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Não está nada fácil
Foi-se o tempo em que mercados emergentes eram só crescimento. Agora é preciso talento para gerir riscos num mundo em ebulição

, Não está nada fácil, Capital AbertoGestores de fundos de private equity estão assustados com a velocidade de notícias e eventos que transformam a maneira de fazer negócios nos chamados “mercados emergentes”. Na abertura da 13ª Conferência Anual de Private Equity Global, realizada entre os dias 10 e 11 de maio em Washington DC, o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, ressalvou: “A primeira vez que o título desta conferência, ‘O Novo Clima de Investimento em Mercados Emergentes’, foi divulgado ainda não tinham ocorrido os eventos que presenciamos nos últimos meses”. O clima “novo”, portanto, já era outro. Zoellick se referia a acontecimentos que agitaram o mundo — o terremoto e o tsunami no Japão; as mudanças políticas no Oriente Médio e no norte da África; e a alta dos preços de combustíveis e alimentos. De certa forma, ele resumiu o sentimento da plateia do encontro, que foi organizado pela International Finance Corporation (IFC) em parceria com a Emerging Markets Private Equity Association (Empea). O melhor conselho para quem possui hoje investimentos espalhados pelo globo é esperar o inesperado.

Mas por que os gestores de private equity deveriam se importar com acontecimentos aparentemente tão desconexos entre si? No fim das contas, esses fatores aumentam a percepção de risco. E risco, quando se fala de economias emergentes ou ainda na periferia do capitalismo, é um desejo até certo limite. Depois de uma dada intensidade, vira repulsa.

Tome-se o exemplo da agitação política no Oriente Médio e no norte da África, após as revoltas que estouraram na Tunísia e no Egito. Essa região, conhecida como Mena, vinha atraindo cada vez mais a atenção de investidores internacionais. Embora se imagine que as mudanças em curso trarão benefícios no futuro, o cenário atual de instabilidade bagunça qualquer plano de investimento. Mesmo o bem-humorado Ahmed Heikal, cofundador e presidente da egípcia Citadel Capital, uma das assets preponderantes da região Mena, fecha o sorriso ao comentar as perspectivas de seu país. “O Egito terá de conviver com a alta taxa de desemprego por muito tempo. Após a fase inicial da revolução, os líderes se dividiram, e cada um parece seguir seu rumo próprio”, contou. “Vamos continuar a investir nas empresas, mas acho que teremos muito cuidado em fechar novos negócios.”

O risco político costuma ser um dos maiores obstáculos para o ingresso de capital estrangeiro

TREMORES POLÍTICOS — Alguns mercados se ressentem do ingresso de capital estrangeiro, que vê no risco político um forte obstáculo a ser superado. A edição de 2011 da pesquisa anual da Empea com investidores aponta que ele é um dos maiores impeditivos para a chegada de fundos de private equity no Oriente Médio. Na Rússia, conhecida pela corrupção no governo, o risco político foi apontado como um entrave por 63% dos entrevistados, à frente de questões regulatórias e oportunidades de saída. Até o poderoso Carlyle Group, do alto de seu portfólio de mais de US$ 100 bilhões, não se sente confortável em fazer negócios no país. “Me lembro quando visitei Moscou, ao ver pessoas andando armadas nas ruas, não me senti seguro. Como líder dessa companhia, quero que meus profissionais assumam riscos ao comprar empresas que cresçam 20% ao ano, mas não quero que ninguém arrisque a sua vida”, afirmou William Conway Jr., sócio-fundador e diretor geral do Carlyle.

Já a queixa mais comum contra China e Índia, alvejadas pelos estrangeiros há muito mais tempo, são os preços altos. Por causa da sensação de bolha, os dois países não causam mais o frisson de outrora. “É comum ouvirmos que, enquanto na Índia não há infraestrutura; na China, trens percorrem milhares de quilômetros de trilhos, mas sem passageiros”, ironizou Prakash Mehta, sócio do escritório de advocacia Akin Gump Strauss Hauer & Feld, indicando o descompasso entre as expectativas e a vida real. Ele sugere que o “segredinho sujo” chinês é o fato de alguns proeminentes gestores locais de fundos de private equity não estarem mais investindo na terra de Mao, em razão dos preços caros. Eles estariam mirando ativos na vizinhança.

MEDO DA INFLAÇÃO — A derrocada dos mercados desenvolvidos durante a crise financeira lustrou as qualidades dos países que compõem a sigla Brics — Brasil, Rússia, Índia, China e, a partir deste ano, a África do Sul. Agora, esse grupo precisa aprender a digerir os recursos que recebeu. “Estamos observando aperto monetário, valorização cambial e níveis de inflação até mais altos do que esperávamos”, disse Jeffrey Leonard, presidente do Global Environment Fund (GEF), fundo que gere cerca US$ 1 bilhão. “Índices inflacionários entre 9% e 10% na Índia e na Rússia são preocupantes. Isso fatalmente muda o perfil de investimento de longo prazo do gestor.” Para completar, as bolsas de valores dos mercados emergentes acabaram atraindo a atenção, deixando em segundo plano os investimentos de private equiy, que não têm liquidez.

“O Brasil é a última nação feliz do planeta. Não há substituto para esse espírito empreendedor”

Não bastassem problemas de ordem interna para resolver, os Brics também têm de dividir os holofotes com países menores que caem no gosto da comunidade de investidores. Num evento patrocinado pela IFC, cujo mandato é levar desenvolvimento para onde ele não existe, é natural haver uma empolgação em torno dos chamados “mercados de fronteira”. Hoje, o portfólio da IFC alcança lugares como Bangladesh, Butão e Nepal. De acordo com Zoellick, nos últimos anos, a África tem oferecido os melhores retornos para a instituição. Essas localidades podem não ser o sonho de consumo de grande parte de investidores privados, mas passos da IFC e de outros bancos de fomento não demoram muito a ser copiados.

