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Pedro Malan – Global e sem rivais
“A colaboração em andamento entre o Iasb e o norte-americano Fasb prognostica uma adoção do IFRS, pelos Estados Unidos, nos próximos anos”
, Pedro Malan – Global e sem rivais, Capital Aberto
Ormuzd Alves/Folha Imagem

Ele foi convidado para a empreitada e topou encarar. O ex-ministro da Fazenda Pedro Malan substituiu o ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) Roberto Teixeira da Costa como curador do Iasc Foundation, organismo que regula o International Accounting Standards Board (Iasb), órgão encarregado de difundir as normas internacionais de contabilidade (IFRS) nos quatro cantos do planeta. Na entrevista abaixo, concedida ao Iasb e reproduzida com exclusividade pela CAPITAL ABERTO, Malan frisa que “em tarefas complexas como essa não há espaço para complacência”. E observa que o crucial, neste momento, é assegurar a convergência entre o US Gaap e o padrão internacional, “encarando o IFRS como o conjunto global e sem rivais de normas contábeis no futuro próximo”. Está lançado o desafio.

O que o motivou a se tornar um trustee do International Accounting Standards Board?
Duas coisas. Primeiramente, minha convicção de que a economia internacional precisa — e vai se beneficiar enormemente — da adoção de um conjunto básico de normas contábeis que seja de alta qualidade, transparente e usada globalmente, permitindo a investidores comparar diferentes companhias, de jurisdições distintas, e a empresas acessar mercados de capitais internacionais a custos relativamente mais baixos. Em segundo lugar, o forte incentivo que recebi de personalidades-chave envolvidas neste esforço há muito tempo. Pessoas pelas quais tenho grande admiração, dos Estados Unidos e da Europa. E, principalmente, foi muito relevante para mim o estímulo daqueles que têm liderado o caminho para a adoção do IFRS no Brasil.

De que maneira o senhor espera contribuir?
Espero muito dar uma modesta contribuição para o avanço do processo, ajudando a assegurar uma adoção ainda mais ampla do IFRS, como proposto pelo Iasb, do que temos hoje, especialmente em países importantes da economia global.

Quais os seus planos como trustee do Iasb?
Trabalhar junto com meus colegas, os membros do conselho do Iasb, reguladores nacionais, profissionais e formadores de opinião pública da minha região (principalmente o Brasil, no momento) para fazer com que a marca IFRS e seus princípios sejam amplamente adotados na América Latina. No Brasil, o processo está bem avançado, com a legislação básica pronta e o Banco Central e a CVM à frente da regulamentação de normas específicas. Várias companhias brasileiras abertas já estão se preparando para uma adoção antecipada do IFRS, anterior aos prazos obrigatórios de 2009 (para bancos) e 2010 (para outras empresas).

Como o senhor avalia o caminho trilhado até agora para a adoção do IFRS em esfera global?
Tenho uma visão muito positiva do progresso alcançado nos primeiros anos deste século. A adoção do IFRS pela Europa foi um marco, apesar do carve out para a norma IAS 39 (sobre a contabilização de instrumentos financeiros a valor de mercado). Foi extraordinária a decisão da Securities and Exchange Commission (SEC) dos Estados Unidos de retirar a exigência de que demonstrações financeiras em IFRS de emissoras estrangeiras fossem conciliadas para o US Gaap. A colaboração em andamento entre o Iasb e o norte-americano Fasb prognostica uma adoção do IFRS, pelos Estados Unidos, nos próximos anos. Este processo de atrair os Estados Unidos, uma prioridade absoluta, é impulsionado pelo fato de países como Canadá, Brasil, Índia, Coréia do Sul, África do Sul e muitos outros terem decidido adotar o IFRS ou estarem caminhando nessa direção num futuro próximo. Os princípios contábeis japoneses e o IFRS terão feito a convergência, espera-se, em 2011. A China está se adiantando. Adota, desde 2007, uma série de normas contábeis com a intenção de produzir os mesmos resultados do IFRS. Em resumo, olhando para o futuro, acho que o Iasb e seus funcionários, o SAC (Standards Advisory Council), o Ifric (International Financial Reporting Interpretations Committee) e a Iasc (International Accounting Standards Committee) Foundation têm todas as razões para se orgulharem de suas conquistas e, delas, obter a energia para continuar a tocar o projeto com uma visão entusiasmada. Em tarefas complexas como essa, como sempre, não há espaço para complacência. Ainda temos um longo percurso a seguir, mas realizar o objetivo final que levou à criação do Iasb está claramente ao nosso alcance.

