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Construção coletiva
Crowdfunding imobiliário se firma como alternativa de captação de recursos para incorporadoras pequenas
, Construção coletiva, Capital Aberto

Ilustração: Rodrigo Auada

À primeira vista, pode parecer que uma norma da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) criada para regular o chamado crowdfunding de investimento nada tem a ver com o mercado imobiliário. Pois a Instrução 588, que completa um ano no próximo mês de julho e normatiza ofertas realizadas por meio de financiamento coletivo na internet, já impulsiona as captações de recursos de incorporadoras de pequeno e médio portes. Elas podem levantar até 5 milhões de reais utilizando plataformas eletrônicas de investimento participativo — montante relativamente baixo para a indústria de construção civil, mas que faz muita diferença para o financiamento de incorporadoras de pequeno porte.

Na prática, o que a Instrução 588 fez foi estabelecer regras claras para o crowdfunding de investimento, gerando segurança jurídica para emissores, plataformas e investidores. Esse cenário incentivou as incorporadoras, acostumadas a utilizar o tradicional (e caro) empréstimo bancário para viabilizar suas obras, a desbravar o universo do financiamento coletivo, já bastante conhecido das startups de tecnologia. “Com o esclarecimento das regras ficou mais fácil participar do jogo”, observa o diretor executivo da Associação Brasileira das Fintechs (ABFintechs), Paulo Deitos.

A mesma visão tem Alexandre Oliveira, diretor de marketing da gaúcha Urbe.Me, primeiro site de crowdfunding imobiliário do Brasil, lançado em 2013. Ele recorda que, antes da Instrução 588, a Urbe.Me gastava muito tempo estudando a legislação para encontrar caminhos viáveis para as ofertas. Para cada operação era necessário pedir dispensa de registro na autarquia, enquanto a Instrução 588 tornou esse processo automático, desde que atendidas determinadas condições. “Com os parâmetros definidos, conseguimos colocar diversas ofertas no mercado. A norma facilitou a estruturação das emissões, que podiam demorar até dois anos para sair”, conta Oliveira.

As primeiras captações feitas sob a Instrução 588 viabilizadas pela Urbe.Me foram fechadas ainda no ano passado — a norma da CVM é de julho de 2017. As incorporadoras RottaEly e Longitude levantaram, respectivamente, 1,5 milhão de reais e 750 mil reais, destinados a empreendimentos residenciais. O primeiro deles, localizado em Porto Alegre, é uma torre de 14 pavimentos com apartamentos entre 82m² e 110m²; o segundo, um condomínio de casas com dois e três dormitórios em Santana do Parnaíba (SP). Nas duas situações foram distribuídas cotas com valores a partir de mil reais — conforme a Instrução 588, investidores não qualificados podem aportar até 10 mil reais por ano-calendário nesse tipo de oferta. Na média, as captações da Urbe.me contam com a participação de cerca de 300 pessoas físicas.

Desde essas duas ofertas, mais quatro ocorreram na plataforma. Ao todo, as seis emissões somam cerca de 13 milhões de reais — o valor supera com folga os 5 milhões de reais levantados nas quatro captações intermediadas pela plataforma antes da Instrução 588. Uma delas, da W Incorporadora, arrecadou 2,4 milhões de reais para um empreendimento comercial em Florianópolis — o montante é o maior já captado por meio de crowdfunding na América Latina. Para evitar que as incorporadoras se alavanquem em excesso, a Urbe.me limita as captações a 50% do valor total de cada projeto. “Até o fim deste ano, nossa expectativa é que mais oito emissões sejam concluídas”, afirma Oliveira.