Nesse contexto cada vez mais complexo, os gestores têm exercido um trabalho ingrato na hora de conquistar investidores e captar. Dados da consultoria Preqin, especializada em investimentos alternativos, indicam que a captação de fundos de private equity do mundo inteiro no primeiro trimestre de 2011 foi a mais minguada desde 2004. O total arrecadado no período foi de US$ 46 bilhões, queda de 40% em comparação ao mesmo intervalo do ano passado. Os números não refletem apenas a captação de fundos focados em mercados emergentes, que, diga-se, vêm ganhando mais importância em proporção aos desenvolvidos. Contudo, todos que operam nesse segmento admitem as dificuldades atuais.

AUSÊNCIA DE TALENTOS — Jonathon Bond, sócio da Actis, gestora de origem inglesa com mais de US$ 4,6 bilhões em fundos sob gestão, acredita que o desafio nos mercados emergentes é encontrar nichos e saber explorá-los bem. A maioria dos investidores procura esses países embevecidos pela tese do crescimento acentuado e acelerado. Na pesquisa da Empea, esse é o fator número um de atração, mais até do que a relação entre risco e retorno geralmente associada a essas economias. No entanto, o mito de que a expansão do PIB basta, aos poucos, se esvai. “Não adianta entregar seu patrimônio e esperar que ele cresça sozinho”, concluiu Scott Kalb, chefe de investimento da Korea Investment Corporation (KIC), empresa que gere fundos soberanos da Coreia do Sul. Há dificuldades a serem superadas nos mercados emergentes. Conway Jr., do Carlyle, reclama, por exemplo, da escassez de administradores de empresas habilidosos. “Nos Estados Unidos, se um CEO é ruim, sabemos que vamos procurar outro e substituí-lo. Nos mercados emergentes, geralmente, ele permanece até que decida por conta própria que não é a pessoa certa para o papel”, comparou. Como lidar com toda essa limitação? “Fizemos ótimos e péssimos negócios na China. O que os bons tinham em comum? Talvez seja sorte”, despistou.

SORTE BRASILEIRA — No meio de tudo isso, o Brasil continua se saindo bem. Instabilidade política o País não apresenta, e os fundamentos da economia ainda são considerados sólidos. Para os próximos anos, o Brasil é visto como o destino mais atraente para compras de fundos de private equity, seguido pela China, conforme o levantamento da Empea. A despeito de os preços das aquisições não andarem mais convidativos como outrora, investidores confiam na competência de gestores locais para pinçar boas compras. “Definitivamente, o Brasil está mais caro hoje. Mas, como qualquer outro mercado, certamente abriga oportunidades. Resta saber procurá-las”, declarou Steve Kaell, analista da Globalist Capital Management, firma de private equity baseada nos Emirados Árabes Unidos.

Há cinco anos investindo em ativos brasileiros, o fundo endowment da George Washington University também não perdeu o entusiasmo com que olha para o País, onde detém US$ 70 milhões divididos entre bolsa e private equity. “É um mercado que apresenta muitas possibilidades com riscos adequados aos retornos”, avaliou Donald Lindsey, chefe de investimentos da universidade. Dentre as qualidades do Brasil, ele sublinha a expansão da classe média e a presença de “empresas de classe mundial”. No pacote de ameaças, Lindsey insere a inflação e a valorização do real. “Mas não acredito que haja muito o que possa ser feito quanto a isso. E, ao que parece, o governo tem adotado as medidas certas”, opinou.

Outro ponto geralmente elogiado pelos estrangeiros é a cultura empreendedora verde-amarela. “Costumamos dizer que o Brasil é a última nação feliz do planeta. Não há substituto para esse espírito empreendedor. A vontade de vencer é muito importante”, atestou Philip Fitzgerald, superintendente da Paladin Realty Partners, empresa de investimentos imobiliários com patrimônio de US$ 400 milhões alocados em solo brasileiro.

O executivo foi um dos palestrantes da sessão da conferência dedicada a discutir o Brasil. Assim como seus pares, ele tentou dissipar os receios de saturação no País. O crescimento vertiginoso do setor de construção, aliás, também tem despertado a cautela dos estrangeiros. Fitzgerald fez questão de dizer que não há bolha. “Três coisas movimentam o mercado imobiliário: aumento demográfico, aumento de empregos e aumento de salários. O Brasil reúne os três ingredientes e está assistindo a uma demanda real por imóveis”, argumentou. Ele explica que só haveria riscos se a venda de imóveis estivesse sendo movida por especulação. “A maioria das pessoas está comprando casas para morar e não para deixá-las desocupadas”, considerou.

Álvaro Gonçalves, sócio da gestora paulistana Stratus, combateu a imagem de superaquecimento. Ele ressaltou, por exemplo, que grandes investimentos feitos por fundos de private equity no Brasil no ano passado, protagonizados por grifes como Carlyle, trouxeram uma falsa impressão. “Apenas 9 das 38 aquisições feitas em 2010 foram responsáveis por 85% do volume investido”, minimizou. Esse número, segundo ele, é baixo em termos históricos e, portanto, o potencial de negócios ainda é grande, sobretudo, em empresas de médio porte e no estágio de venture capital. Gonçalves atentou para o fato de que a indústria de venture capital e private equity no País chegou à “adolescência” só recentemente. Isso significa que há espaço para a entrada de novos gestores. “Hoje, os maiores competidores são de fora da indústria, como holdings e family offices, que não trabalham com os mesmos objetivos de gestores de private equity”, constatou. São oportunidades como essas que fazem os problemas do Brasil até parecerem singelos num mundo tão complexo.


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