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O que virá com Dilma?
Necessidade de financiamento de longo prazo e abertura para novas quedas dos juros fazem o mercado vislumbrar quatro bons anos para o mercado de capitais

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Com exploração do pré-sal, Olimpíada e Copa do Mundo pela frente, o Brasil vai precisar de dinheiro. Muito dinheiro. Estão previstos investimentos de R$ 1,5 trilhão em projetos de infraestrutura na próxima década — o montante total dos programas PAC1 e PAC2, concebidos pelo governo lula e que serão continuados pela presidente eleita Dilma Rousseff. Para financiar a empreitada, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vem sendo devidamente vitaminado. Recebeu nada menos que R$ 200 bilhões em aporte do Tesouro Nacional nos últimos dois anos. Só entre janeiro e outubro de 2010, o banco desembolsou R$ 116 bilhões, 43% a mais que no mesmo período do ano anterior. Mas o crescimento ambicioso que se impõe sobre o governo Dilma não deixa dúvidas: será preciso criar alternativas de financiamento além dessa mina de dinheiro público. É com essa certeza que os defensores do mercado de capitais sustentam uma visão otimista para os próximos quatro anos.

“As oportunidades são muito grandes, e os mecanismos de redução de custo de capital e formação de poupança via mercado de capitais serão essenciais”, diz o coordenador do Plano Diretor do Mercado de Capitais, Thomás Tosta de Sá, também sócio-diretor da Mercatto Gestão de Recursos. Na sua agenda com as entidades que compõem o Plano Diretor, está a expectativa de uma reunião, ainda em dezembro, com o secretário de acompanhamento econômico do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, e com a equipe de transição para discutir avanços. Suas propostas não estão completamente formalizadas, mas o documento entregue pelos organizadores do Plano Diretor aos candidatos durante o período eleitoral dá pistas do que será apresentado.

Além da continuidade das reformas estruturais, da redução dos juros e da carga tributária, um ponto essencial, de acordo com a proposta, é a instalação de um novo sistema previdenciário que contribua para a formação da poupança de longo prazo e aumente a participação dos trabalhadores na economia. Nesse modelo, uma parcela dos recursos recolhidos diretamente no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) poderia ser alocada no mercado de valores mobiliários, à luz do que já ocorre com as aplicações do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Assim, os trabalhadores teriam a liberdade de investir uma parte da sua previdência, que hoje fica integralmente nas mãos do governo, em bolsa de valores. “Nos Estados Unidos, na década de 1970, a poupança previdenciária respondia por 30% do PIB. Hoje, equivale a 100%. No Brasil, ela também pode ser uma alavanca importante”, observa Tosta de Sá. Aqui, esse percentual é inferior a 20% do PIB, segundo a consultoria Mercer.

Plano Diretor propõe que parte dos recursos do INSS seja alocada em valores mobiliários

Diante da necessidade de investimentos em infraestrutura, o governo sabe bem a importância de estimular o financiamento de longo prazo. E é por isso que representantes do BNDES, empresários, banqueiros de investimento e executivos da BM&FBovespa estão debruçados há meses sobre propostas para criar essa poupança. Espera-se que medidas sejam anunciadas ainda este ano ou no início do próximo governo. Um dos objetivos é fortalecer a emissão de títulos de longo prazo ligados a projetos de infraestrutura e estimular o mercado secundário.

“Mecanismos de financiamento de longo prazo são essenciais para que os projetos saiam, porque talvez só a China tenha melhores perspectivas que o Brasil no mundo”, afirma com entusiasmo o presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy. Em sua opinião, o governo deveria dar vantagens tributárias aos investidores que buscarem retorno ao longo dos 20, 30 anos dos projetos. Os bancos, por sua vez, poderiam criar fundos de investimento que aplicam somente em títulos e ações de projetos de infraestrutura específicos. “Alguns desses fundos poderiam, inclusive, chegar ao varejo”, acredita Godoy.

Para que o mercado de capitais participe ativamente do crescimento esperado nos quatro anos de gestão Dilma, é preciso também que as taxas de juros caiam. E essa é uma seara bem delicada. Uma das metas do novo governo é baixar a taxa de juros real, hoje na casa dos 5,5% ao ano, para 2%. Para isso, contudo, é preciso acertar as contas públicas, gastando menos. “Há duas maneiras de se reduzirem juros: por meio da canetada, como se fez na Argentina, ou com um ajuste fiscal, que é o modo correto”, ensina o economista-chefe do Banco Schahin e professor das Faculdades Oswaldo Cruz, Silvio Campos Neto. A presidente eleita tem afirmado que sua intenção é reduzir a dívida interna líquida para 30% do PIB até 2014. Atualmente, está em 41%. Mas o mercado vê essa promessa com desconfiança.

O governo Lula tem gasto muito mais do que arrecada. Segundo cálculos da equipe do economista-chefe do Banco Itaú, Ilan Goldfajn, em setembro, o saldo primário recorrente teria apontado um déficit de R$ 4 bilhões, enquanto na contabilidade oficial aplicaram-se os direitos de exploração de petróleo da União na Petrobras, gerando um superávit oficial de R$ 11 bilhões no setor público. Isso, no entanto, não impediu que a dívida bruta aumentasse R$ 23 bilhões no mês. “O governo teria de atuar para aumentar a eficiência da máquina pública e buscar um superávit primário de verdade de 4%”, explica o economista Paulo Galla, professor de macroeconomia da Fundação Getulio Vargas e consultor da Empiricus.

