Precisa-se de informação
Companhias correm atrás dos dados necessários ao preenchimento do novo IAN

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Quem participou da mais recente oferta de ações da PDG Realty teve a chance de avaliar informações até há pouco desconhecidas pelos investidores. Um exemplo é a remuneração fixa (salário ou pró-labore) reservada aos diretores executivos da companhia. Estimada, em 2009, em R$ 2,1 bilhões, é 46% superior aos pagamentos do ano anterior, que somaram R$ 1,4 bilhão. Na Inpar, cada diretor executivo recebeu, em média, R$ 62,2 mil mensais em 2009, sem remuneração variável — incentivo que a empresa não oferece, mas adotará nos próximos meses. Os investidores souberam ainda que a análise de sensibilidade das aplicações em derivativos cambiais da MRV Engenharia mostrou uma estimativa de ganhos de R$ 166 mil nos três cenários projetados.

Isoladas, essas informações podem não embasar uma decisão de investimento. Mas, somadas a muitos outros dados que as companhias abertas passam a divulgar a partir deste ano, formam um retrato inédito do patamar de transparência alcançado pelo mercado de capitais brasileiro. Elas compõem o novo modelo de informativo anual (IAN) criado pela Instrução 480 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), agora chamado de Formulário de Referência (veja o suplemento especial nesta edição).

Alguns formulários — como os das empresas citadas acima — circulam no mercado em razão de ofertas de ações que essas companhias realizaram. Para quem não tem uma oferta a caminho, o prazo de divulgação termina no fim de maio. O trabalho de preparação segue acelerado. Todos perceberam que não será nada simples fornecer ao mercado, de forma contínua, um nível de transparência tão superior ao que se tinha até então. “Cada linha do formulário representará um bom problema para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) nos próximos anos”, avaliou Paulo Aragão, sócio do Barbosa, Müssnich & Aragão, durante um seminário sobre a nova regra promovido pelo escritório.

“Cada linha do formulário representará um bom problema para a CVM nos próximos anos”

A Totvs trabalha desde o início do ano para ingressar nesse novo mundo de informações. Às áreas jurídica e de relações com investidores (RI), tradicionalmente envolvidas na preparação dos informes anuais, juntaram-se os funcionários da controladoria e do planejamento. O time ganhou ainda o reforço dos dois escritórios de advocacia que atendem a companhia e vão ajudar na confecção do formulário. Uma vez entregue a primeira edição do documento, as empresas terão de preparar as áreas detentoras das informações para mantê-las atualizadas. Há demanda por informações de departamentos que, antes, não forneciam esse tipo de dado.

“Um exemplo é a seção que pede a descrição das áreas de negócios”, comenta José Rogério Luiz, diretor de RI da Totvs. O executivo se refere ao item 7 do formulário, que inova ao exigir a descrição detalhada de todos os segmentos operacionais divulgados nas últimas demonstrações financeiras. São solicitadas desde informações como produtos e serviços comercializados por segmento, receita gerada e sua participação no faturamento total, até a identificação de clientes responsáveis por mais de 10% da receita e a sinalização de eventual dependência de um número limitado de fornecedores. “O formulário de referência representa um avanço significativo (no padrão de disclosure) e mais tranquilidade para o mercado”, declara Luiz, que prevê a divulgação do documento da Totvs para o mês de abril.

MAIS QUE UM PROSPECTO — A comparação com os prospectos de uma oferta pública, regulados pela Instrução 400, de 2003, é inevitável. Até a chegada do formulário de referência, era o prospecto o documento mais avançado no quesito transparência — tanto que sempre foi cercado de cuidados dos advogados da companhia ofertante e dos consultores legais do banco coordenador. Agora, até o prospecto passará por modificações e se adequará à Instrução 480, após alguns ajustes na Instrução 400. Prevista para o fim de março, a nova versão da norma permitirá que os prospectos contenham apenas os dados específicos sobre a oferta e incorporem, por meio de referências, o formulário, evitando duplicidade nas informações sobre o emissor e acelerando o processo de análise da operação.

