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Relações com máquinas
Com investidores focados no curtíssimo prazo — de até milésimos de segundos — ou operando “no escuro”, companhias norte-americanas se perguntam quem está negociando suas ações

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Nos Estados Unidos, os profissionais de relações com investidores (RI) de companhias abertas têm hoje uma grande dificuldade para se relacionar. Descobrir quem está mexendo com as ações da companhia está se tornando cada vez mais difícil. “Para nós, RIs, é uma grande frustração não saber quem está negociando nossas ações”, disse Jeffrey Morgan, presidente do National Investor Relations Institute (Niri). Em tempos de negociação em alta frequência (“high frequency trading”), algoritmos que executam ordens em milésimos de segundo e transações fechadas “no escuro”, uma coisa é certa: “As pessoas com quem você interage diretamente já não são mais responsáveis pela maior parte do volume de negociação da sua companhia”, garantiu John Adams, chefe da Liquidnet Insight, a unidade de serviços corporativos da Liquidnet, a maior “dark pool” do mundo.Essa preocupação rondou várias sessões da conferência anual do Niri. Em parte, pelas dimensões que os sistemas alternativos de negociação (ATSs, na sigla em inglês) e as operações em alta frequência estão tomando. Atualmente, há cerca de 40 dark pools competindo por liquidez com os tradicionais pregões de ações. Um quarto das operações não é mais executado nas bolsas de valores, mas, sim, em espaços alternativos como as dark pools ou até dentro das corretoras, num fenômeno chamado “internalization” (ou “internalização”, em português). Mais da metade da liquidez nos mercados de ações norte-americanos vem das operações em alta frequência, o que significa que elas estão sendo executadas por máquinas. Os RIs querem entender como essas tendências interferem no rumo dos papéis das companhias em bolsa.

Outra razão para o assunto estar na pauta do dia foram os questionamentos expressos pela Securities and Exchange Commission (SEC) nos últimos meses. O regulador fez alertas e levantou discussões sobre a direção que o mercado norte-americano está tomando. Seria correto privilegiar a ordem de uma corretora que só chegou na frente porque tem equipamentos de alta tecnologia que lhe permitem negociar em altíssima velocidade? A SEC tem essa dúvida. No início deste ano, chegou a propor a proibição do chamado “acesso nu” ou “patrocinado”. Nesse tipo de esquema, corretoras credenciadas nas bolsas de valores alugam seus pontos de acesso para operadores de alta frequência interessados em ganhar milésimos de segundo extras. Com o acesso direto, trabalho da corretora de filtrar ordens, por exemplo, pode ser “pulado”. A SEC mostrou preocupação até com os simples erros técnicos e efeitos desastrosos que podem surgir dessa prática.

NADA A FAZER — As operações em alta frequência, em si, não são indesejadas. Para Bruce Aust, vice-presidente executivo da Nasdaq OMX, a cargo do grupo de clientes corporativos, os high frequency traders ajudaram a injetar liquidez no mercado, de 2007 para cá. O inconveniente, talvez, seja o fato de terem deixado mais complexa a visão sobre o volume de negociação das ações. Contudo, não há muito o que fazer em relação a essa tendência, que veio para ficar. “A maioria das negociações em alta frequência é ‘market making’”, observou Frank Hatheway, economista-chefe da Nasdaq OMX, referindo-se à atuação de formadores de mercado. Com esses agentes, os RIs não têm de se comunicar. Colin Clark, vice-presidente executivo da área de análise e estatísticas estratégicas do grupo Nyse Euronext, recomenda às companhias centrarem seu trabalho de RI nos investidores de longo prazo, aqueles que agem mais pela cabeça e menos pelo computador. “Converse com seus investidores institucionais pessoalmente. Descubra como eles negociam suas ações. Assim, saberá avaliar melhor a liquidez dos papéis”, ensinou.

Mais da metade da liquidez nos mercados de ações norte-americanos vem de operações executadas por computadores

Mais controverso é o aumento das negociações que ocorrem fora de bolsa de valores. “Os dias em que a Nyse e a Nasdaq formavam um duopólio se foram. O desafio é ter transparência o suficiente para que o mercado funcione bem, e os emissores e investidores possam confiar nele”, resumiu um executivo presente no evento do Niri. “Quando falamos com bolsas e reguladores de outras partes do mundo, nos perguntam como fomos deixar isso acontecer nos Estados Unidos”, afirma Scott Cutler, vice-presidente executivo da Nyse Euronext, responsável pela área de listagens de companhias das Américas. O surgimento de ATSs e o processo de internalização permitiram a redução de custos de transação, o que, de fato, ocorreu. Mas outra consequência disso foi a diminuição da transparência.

Nas dark pools, investidores fecham operações como num jogo de cartas viradas para baixo. Além de não saberem com quem estão negociando, os usuários dessas plataformas eletrônicas também não têm certeza do preço nem da quantidade de ações que estão, realmente, operando. Os números podem variar dentro de uma margem estabelecida pelo investidor — geralmente definida por algoritmos. O papel da dark pool é juntar compradores e vendedores cujas margens de tolerância sejam compatíveis. As partes descobrem o quanto conseguiram fechar só depois da execução da ordem. Nem os valores nem a cotação são compartilhados com as bolsas.

MERCADOS PRIVADOS — As dark pools surgiram justamente para evitar que os outros participantes do mercado saibam o que os investidores institucionais estão fazendo. Operando com grandes blocos de ações em mercados transparentes como as bolsas, estão sujeitos a ter seus movimentos detectados por terceiros e a causar volatilidade nos preços. Nas dark pools, os investidores podem passear como anônimos. Até aí, as intenções são boas. O problema fica sério a partir do momento em que mais e mais transações preferem o caminho menos transparente. Nesse sentido, as cotações divulgadas pelas bolsas acabam perdendo sua relevância, pois refletem cada vez menos os preços pelos quais o mercado está aceitando pagar ou vender valores mobiliários. “Ainda estamos longe dessa situação, mas, em algumas companhias menos líquidas, a deterioração da transparência já está evidente”, reconhece Hatheway, da Nasdaq OMX.

Há, é claro, razões para as dark pools manterem seus dados entre quatro paredes. Investidores institucionais trabalham duro para executar determinadas ordens. Colocam gestores na estrada, educam analistas, estudam as companhias”, apontou Adams, da Liquidnet, que tem como clientes 600 firmas de investimento, com patrimônio total US$ 13,6 trilhões. Para ele, dar transparência às operações seria como dividir o resultado desses esforços com terceiros — portanto, injusto. As bolsas de valores, por sua vez, querem pôr um limite nesse sigilo. A proposta da SEC, apoiada pelos grupos Nasdaq OMX e Nyse Euronext, é a criação de um sistema único de divulgação de cotações geradas em todos os mercados, inclusive, os alternativos. Com a publicação dos valores, a formação de preços seria mais fiel real à realidade.

Clark, da Nyse Euronext, negou que as críticas disparadas às dark pools sejam pura briga de concorrentes. “As dark pools, muitas vezes, estão entregando os mesmos preços que as bolsas oferecem. É preciso fazer melhor: bater nossas cotações e provar”, ressaltou. Quanto às ordens executadas por meio da internalização de corretoras, Clark tem dúvidas se elas estão mesmo beneficiando os investidores. Teoricamente, se encontrasse o melhor preço na bolsa, a corretora deveria fechar a transação lá e não em seu próprio sistema, mas não se sabe se isso acontece. Suspeita-se que as corretoras estejam realizando as negociações internamente sem que os clientes se dêem conta disso.


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