentabilidade e reduzir burocracia
As inovações da blockchain para além das bitcoins

Ilustração: Rodrigo Auada

Há quem diga que a blockchain é a nova internet. Assim como o advento e a disseminação da rede mundial de computadores transformaram a vida cotidiana em quase todos os aspectos, dizem os entusiastas que a tecnologia blockchain será capaz de promover mudanças radicais na forma como fazemos negócios, armazenamos dados e compartilhamos informação. Criada em 2008 por Satoshi Nakamoto — que até hoje não teve a identidade confirmada — para ser a plataforma que hospedaria o bitcoin, a blockchain tornou-se um código aberto no ano seguinte, e Nakamoto desapareceu dos fóruns e discussões sobre a tecnologia por trás da primeira criptomoeda depois de 2011. Entretanto, a tecnologia continuou a ser expandida e passou a ser também conhecida como distributed ledger technology (DLT).

Basicamente, a blockchain funciona como um livro-razão, no qual informações são distribuídas em blocos. Esses dados foram anteriormente verificados e armazenados por computadores de usuários espalhados pelo mundo. O grande trunfo da blockchain é o fato de não existir uma autoridade central validadora das transações. Todos os registros a ela vinculados ficam guardados definitivamente na rede, com garantia de proteção de identidades. Os usuários responsáveis por depositar as informações (ou criptos) na rede são conhecidos como mineradores — não por acaso, uma designação que remete a quem escava os subterrâneos. No caso do bitcoin, eles recebem recompensa nessa criptomoeda pela realização do serviço. Evidentemente, o primeiro a minerar bitcoins foi Nakamoto. Nessa última década, o código original da blockchain dos bitcoins foi sendo adaptado e, atualmente, é possível minerar qualquer tipo de dado em uma rede DLT. Daí a força descomunal dessa tecnologia, que por suas características pode bem aninhar-se por trás das mais diversas transações — sejam elas sofisticadas ou corriqueiras.

E se as criptomoedas têm enfrentado desconfiança por serem instrumentos para fraude ou para derrocada de investidores incautos, o mesmo não pode se dizer sobre a DLT. Seu potencial para armazenar dados de forma segura — na maior parte das vezes anônima e sem a possibilidade de alteração dos registros — e sua capacidade para compartilhamento em tempo real fizeram da tecnologia a grande promessa para revolucionar o mundo nos próximos anos. “Parece ser um sistema muito difícil de se colocar em prática, mas ele exige não mais do que computadores comuns e acesso à internet. Por isso, a blockchain é uma alternativa democrática, que serve para todo tipo de solução”, destaca Arturo Zampieri, professor de finanças na escola de negócios International Management Development, na Suíça, e autor do livro Blockchange: How to survive the crypto economy. De acordo com ele, embora pareça ficção científica, a blockchain já é realidade. Considerando diferentes campos que de algum modo se interseccionam com o mercado de capitais, mas indo além das operações com criptomoedas, a CAPITAL ABERTO selecionou iniciativas que usam a DLT para mudar a realidade como conhecemos hoje.

 

 

Bolsas de valores e reguladores

Nos Estados Unidos, a Nasdaq criou, ainda em 2015 e com o apoio de startups, a Linq. Trata-se de uma interface que usa blockchain para facilitar investimentos em empresas pré-IPO. A estreante foi a empresa Chain, que teve transações com seus ativos realizadas e gravadas no livro-razão. O intuito da iniciativa é garantir mais transparência, agilidade e controle nas vendas privadas, para as empresas, os investidores e a própria Nasdaq. A bolsa trabalha ainda em parceria com a Microsoft para usar a blockchain Azure, desenvolvida pela empresa de tecnologia, com o objetivo de aprimorar o Nasdaq Financial Framework (NFF), infraestrutura que permite a bancos e corretoras uma visão completa sobre operações financeiras e atualizações regulatórias.

