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Pedra no caminho
Dirigentes de fundos de pensão e gestores de private equity duelam sobre a exigência de participação nos comitês de investimento

 

O mercado de private equity surgiu na segunda metade da década de 90, protagonizou algumas experiências desastrosas, mas ressurgiu em 2004 com a promessa de abocanhar, de maneira crescente, investimentos de longo prazo. A queda dos juros é hoje um de seus principais aliados. Para cumprir as metas atuariais, a tendência é que os fundos de pensão, principais investidores institucionais brasileiros, direcionem cada vez mais recursos para o segmento de ativos alternativos, no qual se incluem os fundos de private equity. No entanto, parece haver uma pedra no caminho.

De um lado estão as fundações, que exigem algumas “garantias” para alocar seus recursos em private equity, entre elas a aquisição de um assento no comitê de investimento do fundo. De outro, os investidores estrangeiros, importantes clientes desses fundos, que se mostram reticentes à idéia de aplicar em carteiras nas quais o cotista tenha participação ativa nas decisões do gestor.

A adoção de comitês, principalmente no mercado local, tem sido considerada uma boa prática de governança corporativa, por ampliar a troca de informações entre o gestor e os detentores do capital. No entanto, a medida caiu em desuso no mercado internacional, mais amadurecido e com um princípio mais enraizado de que competência, confiança e alinhamento de interesses são as peças-chave para a contratação de um gestor. Nos Estados Unidos, por exemplo, os regulamentos são mais detalhados no que diz respeito às possibilidades de investimento — o que aproxima as figuras do gestor e do aplicador durante a formatação do fundo, afastando-as na fase seguinte, quando são escolhidos os tipos de empreendimentos que receberão recursos. Além disso, a estrutura das entidades de previdência complementar é distinta, pois em geral privilegia a manutenção de estrategistas terceirizados, e não de equipes completas de análise, como ocorre aqui.

“No Brasil, tivemos algumas experiências ruins, e o remédio utilizado pelos investidores foi errado, porque não se concentrou na seleção do gestor e nas garantias para que ele atue conforme contratado. Aqui, exige-se a participação nos comitês, mas os fundos de pensão não têm condições de fazer a análise desses investimentos”, explica Patrice Etlin, diretor da Advent Internacional. Esse modelo, afirma Etlin, inviabiliza a captação de recursos estrangeiros pelos gestores locais. Ou, nos casos em que o gestor preferir os estrangeiros aos fundos de pensão locais, restringe para estes últimos o leque de aplicações em private equity.

APRENDIZADO — O presidente da Associação Brasileira de Private Equity & Venture Capital (ABVCAP), Marcus Regueira, contesta o argumento de Etlin. “Prefiro não me deter à perda de recursos, até porque outras variáveis decidem o destino do capital estrangeiro, como a atratividade dos países que formam o grupo dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China). Além disso, o lado positivo desse modelo tem sido mais relevante para o momento atual do nosso mercado.”

Os fundos de pensão reconhecem que a estrutura em vigor pode não ser a melhor, mas enfatizam que ela se justifica. O primeiro ponto a ser observado é a incipiência do setor. O primeiro ciclo de investimentos em ativos alternativos começou na segunda metade dos anos 90, mas culminou em uma série de problemas e desavenças entre gestores e seus investidores. Somente agora, portanto, o Brasil passa do primeiro ciclo de private equity e começa a alocar nos ativos de uma segunda geração.

Quando a discussão recai sobre a falta de cultura em investimentos alternativos, até os gestores desses ativos entendem, ao menos parcialmente, o ponto de vista das fundações. “A possibilidade de aplicar em um fundo com horizonte de longo prazo e sem chances de resgate até a maturação do investimento ainda não está embutida na gestão de ativos no Brasil”, observa Álvaro Gonçalves, sócio da Stratus, uma gestora de fundos private equity.

Os dirigentes de fundos de pensão defendem um pouco mais de maleabilidade para lidar com esse quadro. Ricardo Malavazzi, diretor de investimentos da Petros, fundo dos funcionários da Petrobras, avalia que pode estar faltando mais compreensão por parte dos cotistas estrangeiros que não se conformam com a participação dos investidores locais nos comitês dos fundos. “Se não fosse desta maneira, é provável que a retomada do setor nem estivesse acontecendo.” Segundo ele, estamos passando por um período de transição que deve demorar de cinco a dez anos para acabar — por conta do tempo de maturação dos aportes realizados —, mas que depende dos resultados concretos a serem obtidos com o investimento.

DO JEITO QUE DÁ — As exigências adicionais feitas pelos fundos de pensão visam justamente convencer seus respectivos conselhos de administração a aprovar investimentos no segmento de ativos alternativos. “Além da participação no comitê, precisamos ter o poder de destituir sem justa causa o gestor. São medidas não usuais em mercados amadurecidos, mas fundamentais para que possamos investir”, conta Demósthenes Marques, diretor financeiro da Funcef. O fundo dos funcionários da Caixa Econômica Federal foi um dos que, no final da década de 90, teve divergências com os gestores contratados no segmento de private equity. Em síntese, a fundação alega que os mandatos concedidos não foram obedecidos no que diz respeito, por exemplo, ao prazo de maturação do investimento.

A possibilidade de aplicar num fundo com horizonte de longo prazo e sem chances de resgate até a maturação do investimento ainda não está embutida na gestão de ativos no Brasil

Já o diretor de investimentos do fundo de funcionários da Vale do Rio Doce, a Valia, Manoel Cordeiro, é enfático ao afirmar que o estrangeiro precisa ter consciência de que estamos em estágios diferentes de maturação do mercado. “Na Europa e nos Estados Unidos, os detentores do capital também participaram on-board do processo no ciclo inicial.” Valia elabora atualmente um balanço de todo o seu primeiro ciclo de investimentos em private equity. O documento deverá ficar pronto em junho e terá como objetivo avaliar o retorno obtido e o número de empresas que foram a mercado por meio de um IPO.

Em comum, fundos de pensão e de private equity têm a percepção de que o tempo se encarregará da aproximação dos modelos brasileiro e internacional. Alguns fatores podem, inclusive, acelerar esse processo. A redução da taxa básica de juros e a conseqüente necessidade dos fundos de pensão em aumentar a diversificação para cumprir as metas atuariais é um deles. Quando essas entidades decidirem ampliar a destinação de recursos para ativos alternativos, a exigência de participação nos comitês poderá ser um limitador. “Se uma fundação que conta hoje com sete fundos de private equity passar a ter 30, a presença na gestão poderá ser um obstáculo. A tendência é que, ao longo do tempo, com o aumento da confiança, os fundos de pensão passem a abrir mão desse modelo”, esclarece Gonçalves, que, com a experiência na Stratus, diz nunca ter registrado problemas por conta dos comitês. “Não seguimos o modelo internacional, e isso nos deixa fora da rota de alguns dos maiores aplicadores estrangeiros”, conta. Ao contrário, Gonçalves faz questão de frisar que os fundos de pensão, por causa de sua participação ativa na economia, apenas somaram às discussões. É um dilema para o qual o Brasil ainda precisará definir o melhor caminho.


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