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Ofertas que dão briga
Randall Thomas

Os Estados Unidos têm a fama de ser o maior mercado de processos judiciais do mundo. A repercussão pública que algumas tentativas de fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) entre companhias norte–americanas provocam também reforça a crença de que essas operações quase nunca terminam nas bolsas de valores, mas, sim, nos tribunais. Professor da escola de direito da Universidade Vanderbilt, de Nashville (Tennessee), e autor de vários artigos e pesquisas sobre legislação societária e do mercado de capitais norte–americano, Randall Thomas combate essa ideia no seu estudo mais recente, publicado em setembro. Em parceria com outros pesquisadores, ele detectou um número relativamente baixo de transações de controle que geram, de fato, litígios: 12%, entre 2.512 anunciadas entre 1999 e 2000. Thomas conversou com a CAPITAL ABERTO sobre as razões para as disputas e os variados conflitos em negociações de M&A.

, Ofertas que dão briga, Capital AbertoCAPITAL ABERTO: Por que a parcela de ofertas de fusão e aquisição que causam disputas judiciais nos Estados Unidos é menor do que o senhor imaginava?

RANDALL THOMAS: Essa foi uma das descobertas mais surpreendentes do estudo. Isso pode ser explicado pelo fato de termos olhado para transações de todos os portes. A percepção das pessoas sobre litígios é formada pelas grandes operações, acima de US$ 1 bilhão, porque são essas que entram no jornal e atraem a atenção da maior parte do público. As transações maiores também tendem a provocar mais disputas judiciais.

CAPITAL ABERTO: Quais são as razões mais frequentes para pendengas judiciais em operações de M&A norte–americanas?

RANDALL THOMAS: A vasta maioria das ações judicias são movidas por acionistas da companhia–alvo de uma oferta. A alegação típica é de que os administradores venderam a companhia por um preço muito barato ou se recusaram a vendê–la quando deveriam ter aceitado (nos Estados Unidos, os administradores das companhias precisam recomendar o aceite ou a recusa a uma oferta de aquisição). Essa segunda categoria é formada por ofertas hostis, quando a administração está resistindo a entregar uma empresa a um comprador indesejado.

CAPITAL ABERTO: Qual é o poder do litígio sobre a conclusão das ofertas?

RANDALL THOMAS: O primeiro efeito é a redução significativa do ritmo de conclusão dos negócios e, posteriormente, a elevação do preço da operação. Na maioria das vezes, o objetivo do litígio é tirar do adquirente um preço mais alto. Mesmo que essa busca atrase a oferta e faça o ofertante desistir dela, abre espaço para que um segundo comprador surja e feche a operação por um valor superior.

CAPITAL ABERTO: Seu estudo toca em um ponto crítico: o papel dos consultores das operações. Por que as empresas devem desconfiar dos assessores financeiros?

RANDALL THOMAS: Geralmente, os bancos de investimento que assessoram tanto as empresas–alvo quanto as ofertantes têm interesse em completar o negócio. Num caso registrado na corte de Delaware, uma companhia–alvo havia fechado um contrato com um banco de investimento pelo qual 98% do pagamento decorreria da conclusão do negócio. O incentivo do banco, portanto, fica claro.

CAPITAL ABERTO: O que as companhias devem fazer para evitar o mau incentivo?

RANDALL THOMAS: Deveriam revisar seus esquemas de remuneração de consultores e eliminar essa motivação. O ideal é um mix equilibrado de remuneração fixa e variável. O conflito de interesses do banco ocorre principalmente em ofertas amigáveis, aquelas apoiadas pelos administradores da companhia–alvo, que desejam levar a transação de M&A a cabo. Nesses casos, a remuneração dos consultores costuma ser baseada no sucesso do negócio.

A incidência de litígio tende a elevar o prêmio de controle da empresa–alvo de uma oferta

CAPITAL ABERTO: Que impactos a crise financeira de 2008 em diante trouxe a essas disputas?

