“Nunca pensei em fazer outra coisa”
Luiz Fernando Figueiredo

, “Nunca pensei em fazer outra coisa”, Capital AbertoQuando foi sondado para a diretoria de política monetária do Banco Central (BC), em 1999, Luiz Fernando Figueiredo respondeu ao presidente Armínio Fraga: “Fico honrado só de ser lembrado. Mas se for para assumir uma função tão importante e de tanta confiança, talvez você precise me conhecer melhor.” Armínio já tinha indicações suficientes das qualidades do então tesoureiro do banco BBA, mas, com seu jeito informal, alongou a conversa, que seguiu noite adentro. No dia seguinte, uma terça-feira, o convite foi refeito, dessa vez oficialmente. E aceito. Durante quatro anos, despachando em Brasília, Figueiredo teria uma experiência crucial em sua carreira.

“O convite foi uma tremenda surpresa”, recorda-se Figueiredo, atribuindo a sua reação na época à pouca idade — 34 anos, o que o tornava um dos mais jovens diretores do BC — e também ao tamanho do sonho que se realizava. “Para mim, era como chegar ao topo”, conta ele, que, desde criança, espelhava-se no exemplo do avô, João Baptista Leopoldo Figueiredo, empreendedor e pioneiro no mercado financeiro, presidente do Banco do Brasil antes da criação do BC. “Tive a oportunidade de trabalhar com algumas das pessoas mais brilhantes do país em suas áreas”, comenta, fazendo questão de enumerar, um a um, os colegas de uma das mais prestigiadas diretorias que o Banco Central já teve. “Foi sensacional.”

É assim, em poucos minutos, que logo se percebe em Figueiredo uma das características certamente identificadas por Armínio naquela noite: a humildade. Junto com ela, ou talvez por causa dela, está a empolgação que imprime a suas experiências adjetivos como “sensacional”, “espetacular” ou “fantástico”. É com um deles que qualifica a fusão, anunciada na véspera, das operações de sua empresa, a Mauá Investimentos, com a gestora Sekular, formando a Mauá Sekular Participações.

Além de agregar novas atividades à Mauá — “wealth management” e gestão de fundos de crédito —, o negócio marcou a sua recuperação. Em março deste ano, a gestora bateu no fundo do poço ao acumular uma perda de patrimônio de mais de 80% em relação ao que administrava um ano antes. “Os clientes ficaram inseguros, com razão. Nossa decisão foi zerar todo o risco da carteira. Em seguida, veio a maior crise da história. Foi a ‘perfect storm’”, diz Figueiredo. As medidas de ajuste, no entanto, se mostraram acertadas, e, em apenas sete meses, a Mauá dobrou o patrimônio. “Você só conhece o lugar em que trabalha quando as coisas vão mal. Hoje estamos vivos, fortes e fizemos uma fusão.”

A Mauá Sekular nasce com cerca de R$ 1 bilhão sob gestão, dos quais R$ 700 milhões vieram da empresa fundada por Figueiredo no início de 2005. Foi naquele ano que o administrador decidiu sair, junto com um grupo de dez pessoas, da Gávea Investimentos, criada por Armínio após a saída do BC. A cisão aconteceu de forma amigável, diz ele, e a Gávea permaneceu sócia da Mauá por três anos. “Havia fundamentalmente uma questão logística, porque o Armínio queria a empresa toda no Rio”, conta Figueiredo, paulistano apegado à família, especialmente aos quatro filhos meninos, dois deles do primeiro casamento.

Teoricamente, o ex-chefe no BC e amigo Armínio Fraga é hoje um concorrente. Mas Figueiredo minimiza a competição no setor. “Conversamos muito e brincamos que nosso concorrente é o CDI.” Ele também rejeita qualquer tentativa de se personalizar sucessos e fracassos nas empresas de asset. “Não acredito nessa história de gênio do mercado financeiro. O talento está no grupo. O Brasil tinha o time dos sonhos em 1982, com os maiores talentos individuais de todos os tempos, e não ganhou a Copa do Mundo.”

As metáforas esportivas permeiam os raciocínios de Figueiredo, que já foi vice-campeão máster de polo aquático duas vezes. A ida para o BC, por exemplo, foi “como ser chamado para a seleção brasileira”. Ele diz que a prática de esportes — polo, esqui, capoeira — o ajuda a controlar o estresse inerente à profissão. Mas o gestor é considerado uma pessoa calma, com um temperamento que foi colocado à prova nos tempos do BC, onde ele se destacava como o diretor de maior exposição na mídia, com a espinhosa tarefa de explicar medidas relacionadas às sucessivas crises que atingiam o Brasil. “Uma vez surgiu um boato nos jornais de que eu tinha brigado com outro diretor. Meus amigos riram, diziam que quem escreveu aquilo não me conhecia, porque eu não brigo com ninguém.”

