No grid de largada
Boas notícias sinalizam perspectivas mais animadoras para conquista do concorrido capital dos fundos de pensão

, No grid de largada, Capital AbertoApós anos patinando e carente de perspectivas econômicas favoráveis, a indústria de fundos de participações em empresas com alto potencial de valorização, conhecida como private equity ou venture capital, começa a dar sinais de que pode deslanchar. Além da tendência de queda nas taxas de juros, o prognóstico para esses fundos – especialmente voltados a investidores qualificados – leva em conta os avanços na institucionalização do setor, expectativas de realização de lucros nos próximos meses e a primeira regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para o segmento.

Juntos, esses elementos começam a compor um cenário mais favorável para o tão esperado ingresso dos investidores institucionais no mercado de capital de risco. Ao regular os fundos private equity por meio da Instrução 391, lançada em julho deste ano, a CVM viabilizou o investimento direto de fundos de pensão em fundos private equity. Até então, devido às normas de entidades reguladoras para que os fundos de pensão somente apliquem em empresas ou fundos fiscalizados pela CVM, esses investimentos não estavam autorizados.

A instrução 391 ficou três anos em preparação na CVM e recebeu mais de 100 sugestões durante o período em que esteve em audiência pública. O resultado foi uma regulamentação que define padrões mínimos de governança corporativa para as empresas investidas de capital fechado e mecanismos que facilitam as relações societárias, como a Câmara de Arbitragem. Com regras próprias, o mercado brasileiro de venture capital experimenta somente agora o que os fundos norte-americanos vivenciaram em 1978, quando saiu a primeira regulamentação para investimentos dos fundos de pensão em private equity.

FUNDOS NOVOS NO MERCADO – Diversos fundos foram criados sob a perspectiva de injeção de recursos de investidores institucionais. Para se ter uma idéia, a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, recebeu este ano propostas de dez novos fundos à procura do capital desses investidores. Por meio do Projeto Inovar, que tem entre seus parceiros o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e a Fundação Petrobras de Seguridade Social (Petros), a Finep, que também financia projetos, faz a ponte entre investidores e empresas que precisam de capital. A concorrência este ano foi maior do que em 2002, quando oito fundos disputaram recursos. Mas ficou bem longe do resultado da primeira reunião entre gestores e investidores, organizada em 2001, da qual participaram 18 fundos.

Stratus Investimentos, Dynamo, Fir Capital e Pátria Banco de Negócios são alguns gestores que buscam capitalizar fundos recém-lançados. Este último criou um produto focado em saúde e educação, destinado a empresas mais maduras. Parte dos R$ 150 milhões que o banco precisa levantar entre 9 meses e um ano já foi captada: R$ 50 milhões vieram do BNDES e R$ 30 milhões do bolso do Pátria. A idéia, segundo Alexandre Saigh, sócio do banco, é abrir um outro fundo, também voltado a empresas nacionais de saúde e educação. O projeto poderá sair do papel ainda este ano ou no próximo e, desta vez, a expectativa é captar com investidores internacionais.

REALIZAÇÃO DE LUCROS – Um novo ciclo de desinvestimentos também poderá aquecer o setor de venture capital. A fase de maturação do investimento normalmente oscila entre cinco e oito anos, conforme o desenvolvimento da companhia investida e a modalidade do fundo. Quanto mais avançado o estágio da empresa, por menos tempo o fundo tende a ancorar recursos nela.

Álvaro Gonçalves, sócio da Stratus Investimentos, frisa que uma onda de desinvestimentos estava prevista para ocorrer entre 2002 e 2003. O atraso, avalia, pode ser atribuído à situação macroeconômica desfavorável, a mudanças nos acordos privados entre os fundos e empresas investidas ou mesmo a resultados insatisfatórios. Pelos cálculos de Gonçalves, há cerca de 100 negócios de valor relevante nas carteiras de venture capital em operação no Brasil. Ele estima que, desde 1996, mais de 300 companhias tenham sido capitalizadas.

As últimas “realizações de lucro” foram com Drogasil e Sé Supermercados. Sem revelar números, Alexandre Saigh diz que o investimento na Drogasil, entre 1994 e 2002, deu retorno anual “bem superior” à Selic atual, de 24,5% ao ano. “Alguns começaram a desinvestir com sucesso. Quando forem mais freqüentes, operações como essas darão confiança aos investidores quanto ao retorno e ao benefício social do private equity”. Sua expectativa é de que 2004 marcará uma nova etapa de captação de recursos.