Recentemente, o banco central do Canadá e o grupo TMX, detentor da Toronto Stock Exchange, testaram a tecnologia para compensação e liquidação de ações. Nas simulações, foi possível trocar ações por dinheiro, ambos armazenados no livro-razão — resultado que mostra ser possível fazer transações entre compradores e vendedores de ações por meio do sistema. Já a bolsa de valores Australian Securities Exchange (ASX) substituirá, a partir de 2021, todo o seu sistema de registro, compensação e liquidação, que passarão a ser feitos com tecnologia blockchain. A ideia é reduzir os custos para os usuários.

No Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) estuda desenvolver um cadastro único para investidores usando DLT. Em novembro, a autarquia firmou acordo com o Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS Rio) para verificar a viabilidade do projeto. A existência de uma ferramenta como essa facilitaria a vida de investidores que operam em mais de uma corretora, já que estaria dispensada a necessidade de múltiplos registros. O plano é que apenas a identidade do investidor seja conhecida, sendo mantidos em sigilo os dados sobre investimentos.

Transações financeiras

Grandes bancos têm se unido numa série de testes relacionados à aplicação da tecnologia — alguns mais, outros menos claros acerca de sua efetividade e de seu potencial prático. O maior banco da Suíça, o UBS, lançou já em 2015 a criptomoeda Utility Settlement Coin (USC) para ser usada exclusivamente em transações entre bancos, em iniciativa que uniu Barclays, Credit Suisse, Deutsche Bank, HSBC e outros players. Na África do Sul, a união entre os principais bancos do país e o banco central resultou em um novo contrato entre eles na blockchain Ethereum, uma das mais usadas no mundo — as instituições testaram a emissão de empréstimos sindicalizados por meio da blockchain. Em uma parceria entre o banco inglês Standard Chartered e o Itaú Unibanco, foi realizada a primeira operação de empréstimo sindicalizado — uma captação de 100 milhões de dólares do Itaú. A blockchain utilizada foi a Corda, desenvolvida pelo consórcio R3, que reúne bancos em torno do desenvolvimento conjunto de facilidades com uso da tecnologia.

Esse tipo de aliança entre bancos propõe-se inicialmente a reduzir custos e a promover simplificações, mas, ao longo do processo, tendem a surgir também possibilidades e reflexões mais amplas, como o uso de criptomoedas em transações entre bancos centrais e até como moeda nacional. Pode parecer filme de ficção, mas a hipótese é proposta inclusive como uma forma de o G-20 ampliar a transparência de suas operações financeiras, a partir do uso de uma criptomoeda própria. A ideia surgiu num think tank realizado no Canadá Centre for International Governance Innovation. Ela também foi levantada por membros do legislativo iraniano para contornar a inflação no país e as sanções dos Estados Unidos, conforme declaração dada pelo então presidente da comissão econômica do parlamento, Mohammad Reza Pour-Ebrahimi, à agência de notícias árabe Mizan.

Em fevereiro passado, o governo venezuelano anunciou a petro, criptomoeda nacional lastreada nas reservas de petróleo do país, que já teria atraído gordos investimentos, segundo informações do presidente, Nicolás Maduro. Entretanto, confirmando suspeitas, reportagem da agência de notícias Reuters afirmou que provavelmente a moeda sequer existia, o que suscitou dúvidas a respeito do potencial de projetos como esse realmente promoverem mais transparência.

Pagamentos e emissão de títulos

Um caminho utilizado pelo mercado financeiro é o emprego da blockchain para otimizar transações além das fronteiras nacionais. Liderado pelo banco J.P.Morgan, o projeto Interbank Information Network (IIN) reúne cerca de 100 grandes bancos ao redor do mundo, incluindo Santander e Royal Bank of Canada, em uma rede à qual todas as instituições têm acesso para controlar fraudes, evitar perda de dados e checar controles. A rede fica hospedada na blockchain Quorum, pertencente ao J.P.Morgan. Com testes iniciados no final de 2017, a IIN oferece uma alternativa para se fazer pagamentos e transferências que não sejam limitadas por fronteiras entre países e moedas. A expectativa do banco americano é que, ao atingir larga escala, a IIN viabilize cerca de 300 mil transações por dia. Mas ainda será pouco diante das cerca de 15 milhões feitas por meio do sistema Swift, usado pelos bancos internacionalmente para oferecer aos usuários transações entre países. A vantagem, entretanto, pode ser questão de tempo.