E o que está por vir?
Além de preservar o momento de avanço da adesão ao IFRS, conquistado ao longo dos últimos anos, prosseguir com o Processo de Revisão da Constituição (Constitution Review Process), que, eu espero, garantirá a integridade do IFRS, um conjunto sem rivais de padrões globais, e a consolidação da independência do Iasb. Ao mesmo tempo, os trustees deveriam ser capazes de mostrar para uma opinião pública mais abrangente, nacional, regional e internacional, que somos parte de uma organização de IFRS transparente e responsável — uma marca respeitada por sua especialização técnica, habilidade para forjar consensos ou convergências, e visão estratégica de seus conselhos e grupos de monitoramento.

Quais os impactos do IFRS para as empresas brasileiras?
Não vou falar sobre o processo que nos conduziu até agora, porque ele é conhecido dos nossos leitores. Mas acredito que a implementação do IFRS no Brasil será um grande diferencial para a estatura das firmas brasileiras nos mercados de capitais internacionais e entre investidores, analistas, auditores, agência de rating de crédito, acionistas e partes interessadas em geral. É importante notar que, promovendo esse processo, desde meados da década de 90 (quando o Brasil derrotou a hiperinflação com o plano de estabilização do real) até o feito de dezembro de 2007, estiveram pessoas profissionalmente competentes não só no governo, claro, — especialmente atuais e ex-diretores do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) —, mas também alguns dos melhores e mais brilhantes profissionais no campo da contabilidade e auditoria, que exerceram um papel fundamental. Tanto que o não-governamental Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) é tão respeitado tecnicamente que teve, e continuará a ter, uma influência significativa na regulamentação da legislação básica pela CVM e pelo Banco Central.

O senhor acredita que países como o Brasil estão suficientemente envolvidos no processo de conversão para o IFRS ou há espaço para melhora?
Tudo na vida tem espaço para melhora. Seria muito ingênuo se dissesse que o País como um todo está firmemente atrás do IFRS ou até que se sente envolvido o bastante. Mas tenho certeza que há, em círculos informados nos setores privado e público, um crescente reconhecimento da importância crítica de empresas brasileiras adotarem normas globais de alta qualidade baseadas em princípios que sejam transparentes e internacionalmente comparáveis. Mas há, sem dúvida, espaço para melhorias, no sentido de tornar essa visão mais difundida no Brasil e na América Latina.

A organização recebeu, recentemente, críticas por falta de transparência e vigilância. Elas são justificáveis?
Acabei de ser nomeado trustee da Iasc Foundation e, portanto, não sou a melhor pessoa para dar uma resposta completa para essa questão. Mas tenho lido uma quantidade enorme de material para os encontros de trustees de Roma e Londres de 2008, além dos encontros de 2007, quando estava decidindo se aceitaria o desafio, e das reuniões de 2008, das quais participei como observador. Baseado nisso, não acho que as críticas sejam inteiramente justificáveis. Deixe-me dizer por que, supondo que eu possa estar errado. Vi, em documentos submetidos aos trustees em 2007 (nos encontros de Madri e Nova York), algumas expressões de preocupação sobre o que foi chamado em um texto de “sub-representação de reguladores” no Advisory Nominating Group”, e portanto, “em seleções de trustees e membros do Iasb”. Essa é uma preocupação que está sendo dirigida, espero, com a composição do novo Grupo de Monitoramento, agora sob discussão no contexto da primeira Revisão Constitucional (Constitution Review), iniciada este ano. Dada a excelente qualidade dos outros trustees, tenho a impressão, pela riqueza de informações que recebemos do presidente do Iasb, David Tweedie, e do nosso diretor de operações, Tom Seidenstein, que nós, como trustees, temos todas as condições de exercer perfeitamente nossas responsabilidades de vigilância, auxiliados, de maneira apropriada, por um eficiente Grupo de Monitoramento com representantes de agências regulatórias e organizações interessadas e focados na eficiência e no sucesso do nosso trabalho.

