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Pronto para comprar – Edemir Pinto
Os passos do presidente da BM&FBovespa para transformá-la em uma bolsa de valores global

, Pronto para comprar – Edemir Pinto, Capital AbertoEle não vê a hora de dar o primeiro bote. E sua expectativa é fazê-lo nos próximos 90 dias. Comprar uma bolsa será, para Edemir Pinto, presidente da BM&FBovespa, a consagração da parceira com o CME Group, controlador da Chicago Mercantile Exchange, fortalecida no mês passado. A Bolsa brasileira ampliou sua participação no conglomerado norte-americano de 1,5% para 5%, tornando-se o seu maior acionista individual, a partir de um projeto que está cristalino na cabeça de Edemir. De braços dados com a norte-americana — “como um casal”, compara — vai prospectar bolsas de países em desenvolvimento. Já que várias delas apresentam barreiras para aquisições superiores a 20% do capital (as tais poison pills), a tática será a Bolsa comprar 20% e a CME, outros 20%. Conquistarão, assim, o controle acionário de bolsas sem precisar comprá-lo. E fincarão suas bandeiras no mapa-múndi globalizado dos mercados de capitais, em que, dizem as apostas, haverá espaço para poucos, muito poucos. Quantos? “Difícil cravar um número, mas algo entre quatro e oito grandes centros de liquidez regionais”, afirma Edemir.

O CEO conta que já tem um alvo. Não o revela, infelizmente, para uma jornalista. Sua preferência é pela Ásia — “Lá tudo interessa, o povo está louco para investir”—, mas não é exatamente ali que o casal de bolsas começará seu ambicioso plano de aquisições. Também não é nos mercados desenvolvidos (“Eles já estão superconcorridos”), tampouco na América Latina, onde a estratégia , Pronto para comprar – Edemir Pinto, Capital Abertode expansão é outra, por meio de parcerias (“Vai demorar muito tempo para que eles tenham um volume que justifique comprá-los”). Tirando as incipientes opções do Oriente Médio, sobram África e Leste Europeu. “É isso Edemir, vocês vão comprar na África?”. Ele desconversa. Afoito para mudar de assunto, confirma, apenas com um “sim”, que o alvo é uma bolsa mista — com ações e derivativos — e dotada de poison pill. Ponto, sem mais dicas.

Até que dar um bote na África não parece má ideia. Líder no continente, integrada (possui a sua câmara de liquidação, mesmo modelo da BM&FBovespa), 18º no ranking mundial (por capitalização das empresas listadas) e parceira de negócios da CME, a Bolsa de Johannesburgo, na África do Sul, é mista e tem uma base acionária fortemente pulverizada. De acordo com o seu website, o maior acionista da Johannesburg Stock Exchange (JSE), o Standard Bank of South Africa, detém 7,2% do capital. Com apenas 410 companhias listadas, está barata em relação à cotação que atingiu em 2007.

Mas de concreto, por enquanto, o aumento de participação da BM&FBovespa na parceira norte-americana significa duas coisas: um investimento de US$ 620 milhões e um conselheiro da Bolsa brasileira sentado no conselho de administração do CME Group para decidir junto os próximos rumos. O acordo prevê também o desenvolvimento de uma nova plataforma de negociação multimercado que será de propriedade das duas bolsas e poderá ser explorada comercialmente por ambas. Com tempo de processamento dos negócios inferior a um milissegundo, o sistema servirá aos mercados de ações, derivativos, câmbio, títulos privados de renda fixa e títulos públicos. “Eu tenho a inteligência do Globex (o sistema da CME) na minha mão e com ele posso fazer qualquer coisa. E a CME só aceitou fazer isso porque agora somos sócios deles, com 5%.”

“LIGHT” POOLS — De posse dessa tecnologia, o presidente da Bolsa vai trazer para o Brasil uma versão iluminada das polêmicas “dark pools”— as plataformas alternativas que pipocaram nos Estados Unidos nos últimos anos e têm sido criticadas por sua falta de transparência. Elas levam esse nome por permitir que investidores transacionem grandes lotes de ações sem serem identificados e sem impactarem o preço do papel nos mercados tradicionais. Na versão tropicalizada de Edemir, essa plataforma será um ambiente alternativo, na forma de um balcão organizado, mas dentro da Bolsa. Não terá o anonimato — “já que isso contrariaria o espírito de transparência da própria Bolsa” —, porém permitirá que grandes fundos de pensão, por exemplo, desfaçam-se de uma posição acionária relevante sem prejudicar o mercado. “Vamos criar uma barreira para quem quiser ocupar esse nicho no Brasil”, afirma Edemir. Mas esse espaço não continuaria desocupado, já que a dark pool da BM&FBovespa não será às escuras? “É verdade. Mas se vier gente de fora criar isso aqui, lembre-se de que não terão a clearing, o que vai complicar muito a vida deles.”