Também passam pela blockchain as estratégias dos bancos tradicionais para competir com as fintechs, que crescem rapidamente no mundo todo oferecendo custos baixos e serviço mais ágeis — caso da britânica Transferwise. A startup, que já vale quase 2 bilhões de reais, disponibiliza o serviço de emissão e recebimento de remessas entre cerca de 70 países. Um de seus fundadores, Taavet Hinrikus, diz desconfiar do potencial da blockchain para ser aplicada em larga escala como forma de melhorar serviços financeiros. Em entrevista à revista Fortune em novembro, ele afirmou que a ideia pode ser “ótima no papel, mas muito difícil de ser colocada em prática”. Prova disso, segundo ele, seria a baixa adesão dos bancos às tecnologias desenvolvidas pela startup californiana Ripple, que oferece transações financeiras baseadas em blockchain. A empresa é a principal referência no oferecimento do serviço às instituições financeiras, trabalhando em parceria inclusive com a Western Union, que realiza a maior parte das transferências internacionais entre bancos.

Criada pela Ripple, a tecnologia XCurrent faz transações para dólares e libras e é empregada pelo Santander, um de seus investidores de venture capital. Em abril deste ano, o banco espanhol anunciou o serviço One Pay FX para seus clientes no Brasil, na Espanha, na Polônia e no Reino Unido, para transferência internacional de valores de até 3 mil dólares — baseada em blockchain, gratuita e muito mais veloz. Se feita em horário de expediente bancário do país de destino, a concretização da operação, pelo menos em tese, levaria cerca duas horas — no Swift demandaria dois dias. No Brasil, as transferências via blockchain podem ser feitas por ora apenas para o Reino Unido.

E já existem os primeiros títulos emitidos via blockchain. O Banco Mundial contratou o Commonwealth Bank of Australia para gerenciar o título, lançado em agosto passado e apelidado de bond-i. A emissão levantou 110 milhões de dólares. A instituição tem dado especial atenção aos múltiplos usos para a blockchain, tendo lançado, em 2017, o Blockchain Innovation Lab para avaliar o impacto da tecnologia em diversas áreas. Antes da emissão do Banco Mundial, a montadora alemã Daimler havia usado blockchain para lançar um tipo de título em um projeto-piloto de menor escala em 2017.

Comércio exterior e transporte

O HSBC completou, em maio deste ano, aquele que foi considerado o primeiro financiamento comercial com o uso de blockchain — uma letra de crédito emitida pela gigante privada de agropecuária Cargill, cujos recursos seriam destinados ao transporte de soja da Argentina para a Malásia. Para efetuar a operação, o banco britânico usou o livro-razão Corda.

Outra parceria para o incremento do comércio global foi firmada em janeiro deste ano: uma joint venture entre a empresa de tecnologia IBM e a líder mundial em transporte de contêineres Maersk dedicada ao monitoramento em tempo real de movimentações de carga e automatização de registros do transporte marítimo por meio de blockchain. Em agosto passado, a plataforma desenvolvida pelas empresas, chamada de TradeLens, contava com 94 participantes (como operadores portuários, terminais e autoridades alfandegárias) e registrava 154 milhões de eventos — naquele momento, com os registros crescendo a uma taxa de cerca de um milhão por dia, de acordo com comunicado das companhias.

A empresa americana de logística FedEx também vem se unindo a uma série de iniciativas para aplicação de blockchain em logística, como o grupo Blockchain in Transport Alliance (BiTA), que reúne empresas do setor. O setor aéreo igualmente corre para não perder oportunidades de uso da tecnologia: a alemã Lufthansa e a franco-holandesa Air France-KLM fizeram parceria com a empresa especializada em agendamento de voos com base em blockchain Winding Tree.

