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Sete erros – Parte I
Os equívocos cometidos pelas companhias que aproveitaram o boom dos IPOs

Crescimento exponencial do número de matérias em governança corporativa, migrações maciças para o Novo Mercado, aprimoramento da regulação e maior conscientização de conselheiros e executivos. Esses são apenas alguns dos fatores que tornaram o Brasil líder inconteste da América Latina no tema. Como resultado, o momento eufórico vivido no mercado de ações durante o boom dos IPOs de 2004 a 2007 traduziu-se em sentimento similar nos eventos de governança corporativa. Eles contaram com saudações efusivas entre os participantes e inúmeros elogios ao grau de “amadurecimento de governança” alcançado pelas companhias brasileiras da bolsa. Entretanto, como todo momento de euforia dá margem para que erros relevantes passem despercebidos, essa onda de IPOs também trouxe à tona episódios inesperados em relação às boas práticas de governança.

Denominadas como os “sete erros” da governança corporativa durante o boom dos IPOs, estas são questões previamente inexistentes ou pouco debatidas em nosso mercado. São elas: 1) poison pills brasileiras: adoção indiscriminada de mecanismos para evitar a formação de blocos acionários relevantes pelas companhias que vieram a mercado; 2) insider trading: suspeita de negociação de ações por pessoas com posse de informações privilegiadas em diversas operações de aquisição de controle; 3) equity kickings: aceleração do processo de abertura de capital de companhias por meio da alavancagem financeira oriunda de recursos de seus bancos coordenadores; 4) BDRs: emissão de recibos de depósito de ações para serem negociados no Brasil por empresas intrinsecamente brasileiras como se fossem estrangeiras, com diversos casos resultando em problemas financeiros e de governança; 5) gestão de riscos: falta de atenção dos conselhos de administração no monitoramento dos riscos aos quais suas companhias estavam expostas; 6) aquisições originárias: estruturação de operações de venda de controle sem aprovação ou possibilidade de saída dos minoritários por companhias do Novo Mercado; e 7) mecanismos para aumento do controle (control-enhancing mechanisms – CEMs): usados para aumentar o poder de controle por parte de acionistas majoritários, inclusive por empresas do Novo Mercado.

Na coluna deste mês, o texto está dividido em duas partes. O objetivo é trazer uma reflexão mais profunda sobre cada um dos itens mencionados acima. A seguir, você acompanha as discussões sobre os quatro primeiros erros de governança corporativa. Os três últimos serão abordados na edição de agosto.

Um ano após os IPOs, empresas que receberam empréstimos dos seus bancos coordenadores apresentaram resultados piores

Poison pills brasileiras: cerca de 60% das empresas que vieram a mercado entre 2004 e 2007 adotaram tais cláusulas. Estas geralmente obrigam o adquirente de certo percentual acionário (“gatilho”) a fazer uma oferta pública de compra de todas as ações, a um preço elevado. Além de um baixo gatilho a um alto preço (o que dificulta a entrada de acionistas relevantes e com maior poder de voz), muitas companhias também adotaram as chamadas “cláusulas pétreas”: um mecanismo ilógico que obriga os acionistas que votarem a favor da remoção dessas cláusulas a fazerem oferta pública de aquisição das ações em questão. Além de sua utilidade nunca ter sido comprovada, as poison pills vêm obstruindo a realização de reestruturações societárias potencialmente positivas e dificultando a substituição de gestores com baixo desempenho.

Insider trading: obviamente, não se trata de um fenômeno novo. Entretanto, chama a atenção o número de operações de aquisição de controle que levantaram suspeitas na mídia especializada. Como exemplo, podemos citar a famosa tentativa de aquisição da Perdigão pela Sadia em 2006. Nela, o ex-vice-presidente do conselho de administração e o ex-diretor financeiro da potencial adquirente tiveram que realizar acordos para pagamento de multas à Securities and Exchange Comission (SEC) por usar informação privilegiada. Além disso, foram punidos administrativamente pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) por comprarem American Depository Receipts (ADRs) da Perdigão no mercado norte-americano antes do anúncio. Esse caso também ficou famoso por resultar na primeira ação penal relacionada ao tema do País, ainda a ser julgada. Além desse, operações como as aquisições de controle da Ipiranga, Suzano Petroquímica, Varig e Nossa Caixa ganharam as manchetes com suspeitas de utilização de informações privilegiadas.

Ipiranga, Suzano Petroquímica, Varig, Sadia e Nossa Caixa ganharam as manchetes com suspeitas de uso de informação privilegiada

Equity kickings: o fenômeno da alavancagem de empresas pré-IPO por parte de bancos coordenadores também merece destaque. Em um estudo recente, avaliamos todos os IPOs realizados no Brasil e observamos que, em 28% deles, os bancos coordenadores forneceram capital às companhias para viabilizar ou acelerar sua ida ao mercado. Separamos as companhias que vieram a mercado em dois grupos: com e sem equity kicking. Percebemos que, um ano após os IPOs, as empresas que receberam empréstimos dos seus coordenadores apresentaram resultados substancialmente piores, tanto operacionalmente (retorno sobre o patrimônio líquido de 8,5%, contra 20,8% do outro grupo), quanto no desempenho de suas ações (retorno negativo de 36%, contra um retorno positivo de 8% do outro grupo). Em suma, tais companhias parecem ter vindo a mercado de forma prematura, isto é, sem possibilidade de entregar os resultados prometidos e/ou a um preço muito elevado, gerando maior queda no retorno das ações após os IPOs.

BDRs: a ideia desses instrumentos é trazer ao mercado brasileiro papéis de companhias estrangeiras de forma a aumentar as opções disponíveis para o nosso investidor. Essa situação é extremamente positiva, já que permite a criação de carteiras mais diversificadas e eficientes. Entretanto, quase todos os BDRs negociados no País são de empresas intrinsecamente brasileiras. Coincidentemente ou não, algumas dessas companhias (sempre listadas em paraísos fiscais e sob regras societárias mais brandas) apresentaram sérios problemas de governança. O caso de maior destaque foi o da Agrenco. A companhia captou aproximadamente R$ 700 milhões em nosso mercado no fim de 2007 com uma ação cotada a cerca de R$ 10. Meros oito meses depois, no entanto, apresentou queda de 99% em seu valor (para quase R$ 0,13), devido à prisão de diretores da empresa. Tal situação colaborou para a perda de patrimônio de diversos fundos e investidores de classe média. Uma análise do período de 15 dias após o anúncio dos problemas da Agrenco mostrou um retorno negativo de suas ações de 82%, com destruição líquida de valor para os acionistas de R$ 297,2 milhões.


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