Em que medida será importante a representação local de trustees e membros do conselho na organização?
Conforme nos aproximamos do estabelecimento do IFRS como o conjunto global de normas contábeis em uma base jamais antes alcançada, e os mercados emergentes aumentam seu peso nos mercados de capitais internacionais, o tema da representação deve ganhar mais força. Até porque, nossa constituição diz que “a mistura de trustees deve refletir amplamente os mercados de capitais do mundo e uma diversidade geográfica e de backgrounds profissionais”. Mas, para ser um mecanismo eficiente, o número total de trustees não deve ser muito maior que os atuais 22. Em relação à composição do Iasb, nossa constituição afirma clara e corretamente que “a seleção de membros do Iasb não deve ser baseada em critérios geográficos, mas os trustees devem garantir que o Iasb não seja dominado por nenhum eleitorado particular ou interesse geográfico. As principais qualificações para a associação ao Iasb devem ser competência profissional e experiência prática”. Estes deveriam permanecer como os critérios básicos, mesmo quando considerarmos, em certo ponto, aumentar a atual quantidade de membros de 14 (12 em período integral e 2 em meio período) para um número um pouco maior, com cerca de dois novos membros. O que espero realmente é que todos nós tenhamos consideração total pela relevância do anexo da nossa constituição (que eu considero parte integrante dela), chamado “Critérios para membros do Iasb”. Gosto muito da clareza dos oito critérios, incluindo a referência, no critério número 5, ao fato de “os membros do Iasb deverem ter entendimento sobre o ambiente econômico global em que o Iasb opera”. O que disse acima sobre trustees e membros do Iasb também se aplica ao Ifric e, especialmente, à associação ao SAC, onde a representação geográfica extensa é muito importante.

O senhor acredita que haja um temor de dominação norte-americana e européia na organização?
Neste momento, acho que deveríamos nos concentrar e preocupar com as prioridades mais urgentes do Iasc e do Iasb. Entre elas, é crucial assegurar a convergência entre o US Gaap e o IFRS, encarando o IFRS como o conjunto global e sem rivais de normas contábeis no futuro próximo — e usado por um número cada vez maior de jurisdições. Preocupações com a “dominância” ou “preponderância” de certos países ou regiões poderiam ser reduzidas com transparência, prestação de contas e a disposição para considerar o aumento do número de membros (como poderemos fazer no caso do Iasb na próxima revisão da constituição). E acredito que a composição do Ifric e do SAC poderia e deveria ser usada para amenizar alguns dos medos e preocupações em torno do balanço geográfico, desde que competência técnica e experiência sejam preservados como critérios fundamentais para a elegibilidade. Este é um processo vivo e em evolução. Deveríamos nos preocupar, no momento, com canais fluidos e abertos de comunicação com todos os stakeholder legítimos, e com a integridade do processo. Deve haver espaço, por exemplo, para interessados se expressarem em audiências públicas, respondendo ou eventualmente criticando os “drafts” e propostas de emendas regularmente emitidas pelo Iasb. Há muitas formas de participação. Quanto mais efetivamente elas são conhecidas e usadas, menores serão os medos de predomínio de um país ou região.


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