Decisão emblemática
Caso niobium começa a delinear critérios mais claros para as ICOs no Brasil
Pedro Eroles*

Pedro Eroles*

Em dezembro do ano passado, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), por meio de sua Superintendência de Registro de Valores Mobiliários (SRE), entendeu que a Initial Coin Offering (ICO) da criptomoeda denominada niobium coin não estaria no âmbito de sua competência de regulação e supervisão, uma vez que não poderia ser caracterizada como um valor mobiliário.

Com relação às criptomoedas, anteriormente a CVM já havia analisado o caso da plataforma Hashcoin Brasil, relacionado à oferta pública de cotas em grupo de investimento em mineração de bitcoin, determinando na Deliberação 785 a suspensão da oferta e a cominação de uma multa diária em caso de descumprimento da decisão. Mas nessa situação a operação da Hashcoin Brasil foi caracterizada como uma oferta de títulos ou contratos de investimento coletivo (outra espécie de valor mobiliário), e não uma ICO.

A ICO da niobium foi a primeira analisada pela CVM de que se tem conhecimento desde a emissão de uma nota pela autarquia, em outubro de 2017, acerca dos riscos relativos a essas operações. Nessa nota, a CVM esclareceu que os ativos virtuais emitidos por meio das ICOs, a depender do contexto econômico de sua emissão e dos direitos conferidos aos investidores, poderiam representar valores mobiliários e que, nessas hipóteses, as operações correspondentes estariam sujeitas à legislação específica para ofertas públicas de valores mobiliários. Por outro lado, a nota também ressaltava que certas ICOs não configurariam ofertas públicas de valores mobiliários, ficando, portanto, fora do escopo de regulação e supervisão da CVM.

O parâmetro utilizado no memorando da SRE para averiguar a caracterização da niobium como valor mobiliário foi o critério residual incluído em 2001 ao artigo 2º da Lei 6.385 (lei que regula o mercado de valores mobiliários no Brasil), elaborado com base no famoso case americano “Securities and Exchange Commission v. W.J. Howey Company”, que estabelece que são valores mobiliários “… quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros”.

Ao aplicar esse critério, a SRE concluiu que a oferta pública da niobium constituiria um investimento (uma vez que, conforme estabelece o “white paper”, espécie de prospecto da oferta, os investidores adquiririam a niobium pela troca por bitcoins ou ethereums — as quais, por sua vez, podem ser compradas com a aplicação de recursos financeiros) coletivo (visto que será oferecido e adquirido pelo público em geral) e formalizado por um título ou por um contrato (pois a sua formalização se dá pelo recebimento de um e-mail padrão pelo adquirente, com a indicação do procedimento para efetuar a troca de criptomoedas por niobiums). Entretanto, a SRE concluiu que não há qualquer direito a participação, parceria ou remuneração aos investidores pela aquisição da niobium.

Dessa forma, como a niobium não atendeu um dos critérios necessários para a sua caracterização como valor mobiliário — direito a remuneração, parceria ou remuneração aos investidores —, a SRE concluiu que a ICO da niobium não estaria no âmbito da competência de regulação e supervisão da CVM. Contudo, o memorando da SRE foi encaminhado ao colegiado da autarquia, que declarou serem necessárias diligências adicionais para se aprofundar a análise do tema.

Apesar de o entendimento da SRE estar sujeito eventual revisão, o caso niobium começa a delinear de forma mais clara as diretrizes para as ICOs no Brasil. Caso as conclusões da SRE venham a ser confirmadas pelo colegiado da CVM, os critérios para afastamento da competência da autarquia já terão um precedente para orientação do mercado.

Por outro lado, as diretrizes para as ICOs dos ativos virtuais não caracterizados como valores mobiliários permanecem incertas. No Comunicado 31.379/17, o Banco Central afirmou que “não regula nem supervisiona operações com moedas virtuais”, o que suscita a questão: não serão tais ICOs regulamentadas ou supervisionadas por nenhum regulador?

Portanto, não obstante as incertezas regulatórias que ainda permanecem com relação às criptomoedas e às ICOs, a análise do caso niobium pela CVM começa a delinear critérios mais claros para as ICOs no Brasil, o que certamente vem em benefício tanto do mercado quanto da proteção dos potenciais investidores.


*Pedro Eroles ([email protected]) é advogado da área bancária e securitária de Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados

 

 


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