Calmo sim, mas a determinação férrea já lhe rendeu a pecha de “cabeça-dura” na família. Foi este foco extremo que o norteou na escolha da profissão e na condução da carreira, iniciada nos anos 80 em corretoras, e com uma passagem pelo banco JP Morgan antes de chegar à tesouraria do BBA. “Nunca pensei em fazer outra coisa”, diz ele, que se graduou em administração e finanças, fez cursos de especialização, deu aulas em MBAs, mas considera que seu maior aprendizado foram os quatro anos no BC. “Passei a entender em detalhe a economia.”

A passagem pelo governo o ajuda atualmente na construção de cenários — “Nossa visão é a de que o Brasil viverá um ciclo muito positivo nos próximos cinco anos” —, sempre com a ajuda da equipe, ressalta ele, ampliada de 25 para 40 pessoas com a fusão.

3×4Rotina – Faz ginástica pela manhã, lê os jornais e leva o filho de 5 anos na escola antes de ir ao trabalho. “É uma delícia esse momento que tenho com ele”. Depois da leitura de mais jornais e análises, reúne-se com as equipes da empresa para traçar as estratégias do dia.
Como lida com o excesso de informações – “É um desafio. O mais relevante não é a conclusão das análises, mas a base. Ali pode estar alguma informação ou entendimento que você não está conseguindo ver. Para nós é fundamental ter uma visão independente.”
Almoço – “É 100% trabalho”. Em geral almoça na empresa, em reuniões com comitês internos ou com clientes. “Tento reservar os almoços de sexta-feira, mas nunca funciona.”
Para relaxar – Pratica muito esporte. A vida toda fez capoeira e jogou polo aquático. Ainda compete na categoria máster, participando dos mundiais a cada dois anos. “Ter muitos amigos também ajuda a mudar o foco do trabalho.”
Fim de semana – Tem uma casa de campo, junto a uma represa, onde esquia e anda de motocicleta. “Sou muito caseiro e tenho família grande.” Às vezes precisa trabalhar, como nos meses de negociação com a Sekular.
Cuidados com a saúde – Faz ginástica “religiosamente”, três vezes por semana, além de jogar polo uma vez na semana.
Uma inspiração – O avô João Baptista Leopoldo Figueiredo, do banco Sul Americano, que formou o Itaú. “Ele era um grande profissional, admirado e consultado sobre a visão que tinha das coisas.”
Livro na cabeceira – Está lendo A colossal failure of common sense: the inside story of the collapse of Lehman Brothers. “Os erros do passado ensinam muito.”
Uma vitória – Ter ajudado a implementar o Sistema de Pagamentos Brasileiro. “Talvez seja o melhor do mundo, porque estudamos todos os países que fizeram mudanças.” Ele destaca também a reconquista da credibilidade da Mauá, depois da crise de 2008. “É uma satisfação ver a empresa bem.”
Momento mais difícil – No BC, o ano de 2002, por conta da expectativa de mudança de governo. “As coisas não estavam mais em nossas mãos.” Na Mauá, a crise do ano passado. “Não fizemos nada errado, mas tivemos a perda.”
Talento X disciplina – Acredita que o mais importante é ter disciplina para fazer o dever de casa, e aí então ter condições de acertar. “Quem ganhou dinheiro com ‘Feelings’ foi o Morris Albert”, brinca.
Há dez anos – Era o diretor de política monetária do Banco Central.
Daqui a dez anos – Espera ver a Mauá reconhecida como uma gestora de excelência. “Ainda estarei trabalhando bastante, mas espero ter orgulho do que já construí na empresa e na minha família.”
Conselho para quem está começando – Que os primeiros dez anos da carreira sejam dedicados somente ao aprendizado. “Nessa fase é melhor ganhar pouco e aprender muito.”
Talento que gostaria de ter – É fã de Tom Jobim, e adoraria ter sido músico e compositor. “Mas não levo o menor jeito.”
Viagem marcante – Adora ir para lugares exóticos, como o Egito. “É flagrante o contraste entre a riqueza do passado e a pobreza atual.”
Paixões – Trabalho e família. “Sou uma pessoa apaixonada pelo que eu faço. Meu irmão diz que é impressionante a minha capacidade de capturar prazer no trabalho.”
Superstição – Garante que não tem, mas quando acaba a entrevista pede para não aparecer na capa da revista. Diz que fundos e empresas que ganham destaque em capas acabam indo mal no ano seguinte. “Não acredito em bruxas, mas que elas existem…”

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