RANDALL THOMAS: A crise financeira alterou a disponibilidade de crédito para o financiamento de operações de M&A. O decréscimo foi expressivo, sobretudo, para transações conduzidas por fundos de private equity, normalmente dependentes de alavancagem. Essa mudança, porém, não é tão evidente em transações com investidores estratégicos e ofertas hostis. Dados do Goldman Sachs indicam, por exemplo, que a proporção de aquisições hostis e estratégicas tem crescido muito de 2008 para cá. Essas operações têm provocado mais pleitos judiciais. Outra mudança importante é o aumento da quantidade de contestações por transação. Hoje, alguém abre um processo em Delaware, outra pessoa em um segundo estado, e um terceiro, numa corte federal. Isso está encarecendo a resolução de disputas e aumentando a demora para a conclusão de operações de M&A.

CAPITAL ABERTO: Pode–se dizer, então, que a probabilidade de ocorrência de processos judiciais prejudica o mercado?

RANDALL THOMAS: Não posso ir tão longe assim. A incidência de litígio tende a elevar o prêmio de controle das empresas–alvo. Para elas, é interessante receber preços maiores. Ao mesmo tempo, isso diminui o número total de transações que são completadas. Para os ofertantes, pode não ser bom fechar menos negócios e pagar mais por eles. Mas é difícil determinar as implicações sociais disso.

CAPITAL ABERTO: Nos últimos tempos, as companhias norte–americanas têm eliminado suas poison pills, por pressões de investidores institucionais. Num mercado volátil e com preços mais baixos, há chances de essa tática voltar a ser aplicada para defender empresas de tomadas hostis de controle?

RANDALL THOMAS: Na verdade, quase todas as companhias que removeram suas poison pills podem voltar a colocá–las em prática imediatamente após o anúncio de uma oferta de aquisição. A regra geral, com exceção de alguns estados, não exige que os acionistas aprovem o uso de uma poison pill. Essa decisão cabe ao conselho de administração de uma companhia. Mas a defesa mais efetiva contra oferta hostil é a combinação de uma poison pill com um conselho classificado (classified board, em inglês). Para que os acionistas consigam excluir uma poison pill, eles precisam eleger conselheiros que façam esse trabalho. No entanto, um conselho classificado, usualmente, renova apenas um terço de suas cadeiras por ano. Assim, os investidores descontentes têm de vencer duas assembleias seguidas para obter maioria no board, enfrentando gastos com campanhas publicitárias para a conquista de votos, algo bem difícil de acontecer. Isso pode arrastar uma operação por anos.

CAPITAL ABERTO: Neste ano, os investidores norte–americanos teriam conquistado o direito de incluir seus candidatos ao conselho nos materiais de divulgação de assembleias (o chamado proxy access), não fosse uma decisão contrária do Tribunal de Apelações do Distrito de Colúmbia. Por que esse direito, básico em países como o Brasil, é tão contestado nos Estados Unidos?

RANDALL THOMAS: Porque o proxy access significaria uma tremenda mudança na América corporativa, na qual os administradores têm grande poder, visto que a maioria das nossas companhias não tem acionistas controladores.

CAPITAL ABERTO: Mas o senhor acredita que faz sentido temer o proxy access?

RANDALL THOMAS: Não acredito que esse direito seria muito usado, pelo menos não pelos agentes mais temidos, que são os hedge funds e os fundos de investimento de organizações sindicais. Os hedge funds já têm conseguido nomear alguns de seus representantes para os conselhos de administração. E o período mínimo de titularidade dessa quantia de ações para que o investidor possa exercer o direito de indicar candidatos também é longo demais para eles, que são mais focados no curto prazo. Para os fundos de sindicatos, a fatia mínima de 3% das ações com direito a voto, como propunha o projeto de lei para qualificar os acionistas habilitados ao proxy access, também é muito elevada.

Leia o artigo mais recente de Thomas sobre litígios em operações de M&A


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