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Rafael La Porta – Disclosure não é tudo
O Novo Mercado é um sucesso. A transparência é fundamental. Mas tudo isso não é suficiente para um bom sistema de governança corporativa. É o que constata Rafael La Porta, professor de finanças da Tuck School of Business, da Dartmouth College, nos Estados Unidos.

, Rafael La Porta – Disclosure não é tudo, Capital AbertoO Novo Mercado é um sucesso. A transparência é fundamental. Mas tudo isso não é suficiente para um bom sistema de governança corporativa. É o que constata Rafael La Porta, professor de finanças da Tuck School of Business, da Dartmouth College, nos Estados Unidos. Para ele, é preciso garantir a proteção ao investidor, o que significa atribuir-lhe o direito de pedir explicações e cobrar resultados dos administradores. “Tipicamente, isso exige ir além de regras de listagem.” Um dos pesquisadores mais respeitados do mundo na área governança corporativa, La Porta se preocupa com o sistema judicial brasileiro, “dolorosamente lento”. Em um de seus últimos estudos, The law and economics of self-dealing, o acadêmico demonstra que os prêmios de controle são a melhor forma de mensurar os benefícios privados dos acionistas majoritários. E que os prêmios de controle são altos no Brasil porque a proteção dada ao investidor ainda é inadequada. “Em resumo, um prêmio elevado é sintoma de um sistema de governança que não funciona direito”, atesta. Por e-mail, La Porta comenta essa e outras questões na entrevista a seguir.

CAPITAL ABERTO: No Brasil, vivemos um momento em que as companhias estão pulverizando seu capital. Que tipo de conselhos o senhor daria para amenizar os conflitos de agência que surgem nesse novo ambiente?
Rafael La Porta: A explosão das ofertas de ações tem muito a ver com o aumento da proteção ao investidor conferido pelo Novo Mercado. Pelo que entendo, o processo de pulverização começou em companhias como Lojas Renner e Submarino, que não eram empresas familiares anteriormente. Esse mecanismo levanta duas questões. A primeira: companhias sem controle definido podem se tornar alvos de ofertas hostis. De fato, a oferta da Sadia pela Perdigão pode não ser a última de tais ofertas hostis. O advento das tomadas de controle vai exigir uma atualização do arcabouço regulatório. Em segundo lugar, pode não ser prudente confiar em regras de listagem como a fonte primária de proteção ao investidor. O Novo Mercado é um sucesso. O disclosure é extremamente importante. Bons prospectos também. Apesar disso, a proteção ao investidor também requer permitir a acionistas encostar insiders na parede. Tipicamente, isso exige ir além de regras de listagem.

Precisamos de mais regulação?
Freqüentemente, defensores do livre mercado na América Latina não entendem como os mercados atuam de verdade. Na área de finanças, mercados não regulados são pequenos. Em contraste, mercados financeiros bem-sucedidos, como os de Nova York ou Londres, são pesadamente regulados. É importante lembrar que mercados bem-sucedidos privilegiam a regulação que apóia o mercado (como disclosure e litígios privados), e não a que o suprime (como a propriedade estatal de bancos, por exemplo). No caso específico do Brasil, minha impressão é de que o Novo Mercado foi um passo na direção certa. Aumentou a transparência, restringiu o uso de ações sem direito a voto etc. No entanto, só o disclosure nunca é o bastante. A recente reorganização societária anunciada pela Cosan ilustra esse assunto. Os minoritários ficaram furiosos. O fato de terem sido avisados sobre a reestruturação da Cosan não bastou.

Embora as companhias estejam dispersando o capital, ainda encontramos grupos que mantêm o poder de controle de uma empresa com menos de 50% de suas ações, principalmente quando as assembléias têm baixa adesão. Quais as preocupações que esse tipo de situação desperta para a governança?
O fenômeno que você está descrevendo é predominante entre companhias pequenas e médias nos Estados Unidos. Em primeiro lugar, se o quórum exigido é alto, o processo de tomada de decisão pode ficar paralisado se acionistas deixarem de comparecer às assembléias. Em tese, esse problema pode ser resolvido com a redução do nível mínimo de quórum e mecanismos que facilitem a participação nas assembléias, como o voto eletrônico. Em segundo lugar, os interesses de insiders podem não ser suficientemente alinhados com os dos demais acionistas. Se a fatia do capital detida por eles cai, eles arcam menos com os custos de quaisquer prejuízos que venham a produzir. Um ambiente eficiente exige que esses insiders sejam monitorados e os minoritários tenham a chance de expurgar administradores ruins.