Exemplo de desinvestimento em via de se concretizar é o da Fundação Vale do Rio Doce de Seguridade Social, a Valia.  De 1998 para cá, a Valia investiu R$ 30 milhões em fundo do Pátria Banco de Negócios, contemplando empresas como Casa do Pão de Queijo, Delboni Auriemo, Camelot e Fotóptica. Está chegando a hora de reaver o investimento feito em empresas mais maduras, no caso o Delboni Auriemo, adianta Manoel Cordeiro Silva Filho, diretor da Valia. “Só o Delboni deve pagar o investimento feito em todas estas empresas”, afirma. Como forma de saída, Cordeiro pretende vender sua participação a potenciais compradores do setor de análises clínicas e diagnósticos.

ARRUMANDO A CASA – Com tamanho anseio de que o setor realmente decole – já que de 2000 a 2002 os investimentos dos fundos private equity caíram 77% em dólar, de US$ 1,48 bilhão para US$ 342 milhões, é de se imaginar que os agentes estejam trabalhando duro para demarcar território no mercado de capitais. E essa mobilização não é de hoje. Antes de a CVM criar a nova Instrução, os gestores começaram a trabalhar para que a indústria de venture capital pudesse se organizar, construir bases institucionais e definir claramente os papéis dos tomadores, gestores e fornecedores de recursos. Por ora, pouco evoluiu no quesito transparência de informações e os raros números levantados sobre o setor continuam díspares. Presume-se que, com o mercado mais competitivo, essas assimetrias diminuam.

A cultura de investimento do brasileiro também passou a ser objeto de análise desses fundos. A história do Brasil apresenta poucos capítulos sobre a relação de financiamento de longo prazo entre investidores privados e empresas. “Um dos principais problemas do private equity no Brasil diz respeito à cultura dos investidores. “O Brasil precisa educar, formar e treinar pessoas, processo que vem evoluindo com a Lei das S.A., o desenvolvimento de boas práticas de governança corporativa e a criação do Novo Mercado”, afirma Luiz Martins de Melo, superintendente de investimento em inovação da Finep. Para atenuar estas questões, foram criados a Associação Brasileira de Capital de Risco (ABCR) e o FGV/CEPE (Centro de Estudos de Venture Capital e private equity da Fundação Getúlio Vargas). Ambos visam, além de capacitar profissionais e elaborar pesquisas e publicações, aproximar o brasileiro da invejada cultura de investimento norte-americana, guardadas as devidas proporções.

ESPECIALIZAÇÃO COM CAPITAL NACIONAL – É certo que o mercado brasileiro de private equity está se desenvolvendo e se aperfeiçoando. Dentre as principais tendências e evoluções do setor estão a especialização, beneficiando fundos setoriais ou regionais, e o fortalecimento dos fundos geridos por brasileiros, até então ofuscados pelo porte dos internacionais. Porém, para que a indústria se consolide e se financie em reais, garantindo menos dependência do capital volátil, deve enfrentar obstáculos até então difíceis de transpor. Um deles é a limitação do mercado de capitais, que dificulta a saída dos investimentos por meio da bolsa de valores. “Pouquíssimas empresas abrem capital, já que as cotações da bolsa estão depreciadas e os custos transacionais e de abertura são muito altos. Além disso, a empresa que recebe recursos de private equity precisa crescer muito para compensar inflação e oscilação cambial”, exemplifica Erwin-Theodor Russel, diretor da Advent International.

Mais do que as restrições do mercado de capitais, difícil mesmo é competir com os elevados juros pagos pelo governo. “Os fundos brasileiros têm dois grandes entraves: o risco de variação cambial para obter funding em moeda estrangeira e a competição de todos os capitais privados com empréstimos tomados pelo setor público”, afirma Cláudio Furtado, professor e diretor do FGV/CEPE. Segundo Carlos Sussekind, superintendente de Relações com Investidores Institucionais da CVM, os fundos de private equity têm garimpado projetos com potencial de retorno esperado entre 50% e 75% ao ano, a fim de fazer valer o risco e superar a remuneração dos títulos governamentais.

REFÚGIO PARA CUMPRIR METAS– Na ânsia de cumprir a meta atuarial de 6% ao ano, mais correção monetária, e de preservar a poupança dos trabalhadores, os fundos de pensão acabam se acomodando nos títulos públicos. Do patrimônio líquido de R$ 200 bilhões das entidades fechadas de previdência, 70% estão alocados em títulos públicos federais. A Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, é uma rara exceção: 58,21% ou R$ 25,3 bilhões de uma carteira de R$ 43,5 bilhões estão em renda variável. Sua parcela destinada aos fundos de participações, no entanto, ainda é pequena, 0,64% ou R$ 277,4 milhões. Cálculos de Cláudio Furtado, da FGV, indicam que, nos Estados Unidos, o investimento padrão de fundos medianamente conservadores em capital de risco oscila entre 3,5% e 5% da carteira.

“Para bons resultados, é necessário sair do panorama instantâneo e pensar no futuro: o horizonte de investimento de um fundo de pensão é de 30 anos. Em um análise de longo prazo, vê-se períodos em que a renda fixa foi negativa em relação à inflação. O ideal é dedicar até 5% do patrimônio em investimentos de maior risco e retorno”, afirma Binder, diretor-executivo da ABCR.