Para José Luiz Homem de Mello, sócio do Pinheiro Neto Advogados, algumas seções, como as de remuneração dos administradores, comentários dos diretores e riscos de mercado, prometem ser mais trabalhosas. Os escritórios de advocacia e as empresas de consultoria estão animados com a demanda gerada pela instrução. Mello conta que enviou vários orçamentos para auxiliar no preenchimento do formulário de referência. Frederico Costa, da MZ Marketing Inteligence, diz que foi consultado por algumas das áreas internas que fornecerão informações para o formulário.

Para sanar os inúmeros questionamentos, a CVM, além de participar de eventos que visam a discutir a regra, trabalha na emissão de ofícios circulares. O primeiro, com orientações gerais sobre a norma, foi emitido em janeiro. O segundo, específico sobre o preenchimento do formulário, será publicado na primeira quinzena de fevereiro, conforme informou a superintendência de relações com empresas (SEP), a área da autarquia responsável pela análise periódica do documento. A SEP cogita a elaboração de ofícios adicionais, à medida que novas questões aparecerem.

EDUCAR EM VEZ DE PUNIR — Companhias e advogados questionam cada item do formulário para não correrem o risco de receber um puxão de orelhas da CVM. Mas o regulador promete ser compreensivo. “Evitaremos começar direto com ações punitivas”, tranquilizou Maria Helena Santana, presidente da CVM, durante seminário sobre a instrução. O compromisso inicial da autarquia é educacional, e o nível de exigência poderá avançar com o tempo. No entanto, cabe um alerta.Não receber nenhum pedido de complementação do formulário não significa que a CVM esteja totalmente satisfeita com o documento entregue. A análise seguirá os critérios da supervisão baseada em risco (SBR), ou seja, quanto mais exposta ao mercado, mais atenção a companhia receberá do regulador ao seu formulário. Outra possibilidade é a análise temática. Ou seja, a CVM poderá escolher um determinado capítulo e analisá-lo em todas as empresas. Caso necessário, solicitará dados complementares, o que também não deverá ser entendido como um sinal de aprovação das demais seções.

Para as companhias que pretendem captar recursos faltam algumas definições, especialmente quanto ao convênio firmado entre a CVM e a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Graças ao acordo, as ofertas protocoladas para análise na associação ganham agilidade. No entanto, a Instrução 480, somada à reforma da Instrução 400, permitirá a análise mais rápida dos pedidos, o que cria um ponto de interrogação sobre a capacidade de redução adicional do tempo de análise das ofertas. Acabar com o convênio ou deixá-lo morrer por uma eventual falta de atratividade não é interesse da CVM. Segundo a autarquia, a viabilidade de prazos mais enxutos será avaliada nas próximas semanas, após o lançamento da nova regra sobre ofertas.

Dúvidas à parte, a expectativa é que o formulário de referência traga um conjunto amplo e periódico de dados sobre as companhias abertas. Espera-se também uma melhoria da qualidade das informações, principalmente por iniciativa das empresas que não possuem as políticas de governança corporativa agora exigidas pela instrução, avalia Valter Faria, da CorpBrasil, consultoria especializada em governança e sustentabilidade.

Mas nem todas as companhias abertas embarcarão nessa proposta. Empresas menos interessadas em captar recursos no mercado de capitais poderão deixar a categoria A, mais exigente em informação, segundo a 480, e migrar para o grupo B, menos exigente e aplicável apenas às companhias que não emitem ações. Segundo advogados, já há consultas de companhias de baixo free float que consideram essa possibilidade. A migração, no entanto, pode pesar no bolso. Para sair da categoria A, é preciso cumprir a Instrução 361, que trata dos procedimentos aplicáveis às ofertas públicas de aquisição de ações (OPA). Ou seja, a companhia escapa de um formulário de referência complexo, mas não sem antes cumprir suas últimas obrigações como empresa de capital aberto.


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