Embora reduzir juros seja uma questão complexa, os economistas apontam que há espaço para a taxa atual cair abaixo de 5% ao ano até 2014. De 1994 a 1999, a taxa de juros real ficou em 16% ao ano; entre 2000 a 2009, atingiu 9%; e, em 2010, ficou ao redor de 5,5%. A abundância de recursos externos no País valoriza a moeda doméstica e ajuda a controlar a inflação, já que o câmbio favorável às importações estimula a concorrência e segura os preços. O movimento abre espaço para uma política monetária mais flexível. “Há espaço para (o juro) cair mais, e isso pode provocar um forte crescimento da economia, da infraestrutura e da habitação”, ressalta Galla.

BOM PARA OS “ALTERNATIVOS” — O segmento de construção civil será um dos mais beneficiados se essa redução vier. Em 2008, o financiamento ao setor imobiliário representava 2,1% do PIB do País. Em 2010, deve chegar a 3,9% e, em 2014, a 14,7%, segundo dados do Bradesco. As classes C e D começaram a ingressar com força no financiamento. “Cerca de um terço do dinheiro concedido a pessoas físicas para compra de imóveis tem sido direcionado a quem recebe entre três a dez salários mínimos”, destaca o diretor da área imobiliária do Bradesco, Cláudio Borges.

Uma parte desse crescimento certamente passará pelo mercado de capitais. Hoje, as duas principais fontes de financiamento no setor são a poupança e o FGTS, e este último chega a representar 70% dos financiamentos de imóveis de baixa renda. “Não se pode ficar preso a recursos compulsórios”, considera Tosta de Sá. Há necessidade de diversificação de fontes para o setor imobiliário e de estímulos para o mercado de securitização com lastro imobiliário, que ainda é muito pequeno.

A oferta de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) registrados na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) entre janeiro e novembro somava pouco mais de R$ 2 bilhões, obtidos em total de 53 operações. Esse volume representava um quarto das emissões de fundos de direitos creditórios e metade das de cotas de fundos imobiliários. Outro título que pode ganhar impulso no próximo governo é o Certificado de Potencial Adicional de Construção (Cepac). A prefeitura do Rio de Janeiro tem apostado na emissão desses papéis para assegurar a construção do Porto Maravilha, uma obra de urbanização na zona portuária que pode movimentar mais de R$ 7 bilhões em investimentos até 2016.

Juros declinantes também favoreceriam a indústria de capital de risco. Nos Estados Unidos, 17,6% da receita anual corporativa é gerada por empresas que têm participações de fundos de venture capital. No Brasil, esse número ainda não foi calculado pelas entidades, porém sabe-se que é reduzido. “Estamos elaborando uma proposta para que os investidores anjos, que têm um prazo de investimento bem maior que os outros, tenham um tratamento tributário mais favorável do que o do investidor tradicional que aplica em ações”, revela o vice-presidente da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCap), Luiz Eugênio Figueiredo.

As propostas estão na mesa. Associá-las às necessidades de arrecadação do novo governo, entretanto, é uma outra história. Ainda assim, se as perspectivas de juros declinantes se confirmarem no governo Dilma, o mercado de capitais brasileiro já terá um ótimo motivo para comemorar.

Desconfiança pós-Petrobras persiste

As perspectivas de crescimento forte e de continuidade da queda dos juros animam os investidores para os quatro anos de gestão Dilma. Mas uma dúvida incômoda também paira no ar: terá o novo governo a mesma conduta do anterior em relação às companhias abertas estatais?

A capitalização da Petrobras manchou a imagem do governo atual no quesito governança corporativa. A forma como a União subscreveu o aumento de capital, reduzindo a voz dos acionistas minoritários apesar do conflito existente nessa megaoperação com parte relacionada, deixou o mercado com o pé atrás. A má notícia para os reticentes é que a União está fortemente presente na Bolsa de Valores. Conforme estudo da Itautrade, 20% das empresas de capital aberto têm o governo federal ou estadual — direta ou indiretamente — dentre seus cinco maiores acionistas. Esse número também inclui as participações controladas por fundos de pensão de empresas estatais. São 80 dentre 409 empresas. Elas representam 48% do Ibovespa.

A Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec) realizou, em novembro, um seminário para debater o tema. O objetivo foi criar um ponto de partida para a formação de grupos de trabalho que venham a encaminhar propostas para os governos federal e estaduais. Uma das ideias defendidas no evento foi o estabelecimento de um convênio entre a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e as autoridades do governo para disseminar as melhores práticas de governança corporativa entre executivos de estatais. Também foi sugerido que a Presidência da República crie um código de conduta sobre declarações e informações prestadas por estatais e órgãos públicos que interajam diretamente com o mercado. O objetivo é evitar declarações públicas displicentes e prejuízos aos acionistas minoritários.

O presidente do conselho do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Gilberto Mifano, alerta também para a formação dos conselhos de administração das estatais. “É fundamental que os integrantes sejam escolhidos por suas aptidões e que estejam preparados para gerenciar uma sociedade anônima”, declara. (R.R.)


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