RETÓRICA POUCO CONVINCENTE – Para os grandes investidores nacionais, contudo, o discurso do investimento alternativo e diversificado e do papel dos fundos de pensão no desenvolvimento econômico tem sido pouco persuasivo. Quando o que está em jogo são recursos públicos e o compromisso de apresentar rentabilidade mínima, a preferência é pela cautela. “É lógico que queremos incentivar o crescimento do país, mas o gestor do fundo de pensão tem compromisso com seus participantes. Diversificar o investimento é importante, desde que seja respeitado o trinômio rentabilidade, liquidez e segurança”, observa Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira das Entidades de Previdência Complementar (Abrapp) e da Fundação Sistel de Seguridade Social. Ele ressalta que os fundos de pensão deixaram de ser fornecedores de recursos a perder de vista e que agora é preciso garantir em contrato rentabilidade adequada, período de maturação do negócio e possibilidades de saída do investimento.

Wagner Pinheiro de Oliveira, presidente da Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras, é mais otimista. Ele avalia que o governo tem acenado com a possibilidade de investir no setor produtivo, o que, aliado a melhores condições macroeconômicas, impulsionará a indústria de capital de risco. A Petros aplica R$ 550 milhões de seus R$ 19 bilhões em projetos de infra-estrutura, em muitos casos semelhantes aos investimentos dos fundos de participações. Há dois meses, aprovou um plano de R$ 21 milhões para a construção de uma fábrica de produtos químicos no Rio de Janeiro, em parceria com a BR Distribuidora.

Para os fundos de pensão, argumento a favor da diversificação é pouco convincente

Pinheiro de Oliveira destaca que o horizonte temporal dos fundos de pensão permite investir em empresas de capital fechado e de médio porte. No entanto, frisa, deve-se observar o casamento entre passivos e ativos antes de tomar qualquer decisão. “É preciso ser conservador, fazer uma análise técnica cuidadosa, avaliar a relação risco e retorno, os mecanismos de saída do investimento, ter transparência e presença dos participantes do fundo na gestão”, aconselha. No que diz respeito aos fundos de private equity, ele julga interessante os gestores depositarem recursos próprios no projeto, como forma de provar comprometimento financeiro.

HEDGE CONTRA BAIXA NA SELIC – Há quem diga ainda que um novo fôlego para os investimentos em private equity virá com um movimento mais forte de queda dos juros. Para proteger suas carteiras dos efeitos da queda da Selic, os fundos de pensão terão de correr para investimentos com potencial maior de retorno. Manoel Cordeiro Silva Filho, diretor da Valia, está convencido de que não há outro movimento para os juros senão o declínio, o que deixaria os fundos de pensão um tanto desconfortáveis. “A atitude para gerar melhores resultados e bater a meta atuarial deve ocorrer agora. Daí a necessidade de usar outras alternativas, como private equity, project finance, securitização de recebíveis e fundos imobiliários”.

Investimentos em infra-estrutura podem dar novo fôlego às carteiras de private equity

A Valia tem até 5% da carteira de R$ 4,3 bilhões orientada a investimentos alternativos. O Projeto Marlim, de exploração de petróleo e gás natural no Campo de Marlim (Bacia de Campos – RJ), representa mais da metade dos investimentos nesta modalidade. Sobram cerca de 2% da carteira para private equity. Ao longo dos últimos quatro anos, estes investimentos renderam 25% ao ano.

O executivo não pretende destinar recursos adicionais aos fundos de participações. A intenção é realocar o capital, tirando-o de investimentos já maduros para destiná-lo a novos projetos. Claro que nem toda a simpatia pelas aplicações diferenciadas diminui a preocupação de Cordeiro com seus aposentados. Afinal, no universo dos fundos de pensão, rentabilidade, segurança e liquidez são mesmo palavras de ordem.


Para continuar lendo, cadastre-se!
E ganhe acesso gratuito
a 3 conteúdos mensalmente.


Ou assine a partir de R$ 34,40/mês!
Você terá acesso permanente
e ilimitado ao portal, além de descontos
especiais em cursos e webinars.


Você está lendo {{count_online}} de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês

Você atingiu o limite de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês.

Faça agora uma assinatura e tenha acesso ao melhor conteúdo sobre mercado de capitais


Ja é assinante? Clique aqui

mais
conteúdos

APROVEITE!

Adquira a Assinatura Superior por apenas R$ 0,90 no primeiro mês e tenha acesso ilimitado aos conteúdos no portal e no App.

Use o cupom 90centavos no carrinho.

A partir do 2º mês a parcela será de R$ 48,00.
Você pode cancelar a sua assinatura a qualquer momento.