RESERVA DE MERCADO —Ter sob controle a única câmara de liquidação do País é o seu grande trunfo para afastar a concorrência no ambiente interno. Quem quiser desbravar o promissor mercado secundário de ações e títulos do Brasil terá antes que conversar com a BM&FBovespa para usar os serviços da sua clearing. Esse player poderia até pensar em montar uma câmara, mas isso consumiria muito tempo e um investimento respeitável. Para Edemir, a concorrência que importa está no exterior, e é com a obstinação de vencê-la que ele trabalha. “A China vai ser maior do que o nosso país em muita coisa, mas no segmento de bolsa eles não vão ser, não”, crava o CEO. Em uma folha de papel, ele escreve em letras garrafais que a companhia BM&FBovespa é hoje a terceira mais valiosa do mundo dentre as bolsas de valores listadas, atrás apenas da parceira CME e da desafiante Bolsa de Hong Kong. “Seremos a segunda do mundo em janeiro de 2012”, promete.

VAREJO INTERNACIONAL — Mover-se mais rápido que China e Índia é a obsessão de Edemir. E crescer em número de investidores e de companhias listadas lhe parece o mais simples e certeiro caminho para isso. Sua meta é sair dos atuais 556 mil aplicadores pessoas físicas, registrados em janeiro, para 5 milhões em cinco anos. Mais investidores atraem um maior número de empresas, o que leva ao seu outro objetivo agressivo: atingir 1,5 mil companhias listadas em dez anos, praticamente três vezes mais que o número atual.

Multiplicar por dez a atual base de investidores significa buscá-los aqui e lá fora. Internamente, o plano é manter todos os programas de popularização criados pela antiga Bovespa e adicionar ações em televisão — além da programação que a Bolsa já tem nos canais Cultura e Futura, ele quer espaço na Globo e na Record — e em internet, com simuladores avançados de operações com ações. Até programa de milhagem está na pauta para fidelizar os investidores que forem angariados. No plano externo, a palavra-chave é tecnologia. “Vai ser tudo automático”, descreve Edemir. “A velhinha que investe nos Estados Unidos vai comprar Petro e Vale do terminal dela, sem precisar fazer o cálculo do câmbio.”

O projeto é ambicioso e faz brilhar os olhos de Edemir. Até o fim do ano, ele promete desenvolver uma tela de negociação, chamada por ele de “livro de oferta em dólar”, que será amigável à pessoa física de qualquer lugar do mundo e virá com a operação de câmbio fechada. Como esse investidor entrará no Brasil? O CEO garante que isso não será problema. Todos entrarão com um número de CPF e sem ferir a Resolução 2.689 do Banco Central, que estabelece uma série de exigências para não residentes investirem no Brasil. “Estamos negociando os ajustes necessários com o BC, e nossa proposta está sendo muito bem recebida.”

Solucionados a tecnologia e o ingresso no País, Edemir quer fazer sua supertela ganhar o mundo, por meio de uma ramificada rede de distribuição: os 110 mil terminais da CME nos cinco continentes, além dos terminais Bloomberg, Reuters e o acordo de roteamento de ordens feito com a Nasdaq no fim do ano passado. “Vamos espalhar a Bolsa feito capim ‘margoso’”, comenta, referindo-se à erva amargosa que costumava ver brotar em sua terra natal, a cidade de São José do Rio Preto (SP). A gramínea, aliás, vem frequentemente lhe servindo de referência visual para representar a rapidez com que ele sonha ver a BM&FBovespa expandir pelo mundo.

BRAIN PARA O HEMISFÉRIO SUL — Para crescer com tamanha envergadura, Edemir tem consciência de que seus planos devem ir além da Bolsa. É preciso ganhar espaço no cenário político. Por isso ele trabalha, há mais de um ano, em parceria com a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) e a federação dos bancos, a Febraban, em um projeto para tornar o Brasil um centro financeiro regional. Atraindo as empresas da América do Sul e, depois, da África, para emitirem títulos e ações no País, “seremos como Londres para a Europa, Wall Street para a América e Hong Kong para a Ásia”, sentencia.

A princípio chamado de Ômega e agora oficialmente batizado de Brain (Brasil, Investimento e Negócios), o plano será lançado no dia 25 de março, em São Paulo, com a presença do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. “O aumento do turismo de negócios vai representar crescimento nas áreas de lazer, comércio e infraestrutura, como acontece em Londres. Trata-se de um projeto de política pública.” No lançamento, os autores do Brain vão apresentar a entidade constituída para pilotá-lo, ao lado da Boston Consulting Group, da agência de propaganda Lew Lara e de uma empresa de recursos humanos — todos contratados para ajudar a colocar o projeto de pé. Segundo Edemir, eles estão atrás de outros parceiros, porque “será preciso muito dinheiro” para fazer o Brain acontecer. Já conseguiram atrair a Cetip e agora procuram convencer as federações das indústrias dos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro (Fiesp e Firjan).