Saúde

Por funcionar como validadora inviolável para registros de transações, a blockchain é capaz de rastrear a origem de remessas e impedir falsificações — o que é útil para o setor de transportes e também para a indústria farmacêutica. Iniciativas do tipo são urgentes, já que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 10% dos medicamentos distribuídos em países de baixa e média rendas são falsificados. Não à toa, na Índia, o National Institution for Transforming India (NITI) — think tank apoiado pelo governo local — e a empresa americana de tecnologia Oracle testam modelos para colocar a cadeia de suprimentos da indústria em livro-razão, com rastreamento dos medicamentos desde que saem das fábricas até chegarem aos pontos de venda — abordagem já em implementação, mas em pequena escala, pela startup francesa Blockpharma.

Outra iniciativa envolvendo blockchain é encampada pelo governo do estado indiano de Andhra Pradesh, que, em abril passado, firmou uma parceria com a startup alemã Shivom para mapear o genoma de sua população, que chega a 50 milhões — por enquanto é um projeto-piloto, mas o intuito é conectar doadores de DNA a pesquisas médicas e da indústria farmacêutica em um ambiente seguro para os dados. Guardadas as devidas proporções de ordem populacional, em 2017 o governo da Estônia lançou-se em empreitada semelhante. A startup local Guardtime ficou encarregada de guardar os registros de histórico médico (incluindo dados genéticos, em alguns casos) de cerca de um milhão de estonianos, para facilitar o acesso durante tratamentos de saúde.

Educação

Assim como tem sido empregada para manter o histórico médico de pacientes, a blockchain é usada na educação para armazenar registros acadêmicos com autenticidade garantida, como já fez a startup britânica Blockcerts com graduandos do Massachusetts Institute of Technology (MIT). Eles receberam uma versão digital de seus diplomas, que ficam registrados permanentemente na rede e acessíveis a empregadores. Para permitir que múltiplas instituições adicionem conquistas acadêmicas individuais e outras informações de estudantes em rede, a Sony, em parceria com a IBM, criou a iniciativa Sony Global Education — o modelo foi testado com participantes do Global Math Challenge de 2018.

Fundada por professores de Oxford, a Wolf University — que se intitula a primeira universidade blockchain do mundo — pensa em como usar a DLT para mudar o ensino. Algumas das funções da rede pensada por eles são a execução de contratos inteligentes e a diminuição da papelada da educação. Check-ins de estudantes e professores na rede deixam registros como presença e entregas de avaliações — os contratos inteligentes, acionados pelo celular, seriam capazes de pagar professores automaticamente e fornecer microcrédito aos alunos.

Sustentabilidade ambiental e social

Por garantir transparência a todos os envolvidos em uma cadeia, de produtores a consumidores, a DLT tem sido apontada como uma boa ferramenta para a produção de informes de sustentabilidade, de governança corporativa e de impacto social (os chamados fatores ESG) mais eficientes. Isso porque ela armazena interações e resultados que podem ficar acessíveis a um amplo número de usuários, praticamente em tempo real. Atenta a esse potencial, a fundação Responsible Finance & Investment (RFI), sediada em Londres, desenvolve uma ferramenta que usa DLT para acompanhar o comprometimento em sustentabilidade das companhias. O objetivo é que ela ajude a identificar aquelas que não estão seguindo suas alegadas credenciais éticas e as que estão tirando do papel suas promessas, o que ajuda a coibir o chamado greenwashing. “A plataforma é desenhada para funcionar como um empreendimento social, mantido pelos usuários de modo a manter dados abertos e acessíveis, como um bem de interesse público”, explicou à agência Reuters Blake Goud, diretor executivo da fundação, que conta com outros 23 signatários para lançar a tecnologia até 2019.

