Racha de opiniões
Remuneração variável para conselheiros de administração é motivo de controvérsia entre especialistas — e as opções de ações são as principais vilãs

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Nos Estados Unidos, a remuneração dos administradores de companhias listadas em bolsa passou por uma situação curiosa. Enquanto os CEOs viram seus rendimentos regredirem neste ano, o pagamento aos conselheiros, na média, só vem crescendo. Num momento em que os incentivos dados aos executivos das empresas norte-americanas são colocados em xeque, tudo indica que a discussão não afetou o bolso dos membros do board. Estudo feito pela Mercer, em setembro, mostra que a remuneração a cada conselheiro das 50 maiores companhias (com receita média de US$ 66,2 bilhões) atingiu, em 2007, uma média de US$ 236 mil, 4,2% maior que no ano anterior. Nas 150 empresas de grande porte (receita média de US$ 16,7 bilhões), o valor foi de US$ 202 mil, um incremento de 8,7%. Na análise de 150 empresas de porte médio (receita média de US$ 3,2 bilhões), o pagamento subiu 8,4%, para US$ 159 mil.

O trabalho da Mercer também constatou uma tendência de retração no uso de opções de ações na remuneração de conselheiros. Dentre as 50 maiores companhias, as opções fizeram parte de 9% dos pacotes de remuneração em equities para conselheiros — contra 13% no ano anterior. No recuo das stock options, quem ganhou terreno foram as ações e as ações restritas (restricted stocks) — que só podem ser negociadas depois de um certo prazo.

“Pode ser uma resposta do mercado norte-americano ao lado perverso das stock options, que desalinham os interesses do conselheiro com a companhia”, opina Herbert Steinberg, presidente da Mesa Corporate Governance, empresa de consultoria em governança corporativa. O grande problema estaria no possível conflito de interesses oriundo dessa relação. Imagine que um conselheiro tenha em seu pacote de remuneração opções de ações para serem exercidas um ano após ter sido contratado. Se detectar problemas na companhia, ele os apresentará imediatamente aos investidores externos ou esperará até que possa exercer suas opções?

O uso de stock options para remunerar o board é um dos temas mais controversos nas discussões internacionais sobre governança corporativa. Na última conferência realizada pelo International Corporate Governance Network (ICGN) — associação internacional de investidores institucionais que trabalha pelas boas práticas de governança corporativa —, em junho, na Coréia do Sul, o assunto gerou debates acalorados entre participantes de todo o mundo. Na assembléia anual da entidade, vários pontos são debatidos e, ao final, o ICGN elabora um relatório com seu posicionamento oficial. “Mesmo dentro da delegação brasileira, as opiniões foram divergentes”, lembra Steinberg, que esteve no evento. Terminado o debate, a entidade resolveu não se posicionar, alegando a necessidade de mais discussão.

No Brasil, o debate também ganha destaque nas rodas de governança. A próxima versão do código de melhores práticas do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) deverá trazer novidades sobre o tema. “O uso de stock options para o conselho está sendo bastante discutido”, diz Heloísa Bedicks, secretária geral do instituto. Heloísa está no time contrário a qualquer forma de remuneração variável para conselheiros. “A remuneração do conselheiro deve ser apenas a fixa. O órgão tem força maior quando sua remuneração não está atrelada ao resultado da empresa. Como o conselheiro vai, por exemplo, discutir a melhor forma de remuneração dos executivos, se a sua também estiver alinhada com o curto prazo?”, questiona.

Para Steinberg, a remuneração do conselheiro também deve ser exclusivamente fixa, sem qualquer concessão de remuneração variável, seja através de opções ou restricted stocks. “Longo prazo significa dez anos ou mais. Não se deve alinhar remuneração de conselheiros aos mesmos ciclos de tempo e métricas adotadas para a administração”, opina. O elemento variável, defende o consultor, pode acabar orientando a visão do conselheiro para o curto prazo.

Pagar conselheiros com stock options é prática ainda incipiente no Brasil. Algumas companhias, como a Cremer e a Infinity, oferecem opções de ações aos membros de seu board. Contatadas pela reportagem, não se pronunciaram. A prática corrente por aqui é o pagamento de uma taxa fixa a cada reunião realizada. Segundo dados da Mesa Corporate Governance, conselheiros de administração no Brasil recebem, em média, de R$ 8 mil a R$ 12 mil por reunião. Grandes conglomerados pagam mais, por volta de R$ 14 mil. No caso de conselheiros “estrelas” — profissionais famosos —, a remuneração sobe de R$ 14 mil a R$ 25 mil. De acordo com pesquisa da Hay Group, que analisou dados de 74 companhias, 35% delas realizam até quatro reuniões de conselho por ano. As que promovem de cinco a oito reuniões representam 16%; e as que reúnem o board de nove a 12 vezes, 39%.

Para Peter Anderson, sócio da ARC Executive Talent Recruiting, consultoria de gestão e recrutamento de executivos, o uso de stock options é positivo. “Isso motiva o profissional a sempre buscar o melhor para a companhia, pois seu dinheiro está investido nela. Com as opções, os objetivos da empresa, conselheiro e acionista se alinham”, diz.

Alexandre Di Miceli da Silveira, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP) e coordenador executivo do Centro de Estudos em Governança Corporativa (CEG) da Fipecafi, também não vê grandes problemas na concessão de opções de ações para conselheiros, desde que sua perspectiva de exercício seja, no mínimo, para o médio prazo. “Se forem opções para serem exercidas depois de dois anos, e cuja venda só puder ser feita depois que o profissional sair do conselho, a possibilidade de haver conflitos diminui bastante”, comenta. Di Miceli não é favorável a uma remuneração integralmente fixa, pois o conselheiro pode não se motivar tanto para que a companhia gere valor. Melhor que as opções, diz, é que o conselheiro tenha uma boa parcela de ações, pois “se a empresa for mal, ele sentirá no bolso”.

O grande desafio para as companhias é encontrar o balanceamento ideal entre valores, independência e alinhamento de interesses. “O conselheiro deve ganhar bem, mas não uma fortuna, como ocorre em grandes conglomerados”, finaliza o professor. Muito dinheiro pode significar uma relação de dependência nada desejável quando se trata de um conselheiro de administração.


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