UM INIMIGO CHAMADO ADR — A fissura do presidente da Bolsa por expansão internacional encontra um inimigo que ele não esconde odiar: os recibos de depósito de ações negociados nos Estados Unidos, os ADRs. “Não entra na minha cabeça como o Banco do Brasil pode estar fazendo uma coisa dessas. Isso depõe contra o País”, reclama Edemir, referindo-se ao lançamento do programa de ADRs nível 1 do BB em dezembro passado. Para ele, o País já atrai boa parte da visibilidade externa que os emissores almejam quando lançam ADRs, e a tendência é que isso cresça cada vez mais. O único argumento em defesa da emissão de ADR que o CEO da Bolsa reconhece é o interesse em atrair o varejo internacional. “Quando o Roger (Agnelli, presidente da Vale) me disse que emitiria ADRs por essa razão eu disse: ‘tá bom, tá certo. Pode ir’.” Mas Edemir está confiante de que seu projeto “capim margoso” vai logo aniquilar esse argumento. E já está arrumando mais uma carta para ter na manga: vai negociar com a Bolsa de Hong Kong um acordo para que as ações das companhias listadas na BM&FBovespa possam ser transacionadas lá enquanto nós dormimos aqui. “Ofereceremos 24 horas de pregão para as nossas empresas, sem cobrar nada a mais por isso”, promete.

Edemir não perde a oportunidade de puxar o tapete dos bancos depositários de ADRs. Ano passado, quando aumentou as taxas de custódia da Bolsa, isentou da nova tabela os estrangeiros que investissem direto no Brasil. Os bancos depositários, portanto, que antes nem repassavam o custo irrisório da custódia aos seus investidores de ADRs, teriam agora uma enorme despesa extra. Estimou-se na época que os três maiores depositários juntos (Bank of New York Mellon, Citibank e J.P. Morgan) viriam a ter uma conta de R$ 9 milhões. Se repassassem esse custo aos investidores, seus ADRs poderiam tornar-se menos atrativos do que uma negociação direta no Brasil — exatamente o que Edemir queria. Os depositários, entretanto, defenderam-se cancelando o contrato com a CBLC e aderindo aos serviços de custódia oferecidos pelos grandes bancos. Valeu a pena aumentar tanto as taxas de custódia, Edemir? “Não, não valeu”, conforma-se o CEO.

DESAFIO DE MUDAR — A alteração nas taxas de custódia causou-lhe muitos problemas. Não pela revolta dos depositários — afinal, ele não morre de amores pelos ADRs mesmo —, mas pelo impacto que a medida teve no mercado. “Nos comunicamos muito mal naquela época”, admite. Era uma manobra difícil. No papel de uma empresa sem fins lucrativos e monopolista, a Bovespa nunca se preocupou em ganhar dinheiro com a atividade de custódia. Concentrava toda a carga nos custos de transação, que não por acaso ganharam fama de estratosféricos em comparação com o resto do mundo. Quando se desmutualizou e encarou um mercado exposto à concorrência após a Instrução 461 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), viu que sua tabela de preços não se sustentava. Era premente atribuir preço a cada serviço prestado, tanto para tornar os custos de transação mais competitivos como para ter valor nos serviços da Câmara Brasileira de Liquidação e Custódia (CBLC), que agora poderia ser usada até por um concorrente.

Só que a distorção era violenta, assim como foi a tentativa de corrigi-la. A Previ, por exemplo, maior investidor institucional brasileiro, com R$ 90 bilhões em renda variável, pagava R$ 84 por ano em taxa de manutenção, o mesmo valor de uma pessoa física. Quando viu que passaria a desembolsar cerca de R$ 1,6 milhão, não teve dúvida: migrou parte de suas posições para um agente custodiante (no caso, o próprio BB). Edemir negociou, negociou e conseguiu trazer a Previ de volta para a CBLC. Reduziu os preços, chegando à metade do que tinha proposto inicialmente. “A Bolsa vai bem, o Ibovespa praticamente dobrou em número de pontos, e isso me deu conforto para renegociar.” Ele quer divulgar uma nova tabela, ainda mais reduzida, a partir de junho. “Vamos fazer uma média dos valores cobrados e realinhar tudo. Não tenho o menor interesse de ganhar dinheiro com custódia no curto prazo, apenas de redistribuir a receita da Bolsa.”

REPENSANDO A AUTORREGULAÇÃO — Adaptar a BM&FBovespa ao papel de uma companhia com propósitos comerciais não é fácil, nem mesmo quando o assunto é autorregulação. Regular companhias abertas e, ao mesmo tempo, ser uma delas é um conflito delicado. Por isso Edemir entende que a Bolsa deverá reduzir o seu papel de autorreguladora das práticas de governança do mercado. “A Bolsa não pode mais continuar com todas essas regras. Muitas delas agora têm de entrar na Lei das S.As. ou na regulamentação da CVM”, conclui, referindo-se às normas dos segmentos diferenciados de governança. “Vamos sentar para conversar com a CVM e ver o que podemos tirar daqui.”

Essa é uma ideia para o futuro. Sua prioridade agora é aprovar a reforma do Novo Mercado, que está em curso. O futuro, no entanto, é o que move este CEO. Após mais de duas décadas de trabalho — Edemir entrou para a BM&F no fim de 1985 —, ele foi o escolhido para tocar a Bolsa que nasceria da fusão das quase inimigas Bovespa e BM&F com a vocação de ganhar o mundo. Com seu entusiasmo e sua paixão pela ideia, ele convence de que é capaz de cumprir a missão.


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