Em expansão

O apetite das construtoras menores pelo crowdfunding imobiliário fez a Urbe.me ganhar concorrentes. De acordo com dados da CVM do fim de março, mais cinco plataformas registradas na autarquia permitem a captação de poupança pública para o financiamento imobiliário coletivo: EqSeed, MyFirstIPO, StartMeUp, Glebba e Kria. E esse grupo deve aumentar. Até o fim deste mês, a paranaense FinCo Invest espera obter da CVM o registro para se juntar à turma. Segundo o CEO da empresa, Luiz Felipe Bazzo, há cinco empreendimentos (três em Curitiba, um em Foz do Iguaçu e um em São Paulo) prontos para a fase de obtenção de recursos. Se a autorização do regulador vier no prazo previsto, a primeira operação da FinCo Invest deve ocorrer em julho. “O diferencial estará nos projetos, que devem sempre apresentar alguma inovação arquitetônica ou nos métodos construtivos”, comenta Bazzo. Sua expectativa é que ao menos quatro projetos saiam do papel neste ano, com captação unitária de 1 milhão de reais.

Na plataforma Kria (antiga Broota, que capta recursos também para outros segmentos), a área de crowdfunding imobiliário é fruto de uma parceria com os empresários Caio Teles e Ricardo Penna, que atuam há cerca de 20 anos na construção civil.  Eles esperam viabilizar uma primeira oferta entre julho e agosto deste ano. “Nesse modelo, o Caio e o Ricardo usam a permissão regulatória e a tecnologia da Kria para viabilizar ofertas de incorporadoras e concorrer com a Urbe.Me”, explica Frederico Rizzo, um dos fundadores da Kria.

Limitações

Embora bem recebida por participantes do mercado de capitais, a Instrução 588 não escapou de críticas, especialmente em relação às restrições de tamanho e perfil das empresas aptas a levantar dinheiro pelo crowdfunding de investimento — elas não podem ter receita bruta superior a 10 milhões de reais no exercício social anterior à oferta e serem registradas como emissoras de valores mobiliários na CVM. As limitações evidentemente deixam o instrumento fora do alcance de construtoras maiores.

Nada impede, no entanto, que participantes do setor imobiliário se organizem para, em algum momento, reivindicar uma revisão das restrições. Na avaliação do coordenador-adjunto do grupo de novos empreendedores do Secovi-SP, Rodrigo Fonseca, é possível que, conforme o crowdfunding de investimento ganhe representatividade e demanda, a distensão dos limites seja conquistada. Esse afrouxamento ajudaria as grandes construtoras, que poderiam obter recursos a taxas mais atrativas principalmente para o início das obras — fase em que o custo do capital é mais alto em decorrência do risco maior. A recessão econômica derrubou as vendas de imóveis na planta, modelo em que os compradores financiam diretamente o pontapé inicial das obras. E o problema é que, em geral, os construtores só têm acesso ao crédito bancário com no mínimo 20% da obra executada e 40% do empreendimento vendido.

Riscos

Como forma de garantir a segurança do investidor, as plataformas de crowdfunding não analisam apenas o balanço e o contrato social das incorporadoras, como manda a CVM. Elas também avaliam o potencial de sucesso das vendas do empreendimento, a capacidade da empresa para terminar as obras no prazo, com base no histórico de operação, e o estabelecimento das devidas garantias para eventuais ressarcimentos de investidores caso o empreendimento não seja concluído. As precauções são importantes principalmente por causa da alta demanda por recursos na construção civil. “Recebemos praticamente um projeto por dia”, diz Eduarda Fabris, diretora administrativa e de relações com incorporadoras da Urbe.Me. Tamanha procura requer um filtro eficiente.

Após essas checagens, é chegada a hora de definir um prêmio de risco ao investidor. De modo geral, as incorporadoras têm oferecido uma remuneração mínima que varia entre 100% e 120% do CDI ao ano. Em captações feitas em várias rodadas, algumas delas ainda oferecem como atrativo aos primeiros investidores um piso de rentabilidade superior ao dos que vêm na sequência. Não há teto de ganhos: dependendo da circunstância de venda do imóvel após a conclusão das obras a rentabilidade pode subir. Na Urbe.me, os resultados das vendas do empreendimento são apurados trimestralmente, e o investidor recebe o dinheiro diretamente na sua conta bancária. Embora as oportunidades oferecidas nas plataformas possam ser atraentes, é bom o investidor ser cauteloso. As incertezas que ainda pairam sobre a economia e a política podem reservar ao setor da construção civil novos chacoalhões.


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