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Relevo | Leonardo Pereira
“A CVM está preparada para lidar com um Brasil novo”
Leonardo Pereira

Leonardo Pereira

No dia 14 de julho, o engenheiro Leonardo Pereira encerrou sua gestão à frente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Foram quase cinco anos envolto com as questões de um mercado de capitais combalido pela desaceleração econômica e por escândalos corporativos, como a bancarrota do Grupo X e as denúncias derivadas da Operação Lava Jato. Os últimos dias de Pereira no cargo de presidente da autarquia foram movimentados.

Na semana passada, a CVM divulgou sua primeira norma sobre equity crowdfunding (ao longo do mandato, foram editadas 56 instruções) e avaliou processos importantes — até o fim de junho, a gestão de Pereira acumulava 234 processos julgados. O destaque final ficou por conta de casos envolvendo a Petrobras. Em sua última sessão de julgamento, ele fez coro aos demais diretores ao absolver os ex-presidentes da petroleira Maria das Graças Foster e José Sérgio Gabrielli da acusação de falha nas informações prestadas ao mercado na megacapitalização promovida pela petroleira em 2010. A CVM apurava se a companhia havia vendido 120 bilhões de reais em novas ações fornecendo dados falsos ou incompletos aos investidores. Já ao julgar a adoção do hedge accounting pela empresa ele foi voto vencido.

Os desafios foram tantos que, nesses últimos tempos, Pereira passou a ouvir uma pergunta recorrente: “O que você diria ao seu sucessor?”. A resposta veio em evento promovido pelo escritório Cantidiano Advogados, no último dia 7, em São Paulo. Pereira listou os três itens que avalia merecerem a atenção de Marcelo Barbosa — na noite de 12 de julho, o Ministério da Fazenda oficializou a indicação do advogado, que agora precisa ter seu nome referendado pelo Congresso. Até lá, Pablo Renteria assume a função de presidente interinamente.

“É preciso prestar atenção aos três ‘cês’. O primeiro tem a ver com o nosso papel como reguladores de conduta. O segundo ‘c’ é de coordenação, fundamental se queremos um mercado de capitais mais forte, integrado e que funcione. O terceiro é a capacitação. Questões como tecnologia e orçamento se resolvem, mas se não investirmos em pessoas, teremos um problema”, destacou.

A seguir, a entrevista que Pereira concedeu à CAPITAL ABERTO dias antes de deixar a CVM e partir para os Estados Unidos, onde cumprirá a quarentena de seis meses — imposta a todos os diretores que deixam o órgão regulador — como pesquisador convidado na Harvard Law School.

Escândalos

“Não esperava que todos esses escândalos envolvendo companhias de capital aberto fossem aparecer. Quando surgiram os problemas envolvendo o Grupo X, muitos falavam: essa será sua grande crise. Hoje quase não se fala mais do caso, apesar de estarmos julgando pontos muito importantes. Eu estou surpreso com a falta de reflexão do mercado sobre os casos envolvendo o Eike Batista e suas empresas, que foram muito sérios para o mercado de capitais. Esse é um grande caso para estudo sobre a prestação de informações, o papel do controlador e do conselheiro de administração, o que se espera da atuação de um administrador diligente e o que se entende por dever de lealdade.”

Insider trading

“O grupo de trabalho sobre o tema foi encerrado no ano passado, e as propostas estão sendo implementadas. Foram colocados novos filtros [na atividade de fiscalização]. O trabalho ficará mais evidente quando alguns casos-piloto forem julgados. Temos dois inquéritos sendo instaurados dentro dessa nova metodologia — que envolve mais interação dentro da CVM, interlocução com outros órgãos e análise das conexões existentes nas redes sociais. O grande desafio nas questões de insider é ter evidências suficientes para consolidar uma boa peça acusatória.”

Governança

“Vimos que as atitudes estavam muito na forma e pouco na substância. Saio contente por termos tido a reforma do Novo Mercado, a discussão sobre as sociedades de economia mista e a elaboração do Código Brasileiro de Governança, que envolveu 11 entidades totalmente diferentes.”

MP 784

“A MP gera mais responsabilidade para o colegiado exercer seus poderes. Hoje, a caixa de ferramentas da CVM para punir é maior, e ela deve ser usada com técnica e cuidado. O limite de 500 mil reais [multa máxima que podia ser aplicada pelo regulador antes da MP] atendia alguns casos, mas outros não. E ainda gerava a percepção de que a multa máxima estava embutida no custo da transação irregular.”

Acordo de leniência

“A discussão sobre a regulação dos acordos está sendo feita e haverá audiência pública. Essa é uma prioridade. Não vamos punir ou fazer acordos de uma forma que seja ruim para a sociedade. A missão da CVM é assegurar que o mercado de capitais seja mais forte e resiliente.”

Caso Eletrobras

“Divulgamos um comunicado sobre esse assunto basicamente dizendo que esse colegiado tem o mesmo pensamento daquele que proferiu a decisão [em 2015, de responsabilizar a União por ter votado em situação de conflito de interesses numa assembleia da Eletrobras]. A discussão sobre esse caso não é pacífica [em junho, o conselhinho reverteu a decisão da CVM], mas se as respostas fossem claras e evidentes não precisaríamos discutir para evoluir. Só acho importante lembrar que governança corporativa é substância e não apenas forma.”

JBS

A CVM foi rápida [abriu 13 processos e investigações relacionados a JBS] porque os estoques de processos haviam sido limpos. Hoje, se um caso importante e com efeito sistêmico chega à CVM, o processo pode ser instaurado em 15 dias. Temos um comitê de gestão de risco unificado que faz reuniões semanais para coordenar a estratégia de investigação e acusação — para evitar que a fragmentação dos casos em vários processos vire diluição. Mas, em algumas situações, não dá para colocar tudo num saco só. O caso Petrobras, por exemplo, tinha um processo-mãe que precisou ser fragmentado.”

Arrumação

“Era necessário fazer uma arrumação. Eu e Maria Helena [presidente da autarquia entre 2007 e 2012] atuamos numa CVM pós-crise de 2008, que mudou totalmente o papel do regulador e em que as discussões ganharam outro patamar. Em 2012, quando entrei na CVM, listei quatro prioridades. Uma era retomar a discussão sobre governança. A outra, no campo da contabilidade, era o papel do auditor — não por problemas, mas por achar que o Brasil tinha se saído bem na adoção do IFRS, padrão contábil muito mais subjetivo. A terceira prioridade era a indústria de fundos, por causa do seu tamanho e importância. A quarta, a capacitação e educação financeira. A partir dessas prioridades, traçamos um plano estratégico, que foi realmente implementado. Hoje, apesar dos desafios, acredito que a CVM está preparada para lidar com um Brasil novo.”


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