Nem os bichos escapam da onda. O zoológico Seneca Park, em Nova York, tem usado blockchain para acompanhar a gestão de seus investimentos em reservas ambientais e iniciativas de conservação ambiental ao redor do mundo. O projeto, em parceria com a Ixo Foundation, começou com o monitoramento de um esquema de plantação de árvores no parque nacional Ranomafana, em Madagascar, financiado pelo zoológico. Antes as informações chegavam em relatórios anuais, e agora esse acompanhamento é feito praticamente em tempo real, com o apoio de outras tecnologias, como sensores wireless, imagens de satélite e GPS, para que se verifique se a floresta está de fato crescendo. A blockchain é a cadeia que coordena todo o processo, mantendo e checando as informações gravadas digitalmente. A direção do zoológico planeja que, em 2019, os visitantes que doam para a iniciativa possam acompanhar seu desenvolvimento pelo celular.

Também com base no uso da blockchain para rastreamento, aliado a garantias de autenticidade e de origem, pode-se combater o comércio de “diamantes de sangue” e de “ouro de sangue”, oriundos de práticas de mineração desumanas e geradoras de ganhos ilícitos. É o que propõe o mercado de balcão para negociação de ouro e prata London Bullion Market Association. Além disso, refinadoras europeias de ouro como Valcambi, Yamana Gold e Iamgold firmaram acordo em 2018 para pensar em soluções usando a tecnologia. Para evitar falsificação, a empresa de tecnologia Everledger usa blockchain para monitorar a procedência e proteger bens de valor, incluindo diamantes e outras pedras preciosas. Por meio de visão digital de alta precisão, as pedras são mapeadas, o que cria uma espécie de marca digital única, armazenada na rede. Com histórico de inovação no campo social e ambiental, o Carrefour fechou em 2018 parceria com o programa Seafood Watch, da organização americana Monterey Bay Aquarium, para monitorar a sustentabilidade da produção de peixes via blockchain, observando boas práticas de aquicultura e manejo.

Em Gana, na costa ocidental africana, produtores rurais estão recebendo microfinanciamento e combatendo pragas em cooperação com a empresa suíça de saúde Vestergaard e a startup dinamarquesa Hiveonline. Fornecedora de suprimentos para países em desenvolvimento, a Vestergaard já vendia aos fazendeiros inseticidas para impedir a disseminação de pestes nas plantações. Agora, a qualidade das safras pode ser avaliada via reconhecimento de imagem e, com base nesses dados, são viabilizados empréstimos (com a possibilidade de os recursos serem enviados via criptomoedas), sem a necessidade da intermediação de um banco convencional. Em áreas remotas, com pouco acesso a instituições financeiras, a blockchain é uma alternativa para se levar crédito.

Como força de avançar no cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) da ONU, a corretora de criptomoedas Binance lançou o portal de doações Blockchain Charity Foundation (BCF) durante o Fórum de Investimento Mundial da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, em outubro de 2018. O objetivo é que doações para instituições de caridade que trabalhem questões endereçadas pelas ODSs sejam monitoradas pela BCF. “Com mais transparência, podemos ter certeza de que os fundos estão indo corretamente para as propostas”, afirmou Changpeng Zhao, CEO da Binance, em sua apresentação.

Energia e carbono

Embora receba atenção por ser uma alternativa de fomento à sustentabilidade, a blockchain ainda precisa equacionar uma questão que afeta diretamente seu sucesso nas mais diversas áreas: o alto consumo de energia envolvido no seu uso. Anualmente, apenas transações de bitcoin gastam 2,55 gigawatts de energia por hora, volume comparado ao consumo energético de países como a Irlanda, conforme levantamento da PwC da Holanda. Dado que boa parte da energia produzida mundialmente não é limpa, estima-se que somente a produção de carbono relacionada ao bitcoin poderia contribuir para o aumento do aquecimento global em cerca de 2 graus Celsius em três décadas, segundo estudo publicado em outubro de 2018 pela revista Nature. Algumas tentam diminuir a pegada de carbono deixada pela blockchain. A startup Carbon Grid Protocol quer ajudar projetos baseados em DLT a trabalhar para neutralizar sua pegada de carbono usando créditos de carbono, bem como a organizar suas estruturas de modo a cumprir preceitos ESG e atrair investidores. Evidentemente, já há investidores pensando em aliar investimentos em blockchain e ESG, como a firma de venture capital americana Eterna Capital, lançada em 2018 com foco nesse tipo de negócios. Como se vê, até mesmo as fragilidades da blockchain podem virar oportunidade para quem tiver interesse em desbravar esse universo. Considerando o ritmo com que isso vem sendo feito, essa tecnologia não deve demorar a se alastrar pelos mais diversos setores.