No seu estudo The law and economics of self-dealing, o Brasil aparece com um dos maiores prêmios de controle do mundo (49%). Por que aqui o controle vale tanto?
Para se entender o valor do controle, é preciso refletir muito sobre os benefícios privados do controle. Com certeza, há muitas coisas acontecendo. Por exemplo, acionistas controladores podem valorizar o prestígio associado ao poder. Tais benefícios não monetários são uma parte da história. Porém, provavelmente não explicam tudo. O estudo argumenta que um determinante fundamental do valor do controle é a possibilidade de extrair benefícios financeiros por meio de transações que expropriam investidores. Essas operações geralmente viram manchete. Por exemplo, a petrolífera russa Gazprom comprou materiais para novos oleodutos através de intermediários, cujos donos eram executivos da companhia.

Companhias brasileiras também estão adotando poison pills. Esses mecanismos são usados para manter o poder de controle de uma companhia nas mãos de determinados grupos. O senhor as considera uma boa prática?
O argumento a favor das poison pills é de que elas podem beneficiar acionistas, quando usadas como ferramenta para forçar adquirentes a pagar um preço mais elevado pelo alvo. Claro, as pílulas de veneno também podem entrincheirar insiders, na medida em que tornam economicamente inviável a venda de uma empresa mal administrada. Na minha opinião, deveria caber a acionistas não interessados — não ao conselho de administração e certamente não aos insiders — acionar uma poison pill, quando confrontados com uma oferta hostil de aquisição de controle.

Quer dizer que as poison pills não deveriam fazer parte dos estatutos?
Não, não deveriam. Os acionistas deveriam ter o direito de votar sobre a conveniência da adoção de mecanismos de defesa no momento em que é feita uma oferta hostil de aquisição de controle.

O senhor acredita que as pílulas de veneno estejam desaparecendo nos Estados Unidos?
As poison pills permanecem um obstáculo formidável para tomadas de controle. Os Estados Unidos são muito ruins em proteger acionistas de administradores entrincheirados. São melhores em proteger minoritários de controladores. O Reino Unido é o país com as melhores práticas na regulação sobre aquisições.

Em países em que o sistema judicial é lento, a auto-regulação é suficiente para proteger o investidor?
O mercado precisa ser capaz de lidar com problemas de governança corporativa. O disclosure amplo sobre questões de governança, como transações que beneficiam insiders, é um primeiro passo crucial. O mercado pode, então, começar a recompensar companhias com melhores práticas de governança com um preço de ação mais alto. Se você pensar, isso é, em parte, o que os ADRs proporcionam para as companhias que se listam em Nova York: eles aumentam radicalmente o disclosure. Naturalmente, o disclosure sozinho não é o suficiente. Em países com poder judiciário fraco, dar a acionistas o direito de decidir em assembléias gerais sobre transações que envolvam conflitos de interesses é uma iniciativa que independe de um sistema judicial eficiente.

O valor de mercado de grandes bancos estrangeiros caiu drasticamente devido às perdas causadas por títulos subprime. Isso significa que essas instituições não estavam informando bem seus acionistas sobre os investimentos em produtos de alto risco?
Esse é um assunto complexo. Os Estados Unidos vivenciaram uma bolha no setor imobiliário e os bancos estão experimentando um certo grau de agonia financeira. A securitização pode ter colaborado para isso. Porém, bancos japoneses ainda estão sofrendo com a bolha dos preços de terrenos que estourou nos anos 90. Em suma, bancos sofrem quando preços de imóveis caem, mesmo na ausência de títulos lastreados por hipotecas de alto risco. É interessante notar que investidores muito sofisticados compraram esses títulos. Esse pessoal não pode dizer que não estava bem-informado.

O que a crise deve trazer de novidades para a governança?
É seguro dizer que pouca coisa vai mudar. As atenções estarão focadas em restaurar a saúde do sistema financeiro. O Congresso norte-americano vai tentar corrigir falhas no arcabouço regulatório, olhar para regulamentações adicionais para bancos de investimento e reexaminar o papel das agências de rating.

Conteúdo extra

Acesse o estudo The Law and Economics of Self-Dealing, de Rafael La Porta.


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