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Quem é o chefe?
Nem sempre o diretor-presidente deve ser considerado a pessoa-chave da empresa

, Quem é o chefe?, Capital AbertoNo centro dos debates sobre governança corporativa está a forma como as decisões de alta gestão são tomadas nas organizações empresariais. Em tese, as grandes decisões deveriam ser deliberadas, de maneira colegiada, pelo conselho de administração (CA), órgão legalmente constituído com essa atribuição. Entretanto, a realidade muitas vezes é outra. Tais decisões tendem a ser tomadas, ou ao menos fortemente influenciadas, por um indivíduo que pode ser intitulado de “líder corporativo”. Para os estudos realizados no ambiente anglo-saxão, esse líder é invariavelmente o diretor-presidente (CEO). Já no Brasil, esse cenário nem sempre se repete.

Vejamos dois casos específicos: Abilio Diniz, no Pão de Açúcar; e Eike Batista, nas empresas do Grupo EBX. Ambos os empresários optaram por separar as funções de presidente do conselho de administração e CEO, restringindo-se ao primeiro cargo. É notório, porém, que desempenham papel central na tomada das grandes decisões de suas companhias. Geralmente, são eles, por exemplo, que negociam fusões e aquisições e aparecem na mídia quando esses assuntos vêm à tona. Em comparação com seus respectivos CEOs, ambos possuem incomparavelmente mais ações e, portanto, maior poder político. No caso do Pão de Açúcar, Diniz tem 55 anos “de casa”, sete vezes mais que o presidente executivo. Nas empresas “X”, os CEOs nem mesmo fazem parte do conselho.

Esses exemplos mostram que, no Brasil, o presidente do conselho de administração pode ser, de fato, o líder corporativo, enquanto a atuação do CEO se restringe às decisões operacionais diárias. Isso se repete com frequência ou se limita a casos pontuais? Para responder a essa questão, analisamos o poder relativo dos presidentes do conselho ante o dos CEOs das 159 companhias brasileiras de maior valor de mercado da Bolsa com pessoas diferentes ocupando os dois cargos-chave.

O primeiro passo foi criar um método para aferir o poder de cada um. De acordo com a literatura, existem quatro dimensões principais de poder nas companhias: 1) a estrutural, baseada em cargos ocupados; 2) a acionária; 3) a da expertise; e 4) a do prestígio, decorrente da reputação do indivíduo perante stakeholders.

, Quem é o chefe?, Capital AbertoCriamos, então, um questionário composto de sete questões, a fim de avaliar presidentes do conselho e CEOs. Levamos em consideração aspectos como: 1) presença de fundador ou descendente no papel de presidente do conselho ou presidente executivo; 2) atuação do ex-CEO como presidente do conselho; 3) tempo “de casa”; 4) posse de ações ordinárias; 5) atuação em comitês do conselho; 6) CEO como membro do conselho; e 7) atuação em outros conselhos. Ao final, geramos uma pontuação numa escala de 0 a 10.

Os resultados foram surpreendentes. Em 118 empresas (cerca de 75% da amostra), os presidentes do conselho podem ser considerados mais poderosos nas grandes decisões empresariais. Logo, nas companhias listadas em bolsa no Brasil com pessoas diferentes nos cargos-chave, presidentes do conselho — e não CEOs — tendem a atuar como principal “líder corporativo”. Trata-se de um cenário distinto do observado no ambiente norte-americano.

A aplicação do questionário permitiu ainda identificar os presidentes do conselho e CEOs brasileiros com maior poder relativo. (ver tabela ao lado e na página anterior)

Seriam esses resultados decorrentes da aplicação de uma metodologia inadequada? Alteramos pesos e perguntas, e os resultados gerais se mantiveram. Adicionalmente, procuramos validá-los investigando o conteúdo dos relatórios anuais e Formulários de Referência. Para isso, separamos as companhias em três grupos: aquelas com presidentes do conselho “muito poderosos” e “fortes” (respectivamente, grupos A e B) e as com CEOs “poderosos” (grupo C).

Comparamos, depois, os relatórios anuais dos grupos A e C. Mais uma vez, os resultados se mostraram interessantes, corroborando os obtidos inicialmente: os presidentes do conselho classificados como “muito poderosos” recebem remunerações maiores, são mais citados nos documentos, assinam a “mensagem aos acionistas” com maior frequência e têm mais fotos suas publicadas nos relatórios. Em alguns casos, como nos de Marcopolo e Bardella, a maior remuneração paga ao conselho se mostrou superior à maior paga à diretoria, sugerindo uma remuneração do presidente do conselho superior à do diretor-presidente.

A análise obviamente possui suas limitações. Em empresas de controle compartilhado, por exemplo, têm-se em geral representantes de diferentes acionistas controladores no conselho. Pode haver, inclusive, outras pessoas muito poderosas que não atuam necessariamente como presidente do conselho ou CEO. Por outro lado, os resultados fazem especial sentido quando analisamos as companhias que fizeram IPOs nos últimos anos. Em muitos casos, famílias controladoras aceitaram restringir sua presença no conselho, contratando executivos de mercado como forma de sinalizar a adoção de boas práticas de governança. Em outros, fundos de private equity se tornaram controladores, alçando o sócio principal ao cargo de presidente do conselho e executivos sem grande poder de barganha à posição de CEO.

Os resultados possuem implicações para diferentes públicos. Para acadêmicos, a pesquisa deixa claro que a mera extrapolação de metodologias aplicadas no mercado norte-americano pode ser extremamente problemática, tendo-se em vista as diferenças substanciais nos modelos de governança. Para praticantes de mercado e reguladores, o estudo deve levar a uma reflexão sobre o processo decisório das companhias brasileiras, com potencial impacto sobre as práticas de governança a serem recomendadas e sobre novas regulações.


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