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Os mitos da blockchain

O entusiasmo com o uso da blockchain, aliado ao seu recente histórico e ao pequeno entendimento sobre suas possibilidades, criou dois mitos: o de que essa tecnologia sempre proporciona redução de custos e que sua segurança é inviolável. Segundo especialistas, as duas afirmações deveriam ser suavizadas, já que a blockchain pode sim significar redução de custos e melhora de segurança, mas dependendo do tipo de rede adotada e de sua programação.

De acordo com Luiz Carvalho, sócio da consultoria Nexo AI, a blockchain é uma tecnologia adequada para se lidar com situações nas quais há uma grande necessidade de controle de informações, em que é preciso usar criptografia e ter aceite mútuo e consensual das partes envolvidas. Ou seja, quando a preocupação com segurança e transparência é uma questão crucial. Exemplos seriam a realização de eleições, de transações bancárias e de remessas de recursos. Quando as redes de blockchain são públicas, a afirmação de que a tecnologia reduz os custos e é altamente segura faz sentido, considera.

No entanto, uma tendência crescente tem sido a utilização de redes privadas, nas quais há uma figura que, em última instância, é capaz de validar as transações. Essa figura geralmente é o criador da rede e dos contratos inteligentes (ou smart contracts, que são linhas de código dentro dos blocos) e faz as validações, atestando se as transações podem ou não prosseguir. Esse gestor detém os dados e tem o poder de convidar e vetar participantes. Mas também precisa contar com uma estrutura de computação robusta para dar suporte à tecnologia.  “Muitas empresas estão adotando as redes privadas para se antecipar em processos, buscando a vantagem de ser ‘first movers’”, afirma Ricardo Anhesini, sócio da área de serviços financeiros da KMPG. E como o desenvolvimento dessa estrutura implica investimento, nem sempre a blockchain reduz os custos. Na rede pública, os dados são processados e validados por computadores de numerosos participantes, o que dilui os gastos de infraestrutura. Além disso, quanto maior a necessidade de criptografia, maior é o custo.

Por isso, Carvalho observa que a adoção da tecnologia deve ser estudada caso a caso. A Nexo, por exemplo, está estruturando uma rede privada para controlar a cadeia de suprimentos de um grupo hospitalar. No momento, o objetivo é rastrear os medicamentos, desde o momento em que entram no estoque até o uso pelo paciente. A ideia é reduzir o desperdício e o desvio de remédios na farmácia — o que também poderia ser alcançado com outra tecnologia, segundo o executivo. Mas, como se pretende estender o sistema a toda a cadeia de procedimentos do grupo, ele permitirá ganhos de escala.

Em relação à segurança, Carvalho explica que a tecnologia em si é de fato inviolável, já que a blockchain trabalha com base no consenso das transações — todos os envolvidos na rede precisam validar as informações para que elas se tornem verdadeiras. Desse modo, falhas de segurança podem ocorrer não por conta da tecnologia em si, mas por erros de programação dos contratos inteligentes. Quando se cria uma criptomoeda, por exemplo, o programador estabelece regras, como o número de moedas previstas e a forma de fracionamento. Dentro desses códigos pode haver falhas. Outro fator que pode fazer a segurança cair por terra é o armazenamento das informações em bancos de dados locais. Foi o que aconteceu no caso dos roubos de bitcoins ocorridos em corretoras na Ásia: elas armazenavam a moeda em seus bancos de dados, com brechas que facilitaram a atuação de hackers. (Luciana Del Caro)


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